Discurso no Senado Federal

COMBATE A SONEGAÇÃO FISCAL.

Autor
Carlos Patrocínio (PFL - Partido da Frente Liberal/TO)
Nome completo: Carlos do Patrocinio Silveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FISCAL.:
  • COMBATE A SONEGAÇÃO FISCAL.
Publicação
Publicação no DSF de 15/06/1999 - Página 15251
Assunto
Outros > POLITICA FISCAL.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, GAZETA MERCANTIL, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DENUNCIA, PROCURADOR DA REPUBLICA, LEGISLAÇÃO, INCENTIVO, SONEGAÇÃO FISCAL, FAVORECIMENTO, IMPUNIDADE, CRIME DO COLARINHO BRANCO.
  • JUSTIFICAÇÃO, RENOVAÇÃO, APRESENTAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO, COMBATE, CRIME, SONEGAÇÃO FISCAL.

O SR. CARLOS PATROCÍNIO (PFL-TO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores: "Deveriam revogar o crime de sonegação fiscal que raramente resulta em punição. Assim, desocuparia o trabalho do Judiciário e da Polícia Federal." Está claro senhores que essa frase chocante representa apenas o desabafo e a indignação de uma autoridade, no caso o Procurador Regional da República Odim Brandão Ferreira, que participou da investigação do caso PC Farias/Collor.  

Ouvido pelo jornal Gazeta Mercantil , o Dr. Odim Brandão esclarece que a Lei nº 9.249, de 1995, estimula a sonegação: "O cidadão só paga no âmbito administrativo da Receita ou do INSS quando a dívida é descoberta, e ainda assim fica impune". (art. 34)  

Segundo a Gazeta Mercantil , procuradores apontam duas leis que favorecem a impunidade dos sonegadores em nosso País, ambas sancionadas pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso. A primeira é a que acabei de citar. Se o indivíduo pagar na instância administrativa, ainda que seja um estelionatário ou um fraudador da Previdência ou de outros impostos federais, ele estará isento de ir para a esfera judicial.  

Sobre a outra, peço vênia a este colendo Plenário para me alongar um pouco mais. Refiro-me à Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, que "dispõe sobre a legislação tributária federal, as contribuições para a seguridade social, o processo administrativo de consulta e dá outras providências".  

Informa a Gazeta Mercantil que essa lei veio dificultar ainda mais a punição dos sonegadores, já que, "pelo art. 83, a Receita Federal não pode informar o Ministério Público sobre os crimes de tributos já detectados." Tal falha da lei é confirmada pelo Procurador Regional da República Mário Bonsaglia, na mesma matéria jornalística.  

Até 1996, nobres colegas, conforme a edição de 30 de abril daquele jornal, o Ministério Público Federal de São Paulo recebia, anualmente, entre duas mil e três mil representações da Receita Federal relativas a sonegações. A partir daí, o Ministério Público formalizava a denúncia.  

Com a vigência da Lei nº 9.430, o Ministério Público, que antes era comunicado pela Receita Federal, só recebe a representação do débito fiscal ao requisitar informações de determinada pessoa. Também essa entrega da representação ao Ministério Público ficou condicionada, pela mesma lei, à conclusão do processo administrativo na Receita, o que pode se arrastar de cinco a oito anos e normalmente caduca na instância administrativa.  

Alertado pela Consultoria Legislativa desta Casa, apresentei o Projeto de Lei do Senado que recebeu o nº 33, de 1997, com o firme propósito de revogar o caput do art. 83 da citada Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996. Apesar do parecer favorável do Relator, a proposição não chegou a ser discutida pelos membros da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, sendo então arquivada, segundo as disposições regimentais.  

Atento à necessidade de que seja revogado o referido artigo, reapresentei a proposta, designada como PLS nº 72, de 1999, cuja argumentação básica passo a lhes apresentar.  

O art. 83 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, dispõe que, nos crimes de sonegação fiscal, a Receita Fiscal (ou fisco estadual) somente encaminhará ao Ministério Público representação fiscal para fins penais, contendo as informações e documentos necessários à propositura da ação penal, após proferida a decisão final, na esfera administrativa, sobre a exigência fiscal do crédito correspondente.  

A decisão final no processo administrativo demora, via de regra, muitos anos para ser proferida, uma vez que está sujeita a duas instâncias, podendo, em alguns casos, submeter-se a uma terceira instância. Mesmo vencido em todas as instâncias administrativas, terá sempre o contribuinte a possibilidade de recorrer ao Judiciário, em face do princípio constitucional da inafastabilidade do acesso ao Judiciário (art. 5º, XXXV, da Constituição Federal). São mais três ou quatro instâncias.  

Como se vê, o contribuinte pode sempre protelar a discussão do débito e inviabilizar completamente o processo criminal, pois fatalmente ocorrerá a prescrição, seja tornando insubsistente a pena que venha a ser eventualmente aplicada, seja até mesmo impedindo o início do processo.  

O citado art. 83 viola o princípio da independência entre as instâncias administrativa e penal, segundo o qual as decisões administrativas não vinculam a manifestação do juízo criminal. O dispositivo é, pois, inconstitucional, já que visa coarctar a propositura da ação penal pública por parte do Ministério Público, impedindo-lhe, na prática, o exercício da função prevista no art. 129, inciso I, da Constituição, e, em decorrência, vedando-lhe o acesso ao Judiciário.  

Argumenta-se, em prol do art. 83, com a possibilidade de o contribuinte, processado criminalmente, vir a beneficiar-se com uma decisão favorável do Fisco. Essa hipótese criaria, por certo, uma situação contraditória, em prejuízo das garantias individuais. Para hipótese, extremamente remota – não há registro de fato semelhante –, existe solução adequada na legislação vigente.  

Com efeito, o Código de Processo Penal – CPP (arts. 92/94) prevê a possibilidade de o processo criminal ser suspenso enquanto é discutida, na Justiça Cível, questão que se mostre prejudicial ao julgamento penal. E, para que não ocorra a prescrição (isto é, a extinção da punibilidade do crime em face do transcurso de determinado lapso temporal, relacionado à pena máxima cominada ao delito ou à pena efetivamente aplicada), o CPP prevê também a suspensão da prescrição desses crimes. Já a Lei nº 9.430 não prevê a suspensão da prescrição.  

A situação do sonegador já fora facilitada com a introdução, pela Câmara, do art. 34 do projeto de lei do Imposto de Renda da pessoa jurídica convertido na Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995.  

O dispositivo permite que o sonegador se livre do processo criminal, pagando, desde logo, o débito fiscal.  

O art. 83 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, foi além: o sonegador sequer precisa pagar o débito: basta contestá-lo, interminavelmente, na esfera administrativa e, depois, na judicial.  

Sr. Presidente, ilustres Colegas, estava mais do que certo o nobre Senador Roberto Requião, quando disse que "a Lei nº 9.430 faz uma homenagem póstuma a PC Farias".  

O Procurador Mário Bonsaglia explica-nos claramente que, com todas essas vantagens em favor do sonegador, apenas cerca de 1% de todos os crimes fiscais cometidos resultam em processo e condenação.  

Perante a CPI do Sistema Financeiro, o secretário da Receita Federal afirmou que "as leis estão favorecendo os sonegadores".  

A Gazeta Mercantil , ao analisar os fatores que impedem a utilização das provas pela CPI que investiga o sistema financeiro, afirma, sem risco de errar: "Prisões por crimes fiscais e devolução de dinheiro desviado em sonegação são raros na Justiça brasileira. Na avaliação de procuradores de Justiça, as leis sobre crimes de colarinho branco contribuem para esse desfecho".  

Senhores, os que sonegam são os que, além de dever, têm condições de pagar. Há alguns anos, o Brasil vem necessitando do sacrifício da maioria da população, principalmente da classe média e dos menos favorecidos, que têm dado sua contribuição. É necessário fazer justiça também nas classes de maior poder aquisitivo.  

Espero, portanto, que meus nobres Pares somem aos meus os seus esforços para que possamos eliminar da Lei nº 9.430 esse artigo tão nocivo à sociedade.  

É hora de dar um basta à falta de caráter e de patriotismo da minoria gananciosa capaz de sugar o sangue do povo brasileiro.  

É a contribuição que gostaria de dar, Sr. Presidente, sobretudo após a magistral exposição do secretário da Receita Federal e de ver nosso projeto de lei, que procura evitar a sonegação fiscal em nosso País, ser rejeitado. Fiz uma reapresentação. Espero receber o respaldo da Comissão competente e, posteriormente, do plenário do Senado Federal.  

Muito obrigado.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/06/1999 - Página 15251