Discurso no Senado Federal

REGOZIJO PELA APROVAÇÃO DAS MEDIDAS CONTRA A POBREZA. (COMO LIDER)

Autor
Marina Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • REGOZIJO PELA APROVAÇÃO DAS MEDIDAS CONTRA A POBREZA. (COMO LIDER)
Aparteantes
Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 01/12/1999 - Página 32438
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • INFORMAÇÃO, CONCLUSÃO, TRABALHO, COMISSÃO MISTA, ERRADICAÇÃO, POBREZA, ELOGIO, ATUAÇÃO.
  • EXPECTATIVA, CONGRESSO NACIONAL, APROVAÇÃO, PROPOSIÇÃO, CRIAÇÃO, FUNDO ESPECIAL, SOLIDARIEDADE, PROGRAMA, RENDA MINIMA, REVISÃO, SALARIO MINIMO, IMPLEMENTAÇÃO, ORÇAMENTO, POLITICA SOCIAL, TRAMITAÇÃO, URGENCIA, EMENDA CONSTITUCIONAL, SENADO, CAMARA DOS DEPUTADOS.
  • REGISTRO, COMPROMISSO, MEMBROS, COMISSÃO MISTA, ACOMPANHAMENTO, IMPLEMENTAÇÃO, PROGRAMA, ERRADICAÇÃO, POBREZA.
  • DEFESA, COBRANÇA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DEFINIÇÃO, INVESTIMENTO, POLITICA SOCIAL.

A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT - AC. Como Líder. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, no dia 24, encerramos os trabalhos da Comissão Mista de Combate à Pobreza.  

O resultado do trabalho de quase quatro meses em que 19 Srs. Senadores e 19 Srs. Deputados trabalharam para apresentar medidas para erradicação da pobreza em nosso País foi, do meu ponto de vista, como instrumento de luta política e de atuação do Congresso Nacional e das instituições que operam políticas sociais, importante e significativo. Compreendo, entretanto, que se trata apenas do primeiro passo e que há ainda um longo caminho a ser percorrido, principalmente no Congresso Nacional, porque é preciso aprovarmos as propostas indicadas pela Comissão como importantes para o combate à pobreza: a criação do Fundo de Solidariedade proposto pelo ilustre Relator Roberto Brant; o Programa de Renda Mínima, iniciativa em tramitação na Casa - incorporada ao relatório a partir dos debates -, proposta pelo Senador Eduardo Suplicy; revisão do salário mínimo, proposta do Deputado Paulo Paim, também em tramitação na Casa; e a instituição de um orçamento social com recursos carimbados no Orçamento para investimentos na área social, de forma a haver recursos com destinação vinculada a programas de combate à pobreza.  

Inicialmente, houve um certo distanciamento entre o relatório apresentado pelo ilustre Relator, em que pese todo seu esforço em sintetizar o que foi debatido durante os três meses em que a Comissão trabalhou, e as propostas que a Oposição e outros Srs. Deputados e Senadores, independentemente de serem da base de sustentação do Governo, consideraram importantes serem contempladas no relatório.  

Ao final, houve aquiescência por parte de toda a Comissão de que se deveria produzir um relatório de consenso. A partir daí, incorporaram-se a proposta de renda mínima, a instituição do orçamento social e a revisão do salário mínimo, bem como modificação na proposta de criação do Conselho Nacional de Solidariedade. Inicialmente, havia a proposta do Relator de que o Conselho se compusesse de nove membros do Executivo e quatro da sociedade civil organizada. Alterou-se para seis da sociedade civil e seis do Governo. Esse Conselho, sendo paritário, constituirá o instrumento que irá operar, fiscalizar e avaliar as políticas sociais, além de enviar ao Congresso Nacional a prestação de contas do orçamento social.  

Comporá o Fundo de Combate à Pobreza, além do fundo proposto pelo Relator, o imposto sobre grandes fortunas.  

A caracterização das pessoas que terão acesso à renda de cidadania, à bolsa-escola, será instituída por Lei, o que, do meu ponto de vista, foi uma vitória da nossa Comissão, porque não estamos transferindo para o Conselho, seja Federal, Estadual ou Municipal, a responsabilidade de caracterizar os segmentos da sociedade que, em função da sua situação de pobreza, terão acesso aos recursos do bônus ou da renda de cidadania.  

De sorte que considerei o Relatório final importante. As três PECs tramitarão nesta Casa em conjunto, porque serão apresentadas no Senado e na Câmara, com o compromisso tanto do Presidente Antonio Carlos Magalhães quanto do Presidente Michel Temer de que terão tramitação rápida com a finalidade de constituírem-se em um instrumento de combate à pobreza o mais rápido possível.  

Sr. Presidente, gostaria de fazer referência ao esforço necessário para implementar todas as medidas apresentadas pelo Relatório, tarefa desta Casa, do Poder Executivo e da sociedade como um todo. Não vejo outro caminho. Ou o País se une no combate à pobreza, ou se tornará um problema sem solução - se é que existem problemas levantados pelo homem que não tenham solução. Já dizia o nosso velho e bom Marx que os homens só levantam problemas que são capazes de resolver e para os quais existam as condições historicamente dadas para a sua resolução.  

A Comissão também se propõe, por iniciativa de alguns Srs. Deputados, a se constituir, durante o prazo de dez anos, em uma comissão de acompanhamento às medidas de erradicação da pobreza.  

Sr. Presidente, mesmo sendo resultado de requerimento de minha autoria, isso é o que menos me importa no momento. Digo isso tranqüilamente, pois propus a criação de uma comissão no Congresso Nacional que procurasse soluções legislativas e apresentasse propostas eficazes de ação pública para a luta contra a pobreza e que pudéssemos instituir programas de impacto com ações que dessem resposta aos mais diversos problemas que hoje estamos enfrentando: os 78 milhões de pobres que vivem de um salário mínimo; os 43 milhões de pessoas que vivem com menos de US$1,00 por dia. Muitos, embora não sejam governo, realizam trabalho de apoio às pessoas menos favorecidas. Todos temos o compromisso de fazer com que o trabalho da Comissão não se torne um cabo de guerra entre os autores das iniciativas, no sentido de que fiquemos reivindicando desesperadamente a autoria dessas iniciativas. Devemos, sim, de alguma forma, trabalhar coletivamente para aprovar as medidas e buscar, junto ao Poder Executivo, a viabilização dos recursos necessários para sua implementação.  

Sr. Presidente, considero um grande êxito a primeira parte do trabalho da Comissão. E considero que as ações e o conjunto de atitudes que temos que tomar - tanto o Congresso Nacional, como o Poder Executivo e os representantes da sociedade civil -, neste momento, exigem uma qualidade política diferente da do início do trabalho da Comissão. Se naquela oportunidade auscultamos a sociedade, ouvimos aqueles que tiveram êxito em suas experiências, sejam elas institucionais ou da sociedade, buscamos técnicos para que orientassem, teórica e cientificamente, as ações da Comissão, neste momento, considero que a qualidade política do trabalho está numa outra fase, a fase de articularmos a aprovação das iniciativas, não só as emendas à Constituição, mas também os projetos indicados como prioritários - que são mais de 30 projetos -, bem como a viabilização de recursos para o ano 2000 no Orçamento e as emendas apresentadas ao PPA, para que se possa realizar ações concretas já no ano 2000.  

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - V. Exª me permite um aparte?  

A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT - AC) - Ouço com prazer V. Exª.  

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Senadora Marina, quero dar força ao seu pronunciamento, uma vez que V. Exª está registrando as conclusões da Comissão Mista de Combate à Pobreza, que foi iniciativa sobretudo de V. Exª, quando visualizou a necessidade de aqui examinarmos todos os projetos de combate à pobreza, sejam aqueles apresentados pelo Presidente do Senado Antonio Carlos Magalhães, pelo PT ou pelos demais Partidos. Gostaria de ressaltar que avaliei como positiva a forma como concluiu a Comissão Mista, quando o Relator Deputado Roberto Brant considerou adequado que se pudesse realizar um entendimento entre seu relatório, que constituía a visão do Governo, e as inúmeras sugestões que o próprio Bloco de Oposição e outros Partidos apresentaram. No entanto, as idéias foram aceitas não da forma como gostaríamos, mas, pelo menos, o foram na direção que propusemos. No relatório final, S. Exª adotou sugestões de nossa autoria para que o Brasil possa, o quanto antes – depois de ter sido o último país no século passado a abolir a escravatura –, tornar-se um dos primeiros a instituir a renda como um direito à cidadania para todos os que residem no Brasil. E, ainda, por intermédio de mecanismos internacionais, como a taxa Tobin sobre transações financeiras internacionais, colaborar para que, em todo o Planeta Terra, possam os seres humanos receber uma renda garantida como um direito inalienável de todos de participarem da riqueza desta Nação.  

Também gostaria de registrar que o Relator, Deputado Roberto Brant, acatou diversas proposições no sentido de recomendar a sua aprovação com urgência, entre as quais justamente o projeto de lei que define uma linha oficial de pobreza. Por esse projeto, o Governo Federal fica obrigado a definir um patamar de renda, para uma pessoa ou para uma família, abaixo do qual se consideraria insuficiente para as suas necessidades vitais, assim se podendo estabelecer metas de erradicação da pobreza absoluta. Dentro de instantes, na Comissão de Assuntos Sociais, será apreciado esse projeto que institui uma linha oficial de pobreza no País, em caráter terminativo, no Senado, uma vez que já foi aprovado na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania e será apreciado na Comissão de Assuntos Sociais. Muito obrigado.  

A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT - AC) - Agradeço a V. Exª pelo aparte e incorporo-o ao meu pronunciamento, Senador Suplicy. A participação de V. Exª durante os debates na Comissão muito contribuiu para o resultado que obtivemos.  

No início, quando se falava no assunto – e V. Exª era o porta-voz dessa proposta da renda mínima –, alguns Senadores e Deputados não compreendiam adequadamente a sua dimensão. Ao longo desses três meses, a grande maioria acabou por convencer-se dessa idéia de que a sociedade deva disponibilizar para todos os seus filhos uma renda de cidadania para que todos possam gozar em iguais condições daquilo que constitui a riqueza da Nação.  

Foram muito importantes os debates ocorridos na Comissão e o trabalho solidário mesmo de pessoas de posicionamento político-ideológico diferenciado.  

Fizemos uma visita a um grupo de empresários que se articulam em torno de uma idéia denominada "economia de comunhão". Eu, os Senadores Romeu Tuma, Eduardo Suplicy e os Deputados Claudio Cajado, Feu Rosa e Luiza Erundina tivemos a oportunidade de conhecer um grupo de empresários que colocou o objetivo da sua atividade econômica não apenas no lucro pelo lucro ou na vantagem imediata em benefício próprio, mas na instituição de uma atividade produtiva que possa ter uma finalidade social, que possa ter um resultado voltado para minorar o sofrimento das pessoas, produzir emprego, oferecer um produto de qualidade. São exemplos de empresários preocupados em dar a sua parcela de contribuição ao crescimento do País, inclusive, inovando com a idéia de fazer com que os empregados possam também fazer parte da lucratividade das empresas. Eles mesmos relataram que, com essa postura, tiveram uma melhoria significativa dentro do processo produtivo, na qualidade do produto, fazendo com que os empregados passassem a sentir-se parte da empresa, co-proprietários e não apenas subordinados, trocando sua força de trabalho por uma remuneração. Isso foi muito importante.

 

Tivemos a oportunidade de conhecer o trabalho do Padre Júlio Lancelotti com a população de rua e de outras instituições que também trabalham com essas populações.  

Além das populações empobrecidas do Nordeste, conhecemos os menores infratores do Cadeião de Pinheiro e conversamos com seus familiares, principalmente com suas mães.  

O trabalho da Comissão gerou um compromisso com os Deputados e com os Senadores que dela participaram no sentido de fazer com que as ações apresentadas e os debates realizados não venham a constituir-se apenas em uma peça literária ou em uma matéria tramitando infinitamente no Congresso Nacional – como ocorre com algumas delas –, mas que se constituam em instrumentos eficazes de combate à pobreza.  

Nossa participação na Comissão não tinha o objetivo de criar um espaço para disputa política, para visibilidade política desse ou daquele grupo, mas, em primeiro lugar, tinha o compromisso de contribuir com a população excluída e empobrecida do nosso País.  

Todos devemos reivindicar a autoria e o reconhecimento de nossas ações. Todos buscamos fazer com que o bom seja visto. Afinal de contas, Cristo falou que ninguém acende uma luz para colocá-la embaixo de uma mesa. O que é bom, justo e correto deve ser apresentado até como exemplo para que outros possam seguir.  

O objetivo principal dos Deputados e Senadores que estão à frente desse trabalho deve ser necessariamente oferecer um instrumento de combate à pobreza, de realização de políticas públicas voltadas para a inclusão social, que vão desde iniciativas como a bolsa-escola; o assentamento de trabalhadores – hoje há mais de 120 mil famílias assentadas em beira de estrada; a reforma agrária estrutural, que precisa continuar; políticas voltadas para as pessoas de baixa renda, que não alcançam a renda mínima necessária à sua sobrevivência. Enfim, todas essas ações levam-nos à idéia de que a pobreza deve ser um compromisso de todos do ponto de vista prático, uma vez que, do ponto de vista retórico, já nos une de norte a sul deste País.  

Hoje, iniciamos a coleta de assinaturas para a sua apresentação. Esperamos poder contar com todos os Membros desta Casa e da Câmara dos Deputados, para que elas possam tramitar o mais rápido possível e receber um parecer favorável. Entre as iniciativas, está a proposta do Relator, concernente à criação de um fundo constitucional, cujos recursos seriam oriundos do 0,08% da CPMF e de outras alíquotas que o Relator sugeriu, para que possamos ter também o mesmo empenho em relação à proposta de renda mínima ao orçamento social e à questão do salário mínimo, que é uma proposta já trabalhada há muitos anos pelo Deputado Paulo Paim.  

As expectativas que criamos junto à sociedade são favoráveis ao trabalho da Comissão. Embora alguns sejam descrentes em relação a elas, prefiro continuar acreditando até o último momento, para que não venhamos a cometer o pecado de entregar os pontos, antes mesmo de termos entrado no campo de batalha. Considero o relatório apenas o primeiro passo. O verdadeiro campo de batalha ainda continuará nas ações do Congresso para aprovar as emendas à Constituição, na viabilização dos recursos dentro do Orçamento e na apresentação do relatório ao Presidente Fernando Henrique Cardoso, que, quando foi informado de que o Relator estava sugerindo que os 0,08% da CPMF fossem para o Fundo de Combate à Pobreza, disse que não concordava com essa proposta, que o Brasil já tem gastos sociais muito grandes e que é preciso haver uma refocalização na utilização desses recursos.  

Ao levarmos o relatório ao Presidente da República — o que espero que ocorra o mais breve possível —, que seja feita essa cobrança com a qual concordamos. É preciso que se faça uma refocalização dos investimentos sociais.  

Considero que ficar cinco anos à frente do Governo e depois fazer a constatação de que já há investimentos suficientes e que é necessário utilizar corretamente os recursos é, no mínimo, um atestado de incompetência e de descaso para com os recursos públicos ou a demonstração de que, realmente, o Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso não tem nenhum controle e não deu prioridade, até o presente momento, à política social, como já vem sendo dito pela Oposição em todas as oportunidades.  

Quero registrar que as propostas aqui apresentadas farão parte das ações prioritárias do Congresso Nacional, segundo o compromisso assumido tanto pelo Presidente do Congresso, Senador Antonio Carlos Magalhães — que, inclusive, foi um dos que iniciaram esse debate nos termos em que estamos agora fazendo, quando apresentou o seu projeto de criação de um Fundo para o Combate à Pobreza —, como pelo Presidente da Câmara dos Deputados, Deputado Michel Temer, que também se comprometeu em fazer tramitar, o mais rápido possível, essas iniciativas. Espero que todos os Srs. Deputados e os Srs. Senadores que fazem parte dessa Comissão tenham o devido empenho em fazer com que, nas Comissões em que elas tramitarão, possam ser apreciadas o mais rápido possível.  

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, PRONUNCIAMENTO DA SRª SENADORA MARINA SILVA:  

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/12/1999 - Página 32438