Discurso no Senado Federal

IMPORTANCIA DO I CENSO DA REFORMA AGRARIA DO BRASIL, TRABALHO GIGANTESCO LEVADO A EFEITO POR 29 UNIVERSIDADES NOS 1.460 PROJETOS DE ASSENTAMENTO DO INCRA.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA AGRARIA.:
  • IMPORTANCIA DO I CENSO DA REFORMA AGRARIA DO BRASIL, TRABALHO GIGANTESCO LEVADO A EFEITO POR 29 UNIVERSIDADES NOS 1.460 PROJETOS DE ASSENTAMENTO DO INCRA.
Publicação
Publicação no DSF de 18/11/1998 - Página 16087
Assunto
Outros > REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • COMENTARIO, POSIÇÃO, ORADOR, DEFESA, REFORMA AGRARIA, PAIS, FORMA, PROMOÇÃO, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, EXTINÇÃO, CONCENTRAÇÃO, SISTEMA FUNDIARIO.
  • ELOGIO, ATUAÇÃO, MINISTERIO EXTRAORDINARIO DE POLITICA FUNDIARIA (MEPF), IMPORTANCIA, TRABALHO, ESTATISTICA, REFORMA AGRARIA, ASSENTAMENTO RURAL, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA), FORNECIMENTO, DADOS, INFORMAÇÕES, VIDA, POPULAÇÃO, COMPROVAÇÃO, VINCULAÇÃO, PESSOAS, AGRICULTURA, DESMENTIDO, FOMENTO, POLITICA FUNDIARIA, MIGRAÇÃO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP).
  • CONGRATULAÇÕES, UNIVERSIDADE FEDERAL, EXECUÇÃO, PROGRAMA NACIONAL, EDUCAÇÃO, ASSENTAMENTO RURAL, REFORMA AGRARIA, LANÇAMENTO, GOVERNO, OBJETIVO, ALFABETIZAÇÃO, TRABALHADOR RURAL.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, numerosas foram as ocasiões em que ocupei o espaço destinado por esta Casa a pronunciamentos para tratar de um assunto ao qual dedico particular interesse e do qual procuro manter estreito acompanhamento. Refiro-me ao tema sempre momentoso da reforma agrária e de tudo que a cerca.  

Tenho defendido com viva ênfase a necessidade de promovermos uma autêntica reforma agrária em nosso País. Estou mais do que nunca convencido de que essa providência é imprescindível, imperiosa e que a decisão de fazê-la deve ser inabalável. Nos vários pronunciamentos que fiz sobre esse assunto, recordo-me de ter alinhado fortes motivos em sua defesa. Afinal, providências efetivas direcionadas para fixar o homem no campo, dando-lhe oportunidade de trabalho e elevando-lhe a qualidade de vida, contribuem não apenas para aliviar as tensões sociais nas cidades, altamente agudizadas pelo êxodo rural, como também constituem decisivo instrumento para promover a distribuição de renda e reverter a crônica concentração da estrutura fundiária brasileira.  

Por partilhar dessa crença, mantenho permanente e vivo interesse por todas as iniciativas que venham somar contribuições ao objetivo maior da implantação da reforma agrária em nosso País. Nesse sentido, confesso ter sentido inusitado prazer ao tomar conhecimento da realização do I Censo da Reforma Agrária do Brasil , trabalho gigantesco levado a efeito por 29 universidades nos 1.460 Projetos de Assentamento do INCRA.  

Os resultados obtidos no Censo fornecem um retrato do que são os assentamentos e de como vivem suas populações. Esse trabalho nos permite afirmar que, de agora em diante, os debates sobre a reforma agrária e as decisões para o setor estarão fundamentados em dados concretos, deixando para trás muitos mitos que a ausência de informação e a falta de conhecimento real foram gerando aqui e ali.  

Repito, foi um trabalho gigantesco, que vai imprimir excepcional significado às atividades do Ministério Extraordinário de Política Fundiária e do seu órgão executor, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA. Lançado o desafio de realizar o Censo, o Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras tomou a peito a missão, disponibilizando 41 professores-supervisores e mobilizando mais de 1.800 alunos-entrevistadores, que formaram equipes de pesquisa em 26 estados da Federação. Essas equipes percorreram 1.460 Projetos de Assentamento, constatando a presença de 199.218 famílias beneficiárias da reforma agrária até então desenvolvida pelo governo federal, sem contar a participação, nesse processo, de estados e municípios.  

Um dos resultados mostrados pelo Censo, digno de nota, é que, após ter seu pedaço de terra, o assentado não o deixa, porque sua vida, mesmo que ainda precária, está melhor do que era antes. Sabemos que sua renda familiar média ainda é baixa para o padrão desejável, mas é bem melhor do que a de milhões de brasileiros que vivem nas cidades, tendo de enfrentar tensões urbanas de toda ordem, dificuldades de moradia, de transporte, além do terrível drama do desemprego. Ademais, há outro fator digno de nota: no campo, o assentado produz grande parte do alimento que consome, garantindo o sustento para si e para a família.  

Um dos mitos construídos por setores da sociedade brasileira que se opõem à reforma agrária foi derrubado pelo Censo. Argumentava-se que a distribuição de lotes estava contemplando grande número de pessoas sem vinculação com a agricultura. Ao divulgar o resultado do Censo, o Ministro Raul Jungmann desmentiu esse e outros mitos, tomando como base dados do Estado de São Paulo. Nesse Estado, esmagadora maioria dos beneficiários da reforma agrária - 91,94% - têm origem no meio rural. Perto de 60% dessa população trabalhava no campo quando foi assentada.  

Os números totais evidenciam que estão nos assentamentos do INCRA principalmente agricultores tradicionais, pois 44% são originários do campo e trabalhavam como parceiros, arrendatários, acampados ou ocupantes de áreas.  

Outro mito foi destruído. Argumentavam muitos que a reforma agrária em São Paulo estaria incentivando a migração de habitantes de outros Estados do País, constituindo-se no principal motor da demanda por terra. Tal tese foi contestada pelos números do Censo. No universo de pessoas já assentadas naquele Estado, 91,26% procedem de municípios paulistas. Perto de 45% dos entrevistados estão assentados no seu próprio município de origem. Ou seja, não é verdade que a política fundiária esteja fomentando uma migração em massa.  

Há outro dado para o qual devemos voltar nosso olhar, desta feita, um olhar deveras preocupado e inquietante. Diz respeito ao nível de estudo dos beneficiários. Do total, perto de 30% são analfabetos. No meu Estado, o Ceará, essa porcentagem beira os 50%. Ainda no Ceará, não chegam a 6% os beneficiários que chegaram a cursar, no máximo, a 4 a. série do primeiro grau. Esses dados são preocupantes, Sr. Presidente, porque sabemos quão é importante a educação para as pessoas terem um mínimo de sucesso no desempenho de qualquer ofício ou profissão. No caso da reforma agrária, não basta conceder a terra e assentar nela o agricultor. É preciso saber trabalhar a terra para colher dela os melhores frutos. Com analfabetismo, ninguém chega a lugar algum.  

Os dados sobre educação nos assentamentos no INCRA não passaram despercebidos pelo governo federal. O Ministro Raul Jungmann, no momento mesmo em que divulgou à imprensa o resultado do I Censo da Reforma Agrária , manifestou a necessidade de o governo federal montar, com a devida urgência, programas específicos para atenuar a situação. Revelou ainda já ter recorrido ao Ministro Paulo Renato, da Educação, para mobilizar as universidades federais na preparação, em caráter emergencial, de campanhas de educação básica para os assentados.  

A idéia do Ministro Jungmann teve a adesão imediata do Presidente Fernando Henrique Cardoso. E recentemente, no início de junho, foi lançado o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária , o Pronera, que antes mesmo do lançamento oficial, já contava com mais de 20 projetos, apresentados por Instituições de Ensino Superior, voltados para a alfabetização de mais de 60 mil trabalhadores rurais jovens e adultos.  

Nesse ponto, quero dirigir um voto de aplauso às nossas universidades federais, que já tinham realizado, com denodado empenho e em tempo recorde, o I Censo da Reforma Agrária do Brasil e se voltam agora para tornar realidade as metas do Pronera. Mergulhadas em dificuldades de variada ordem, as universidades aceitam mais esse desafio, unindo-se aos movimentos sociais e entidades nacionais e internacionais envolvidos em tão meritório objetivo. Há que se ressaltar, ainda, quão benéfica será para os estudantes universitários a participação nesse processo educacional, que lhes concede a oportunidade de manter contato direto com a população assentada e adquirir in loco o conhecimento real das necessidades das famílias beneficiárias da reforma agrária.  

Para o professor João Cláudio Todorov, ex-reitor da Universidade de Brasília e atual coordenador do Pronera, a criação do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária é uma ação do Governo que, juntamente com outras iniciativas - como o cadastramento rural, a criação de facilidades de acesso ao crédito, mudanças na legislação para apressar os processos de distribuição da terra, entre outras - mostra que este Governo é diferente dos anteriores e está tratando a questão com um novo enfoque, mediante uma atitude que une, numa só direção, todos os atores envolvidos - até mesmo os inimigos mais ferrenhos do governo - além de arregimentar novos e importantes parceiros.  

Para o professor Todorov, essa mobilização retirará das trevas do analfabetismo cem mil trabalhadores rurais jovens e adultos. Mas o Pronera não pára aí. Outros cinco mil assentados, que serão treinados para atuar como monitores em seus assentamentos, vão poder completar o ensino básico num curso supletivo. Mais ainda: está prevista a formação especializada de técnicos de nível médio e superior na área rural.  

Com os recursos já disponibilizados, o Pronera vai dar a partida com sete mil alunos, em 350 turmas, espalhados pelos oito estados de maior demanda.  

Sr. Presidente, já defendi claramente nesta Casa minha posição acerca da reforma agrária em nosso País. Não a considero uma idéia passadista, ultrapassada no decorrer do tempo pelas mudanças ocorridas no perfil da agricultura. Todos os países desenvolvidos do mundo promoveram a reforma agrária e elegeram a unidade familiar como a base da produção agrícola em suas terras. Especialistas têm visto na reforma agrária não somente uma questão de justiça social, mas sobretudo uma questão econômica. Ela é um pré-requisito indispensável para a nossa modernidade, a despeito do alinhamento mundial em torno do processo de globalização do capitalismo.  

Por assim pensar e crer, rejubilo-me com as ações empreendidas nos últimos seis pelo Ministério da Reforma Agrária . Vislumbramos um saldo positivo, embora a urgência nos faça sempre querer um ritmo mais veloz. Mas não podemos ignorar que nesses primeiros seis meses do ano foram assentadas em todo o País 32.491 famílias, número que corresponde a quase 33% da meta estabelecida para todo o ano. Até outubro, o governo federal deverá ter assentado 100 mil famílias. O Ministro Raul Jungmann estima que sejam assentadas nos quatro anos do Governo Fernando Henrique cerca de 300 mil famílias, marca que estará superando a meta do Presidente, fixada em 280 mil.  

Mas assentar famílias não é apenas o que conta. Deve-se reconhecer como ponto imprescindível o aumento substancial dos créditos a serem concedidos aos assentados pelos programas Implantação e Procera. O primeiro alcançou uma elevação de 86,7%, passando de 150 milhões de reais em 97 para 280 milhões este ano. Já o Procera teve um aumento de mais de 105%, atingindo 420 milhões em 98.

 

Devemos reconhecer que o alcance - melhor dizendo, a superação da meta prevista nos planos de governo - é resultado da vontade política do Presidente Fernando Henrique, da pressão dos movimentos sociais e do apoio da opinião pública, somados à determinação com que o Congresso Nacional aprovou as leis necessárias para conferir maior rapidez ao processo da reforma agrária.  

De nossa parte, continuaremos a empenhar todo esforço para que a reforma agrária em nosso País seja uma realidade no prazo mais curto possível. Queremos que o Brasil deixe rapidamente de ocupar o segundo lugar no mundo em concentração da propriedade da terra. Desejamos que o novo século que se avizinha encontre nosso País no rumo do efetivo progresso econômico e social, para o qual são imperiosas a democratização do acesso à terra e a distribuição mais justa dos bens e direitos para toda a população brasileira.  

Era o que eu tinha a dizer.  

Muito obrigado.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/11/1998 - Página 16087