Discurso no Senado Federal

DEFESA DA ALTERNANCIA NO PODER PARA O APERFEIÇOAMENTO DA DEMOCRACIA.

Autor
Ernandes Amorim (PPB - Partido Progressista Brasileiro/RO)
Nome completo: Ernandes Santos Amorim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA POLITICA.:
  • DEFESA DA ALTERNANCIA NO PODER PARA O APERFEIÇOAMENTO DA DEMOCRACIA.
Publicação
Publicação no DSF de 07/10/1998 - Página 13309
Assunto
Outros > REFORMA POLITICA.
Indexação
  • CRITICA, REELEIÇÃO, DEFESA, ROTATIVIDADE, PODER, BENEFICIO, DEMOCRACIA, RESPEITO, TRADIÇÃO, REPUBLICA, BRASIL.
  • DEFESA, REABERTURA, DEBATE, CONGRESSO NACIONAL, REELEIÇÃO, DESINCOMPATIBILIZAÇÃO, UTILIZAÇÃO, PODER PUBLICO, CANDIDATO.

O SR. ERNANDES AMORIM (PPB-RO. Pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, já antes da posse do Presidente Fernando Henrique Cardoso predominava, entre nós, a discussão sobre a reeleição do Presidente da República e, em seguida, de governadores e prefeitos. A discussão não poderia ter sido mais copiosa, vasto o número daqueles que - professores, juristas, advogados e demais especialistas - falaram e escreveram sobre a questão. O debate propiciou, ainda, reuniões, seminários e o assunto ocupou, anos a fio, posição privilegiada na pauta da mídia. No futuro, aquele que se interessar pela matéria encontrará abundantes manifestações, sobretudo em defesa da reeleição.

Infelizmente, esse provável e curioso pesquisador em lugar de argumentos convincentes achará muita falácia. No copioso material, pouco verá que atenda a princípios básicos de ética e moral, coisas que, juntamente com nossas próprias tradições, estiveram bem longe do farto debate de uma questão constitucional de fundamental importância para o nosso futuro.

Logo surpreender-se-á, esse estudioso de amanhã, com a quase unânime invocação do exemplo americano em abono da tese da reeleição, com a indispensável distorção, a fim de torná-la favorável ao Brasil, o que, na verdade é implacável condenação. Mas não verá menção a George Washington que, signatário da Carta de Filadélfia, acatou a reeleição por circunstâncias especiais, mas recusou o seu terceiro mandato, por achar que a rotatividade do poder era essencial para a manutenção da democracia americana recém-instalada. Como também não saberá que a maioria dos candidatos à reeleição, nos Estados Unidos, foi derrotada.

                  As Constituições brasileiras, inclusive a última, assinada pelo nosso atual Presidente, vedaram a reeleição. Sua adoção é um retrocesso político. As instituições da América Latina têm sofrido e sofrem com essa tese e estão sendo ameaçadas pela re-reeleição pretendida por Carlos Menen e Alberto Fujimori. E nós, chegaremos lá? Ou a imposição do parlamentarismo, para mais um mandato aos que serão reeleitos, já está decidida? Será negociada, como o foi a reeleição? A História nos guarda bons exemplos do peso do “encargo” do poder, sem dúvida sentido por Stálin, Hitler e outros déspotas.

                  O suposto pesquisador surpreender-se-á, também, com o esforço com que se buscou exemplos na Europa e em todo o mundo a favor da reeleição e da extinção da inelegibilidade, para liqüidar a rotatividade do poder, base de todo regime democrático, enquanto eram silenciadas as lições de nosso passado, na singular tradição republicana brasileira que levou nossas já abundantes constituintes a manter, sempre, a proibição de reeleição, desde a Constituição de 1891. Como se fosse o Brasil desprovido de tradições merecedoras de, ao menos, atenção. Como se o Brasil só agora nascesse de feliz parto da globalização, tornada maravilha surgida do nada, e não fruto de ininterrupto processo histórico, ao passar dos séculos. De igual maneira, ignora-se a história do Continente, bastando mencionar Argentina e México, países de onde presidentes, a despeito de seus encargos, tiveram que ser escorraçados do poder por revoluções. Tudo mergulhado em sepulcral silêncio sobre nossas tradições republicanas, já bicentenárias.

Hoje, é perceptível geral reclame para que o Congresso, com a máxima prioridade, reabra o problema, não só para repensar sobre a vantagem ou desvantagem da reeleição, mas, principalmente, se mantido o instituto, estabelecer os prazos de desincompatibilização daqueles que Presidente, governadores ou prefeitos se candidatem ao mesmo cargo. Ainda em plena campanha eleitoral, o apodrecimento de costumes políticos eleitorais estarrece a Nação, já plenamente ciente da gravíssima crise que a envolve, no comprometimento de seu futuro próximo. Debate e discussão substituídos pelo poder do dinheiro, público ou privado, que utiliza os fantásticos recursos que a técnica colocou à disposição da mídia para ludibriar o País, pelo uso de escabrosa manipulação.

A presença dos governantes no cargo provoca uma desigualdade entre os demais concorrentes. O uso da máquina administrativa, por mais que neguem os atuais ocupantes dos cargos, é uma realidade e atinge o caráter democrático que deveria reger as eleições. A revisão do processo eleitoral vem ganhando corpo em várias camadas da sociedade brasileira, especialmente, nos meios político e jurídico, mais atentos ao problema. Não há justificativa para que um governador que queira concorrer ao Senado ou à Câmara seja obrigado a desincompatibilizar-se do cargo 6 meses antes das eleições, mas que nele possa permanecer se for candidato à reeleição para o Governo.

Aprovamos, Senhor Presidente, a reeleição sem regras claras, o que está provocando um contingente de abusos e permissividades jamais vistos entre nós. O monopólio do poder acabará sendo uma realidade quando todos sabemos que, para manter viva a democracia, a rotatividade é necessária. Infelizmente, a ação direta de inconstitucionalidade contra a Emenda 16, que tratava da reeleição, foi rejeitada pelo Supremo Tribunal Federal, o que permitiu a não desincompatibilização dos atuais detentores dos poderes federal e estadual.

Não há mais como tapar o sol com a peneira: o mundo inteiro está ciente da profunda crise econômico-financeira em que se debaterá o Brasil, anos a fio, dela decorrendo, sabemos todos, ônus quase insuportável para a imensa maioria dos brasileiros. O momento exige reflexão e a busca de soluções que aprimorem o nosso processo político-eleitoral.

Não há quem, entre nós, esteja cego para a crise que avassala o Brasil, bem como para a deterioração da política brasileira. Acautelemo-nos para que não sejamos vítimas de convulsão social, o que só nos será possível se voltarmos para nossas próprias tradições culturais e políticas, nossos próprios sonhos, fruto da esquecida grandeza desse País. Instituição alguma, país algum salvar-nos-á, pois nosso futuro dependerá apenas de nossas próprias forças e de nossos próprios recursos. E a purificação político-eleitoral é condição sine qua non para dias mais venturosos, aqui se impondo o reexame de mudanças constitucionais agora promovidas, sobretudo no tocante a inelegibilidade, incompatibilidade e desincompatibilização.

Que a revisão da Emenda Constitucional que previu a reeleição seja feita o quanto antes para que, já na próxima eleição, as regras sejam mais claras e menos incongruentes. A desincompatibilização, ficou provado nessa campanha, impõe-se e somos nós, legisladores, os responsáveis pela sua adoção a fim de que o País e os demais candidatos não venham a passar, uma vez mais, pelas agruras e injustiças cometidas neste pleito.

Muito obrigado!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/10/1998 - Página 13309