Discurso no Senado Federal

ANALISE DE ESTATISTICAS DO IBGE SOBRE A ESCOLARIDADE DOS JOVENS DE 15 A 24 ANOS.

Autor
Mauro Miranda (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Mauro Miranda Soares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO.:
  • ANALISE DE ESTATISTICAS DO IBGE SOBRE A ESCOLARIDADE DOS JOVENS DE 15 A 24 ANOS.
Publicação
Publicação no DSF de 12/11/1999 - Página 30611
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, DADOS, ESTATISTICA, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), REFERENCIA, ANALFABETISMO, DESEMPREGO, JUVENTUDE, BRASIL.
  • DENUNCIA, AUSENCIA, PARTICIPAÇÃO, JUVENTUDE, DEBATE, PROBLEMAS BRASILEIROS.
  • DEFESA, POLITICA, EDUCAÇÃO, ESPORTE, POLITICA CULTURAL, INCENTIVO, ALTERNATIVA, PROGRAMA, MEIOS DE COMUNICAÇÃO, INSERÇÃO, JUVENTUDE, CIDADANIA, ADAPTAÇÃO, CRISE, OFERTA, EMPREGO, ESPECIFICAÇÃO, ENSINO PROFISSIONALIZANTE.

O SR. MAURO MIRANDA (PMDB - GO. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, dados estatísticos divulgados em junho pelo IBGE revelam que o Brasil tem hoje mais de 30 milhões de jovens na faixa dos 15 aos 24 anos. Desse contingente, cerca de 3 milhões são analfabetos. Cinqüenta por cento dos nossos desempregados estão nessa mesma faixa etária. São exemplos de um quadro geral de carências que deve merecer a reflexão urgente dos governantes, da mídia e de toda a sociedade.  

Infelizmente, porém, o Dia Internacional da Juventude, celebrado no último dia 31 de outubro, passou em branco em nosso País. Não vi sequer o sinal de um debate consistente sobre a perplexidade que envolve hoje essa faixa expressiva da população brasileira. Isso leva à conclusão de que estamos coexistindo com uma grave realidade: todos nós que temos responsabilidade direta ou não sobre a conjuntura social estamos em débito com a juventude.  

Em 1968, empunhando a bandeira do "É proibido proibir", milhares de jovens franceses saíram às ruas, num movimento que se refletiu em muitos países e que tinha como principais alvos o autoritarismo, o conservadorismo e o poder das gerações mais velhas que constituíam um estereótipo do ancien régime . A partir desse movimento cultural, que também teve seus reflexos diretos na conscientização política da juventude brasileira, alcançamos várias conquistas, sobretudo o Estado Democrático de Direito, restabelecendo as liberdades individuais.  

Enquanto a situação se inverteu no campo político, o mesmo não aconteceu no campo social. A juventude do meu tempo, juventude dos tempos pós-Juscelino, viveu a utopia desenvolvimentista que a integrou num projeto nacional. Já os jovens de hoje enfrentam problemas históricos enraizados na nossa formação sócio-cultural, e que, infelizmente, agravaram-se nos últimos anos. Temos a nossa parcela de responsabilidade nessa frustração de expectativas. Os problemas nacionais são passados aos jovens como se fossem espectadores, numa linguagem distanciada, ou num debate político que não os inclui. Eles sentem que a discussão dos partidos está muito mais voltada para interesses próprios, enquanto os problemas sociais, o desemprego e a violência aumentam.  

É bom lembrar que corremos o risco de incorrer no erro de julgar a juventude de hoje usando as concepções arcaicas do passado. Em A Era dos Extremos , o historiador Hobsbawn comenta as mudanças de mentalidade que estão ocorrendo no mundo ocidental, ressaltando o declínio dos sindicatos e de todas a instituições nascidas no âmbito da sociedade industrial. Ele enfatiza a perda de prestígio dos partidos políticos, considerados até então "grandes máquinas para transformar homens e mulheres em cidadãos ativos". Mostra ainda o crescimento de outros símbolos de identificação nacional, como os esportes e as artes, além da ascensão do direito coletivo das pessoas comuns, e, finalmente, o fortalecimento de um grande ator coletivo, que seriam os meios de comunicação social, como "poderosos contrapesos aos segredos dos governos".  

Essa constatação pode ser o alerta que está faltando para mostrar as vias de reinserção da juventude em um projeto coletivo. A definição de políticas públicas de educação, esporte e cultura voltadas para os jovens e o estímulo à criação de programas alternativos nos meios de comunicação, em que o jovem não seja tratado apenas como mero consumidor, mas como agente ativo da sociedade, parecem ser, afinal, bons caminhos a trilhar.  

Cabe ao Estado patrocinar soluções criativas para as demandas de caráter social, econômico e cultural da juventude. Somente assim poderemos formar cidadãos prontos para interferir numa sociedade mais justa e mais humanitária no próximo século. Vale a pena atentar para o fato de que a participação da juventude no universo demográfico tende a crescer até 2005, configurando o que os especialistas chamam de "onda" adolescente. Isso significa que a geração de adolescentes, no começo dos anos 2000, será mais numerosa.  

Esse diagnóstico merece reflexão mais aprofundada. A chamada onda adolescente deverá ocorrer no mesmo momento em que vão escassear ainda mais os postos de trabalho, em função da globalização e de seus efeitos conhecidos. Esse é um dos mais fortes motivos para a aflição de nossa juventude. Os métodos e a estrutura dos sistemas de ensino têm que ser repensados imediatamente para enfrentar esses novos tempos de mudança nos conceitos de trabalho. Escolas técnicas devem adaptar-se para os novos modelos de formação profissional exigidos pelos mercados em processo de intensa transformação.  

Para mim, é imperativo estabelecer um novo modelo de relacionamento entre as sociedades nacionais e as juventudes. Nós, no Brasil, estamos em dívida com o nosso futuro. E indispensável restabelecer o sentimento salutar da esperança e desenvolver programas culturais e educativos que valorizem e estimulem o ímpeto criador e transformador que é peculiar aos mais jovens. Somente assim será possível esperar que a "santa ira" que lhes é de direito produza seus efeitos na renovação de nossa sociedade. E que a crença na possibilidade de mudar o mundo, indispensável para o equilíbrio entre o eterno embate entre as forças conservadoras e o desejo de renovação, passe a ser um dos principais fundamentos da transição social que estamos vivendo.  

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.  

Muito obrigado.  

 

N


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/11/1999 - Página 30611