Discurso no Senado Federal

HOMENAGEM DE PESAR PELO FALECIMENTO DO DRAMATURGO DIAS GOMES.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • HOMENAGEM DE PESAR PELO FALECIMENTO DO DRAMATURGO DIAS GOMES.
Publicação
Publicação no DSF de 19/05/1999 - Página 12003
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, DIAS GOMES, ESCRITOR, ESTADO DA BAHIA (BA), PARTICIPANTE, ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS (ABL), AUTOR, PEÇA TEATRAL, ATUAÇÃO, TELEVISÃO.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB-RS. Para encaminhar a votação. Sem revisão do orador.) - Não há dúvida nenhuma, Sr. Presidente, de que hoje é um dia de profunda tristeza para nosso País. Lembro-me - e o Senador Suplicy falou há pouco de quando Dias Gomes esteve na Comissão de televisão, ou seja, que estudava os problemas ligados à televisão no Senado - da sua tranqüilidade, da sua serenidade. Lembro-me da discussão - e aí o Senador Roberto Freire lembra agora - que travamos na comissão e principalmente depois, no longo período em que conversamos. Fiz a ele aquela pergunta que ele já estava cansado de ouvir e o Roberto falou: mas um homem como o senhor, com a sua capacidade, com a sua competência, o senhor acha que o caminho é esse, fazer novela? E ele respondeu: “Olha meu filho, eu acho que todos os caminhos são válidos. Eu fiz cinema, fiz rádio, escrevi em jornal, fiz teatro, escrevi livros. Mas a maneira pela qual me aproximei do povo e a maneira que sei e que sinto que a minha arte, aquilo que faço chegou ao povo foi através da televisão, foi através das novelas. E eu procuro nas minhas novelas - disse ele - dar um sentido .É claro que eu não posso fazer de uma novela de um horário nobre da Globo - naquela época a novela tinha uma audiência praticamente total - um lugar onde eu vou expor ideologicamente aquilo que eu penso ou expor intelectualmente aquilo que eu defendo. Mas eu vou expor idéias, eu vou debater”.

Não é à toa que Dias Gomes tem várias peças censuradas. Não é à toa que várias e várias vezes, no regime militar, a censura atingiu as suas obras. Não é à toa que as suas obras tinham um sentido. Até para nós, políticos, é interessante lembrar o deboche e a ironia para com a classe política. Por exemplo, O Bem Amado, talvez uma das novelas que tenha tido mais repercussão na televisão brasileira, não era mais do que uma maneira debochada de analisar o comportamento ético da classe política. O Gracindo fazia o personagem daquele prefeito que queria inaugurar aquele cemitério e ninguém morria. O tempo passava e ninguém morria. Na verdade, essa era a maneira como ele, através da brincadeira, do grotesco, do ridículo, procurava chamar a atenção para os problemas e para as questões da nossa sociedade.

Eu não tenho nenhuma dúvida de que Dias Gomes e Janet Clair, casados há tanto tempo, foram a dupla de maior espetacularidade, de maior competência, de maior genialidade popular em termos de compor obra para a televisão.

Lembro-me do pesar - e eu nunca tinha visto, até então - veiculado pela TV Globo, que dedicou praticamente um Jornal Nacional quase inteiro quando faleceu a Janete Clair.

E vejo agora, dramática e cruelmente, em uma madrugada, em um carro de praça... E quantas vezes orientamos: “Não vá de carro. Não guie. Pegue um carro de praça”. No entanto, o destino é assim, e terminou acontecendo com ele aquilo que nunca imaginávamos.

Porém, o importante é que Dias Gomes era um homem engajado. Ele tinha as suas idéias, tinha o seu pensamento. Desde jovem, já denunciava as suas rejeições ao regime de força da época. Desde que veio lá da sua terra Bahia, Sr. Presidente, ele foi o homem que sempre se posicionou, sempre debateu, discutiu, defendeu as grandes idéias e as grandes causas.

Tem razão o Senador Roberto Freire. Até eu, quando ele esteve aqui, brinquei com ele, mas foi dura a luta que ele teve que enfrentar com os chamados intelectuais da época pelo fato de ele escrever novela, e principalmente na Rede Globo. Ele fazia a sua parte, nunca mudou as suas idéias. Como ele me disse aqui, quando veio depor na nossa Comissão sobre televisão: “Da Rede Globo nunca recebi censura nenhuma; recebi censura do regime. Eu faço, exponho as minhas idéias. Sei que estou em um horário de fazer novela na televisão, mas as idéias que tenho, que sempre tive e sempre defendi, continuo defendendo.”

Na verdade, Sr. Presidente, se debatemos e discutimos muito a televisão brasileira, se debatemos e discutimos muito, dentro da televisão brasileira, as novelas de televisão, não há dúvida nenhuma de que, sob qualquer ângulo que se queira analisar, Dias Gomes representa um papel extraordinário, porque mesmo ali, como em Roque Santeiro, ele não fazia a novela por fazer. Para quem entendesse, para quem compreendesse, para quem interpretasse, ele realmente fazia novela, pode ser de costumes, pode ser debochando, ironizando, mas ele era realmente um extraordinário, um fantástico retratador da sociedade em que vivia.

Levo um abraço à sua segunda esposa, levo a tristeza imensa, a enormidade da tragédia às pessoas que atingiu. Acho que realmente hoje é um dia profundamente triste. Hoje é um dia de mágoa para nós, porque morreu um artista, morreu um intelectual, mas morreu um artista, um intelectual popular, um homem que era povo, que sentia povo, que interpretava povo e que conversava com o povo.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/05/1999 - Página 12003