Discurso no Senado Federal

REFLEXÕES SOBRE A GOVERNABILIDADE E A TRANSPARENCIA NO BRASIL.

Autor
Ernandes Amorim (PPB - Partido Progressista Brasileiro/RO)
Nome completo: Ernandes Santos Amorim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • REFLEXÕES SOBRE A GOVERNABILIDADE E A TRANSPARENCIA NO BRASIL.
Publicação
Publicação no DSF de 03/12/1998 - Página 17607
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • DEFESA, INSTALAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), APURAÇÃO, ESCUTA TELEFONICA, AUTORIDADE FEDERAL, BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL (BNDES), FUNDO DE PREVIDENCIA, BANCO DO BRASIL, PROCESSO, PRIVATIZAÇÃO, TELECOMUNICAÇÕES BRASILEIRAS S/A (TELEBRAS), GARANTIA, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, OPINIÃO PUBLICA, BRASIL.

O SR. ERNANDES AMORIM (PPB-RO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ocupo a tribuna para falar sobre transparência, governabilidade e outros assuntos que me chamam a atenção.  

Ainda ontem vi o Presidente da Previ sair da audiência em que prestava depoimento e dizer que não iria renunciar.  

Neste pronunciamento, quero apontar a necessidade de criação de uma CPI. Eu, por exemplo, presenciei em meu Estado, há quatro anos, uma negociação da Previ com a Paranapanema em que ela comprou uma empresa mineral, de garimpo, especificamente o Garimpo Bom Futuro. Havia uma jazida em exaustão e um processo que tramitava no Judiciário, com liminares que garantiam os direitos dos garimpeiros naquela área.  

Na ocasião, fiz um discurso a esse respeito. Mesmo assim, a Previ, utilizando-se das mutretas e das armações que existem na área econômica, comprou a empresa mineral da Paranapanema e lá investiu milhões de reais, dinheiro que, de um jeito ou de outro, saiu dos cofres públicos. A Previ recebe do Governo recursos que deveriam ser investidos na educação e na saúde. Os fundos de pensão recebem gratuitamente do Governo Federal somas vultosas. Na direção desses fundos há pessoas que não são fiscalizadas e que praticam negociatas.  

E agora, quando temos oportunidade de apurar o feito por intermédio de uma CPI, a criação da CPI está sendo negada por esta Casa. O Presidente da Previ disse que não iria renunciar. Mas se houvesse uma auditoria naquele fundo de pensão, tenho certeza de que aquele cidadão acabaria preso, assim como outros que por ali passaram.  

Um outro exemplo que quero citar é a negociata que fizeram no meu Estado, que gerou prejuízos de milhões de reais para os cofres públicos, o povo, o Brasil e as instituições. Mas para eles tanto faz como tanto fez! Há compras de imóveis e investimentos em setores financeiros que não sofrem qualquer fiscalização.  

Diante desse fatos, vemos a necessidade da transparência, o que não está ocorrendo ultimamente no Governo, principalmente no setor econômico. Talvez não por culpa do Presidente da República; não acredito que o Presidente da República seja culpado por isso e a CPI só iria ajudá-lo, fortalecê-lo e fortalecer as instituições.  

De vez em quando, gosto de assistir a trechos do Programa do Ratinho . Sabemos que esse programa tem sido fiscalizado pelo Ministério Público minuto a minuto. E em uma de suas declarações, o Ratinho disse que o TRT de São Paulo teria recebido milhões para uma obra superfaturada; e dos milhões recebidos, teria havido um envio de depósito às Ilhas no valor de US$50 milhões, ou seja, dinheiro oriundo dos repasses federais ao TRT de São Paulo.  

O Ministério Público Federal já deveria ter se manifestado, assim como a Procuradoria da República ou quem está fiscalizando constantemente aquele programa, que é uma polêmica nacional.  

Uma denúncia do calibre da que o Ratinho fez em seu programa, de que US$50 milhões foram sacados dos cofres públicos para uma obra no Tribunal Regional do Trabalho, em São Paulo, deveria ser investigada - imaginem V. Exªs que não há emprego no Brasil nem tampouco investimento na produção, mas há milhões para obras suntuosas. A Justiça do Trabalho, a meu ver, não tem somado para o desenvolvimento deste País, pelo contrário, tem até atrapalhado, fazendo minguar a oferta de emprego. É um tipo de Justiça que já deveria ter sido extinta, e o Governo Federal libera milhões para ela. Agora mesmo, repassaram recursos para essa instituição, em São Paulo.  

Portanto, há a necessidade de haver transparência neste País. E nós, nesta Casa, devemos dar início a isso. Somos 81 Senadores. Há um instrumento, no Regimento Interno, que nos dá o direito de fiscalizar, acompanhar e prestar contas ao público.  

Estamos colhendo assinaturas para a instalação da CPI; mas do requerimento constam, até hoje, dezenove assinaturas apenas. Sr. Presidente, somos cobrados, por onde passamos, por aqueles que querem a instalação da CPI. E não sabemos nem quantas fitas existem nem quem teve acesso a elas em primeira mão. Imagino que a polícia de um outro país já saberia todas essas informações. Creio que a maioria dos Senadores não sabe o há nessas fitas. Acredito até que, ouvindo as fitas, poderíamos descobrir muitas outras coisas. A instalação da CPI esclareceria todos os fatos.  

Sr. Presidente, os dezenove Senadores que apuseram suas assinaturas nesse requerimento correm o risco de ser perseguidos ou vistos de forma diferente pela maioria que não o assinou. Inclusive gostaria de citar os parlamentares que assinaram o requerimento de criação da CPI, porque daqui a três anos teremos novas eleições e os eleitores cobrarão a nossa posição. Foram reeleitos os Senadores Eduardo Suplicy e Pedro Simon, que desenvolveram um trabalho voltado para o interesse público e por isso retornaram a esta Casa - porque ganharam a confiança da população.  

Portanto, aqueles que assinaram o requerimento têm que dizer à população que nesta Casa existem pessoas preocupadas em esclarecer o que está ocorrendo no País. Gostaríamos também de saber por que se investe dinheiro em Estados falidos, em bancos falidos e em negociatas como as divulgadas pela revista Veja, que teve acesso a fitas gravadas, por grampo telefônico, de conversas entre o BNDES, o Banco do Brasil e a Previ. Creio que se houvesse uma CPI o povo saberia onde está sendo investido o dinheiro da produção.  

O Banco do Brasil, no meu Estado, não financia ninguém; tampouco o BNDES tem um investimento na Região Norte, tão necessitada. No entanto, milhões de reais são, na calada da noite, investidos de qualquer jeito, como sementes que não produzem; como coisa imprestável jogada fora. E na hora de investir na produção, não investem.  

Sr. Presidente, passo a ler os nomes dos Srs. Senadores e Senadoras que apuseram suas assinaturas no requerimento de instalação da CPI, solicitada pelo Senador Eduardo Suplicy, que a encabeçou. Seguem, à minha assinatura, as dos Senadores Carlos Wilson, Antonio Carlos Valadares, José Eduardo Dutra, José Saad, Marina Silva, Abdias Nascimento, Ademir Andrade, Roberto Requião, Emilia Fernandes, Pedro Simon, Josaphat Marinho, Jefferson Péres, Benedita da Silva e Lauro Campos.  

Sr. Presidente, pertenço a um Partido que faz parte da base de sustentação do Governo Federal, mas, como disse o Senador Pedro Simon, temos o pensamento independente. Quando achamos que há a necessidade de trabalhar, de fiscalizar, de exercer dignamente a nossa função, levantamos a cabeça e, humildemente, partimos para fazer as nossas obrigações.  

É obrigação desta Casa esclarecer o povo brasileiro. Creio que essa CPI não será instalada este ano, porque não há mais tempo. Nós nos aproximamos do período de recesso. Mas esse requerimento continuará tramitando na Casa. A partir de fevereiro, novos Senadores assumirão seus mandatos - alguns dos que assinaram o requerimento retornarão aos seus Estados porque não foram reeleitos -, mas esse fato continuará em evidência fazendo-se necessária a transparência dos fatos. Acredito que o Senhor Presidente da República também deseja essa transparência.  

Em uma reunião da Bancada, eu disse ao Presidente do meu Partido, o ex-Governador Paulo Maluf - acusado inicialmente de estar envolvido nessa questão do grampo -, que tenho interesse que tudo isso seja esclarecido. Tenho certeza de que Paulo Maluf não é o responsável pelo grampo. Não é o PPB que está interessado em Ministério nem brigando por espaço. No fim, briga-se por espaço, aparece o problema, mas ele é acobertado enquanto o povo fica a se interrogar.  

No próximo ano, certamente esta Casa instalará uma Comissão Parlamentar de Inquérito para apurar a questão do grampo, como apurou o que houve com Collor de Mello, que foi cassado simplesmente porque recebeu um carro de presente. A Justiça apurou o que houve, julgou-o e Collor foi cassado. Portanto, em um escândalo como esse, temos que puxar o fio da meada.  

Sr. Presidente, sou leigo em economia, mas se fosse vendedor de banana em uma feira, jamais faria negócios como os que são feitos pela equipe econômica do Governo. Eu não teria coragem de negociar com o dinheiro do povo como faz o grupo da área econômica, que deixa de investir na produção, por exemplo.  

Hoje, a agricultura está abandonada, a pecuária, falida, a saúde, abandonada; e ainda se está tirando mais recursos da saúde. A educação teria que ter os recursos que a Constituição manda destinar-lhe, mas eles estão sendo "capados" e se está deixando o analfabetismo tomar conta do povo brasileiro.  

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, essa é uma questão que incomoda o povo brasileiro e alguns Senadores, por isso trouxemos um discurso, que solicitamos seja publicado na íntegra, que aborda justamente a necessidade de se implantar essa comissão e de o Governo exigir transparência dos órgãos federais, para que a população não seja enganada. Afinal de contas, o Presidente da República foi eleito com mais de 51% dos votos no primeiro turno e, tenho certeza de que, pelo que já ouvi falar, Sua Excelência jamais teria a intenção de ser conivente com essa situação que aí está. Há necessidade de se apurar o que ocorre nesses fundos de pensões, nessas negociatas de privatizações. Afinal de contas, o povo brasileiro está perdendo um patrimônio conquistado ao longo de anos e mais anos. Ele está sendo vendido a troco de qualquer coisa, ninguém sabe por quanto e onde está sendo aplicado o dinheiro arrecadado.  

Era o eu que tinha a dizer, Sr. Presidente.  

Muito obrigado.  

SEGUE, NA ÍNTEGRA, PRONUNCIAMENTO DO SR. ERNANDES AMORIM:  

Sr. Presidente, nas sociedades modernas, a transparência é uma característica fundamental dos governos.  

Sem transparência não há como avaliar o desempenho da administração pública.  

Sem avaliar o desempenho da administração pública, não há como exercer a vontade política.  

Não há como decidir as atitudes e comportamentos individuais, nem as políticas públicas, adequadas ao bem público, ao bem geral.

 

Esconder a transparência, é furtar a liberdade política, é furtar a liberdade de escolha dos governantes e seus programas.  

Furtar a liberdade de comparar a prática com a proposta, e a liberdade é a razão básica da organização social e existência de governos.  

Sr. Presidente, fracassaram os modelos baseados no pensamento de que os governos são instrumentos de dominação de classes ou grupos de interesse.  

E estes modelos fracassaram porque há uma dimensão moral no ser humano, na qual as democracias liberais se afirmam, que é exatamente a liberdade.  

Temos o dever de lutar pela liberdade, e manter a liberdade que conquistamos. E a liberdade política depende da transparência na administração da coisa pública.  

Acredito que, por essa razão, abriu-se espaço para a proposta de uma Comissão Parlamentar de Inquérito para apurar o processo de privatização de empresas estatais.  

O que se pretende é a transparência sobre os procedimentos nas privatizações.  

Não se trata de questionar as privatizações, mas tornar transparente os procedimentos adotados.  

A questão é relevante.  

Neste contexto de reforma do Estado, em que está inserida a privatização, estamos lutando para sair da âncora do câmbio e dos juros altos, que fundamentam a atual estabilidade da moeda.  

As soluções apontam para sacrifícios que estão sendo impostos através da Reforma Previdenciária, da Reforma Fiscal, da retração econômica, e tudo apenas pode ser viabilizado com a cooperação efetiva da sociedade.  

Não basta o Presidente Fernando Henrique acenar com seus índices eleitorais, de mais de 50% dos votos no 1º turno, isto é pouco.  

É preciso demonstração clara de transparência, de respeito a liberdade.  

Não se pode impor um modelo de liberalismo econômico.  

O liberalismo econômico é fruto do liberalismo político, e o liberalismo político apenas existe onde existe liberdade.  

Liberdade de informação, transparência.  

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Senador Eduardo Suplicy apresentou o requerimento desta CPI. Juntei minha assinatura, e também, já assinaram, os senadores Carlos Wilson, Antônio Carlos Valadares, José Eduardo Dutra, José Saad, Marina Silva, Abdias Nascimento, Ademir Andrade, Roberto Requião, Emília Fernandes, Pedro Simon, Josaphat Marinho, Jefferson Péres, Benedita da Silva, e Lauro Campos.  

Acredito que no próximo ano esta lista tenha a quantidade de assinaturas necessárias à instalação da CPI.  

Até lá a questão estará isolada de outras questões que lhe foram associadas, como as denúncias de contas bancárias de autoridades no exterior, e a questão policial dos grampos em telefone.  

Também outras questões políticas, como a formação do Ministério, e a eleição das mesas da Câmara e do Senado, estarão superadas.  

Então poderemos voltar a atenção para o objeto da CPI, e dar à sociedade brasileira a transparência que ela merece em relação a esta questão dos procedimentos havidos na privatização de empresas públicas.  

Muito obrigado.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/12/1998 - Página 17607