Discurso no Senado Federal

HOMENAGEM A MEMORIA DO EX-PRESIDENTE JOÃO GOULART.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • HOMENAGEM A MEMORIA DO EX-PRESIDENTE JOÃO GOULART.
Publicação
Publicação no DSF de 07/12/1999 - Página 33875
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE MORTE, JOÃO GOULART, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, ELOGIO, PARTICIPAÇÃO, POLITICA NACIONAL.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não posso deixar de vir a esta tribuna destacar mais um aniversário da morte do Dr. João Goulart. S. Exª foi o único Presidente do Brasil que morreu no exílio. Por mais que se tenha esforçado e se angustiado para retornar à sua pátria, isso não foi possível. Os militares não o permitiram. E João Goulart, doente, fazendo os seus exames em Paris e reconhecendo a dificuldade e a deficiência de sua saúde, desejava retornar ao Brasil, mas isso lhe foi negado. Houve um momento em que tomou a decisão de tomar um avião e descer em Brasília ou no Rio de Janeiro, acontecesse o que acontecesse. Foi-lhe dito que seria preso, e os seus amigos mais chegados fizeram um apelo no sentido de que não retornasse.  

O Dr. Antonio Carlos Magalhães, em uma hora muito feliz, distribuiu aos Parlamentares e à sociedade brasileira os discursos mais célebres do Congresso Nacional – Câmara e Senado. Eu ainda não havia assistido a todos. Conhecia-os, há muito tempo, dos jornais, de manifestações e de decisões, mas ainda não havia assistido ao célebre pronunciamento do Presidente do Senado, quando decretou vaga a Presidência da República. Um desses pronunciamentos – acho muito feliz que estivesse ali – é exatamente o do Sr. Moura Andrade, determinando vaga a Presidência da República.  

Claro que, a essa altura, não há como se imaginar ou se fazer qualquer análise sobre aquela decisão, porque não houve decisão nem votação. O Presidente decretou vaga a Presidência e encerrou a sessão do Congresso Nacional. Abriu a sessão, não se sabe para quê, com os protestos de Tancredo Neves e dos Parlamentares. Leu determinado artigo da Constituição e uma carta do Chefe da Casa Civil, Dr. Darcy Ribeiro, enviada ao Presidente do Congresso, que dizia: "O Sr. Presidente da República, neste momento, está em Porto Alegre com o seu Governo, buscando responder às forças que estão tentando insurgir-se para golpear o Governo". Casualmente, eu estava com ele em Porto Alegre, na casa do Comandante do III Exército, e o Presidente do Congresso Nacional, Sr. Auro de Moura Andrade, declarou vaga a Presidência da República. De um lado, vinham forças golpistas de Minas Gerais e, de outro, uma incerteza relacionada à posição que tomaria o Comandante do II Exército, amigo pessoal do Presidente João Goulart, mas com algumas dúvidas sobre o General Bertholdo Klinger.  

Naquela ocasião, estando o Sr. João Goulart em Porto Alegre, o Presidente do Senado Federal declarou vaga a Presidência da República. Não houve decisão, mas protestos e gritos. Não existiu votação tampouco atendimento ao pedido de recorrer à Comissão de Constituição e Justiça. Não se atendeu ao protesto do Sr. Tancredo Neves, que gritava e protestava que aquilo era golpe. E foi decretada vaga a Presidência da República.  

Isso é muito estranho. Já conheci vários tipos de golpe: golpe militar, golpe até do Congresso, isto é, golpe congressual – lá pelas tantas, a maioria do Congresso une-se aos militares e derruba um Presidente. Agora, golpe do Presidente do Congresso, eu não conheci. Fiquei conhecendo com a gravação de que tive a felicidade de tomar conhecimento por meio da distribuição feita pela Mesa presidida pelo Sr. Antonio Carlos Magalhães. E aconselho V. Exªs: está lá no primeiro dos volumes, que V. Exªs devem ter em suas estantes. Nós já recebemos dois volumes: um, há pouco tempo, e outro, no ano passado. É naquele primeiro volume que consta: "Pronunciamento do Sr. Auro de Moura Andrade".  

Aliás, ele fez dois pronunciamentos – esse Auro de Moura Andrade tem uma história marcada –, um, correto, em que decretou vaga a Presidência da República na renúncia do Sr. Jânio Quadros. Apesar de todo o respeito que o PMDB sempre teve ao Sr. Pedroso Horta – agora não é mais Fundação Pedroso Horta, mas Fundação Ulysses Guimarães; graças a Deus, lutei muito por isso –, eu sempre tive minhas restrições a ele. Homem de bem, digno, correto, valente, competente, mas, cá entre nós, o cidadão era Ministro do Sr. Jânio Quadros, quando este lhe entregou uma carta, renunciando à Presidência. Não sei se o Sr. Jânio Quadros estava um pouco "alto", não sei se queria dar um golpe de estado, não sei o que era; o que sei é que imagino que um Chefe da Casa Civil ou um Ministro da Justiça que tivesse um mínimo de competência deveria ter pego aquela carta, chegado ao Sr. Moura Andrade e dito: "Sr. Moura, tenho uma carta que é muito séria e não sei o que vou fazer". Depois, deveria tê-la colocado no bolso de volta. Deveria ter pego a carta, ido ao Ministro do Exército e dito: "Tenho comigo a carta de renúncia do Sr. Jânio Quadros; o que eu faço com isso?" Em seguida, deveria tê-la colocado de volta no bolso. No entanto, ele a pegou e entregou para o Moura Andrade, que reuniu o Congresso na mesma hora e leu. Caiu Jânio Quadros.  

Esse era o Moura Andrade. Duas vezes ele fez isso: uma, diria que juridicamente foi correto, porque, lendo a carta assinada por Jânio Quadros, não havia mais o que fazer; a renúncia é absolutamente irretratável. Mas ele poderia ter dito para o Ministro do Jânio Quadros: "Cá entre nós, vamos conversar, vamos atrás do Jânio, vamos falar com A ou com B. Ele não fez isso; reuniu na última hora e leu a carta.  

O Sr. Ernandes Amorim (PPB-RO) - Senador Pedro Simon, faço-lhe somente uma pergunta. Quando entregou a carta, a renúncia foi tácita. Por que a do Collor, que renunciou antes, não foi considerada naquele momento?  

O SR. PEDRO SIMON (PMDB-RS) - Esta é um ótima pergunta, muito inteligente.  

Foi pela seguinte razão: porque o Sr. Jânio Quadros entregou a carta de renúncia, e ela foi lida. O Sr. Collor teve dias e dias para renunciar e não o fez. Quatro horas depois, não estava mais aqui o Senado: o Presidente do Supremo Tribunal Federal passou a presidir a nossa sessão, e nós nos transformamos em um tribunal, de acordo com a Constituição, para julgar e decidir sobre o Presidente da República. A sessão foi presidida pelo Presidente do Supremo, e nós praticamente deixamos de ser Senado e nos transformamos em Corte Suprema. Se o Sr. Collor, antes de abrir a sessão, antes de falar... E muita gente lhe falou isso, tanto que dizem alguns que foi erro de seu advogado, porque ele estava com a carta no bolso. Se ele entregasse na hora, se ele pedisse a palavra para uma questão de ordem e entregasse a carta, a renúncia seria aceita; mas ele deixou para fazer isso quatro horas depois. Quando ele sentiu, na ação, nos depoimentos prestados — teve esperança, até a última hora, de que o resultado fosse outro —, que não daria, entrou com a renúncia. Por isso não valeu. Estou sendo claro? A renúncia do Jânio o Presidente do Senado leu em sessão do Congresso Nacional. Ele reuniu o Congresso Nacional e leu. Nós aqui não estávamos nem em sessão do Senado, porque quem leu foi o Presidente do Supremo. E, como disse, já estava em andamento; não alteraríamos a nossa sessão.  

Mas o que digo é que aconteceu isso com relação ao Sr. João Goulart. O Comandante do III Exército estava disposto a fazer resistência. O Dr. Brizola até hoje não perdoou o Dr. João Goulart por não ter feito a resistência. O Dr. João Goulart, de certa forma influenciado pelo que assistiu depois do suicídio de Getúlio Vargas, não aceitou. O golpe já está dado, o Brasil está dividido, será uma guerra civil de conseqüências imprevisíveis. Viajou para o Uruguai. Olha, o que se dizia em relação ao Sr. João Goulart..., tenho medo da mídia quando ela se une, Sr. Presidente.  

A primeira vez que a mídia se uniu foi contra Getúlio Vargas, em 1954, tendo à frente Carlos Lacerda - e vale a pena também ver os discursos. Não que eu queira dizer que o Sr. Antonio Carlos Magalhães só escolheu os discursos, é porque esses eram importantes. Mas está lá o discurso do Afonso Arinos de Mello Franco sobre o que se dizia do Dr. Getúlio Vargas às vésperas do golpe. E contra a mídia organizada é realmente muito difícil! Vi duas vezes a mídia organizada estar com um bom propósito - eu acho, muitos não acham, e provavelmente o querido Senador que me fez um aparte não acha -: nas Diretas Já, no final, porque a Globo foi até o final das Diretas Já, mas, quando começaram a derrubar as caminhonetes da Globo, e havia uma revolta contra a Globo, porque o noticiário da Globo não noticiava o que estava acontecendo – milhares de pessoas se reunindo –, a Globo sentiu que tinha que mudar, e mudou! E houve um movimento em que as Diretas Já só não foram aprovadas porque as tropas militares cercaram o Congresso Nacional e muita gente, muitos Parlamentares, com medo, Sr. Presidente, mudaram o voto. E outros não apareceram para votar, também com medo.  

A outra vez que vi a mídia se unir foi no impeachment. Mas, justiça seja feita, a mídia se uniu no impeachment, quando o Collor foi à televisão e pediu que o povo, que os estudantes, que os jovens, viessem às ruas de verde e amarelo, porque queriam derrubar o seu mandato. E a mocidade veio à rua de preto. Aí, a mídia resolveu assumir a defesa da cassação de Collor.  

Mas, com relação ao Sr. João Goulart, meus Deus! Os jornais do Rio de Janeiro e de São Paulo colocavam na capa, diariamente, ou editorial de cima a baixo, ou discursos do grandes líderes da oposição da época. Meu amigo e hoje companheiro, grande tribuno, Paulo Brossard, Deputado como eu na Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul, em mais de uma oportunidade. Velho Maragato do PL, seus discursos na íntegra, na primeira página de O Globo , O Estadão e de todos os jornais do centro do País.  

O Sr. João Goulart era o homem mais rico do mundo. O Sr. João Goulart, desde que assumiu a Presidência da República, comprava um fazenda a cada semana! Era o maior proprietário de extensão rural do mundo.  

Uma vez, foi tão violenta uma publicação feita no Times que o Correio do Povo de Porto Alegre e os jornais do centro do País publicaram-na na íntegra. Fomos a Montevidéu, seu sobrinho e Deputado estadual Maurício Goulart de Loureiro e eu. Lá, o Jango foi a um cartório do Uruguai, em Montevidéu, e passou uma procuração em causa própria se comprometendo a vender por US$1,00 para o Presidente da

Time, por fazenda que se provasse que tivesse uma certidão que ele tivesse comprado no nome dele, da mulher ou dos filhos desde que tinha assumido a Presidência da República.  

Fiz esse pronunciamento e está nos Anais da Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul esse documento. Fui ao Correio do Povo , levei o documento e dei nas mãos de um grande homem que merece meu respeito, o então Presidente do Correio do Povo. Não consegui, não saiu em nenhum lugar do Brasil, que tinha publicado em capa de todos os jornais, não saiu em nenhum jornal do Brasil uma vírgula com relação à atitude do Presidente João Goulart.  

Hoje, aí está! Ainda na semana passada saiu, e agora, inclusive, a Revista IstoÉ apresentou o Sr. João Goulart como um dos grandes homens deste Século. Está na edição desta semana da Revista IstoÉ que uma semana antes de ser derrubado 85% era o percentual que apoiava João Goulart entre os ótimos, bons e regulares. Não chegavam a 10% os que rejeitavam o Governo de João Goulart. E quem lesse os jornais: era um Governo de escândalos que deveria cair no dia seguinte.  

Ora, Sr. Presidente, foram dias difíceis para o Presidente João Goulart. Dias difíceis no exílio. Catorze anos. E o Sr. Leonel de Moura Brizola morando com ele na mesma cidade de Montevidéu, e não se falavam. E Dona Neuza, mulher fantástica, para atender ao marido, praticamente não falava com o irmão. Só foram se falar antes de Jango embarcar para Paris, já muito doente, e que ele fez questão de se despedir da irmã. Então, ele foi lá e, para felicidade do Brizola, conversaram longamente, inclusive reataram a amizade. Foi a última vez que se viram.  

Lembro-me daquela hora, quando tomamos conhecimento da morte de Jango, na Argentina. Logo fui procurado, porque havia a decisão de que a viúva e os filhos queriam e haviam de enterrá-lo em São Borja, no túmulo da família, a 40 metros do túmulo de Getulio Vargas. Então, as forças do Exército chegaram a mim, Presidente do Partido, para dizer: "Vamos concordar que ele entre, mas ele entrará, caixão fechado, proibido abrir, e será enterrado".  

O corpo passou por Uruguaiana e muita gente nas ruas em Uruguaiana. O carro que o trazia por pouco não atropelou as pessoas, que tiveram que saltar para o lado, porque o carro, com acompanhamento militar – não de honra, é verdade –, passou a 120 quilômetros por hora. Quando chegou em São Borja, tínhamos combinado com o Santo Padre de lá. A igreja, na praça, estava fechada. Quando passou o carro – estávamos ali já com acompanhamento –, paramos na frente da igreja. A igreja se abriu; carregamos o corpo e o colocamos dentro da igreja, que estava lotada de gente. De repente, a igreja vazia e a praça vazia, preparado por eles; a praça superlotada, a igreja superlotada e o corpo dentro da igreja. Aí não deu para tirar. Ele ficou ali sendo velado pelo povo.  

Os militares, angustiados, exigindo o que não tinha, porque da igreja, no centro de São Borja, até o cemitério eram dois ou três quilômetros. Havia um mar de gente. Eram populares e soldados que tinham vindo de todas as regiões: Santiago, Alegrete, Uruguaiana. As tropas vinham de todas as regiões apavoradas com o morto que estava chegando. O comandante da operação procurou-me e disse: "Deputado, vamos entrar no carro e tocar para o cemitério". Respondi: O senhor é que sabe, Coronel. Só que entrou e não deu para tocar para o cemitério, porque na frente do carro havia uma infinidade de gente. O povo pegou o caixão e, a pé, foi para o cemitério.  

Tancredo Neves e eu fizemos um pronunciamento. Estávamos cercados pelo povo e por militares. Fizemos nossa homenagem a João Goulart. Lembramos que ele era o homem do entendimento. O Ministro do Trabalho apresentou uma proposta que Getúlio aceitou – e o responsável era Getúlio – dando um aumento ao salário mínimo. Diante de um manifesto dos coronéis, ele não teve qualquer dúvida: levou a sua renúncia a Getúlio Vargas e saiu do ministério.  

Vice-Presidente, estando na China em missão oficial, diante do golpe de Moura Andrade, que reconheço, juntamente com o golpe que as Forças Armadas estavam dando, teve que aceitar o parlamentarismo. Ele estava em Montevidéu, chegou por lá, quando Tancredo Neves e outras pessoas foram àquela cidade dizer que o Congresso votaria o parlamentarismo e que o meio-termo entre a legalidade que o Brizola estava assumindo e uma luta civil seria ele aceitar o parlamentarismo. E ele aceitou o parlamentarismo, e este foi instalado. E Tancredo Neves foi o Primeiro-Ministro.  

Olha, Sr. Presidente, olha meu amigo, Dr. Brizola, meu amigo JK, meu não-amigo, Dr. Lacerda, essa gente toda se uniu para derrubar o parlamentarismo. JK empolgado com "JK 65"; Lacerda empolgado com "Lacerda 65", e o Brizola empolgado, como sempre, por qualquer causa de luta popular.  

E a maneira como iniciaram a luta contra o parlamentarismo foi cruel. Meu amigo Bernardo, um regime parlamentarista em que os ministros são parlamentares; o Primeiro-Ministro, Deputado Tancredo Neves, que queria se candidatar a Deputado para continuar seu mandato; JK, o PSD e a UDN de Lacerda se uniram e votaram a toque de caixa uma emenda que dispunha que Ministro, para se candidatar a Deputado, tinha de renunciar ao ministério. Obrigaram a cair o Governo do Dr. Tancredo para que ele pudesse ser candidato a Deputado. Aí começou a acabar o parlamentarismo. Num golpe cruel, PSD, UDN, PTB também - diga-se de passagem, Dr. Brizola - não queriam o parlamentarismo.  

Diz bem meu amigo Senador Bernardo Cabral, logo depois, para mostrar a boa intenção e a boa vontade, Jango indica para o Congresso Nacional o nome do estadista, do homem extraordinário que se chamava Santiago Dantas, que deu um show - eu assisti -, deu um show e foi rejeitado. Diziam alguns até: "Nós obrigamos, fizemos tudo para tirar o Tancredo e vem um que pode ser melhor do que Tancredo porque, além de político, é um estadista e economista que entende tudo do recado e foi rejeitado". Rejeitaram a figura de Santiago Dantas.  

V. Ex a tem razão, Senador Bernardo Cabral. Aprovaram Brochado da Rocha, homem extraordinário, mas um político provincial, amigo íntimo do Brizola e, por isso, achavam mesmo que estava compromissado. Cá entre nós, com todo o carinho que tenho pela figura extraordinária de Brochado da Rocha, no fundo, ele estava compromissado com o término do parlamentarismo. No fundo, meu amigo Francisco Brochado da Rocha estava, juntamente com o Dr. Brizola, compromissado em terminar com o parlamentarismo. Mas Jango aceitou o parlamentarismo. Democraticamente fez o plebiscito e assumiu o presidencialismo. E, mais uma vez, voltou como cabeça de seu Governo o Santiago Dantas, que lançou o Plano Plurianual, que o Dr. Fernando Henrique está lançando com o nome fantasia "Brasil em Ação". A primeira vez que se lançou, neste País, um Plano Plurianual dentro de uma visão maior que a do final deste ano, foram João Goulart e Santiago Dantas. Santiago Dantas, Celso Furtado, foi essa equipe famosa que lançou a proposta: o Plano Plurianual!  

Ficaram com medo de que poderia dar certo, e isso redundou no golpe contra o Dr. João Goulart, que foi chamado de corrupto e tudo o mais que se podia imaginar. O interessante é que, deixando a Presidência da República e indo para o exterior, cassado, foi lá no exterior que o Dr. João Goulart ficou milionário. Isso é muito interessante de ser analisado. As terras que ele comprou, o progresso e o desenvolvimento que teve ocorreram no Uruguai, na sua atividade pastoril em que é competente. E aí ele passou a crescer. Pela grandeza inclusive, Sr. Presidente, de se unir a Juscelino Kubitschek e Carlos Lacerda, lançando a frente de entendimento, buscando a democracia. A Frente Ampla – socorre-me mais uma vez o Senador Bernardo Cabral –, com a qual ele, Jango, menos ganharia. Juscelino e Lacerda queriam ser Presidente, porém João Goulart já não tinha mais esse interesse, só tinha o interesse de ver restabelecida a democracia. Até o Lacerda foi cassado porque assinou esse documento.  

Esse é João Goulart. Tenho orgulho de dizer que esse é um brasileiro distinto. Não está preparado para ser Presidente da República? Provavelmente não, assim como Sarney e Itamar não estavam no esquema da Presidência. Uma coisa é ser Presidente, outra coisa é ser Vice-Presidente. Quem é candidato a Presidente faz um esquema, faz um programa, adota uma doutrina e se reúne com uma equipe. Aconteceu com Tancredo; foi o que aconteceu com Jânio Quadros, que depois renunciou; é o que aconteceu com o Collor, quando se candidatou. Mas o Vice assume de maneira abrupta: Jânio renunciou de uma hora para outra; Collor foi derrubado de uma hora para outra; e Tancredo morreu inesperadamente. Nessas condições, assume o Vice. Sarney, Itamar e João Goulart não buscaram a Presidência, o destino lhes deu mas, mesmo assim, há de se reconhecer que os três agiram com dignidade, com honradez e com competência.  

Dizem que a História, Sr. Presidente, só escreve a história dos vencedores, mas nem sempre é assim. Há momentos de vitória e há momentos de derrota. Ninguém no Brasil esteve tão alto e depois tão embaixo como Juscelino Kubitschek. Foi ele o nome de maior badalação da História deste País. Começou a sofrer quando Jânio Quadros, para subir, brincou com a sua honra, usando a vassoura nessa brincadeira. Quando os homens da Revolução precisaram, nesta Casa, do voto de Juscelino para eleger Castello Branco, poucos dias depois o cassaram. Mas, hoje, está aí a imprensa apontando-o como grande estadista do século.  

O meu voto não seria este. Eu votaria em Getúlio Vargas e a seguir Juscelino Kubitschek. Mas, de qualquer maneira, é uma análise interessante.  

O Sr. Antonio Carlos Magalhães (PFL - BA. Fora do microfone) - Afinal, V. Ex a é gaúcho!  

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - É verdade! É verdade! (Risos)  

Juscelino Kubitschek, Getúlio Vargas, Tancredo Neves, Ulysses Guimarães, os quatro grandes nomes que a imprensa aponta como homens deste século. Tancredo não assumiu porque morreu antes de assumir. Dr. Ulysses não assumiu e, ao se tornar candidato, foi vexatório. Getúlio morreu com um tiro no coração e Juscelino morreu na humilhação. Quem vai ao mausoléu de Juscelino e assiste àquela fita, percebe a humilhação sofrida por ele ao tentar descer em Brasília porque o tempo estava muito ruim. O piloto do avião dizia: "Por amor de Deus, eu tenho que descer". E a torre dizia: "Não pode". Está pode. Está escrito que, no Aeroporto de Brasília, Juscelino não desce." Não desceu. Deus o salvou, e o avião desceu em outro lugar, não sei onde. A história muda, Sr. Presidente, e termina dizendo a verdade; hoje, Juscelino é o nome do aeroporto.

 

Trago o meu abraço fraterno e o meu carinho a João Goulart. Não posso me esquecer de que, sete dias depois do seu enterro, participamos de uma missa na Catedral Metropolitana. As tropas militares chegaram. Para fugir dos militares, o povo fugiu para dentro da igreja, e as forças militares entraram também! Houve pancadaria dentro da igreja! Cristo lá e a pancadaria do lado de cá!  

O tempo passou, mas eu não poderia deixar de trazer hoje o meu abraço muito fraterno à memória de João Goulart, do qual se pode discordar, mas que era um homem de bem, sério e bem-intencionado.  

Muito obrigado, Sr. Presidente.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/12/1999 - Página 33875