Discurso no Senado Federal

DEFESA DO APROVEITAMENTO DE FONTES ALTERNATIVAS DE ENERGIA. ENCAMINHAMENTO A MESA DE PROJETO DE LEI QUE SUGERE A CRIAÇÃO DE LINHAS DE CREDITO E MODIFICAÇÕES NA LEGISLAÇÃO FISCAL COM O OBJETIVO DE ESTIMULAR A EXPLORAÇÃO DE ENERGIAS ALTERNATIVAS.

Autor
José Jorge (PFL - Partido da Frente Liberal/PE)
Nome completo: José Jorge de Vasconcelos Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ENERGIA ELETRICA.:
  • DEFESA DO APROVEITAMENTO DE FONTES ALTERNATIVAS DE ENERGIA. ENCAMINHAMENTO A MESA DE PROJETO DE LEI QUE SUGERE A CRIAÇÃO DE LINHAS DE CREDITO E MODIFICAÇÕES NA LEGISLAÇÃO FISCAL COM O OBJETIVO DE ESTIMULAR A EXPLORAÇÃO DE ENERGIAS ALTERNATIVAS.
Publicação
Publicação no DSF de 11/08/1999 - Página 19925
Assunto
Outros > ENERGIA ELETRICA.
Indexação
  • COMENTARIO, AUSENCIA, RESPOSTA, REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES, AUTORIA, ORADOR, SOLICITAÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), ESCLARECIMENTOS.
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, NECESSIDADE, EXPLORAÇÃO, FONTE ALTERNATIVA DE ENERGIA, ENERGIA SOLAR, ENERGIA EOLICA, OBJETIVO, VIABILIDADE, ECONOMIA.
  • APRESENTAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, CRIAÇÃO, CREDITOS, FINANCIAMENTO, EXPLORAÇÃO, ENERGIA EOLICA, ISENÇÃO, IMPOSTOS, TAXAS, APROVEITAMENTO, FONTE ALTERNATIVA DE ENERGIA.

O SR. JOSÉ JORGE (PFL-PE. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, dentre os recursos naturais aproveitáveis pelo homem na produção de riqueza, poucos têm a importância dos recursos energéticos. Desde a primeira revolução industrial, a disponibilidade de recursos energéticos tem, muitas vezes, constituído a diferença entre países adiantados e atrasados. Mais importante ainda, o acesso a eles tem sido motivo de graves disputas e mesmo de guerras. A energia, não tenhamos dúvida, continuará a ser decisiva para o progresso e o desenvolvimento, especialmente dos países e regiões atrasados.  

Nosso País, apesar de não ser auto-suficiente na produção de combustíveis fósseis - carvão e petróleo -, que foram as molas propulsoras das primeiras fases do desenvolvimento industrial do mundo, devido às dificuldades materiais de exploração, é, felizmente, rico em potencial hidrelétrico, cujo aproveitamento nos poupou de uma crise maior, após a elevação brutal dos preços internacionais do petróleo nos anos setenta.  

Hoje, nas regiões de maior demanda - Sudeste, Sul e Nordeste -, o potencial hidrelétrico está praticamente todo utilizado. O que resta está localizado na Região Norte e seu aproveitamento, embora já esteja sendo feito, inclusive com linha de transmissão para o Nordeste e o Sudeste, implica problemas de custo e de preservação ambiental, sendo que o primeiro resulta das grandes distâncias que separam aquela Região do grande mercado consumidor nacional, e o segundo, a exploração do potencial da região, passa por um amplo debate, onde a sociedade como um todo poderá avaliar a conveniência da construção de novas hidrelétricas na Amazônia e o inevitável impacto ambiental advindo de sua implantação.  

Cabe lembrar, também, o fato de que os combustíveis fósseis, além de estarem em vias de esgotamento de reservas em todo o mundo, por não serem renováveis, têm o grave inconveniente, em seu emprego, de serem lesivos ao meio ambiente e à população, devido à emissão de gases poluentes capazes de acarretar danos irreversíveis à natureza, tais como o efeito estufa e as chamadas chuvas ácidas.  

Uma opção de fonte energética, renovável e limpa, que se faz ainda mais atraente em um País tropical como o nosso, é a biomassa. O emprego do álcool carburante é apenas uma das inúmeras possibilidades que o sol nos oferece de maneira perene e não poluente. Trata-se de tecnologia já dominada e que mereceria maior atenção por parte de nossos planejadores estratégicos. Para se ter uma idéia da importância desse tipo de energia, basta lembrar que os Estados Unidos já adotaram a mistura de álcool à gasolina e que, a partir do ano 2000, todos os combustíveis consumidos na França deverão ter uma participação mínima de 5% de combustíveis renováveis como o álcool. Aliás, a mesma determinação foi estendida, pela Comissão de Energia da União Européia para todos os países membros a partir de 2005.  

Não é admissível que um programa inteiramente nacional de substituição do petróleo, após atingir sucesso estrondoso, seja quase que completamente abandonado por simples incúria e falta de visão política e estratégica do Governo Brasileiro. Restaurar a credibilidade do álcool carburante, Srªs e Srs. Senadores, é um dever do Estado e das parcelas lúcidas da sociedade brasileira, que conhecem os benefícios econômicos e sociais, diretos e indiretos, de sua reinclusão na matriz energética nacional, inclusive, e fundamentalmente, a questão do emprego.  

O clima ensolarado da maior parte de nosso País nos faculta a projeção de outras formas de energia obtidas a partir da luz solar. Uma das formas apontadas pela ciência é a utilização de células fotovoltaicas, aproveitando o fenômeno do efeito fotoelétrico, mais comumente chamada de "energia solar". Apesar de tecnicamente viável, tanto que há usinas experimentais em alguns países, a viabilidade econômica ainda não foi atingida, pelo menos em níveis satisfatórios. Vale mencionar, entretanto, que se realiza anualmente uma corrida de automóveis integralmente elétricos através do deserto australiano, o que constitui um indício de que as pesquisas tecnológicas seguem firmes. Em algumas décadas, quem não dominar essa tecnologia terá de adquiri-la de seus detentores, o que é mais uma advertência aos responsáveis pelo planejamento do setor.  

Outra forma de aproveitamento da energia fornecida pelo sol é a energia eólica. Sim, porque os ventos nada mais são do que movimentos da atmosfera causados pelo efeito combinado da rotação do planeta e do gradiente de temperatura do ar sobre os diferentes pontos da superfície da terra e do mar. Assim, o aquecimento diferenciado dessas áreas provoca a formação de células de alta e baixa pressões atmosféricas, fazendo com que o ar se desloque horizontalmente das áreas mais frias para as mais aquecidas.  

Na verdade, até há quinze anos, e talvez menos, a maior parte dos especialistas em fontes alternativas de energia vislumbrava maior potencial de viabilização técnica e econômica, em horizonte mais próximo, para a energia solar de origem fotovoltaica que para a de origem eólica, mas, na prática, não foi isso o que se deu. Enquanto as usinas à base de baterias fotoelétricas seguem timidamente, limitadas a umas poucas unidades e em escala piloto, os cata-ventos das usinas eólicas surpreenderam os céticos e se espalham hoje pelo mundo, em escala de produção efetiva. Desenvolveu-se toda uma tecnologia de projetos de cata-ventos e turbinas específicas para as usinas de energia eólica.  

Com efeito, existe no mundo mais de 20 mil turbinas eólicas, de grande porte, instaladas e em operação, com uma capacidade total de cerca de 9.500 megawatts, que geram, anualmente, cerca de 21 bilhões de quilowatts/hora. São 2.200 megawatts na América do Norte, 6.200 na Europa e mais 1.100 na Ásia. Nos outros continentes, a utilização da energia eólica mal se iniciou. Mais uma vez, o Primeiro Mundo lidera a corrida, enquanto em nossas plagas o atraso gera mais atraso, no círculo vicioso da pobreza e do subdesenvolvimento.  

Trata-se de armadilha da qual temos que nos livrar e, para esse fim, devem juntar forças os setores público e privado. Deve-se ter em mente o fato de que, apesar de estar praticamente limitada aos países desenvolvidos, trata-se da forma de produção de energia que mais cresce no mundo. Somente nos primeiros anos desta década, a potência instalada no mundo cresceu cerca de 5 vezes. Na Europa, por exemplo, projeta-se gerar por turbinas eólicas, até o ano 2020, cerca de 10% de toda a energia a ser consumida no continente.  

Alemanha, Dinamarca e Espanha são os líderes europeus no emprego dessa fonte. Na província espanhola de Navarra, por exemplo, a energia de origem eólica já corresponde a cerca de um quarto, 25% da energia elétrica total consumida. Na América do Norte, o emprego da energia de origem eólica limita-se praticamente aos Estados Unidos; na Ásia, o líder é a Índia, país de nível de desenvolvimento semelhante ao Brasil, mas que, nessa área, saltou, decididamente, à nossa frente.  

No entanto, o potencial brasileiro de energia eólica explorável é enorme, principalmente na costa nordestina e em algumas áreas do sertão do São Francisco, onde a velocidade média dos ventos acima dos 50 metros do solo ultrapassa 8,5 metros por segundo, ou 30,6 km/h. No Nordeste, particularmente, a energia eólica viria a significar um aporte precioso e uma alternativa à energia de origem hidrelétrica, pois ali se enfrenta um dilema trágico entre o emprego da água para a irrigação da agricultura e a sua utilização na produção de energia.  

Trata-se, Srªs e Srs. Senadores, de uma dessas soluções providenciais, verdadeiro milagre à espera apenas de nossa iniciativa para fazer uso de uma coincidência. O regime de ventos é mais intenso justamente na estação mais seca, quando a água vale ouro para o sertanejo. A produção de energia eólica viria possibilitar um emprego mais intenso da água na agricultura, mesmo nos meses secos ou nas grandes estiagens, o que tornaria ainda mais atraentes, tanto social como economicamente, projetos como o da transposição da água do São Francisco para a bacia do Jaguaribe e do Açu-Piranhas.  

Esse potencial ainda é pouco explorado, estando em operação somente três usinas no Ceará, totalizando 16,2 megawatts, no Paraná existe outra gerando 2,4 megawatts, enquanto que em todo o restante do território nacional existem apenas três outras, todas com geração abaixo de 1 megawatt, em Pernambuco, em Minas Gerais e na Ilha de Fernando de Noronha. O custo de produção dessa alternativa energética varia, atualmente, entre US$40 e US$70 o MW/h, muito próximo dos US$40 a US$45 o MW/h da energia termoelétrica. Com a grande vantagem de se tratar de uma energia limpa e renovável o que não acontece com as térmicas, cujos custos ambientais não são devidamente contabilizados.  

Para a superação dos entraves à exploração dessa fonte perene e limpa de energia, o Centro Brasileiro de Energia Eólica - CBEE, ligado ao Fórum Permanente de Energias Renováveis do Ministério da Ciência e da Tecnologia, propõe, entre outras, as seguintes soluções:  

1ª) a criação de uma linha de crédito para financiamento de centrais eólicas, à semelhança do que foi definido pelo decreto do gás natural;  

2ª) a isenção de impostos e taxas, por cinco anos, para essa energia;  

3ª) a criação, também, de fundos de desenvolvimento estadual para energia eólica, financiados pelo ICMS da eletricidade de outras energias; e  

4ª) a utilização dos recursos de fundos de desenvolvimento regionais, como o Finor.  

Cabe, ainda, a meu juízo, incluir a produção de energia de fontes alternativas no elenco de atividades a serem prioritariamente financiadas por fundos constitucionais de desenvolvimento, como o FNE, no caso do Nordeste. Pela relevância estratégica da atividade, deve ser concedido aos projetos de produção de energia de fontes alternativas as mesmas vantagens nos custos do financiamento que são dados aos projetos localizados na região semi-árida.

 

No campo legislativo, as sugestões que se apresentam são:  

1ª) estender para a energia eólica o benefício de redução do pedágio da transmissão de energia elétrica produzida por Pequenas Centrais Hidrelétricas - PCHs, na forma do inciso I do art. 42 da Lei nº 7.990, de 28 de dezembro de 1989;  

2ª) alterar o § 5º do art. 26 da Lei 9.427, de 26 de dezembro de 1996, para permitir a venda da energia eólica para qualquer consumidor com demanda acima de 500 quilowatts, a exemplo do que foi estabelecido para as PCHs;  

3ª) alocar meio por cento (0;5%) do faturamento das empresas de energia elétrica destinados à eficiência energética para estudos, projetos e implementação de centrais eólicas; e  

4ª) definição, por parte da Aneel, no sentido de se cobrarem tarifas de transmissão e distribuição de energia que realmente viabilizem a produção independente, determinando às concessionárias a compra de três por cento de sua energia a fornecedores que trabalhem com fontes renováveis, como a eólica, a fotovoltaica e a de biomassa.  

Nesse contexto, irei propor, nos próximo dias, a esta Casa, através de projeto de lei - espero contar com o apoio de V. Exªs -, algumas dessas modificações na legislação que regula o setor, que a meu ver são essenciais para sua viabilização.  

Ao Ministério da Ciência e da Tecnologia e ao Ministério da Educação caberiam ainda a definição de programas de desenvolvimento de tecnologia para o aproveitamento de energia renováveis nos institutos de pesquisa e nas universidades públicas e privadas do País; fortalecer os sistemas de informação e de difusão tecnológica, e o fortalecimento dos programas de treinamento e capacitação dos Centros de Referências de Energia Eólica - CBEE e de Energia de Biomassa - Cenbio.  

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, já é mais do que hora de se dizer um basta a essa história de que somos o "País do Futuro". Não é próspera a Nação que dispõe de vastos recursos naturais e os deixa repousar em berço esplêndido, à espera do dia em que decidirá empregá-los mas aquela que sabe bem explorar e transformar em riqueza o quinhão que a natureza lhe legou.  

O deleite secular do nordestino do litoral, que, ao deitar-se em sua rede, sente a agradável e permanente brisa proveniente do mar, deve juntar-se a outro merecido prazer, o de ver essa mesma brisa como um fator a mais para a sua libertação da pobreza, do atraso e do subdesenvolvimento. Trabalhemos, Senhores, para que essa agradável brisa trabalhe para nós.  

Muito obrigado.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/08/1999 - Página 19925