Discurso no Senado Federal

ANALISE DO PRIMEIRO ANO DE FUNCIONAMENTO DO FUNDO DE DESENVOLVIMENTO DO ENSINO FUNDAMENTAL-FUNDEF. EXPECTATIVA QUANTO A IMPLEMENTAÇÃO DO PROGRAMA DE GARANTIA DE RENDA MINIMA E DO BANCO DA TERRA.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO. POLITICA SOCIO ECONOMICA.:
  • ANALISE DO PRIMEIRO ANO DE FUNCIONAMENTO DO FUNDO DE DESENVOLVIMENTO DO ENSINO FUNDAMENTAL-FUNDEF. EXPECTATIVA QUANTO A IMPLEMENTAÇÃO DO PROGRAMA DE GARANTIA DE RENDA MINIMA E DO BANCO DA TERRA.
Aparteantes
Mozarildo Cavalcanti, Ramez Tebet.
Publicação
Publicação no DSF de 20/03/1999 - Página 5967
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO. POLITICA SOCIO ECONOMICA.
Indexação
  • COMENTARIO, REALIZAÇÃO, REUNIÃO, SEDE, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, BALANÇO, FUNCIONAMENTO, FUNDO DE DESENVOLVIMENTO, ENSINO FUNDAMENTAL.
  • ELOGIO, EXPERIENCIA, FUNDO DE DESENVOLVIMENTO, ENSINO FUNDAMENTAL, INICIATIVA, GOVERNO FEDERAL.
  • EXPECTATIVA, IMPLANTAÇÃO, PROGRAMA, GARANTIA, RENDA MINIMA, VINCULAÇÃO, EDUCAÇÃO, PROJETO, FINANCIAMENTO, AQUISIÇÃO, IMOVEL, INSTALAÇÃO, TRABALHADOR, FALTA, POSSE, TERRAS, CULTIVO.
  • DEFESA, GARANTIA, RECURSOS, REALIZAÇÃO, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), CENSO DEMOGRAFICO.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, dois assuntos me trazem à tribuna: primeiramente, que a data de hoje assinala a ocorrência de uma reunião, a ser realizada no anexo do Palácio do Planalto, para o balanço do primeiro ano de funcionamento do Fundef - Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental. Essa matéria foi objeto, primeiro, de reforma constitucional e, segundo, de uma lei que reformulou o financiamento do ensino fundamental, remanejando recursos e estabelecendo basicamente um valor por aluno a ser pago ao Estado ou ao Município, dependendo se o aluno está matriculado na rede municipal ou estadual.

Também outra característica desse Fundo é o comprometimento de grande parte de sua receita para melhorar os salários dos professores.

Pois bem, decorrido um ano, apesar de o Fundo não ter sido totalmente implementado, até porque o per capita por aluno é de R$315,00 quando deveria ser no mínimo de R$400,00, apesar do desequilíbrio que, de alguma maneira, ele introduziu nas finanças dos Estados - principalmente no Rio de Janeiro, Bahia e até o Ceará, uma vez que significou perda de receita para esses Estados -, pode-se dizer que foi, ou está sendo, uma experiência plenamente vitoriosa. Foi uma das melhores coisas que aconteceram nos últimos anos em relação à educação, com a participação altamente positiva do Congresso Nacional, da Câmara dos Deputados e do Senado da República.

Vejamos alguns dados sobre esse Fundo de Valorização do Ensino Fundamental e o programa Toda Criança na Escola:

Aumento na matrícula do ensino fundamental de 6%, o que representa, mais ou menos, 1,8 milhão de crianças na escola até 14 anos, tendo o maior crescimento se dado no Norte e Nordeste, justamente onde há um maior número de crianças fora da escola.

Dois mil setecentos e três Municípios tiveram elevação de receita em oito Estados, porque o piso é de R$315,00, o gasto per capita por aluno. Quando a composição do Fundo não absorve essa despesa, a União entra com recursos para complementar e se chegar aos R$315,00;

Em 1998, o Fundef movimentou R$13,3 bilhões, sendo R$8,6 bilhões dos Estados, R$4,2 bilhões dos Municípios e mais R$524 mil da União. Para este ano, a previsão é de que o Governo irá complementar os Estados e Municípios em R$850 milhões;

O Ministério da Educação mostra que foram gastos R$ 422 milhões acima do que determina a Constituição. Todos nós sabemos que a Constituição vincula despesas mínimas para os Estados, para os Municípios e para a União. O dispêndio chegou a mais de R$420 milhões sobre o que a Constituição já prevê.

Em 308 Municípios, o gasto por aluno era inferior a R$100,00; em 613, o gasto variava entre R$101,00 e R$150,00. Com a redistribuição equânime dos recursos, todos passaram a contar com receitas complementares, até alcançar o valor mínimo de R$315,00. Os maiores gastos estão em São Paulo, que investe R$690,00 por aluno na rede pública;

O salário dos professores do ensino fundamental teve um aumento de 12,9% no País, sendo que, nos Municípios, o aumento foi de 18,4%. No Nordeste, chegou a crescer em média 49,6%. O maior salário médio na rede estadual para carga horária de 20 horas semanais subiu de R$462,00 para R$517,00, pagos na Região Sudeste.

Esses dados falam por si mesmos. Esse esforço, que está sendo feito num trabalho articulado entre Estados, Municípios e a União, vem produzindo efeitos altamente positivos. Claro que estamos muito longe ainda de chegarmos aonde desejamos. A reivindicação dos Governadores em todo esse processo de discussão com a União é justamente para que o per capita suba, não fique estabilizado nesses R$315,00, mas chegue a R$400,00. O per capita subindo, vai contribuir para melhorar sensivelmente as receitas dos Estados e Municípios.

Não importa - e já há muitas denúncias - que prefeitos desonestos estejam utilizando esses recursos do Fundef para outras atividades absolutamente estranhas à educação, como festas, por exemplo. Aliás, a própria lei diz claramente em que podem ser gastos os recursos do Fundef. Prefeitos que estão agindo assim estão de fato cometendo um crime, uma indignidade, porque atentam contra o maior valor que se está procurando desenvolver no Brasil, que é educação de boa qualidade para todos.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB-MS) - Permite-me V. Ex ª um aparte?

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE) - Concedo o aparte ao nobre Senador Ramez Tebet.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB-MS) - Senador Lúcio Alcântara, V. Exª aponta o avanço que representa o Fundef, esse fundo de desenvolvimento da valorização do magistério, em prol da educação, mas faz uma constatação sobre o mal que aflige o País de priscas eras: o mal da corrupção, do desvio do dinheiro, dos recursos mal aplicados, dos recursos que se destinam a uma finalidade tão fundamental como a educação e são desbaratados. Mas, se não valorizarmos os programas com receio disso, como V. Exª afirma, positivamente não vamos contribuir para educação. O que se cumpre é que a população puna esses prefeitos, a sociedade fique vigilante a haja o banimento daqueles que corrompem e malversam o dinheiro público. O Fundef é um programa dirigido à educação fundamental, que tem grande importância e está estimulando os professores, que, afinal de contas, mesmo com ele, ainda são mal-remunerados neste País.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE) - Senador Ramez Tebet, no Ceará, a Assembléia Legislativa acaba de constituir uma CPI para apurar a aplicação do Fundef pelos municípios.

Creio que a Assembléia procedeu muito bem, porque não se pode aceitar que uma reforma dessa natureza, para financiar o ensino fundamental, venha esbarrar na má gestão desses recursos por parte dos prefeitos. Claro que o Ministério da Educação deve estar fazendo sua auditagem para acompanhar esse programa, mas a Assembléia decidiu fazer a sua CPI para apurar, realmente, em casos concretos, o desvio de recursos do Fundef.

No entanto, se estou aqui para louvar o Fundef e parabenizar o Presidente Fernando Henrique Cardoso e o Ministro Paulo Renato pela iniciativa, também quero dizer da nossa estranheza que alguns projetos de grande sentido social, que o Governo já mostrou intenção de executar e que foram objetos também de deliberação do Congresso, não tenham saído do lugar. Por exemplo, o Programa de Garantia de Renda Mínima vinculado à educação foi aprovado e tido sempre como um programa de largo alcance social, para que os pais sejam estimulados, principalmente nos pequenos Municípios, nos mais pobres, nos mais carentes, a colocar o filho na escola e, então, receberem uma pequena quantidade de recursos como complementação da sua renda.

Os municípios já são conhecidos, os critérios já estão estabelecidos, mas, até agora, não foi possível firmar um só convênio do Ministério da Educação com esses Municípios. Espera-se que este ano, com a quantia irrisória de R$100 milhões, seja possível iniciar o programa. A segunda etapa prevê a extensão a todo o País. Deve-se pelo menos começar o que está previsto para a primeira fase do programa, o que será de grande importância para os Municípios mais pobres.

O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PFL-RR) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE) - Ouço o Senador Mozarildo Cavalcanti.

O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PFL-RR) - Senador Lúcio Alcântara, parabenizo V. Exª pelo oportuno pronunciamento, em que aborda temas tão importantes como a educação e, especificamente, o Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental. O Programa Bom-Dia Brasil de hoje mostrou uma estatística com a qual fiquei estarrecido: de cada mil alunos que entram na primeira série do Ensino Fundamental, apenas 47 chegam à oitava série. É necessário que nós, Senadores, que temos a responsabilidade de representar os nossos Estados, passemos da atitude de meramente denunciar os fatos para, efetivamente, dentro dos limites das nossas competências, exigir do Governo Federal uma mudança dessa situação, que considero vexatória para o nosso País. Não vejo outro caminho para o desenvolvimento do Brasil senão com investimento maciço e adequado à educação. Portanto, quero parabenizar V. Exª pelo pronunciamento que faz.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE) - Essa prioridade à educação realmente não pode ser ignorada, uma vez que há uma opinião generalizada no sentido de que, sem educarmos nossas crianças, não vamos sair do subdesenvolvimento. Isso exige um esforço enorme da Nação nos diferentes níveis de Governo.

A bem da verdade, tenho encontrado por parte dos prefeitos, de uma maneira em geral, um sincero entusiasmo, um sincero empenho pela melhoria das condições educacionais em seus Municípios. Há algo mais do que retórica; há algo mais do que dizer: “A educação é prioridade da minha administração”. Há um esforço de fato, perceptível, fora os casos de desmando e de má aplicação de recursos, que devem ser punidos exemplarmente.

Nesse particular, creio que o Brasil avançou muito nos últimos anos, encarando seriamente o problema da educação. Isso sem deixarmos de constatar que o problema é grave, e os avanços talvez não corram com a velocidade que desejamos.

Por fim, há um outro programa do Governo, fruto de deliberação desta Casa - aliás, trata-se de um projeto do ex-Senador Esperidião Amin -, que é o Banco da Terra, até agora não implementado. Houve inclusive uma reação do movimento dos sem-terra, que se dirigiram ao Banco Mundial e manifestaram-se contrariamente ao programa. Creio que cometeram um equívoco. O Banco da Terra não veio para substituir a política de reforma agrária; essa política continua. Mas o Banco da Terra visa a financiar aquisição de imóveis para instalar trabalhadores que não têm terra para cultivar.

Infelizmente, uma série de obstáculos tem adiado a implantação do Banco da Terra. Um deles é a concessão do financiamento internacional para capitalizar esse Fundo, que iria adquirir essas propriedades. O segundo é a discussão com as autoridades financeiras sobre os juros, porque a chamada equipe econômica quer impor juros, por intermédio do BNDES, que inviabilizam essa idéia. Nessa disputa, até agora o Banco da Terra não pôde produzir resultados, necessários para facilitar, para ampliar um programa de reassentamento rural. Até porque a lei estabelece claramente quem tem acesso a esse financiamento: é o pequeno agricultor, é o agricultor sem terra, é o pequeno parceleiro.

Aquela acusação que sempre se faz, com muita razão, às vezes, de que esses projetos existem para beneficiar os grandes não é válida para o Banco da Terra. O referido banco existe para o pequeno, para aquele que só poderá adquirir um pedaço de terra com financiamento módico, sob condições de pagamento que lhe permitam pagar de acordo com a rentabilidade do imóvel que vai possuir.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB-RS) - V. Exª me permite outro aparte?

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE) - Ouço o Senador Ramez Tebet.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB-RS) - Nobre Senador Lúcio Alcântara, a política de juros altos, na ótica do Governo, influi para que não haja inflação no País, pelo menos no quadro econômico atual. Mas acredito - e o tenho afirmado reiteradas vezes - que precisamos estabelecer juros diferenciados; juros com os quais as atividades essenciais não precisam arcar. Não estamos votando empréstimos para o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, tal qual ocorreu ainda na sessão de ontem, quando foi aprovada, praticamente por unanimidade, a quantia de US$424 milhões para a preservação ambiental. Pergunto: por que não investir em projetos essenciais que possam melhorar a produção no País, que possam gerar mais empregos? Por que não se pode, nesses programas, aplicar esses juros, que são pequenos? E para financiamentos de projetos tão importantes ao desenvolvimento do País, para a geração de empregos, aumento da produção e melhoria das exportações, por que não se aplicam juros compatíveis e adequados? V. Exª, então, tem razão. Não adianta o Banco da Terra aplicar juros extorsivos, porque, em vez de ser ajudado, o agricultor acabaria enforcado. Essa é a verdade.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE) - O posicionamento de V. Exª tem absoluta razão de ser. Atividades diferentes, tomadores diferentes de crédito requerem juros diferenciados. Essa discussão está havendo dentro do Governo e, de certa maneira, tem retardado a implantação do chamado Banco da Terra. Espero que isso seja superado logo e que o Banco Mundial conclua os seus estudos para liberar os recursos.

Esse programa foi implantado em Santa Catarina pelo Governador Esperidião Amin, quando da sua primeira passagem pelo Governo, e teve muito sucesso. Por isso, S. Exª teve a iniciativa de apresentar esse projeto, do qual fui Relator - elaborei um substitutivo, inclusive de comum acordo com as áreas do Governo Federal interessadas no assunto. Porém, até agora não produziu o resultado que esperávamos, porque os assuntos econômicos fluem com uma celeridade muito grande. Quando chega na área social, geralmente as coisas travam, param, vão devagar. Não sei se é porque existe uma equipe econômica, mas - nunca ouvi falar - não existe uma equipe social. Talvez devamos criar uma equipe social para se contrapor à equipe econômica ou, pelo menos, para, em bloco, defender os interesses da população nessas áreas.

Esse era o registro que eu queria fazer aqui para elogiar a experiência do Fundef com aqueles reparos que fiz durante o meu pronunciamento.

Sr. Presidente, o segundo assunto diz respeito às visões que se tem do Brasil, elas são marcadas pela contradição: um país rico marcado pela pobreza; um povo pobre numa nação rica. Fala-se muito, dentro e fora de nosso território, do que é ou do que não é o Brasil; que a população brasileira é cordata ou violenta; que nossos hábitos são civilizados ou não; que nossos defeitos suplantam nossas virtudes ou vice-versa. E assim se fala sobre tudo que o Brasil é ou deixa de ser. Contudo, fala-se, no Governo, na televisão e no rádio, nos jornais e revistas, nos bancos e empresas, nos sindicatos e associações, de um Brasil segundo a opinião de cada um. Um país do qual se tem, muitas vezes, uma visão meramente opinativa, fruto de experiência específica que se generaliza estendendo-a para todo o território. É assim que, freqüentemente, trata-se Rondônia com os dados do Rio Grande do Sul; Mato Grosso com os da Bahia; Ceará com os de São Paulo.

           E por que toda essa confusão? Certamente porque nos faltam dados objetivos, continuamente atualizados da realidade social, política e econômica do Brasil. Dados que podem ser gerados pelos censos que a Fundação IBGE realiza periodicamente em todo o País. Deles surge a realidade mais profunda de nosso povo.

           E é só com levantamentos abrangentes, consistentes e repetidos que poder-se-á estabelecer um quadro realista do que é o Brasil em todos os níveis de sua vida política, social e econômica. O último feito data de 1990-1991.

           Não há governo, seja o da União, sejam os estaduais, ou mesmo os municipais, que possa gerir, planejar e executar planos para o bem e o progresso de nossa gente sem um retrato atualizado e detalhado do País, dos estados e dos municípios.

           Assim, Sr. Presidente, a realização de um censo no Brasil não é atividade passível de sofrer cortes de verbas por contenção de despesas.

           O Censo do ano 2000 será de fundamental importância para o País e não pode ser prejudicado em sua realização, abrangência e completeza. Toda a boa fundamentação para o desenvolvimento e execução de políticas públicas ou a realização produtiva de investimentos privados ou governamentais dependem da disponibilidade de dados atualizados do povo brasileiro.

           Um exemplo interessante é a medição do nível de emprego no Brasil. Ele é feito com base em seis grandes capitais estaduais - Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo - o que significa a cobertura de uma população em idade ativa (acima de 15 anos) de aproximadamente 31 milhões de pessoas. Ora, o Brasil tem cerca de 110 milhões de pessoas em idade ativa. A simples comparação dos números mostra que o levantamento atinge apenas pouco menos de 30% da população que deveria cobrir. A conclusão é óbvia. Mesmo estudos estatísticos sérios, como os do IBGE, carecem, ainda, de abrangência para que possam ser considerados retratos fiéis do País. Eles são, isso sim, retratos parciais e incompletos. O grave é que é com base em tais informações que decisões capitais para a nação e para os cidadãos são tomadas. Não espanta, pois, a qualquer observador mais atento, que os resultados obtidos sejam freqüentemente pífios, quando não nulos.

           Sr. Presidente, o Censo do ano 2000, que o IBGE está organizando, é uma das atividades mais importantes que o governo brasileiro tem para realizar no futuro próximo. É desse censo que sairão as informações que confirmarão ou negarão todas as grandes polêmicas que se têm estabelecido nos últimos anos em torno da realidade social e econômica do Brasil.

           Sr. Presidente, a realização de um Censo Nacional, como o do ano que vem, é uma operação que se assemelha a uma mobilização de guerra, pois envolve contigente humano e logística dificilmente posta em prática, em um país como o Brasil, fora de situações de crise nacional. O mais próximo que se pode relatar hoje são as campanhas nacionais de vacinação em massa.

           Assim, são exemplos da envergadura da operação Censo do ano 2000, o fato de que serão contratadas temporariamente 150 mil pessoas para realizar a coleta de dados, a supervisão, o apoio técnico-administrativo e apuração dos resultados; serão utilizados mais de 100 milhões de questionários; mais de 6.000 postos de coleta municipais e agências do IBGE; uma vasta rede de microcomputadores interligados nacionalmente a um computador de grande porte para armazenar e tratar toda a massa de dados coletada.

           Ora, Srªs e Srs. Senadores, uma operação dessa envergadura e com a importância que tem para a tomada de decisões no País não pode ser feita pela metade ou feita com cortes ditados por economia de gastos. Tal trabalho não representa gasto para o País. É, sim, investimento básico e indispensável para todos nós. Os dados que o IBGE colocará a nossa disposição de 2001 até 2003 serão úteis a todos.

           Nós, Senadores da República, não podemos prescindir, em nossa atividade de legisladores e fiscais da ação governamental, da disponibilidade de dados atualizados sobre o País.

           Para uma operação do porte do Censo 2000, o IBGE vem se preparando desde 1997, quando começou o planejamento do recenseamento. Os resultados finais só serão conhecidos em 2003, o que significa que a tarefa envolverá 7 anos de trabalho de preparação, execução e tratamento dos dados obtidos.

           Ora, uma tarefa dessa complexidade não pode ser mal feita ou ficar incompleta por falta de recursos. São muitos anos de trabalho para serem perdidos ou mal aproveitados. Esse recenseamento não pode deixar de ser feito, pois a quebra da série decenal não é mais recuperada e trará enormes prejuízos ao estudo e ao planejamento da sociedade brasileira. O Brasil já perdeu anos suficientes de sua história recente para se dar ao luxo de perder outros mais por falta de elementos para uma correta gestão das necessidades e objetivos da nacionalidade.

           A importância dos dados do Censo do ano 2000 é avaliável pelo que eles poderão ser úteis em projetos e programas que contribuirão para:

·     estudar o crescimento e a evolução da população ao longo do tempo, permitindo estabelecer, por exemplo, programas de controle da natalidade e assistência materno infantil mais eficientes;

·     identificar áreas de investimentos prioritários em saúde, educação, habitação, transportes, energia, programas de assistência à infância e à velhice;

·     selecionar locais que necessitam de programas de estímulo ao crescimento econômico, como instalação de pólos industriais;

·     definir a representação política no País, indicando o número de deputados federais, deputados estaduais e vereadores de cada estado e município;

·     subsidiar a reforma política na discussão da forma de eleição dos parlamentares, se proporcional, distrital ou qualquer outra;

·     fornecer subsídios ao Tribunal de Contas da União para o estabelecimento das cotas dos Fundos de Participação dos Estados e dos Municípios e, com isso, fundamentar a reforma tributária do País.

           Sabemos, também, Sr. Presidente, que um censo demográfico bem realizado é também útil para outros agentes sociais que não só o governo:

·     na seleção de locais para a instalação de fábricas, supermercados, shopping centers, escolas, creches, cinemas, restaurantes, lojas;

·     na análise do perfil da mão-de-obra brasileira, instrumento fundamental para sindicatos, associações profissionais e entidades de classe;

·     na análise do perfil sócio-demográfico e econômico da população e sua evolução até o ano 2000;

·     na reivindicação dos cidadãos por maior atenção do governo municipal ou estadual para problemas específicos, como a expansão da rede de água e esgoto, da rede telefônica, a instalação de postos de saúde, etc.

           Na realidade pode-se traçar um novo projeto de país a partir dos números e informações que o Censo do ano 2000 nos trará. A começar por um fato simples, mas de transcendental importância para qualquer nação, mas que pouca relevância tem no Brasil: a criação de uma identidade nacional em torno de um projeto de sociedade. Muito se critica os Estados Unidos da América pelas inúmeras atitudes que toma em relação aos outros países e pelas mazelas que sua sociedade tem. Todavia, não se pode ignorar que o sentimento patriótico e de identidade nacional é uma marca do povo americano e muito os ajudou a serem a potência mundial que hoje são. Em qualquer escola americana os símbolos nacionais são sempre honrados e as crianças são ensinadas a se orgulharem do País onde vivem e colaborarem para seu progresso. Podemos até julgar, à vista de nossa própria cultura, que esse comportamento é um exagero para nosso temperamento. Pode até ser. Mas que nos falta a liga que solidariza todo um povo em torno de um projeto nacional, lá isso falta. Vejamos o recente episódio da desvalorização do real, onde não faltaram abutres domésticos, junto aos estrangeiros, prontos para devorar nossa carniça.

           Sr. Presidente, vim a esta tribuna fazer a defesa e a apologia do Censo do ano 2000. Estou convencido de que ele deve ser tratado como prioridade nacional e mobilizar todas as forças da sociedade para que seja um verdadeiro sucesso. Que nos mais recônditos recantos deste imenso País, que em todas as escolas, para todas as crianças, jovens e adultos, esse seja mais que uma obrigação de participação, seja um meio de preparar o Brasil para dias melhores.

           Era o que eu tinha para dizer.

           Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/03/1999 - Página 5967