Discurso durante a 19ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

NECESSIDADE DA ADOÇÃO DE MEDIDAS PARA COMBATER O DESPERDICIO DE ALIMENTOS NO BRASIL.

Autor
Carlos Patrocínio (PFL - Partido da Frente Liberal/TO)
Nome completo: Carlos do Patrocinio Silveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA.:
  • NECESSIDADE DA ADOÇÃO DE MEDIDAS PARA COMBATER O DESPERDICIO DE ALIMENTOS NO BRASIL.
Publicação
Publicação no DSF de 23/03/2000 - Página 5228
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • OMISSÃO, GOVERNO, AGRICULTOR, COMBATE, PERDA, ALIMENTOS, BRASIL, FALTA, ORGANIZAÇÃO, PLANEJAMENTO, EDUCAÇÃO, CIDADANIA, PREJUIZO, PAIS.
  • DEFESA, CAMPANHA, CONSCIENTIZAÇÃO, POPULAÇÃO, PREVENÇÃO, PERDA, PRODUÇÃO AGRICOLA, ESPECIFICAÇÃO, REDUÇÃO, CUSTO, AUMENTO, PRODUTIVIDADE, UTILIZAÇÃO, TECNOLOGIA, MELHORIA, CULTIVO, COLHEITA, ARMAZENAGEM, TRANSPORTE, COMERCIALIZAÇÃO.
  • DEFESA, INCENTIVO, DOAÇÃO, ALIMENTOS, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO, BENEFICIO, COMBATE, FOME, PERDA.

O SR. CARLOS PATROCÍNIO (PFL - TO) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a prática do desperdício ocupa lugar de destaque no passivo contábil dos países do Terceiro Mundo. Lamentavelmente, os Governos desses países se comportam de maneira totalmente passiva diante de tão grave problema e, na maioria das vezes, não tomam qualquer providência contra esse comportamento perdulário.  

Em nosso País, por exemplo, onde há, na verdade, abundância de alimentos, de mão-de-obra, de espaço, e mesmo de tecnologia, a irracionalidade na exploração, utilização, estoque e consumo dos recursos agrícolas é de causar espanto. Dessa maneira, a cada ano, toneladas de alimentos, dinheiro público e privado, empregos, e outras oportunidades, que são geradas pela produção rural, vão literalmente para a lata do lixo.  

Ao que nos parece, nos países menos desenvolvidos e no Brasil em particular, a prática do desperdício está verdadeiramente incorporada à cultura. Seus maiores sintomas encontram-se basicamente na desorganização institucional; na falta de planejamento estratégico; na ineficiência; na desestruturação das bases econômicas; na baixa produtividade de muitas culturas; na falta de respeito social; na ausência de cidadania; na falta de educação; e na baixa qualificação da mão-de-obra.  

Contabilizando os prejuízos causados pelo desperdício de alimentos nos últimos dez anos, vamos constatar que a nossa economia acumulou perdas irreparáveis nesse período. Foram dezenas de bilhões de dólares perdidos e dezenas de milhões de toneladas de alimentos produzidas e jogadas fora.  

Estima-se que todo o sistema agrícola brasileiro, constituído pela agricultura, biotecnologia e afins, desperdiça cerca de 25% a 30% do valor produzido. Se juntarmos o setor primário com o setor de infra-estrutura, que engloba energia, transportes e telecomunicações, o desperdício anual dos dois setores está próximo dos 6% do Produto Interno Bruto (PIB).  

O Governo Federal e os agentes econômicos privados precisam urgentemente definir uma política mais objetiva para diminuir o desperdício em nível nacional. Para isso, uma ampla campanha de conscientização deve ser promovida e acompanhada de outras medidas fundamentais de caráter mais técnico.  

A questão da racionalidade, ou seja, da utilização correta dos recursos naturais e financeiros, é matéria prioritária para se gerar novas fontes de riquezas, para sanar boa parte do déficit existente, para melhorar a produtividade e para aumentar a renda dos produtores. Em outras palavras, combater o desperdício, significa, portanto, evitar gastos desnecessários, criar oportunidades realmente rentáveis de investimentos em áreas importantes e perseguir ganhos cada vez maiores de produtividade, que é na verdade o objetivo final de qualquer atividade produtiva.  

Em terceiro lugar, é da mais alta importância a implementação de ações eficientes em direção do desenvolvimento científico e tecnológico. Os investimentos em pesquisas terão repercussões diretas no combate às perdas, na qualificação da mão-de-obra, no manejo adequado das matérias-primas, na utilização das máquinas, e no emprego controlado dos produtos químicos exigidos pela produção agrícola.  

Segundo alguns especialistas na área de desperdício econômico, se o Brasil empreendesse realmente uma política agressiva de combate às perdas de sua produção global e de aumento da produtividade, em apenas quatro anos, os ganhos diretos e indiretos de todo o sistema econômico se situariam em torno de 200 bilhões de dólares, ou seja, quase um quarto do PIB.  

Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, a agricultura brasileira perde nos campos, nos armazéns, nos silos, nos caminhões de transporte, nas estradas degradadas, nos mercados atacadistas e de varejo, na manipulação inadequada dos produtos, em sua embalagem, e na especulação criminosa. Ao mesmo tempo em que esse monumental prejuízo se acumula e contribui para manter quase 40 milhões de brasileiros abaixo da linha de pobreza, as medidas para a prevenção das perdas são mínimas e muitas vezes inexistentes.  

Estudos técnicos têm demonstrado que mais de 30% das perdas mundiais de produtos agrícolas nas fases de manuseio, transporte, armazenagem e comercialização, especialmente nos países subdesenvolvidos ou em vias de desenvolvimento como o nosso, são devidas, em sua quase totalidade, ao descaso das autoridades que não enxergam a questão com a prioridade que ela realmente exige.  

No Brasil, como já dissemos anteriormente, o desperdício de alimentos é muito pior do que uma praga. Entre a colheita e a comercialização de grãos, a perda fica próxima dos 30%. Infelizmente, em nosso País, onde existe ironicamente uma "campanha de combate à fome", a cada ano, milhões de toneladas de pimentões, abóboras, melões, mamões, pepinos, tomates, milho, arroz, feijão, mandioca, inhame, enfim, uma quantidade colossal de frutas, legumes e cereais, simplesmente apodrecem impunemente. O que é mais chocante ainda é que, da parte dos produtores, não existe qualquer interesse em armazenar, processar e distribuir os alimentos. Para eles, pouco importa se vão apodrecer. Muitos até queimam os alimentos, numa destruição criminosa, que a impunidade tão comum em nosso País incentiva.  

Nos países do chamado Primeiro Mundo, guardadas as devidas diferenças culturais e as várias conotações diferentes das encontradas no Terceiro Mundo, o desperdício também está presente. Por incrível que possa parecer, nos Estados Unidos, a mais rica potência econômica do planeta, existe fome e existe muito desperdício de alimentos.  

Segundo depoimento da Sra. Heather Dennis Parsons, representante da Foodchain, associação que congrega os programas de combate ao desperdício e à fome nos Estados Unidos, com sede em Atlanta, no simpósio "O Desafio Social da Fome", realizado pelo Serviço Social do Comércio de São Paulo (SESC/SP), em junho de 1995, 45 milhões de americanos sofriam de fome diariamente e 5,75 bilhões de quilos de alimentos eram jogados fora todos os anos. Vale ressaltar que, nesse universo de esfomeados, existiam doze milhões de crianças subnutridas. Em quase 1 milhão de lares, não havia, muitas vezes, o que comer durante dias. Quase 30 milhões de americanos dependiam diretamente de refeições públicas ou de doações privadas.  

Por sua vez, na maioria dos países europeus, e mesmo nos mais desenvolvidos, a fome ronda milhões de lares carentes. No leste europeu, por exemplo, a luta por um prato de comida não difere em nada da batalha que trava boa parte da população da América Latina e de grande parte da Ásia. Mesmo na Alemanha, nos bairros mais pobres, crianças chegam a desmaiar em salas de aula porque seus pais não dispõem de recursos para pagar-lhes o café da manhã.  

Em verdade, por motivos diversos, a crise alimentar está presente em todos os cantos do planeta. Na opinião dos especialistas em agricultura, a solução para a fome está no aumento constante da produção dos alimentos e no acesso de todos às disponibilidades existentes.  

Infelizmente, o Brasil vai entrar no século XXI jogando toneladas de comidas na lata do lixo. Só nas feiras livres de São Paulo, cerca de 1.100 toneladas de lixo são produzidas diariamente. Desse total, segundo estimativas oficiais, 80% são alimentos que poderiam ser reaproveitados. O desperdício brasileiro atinge toda a cadeira alimentar e é suficiente para distribuir cestas básicas mensais, no valor de um salário mínimo, para mais de 8 milhões de famílias.  

Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, a doação de alimentos precisa ser mais incentivada em nosso País. Para isso, torna-se necessário rever a legislação existente e instituir um tratamento mais especial para a doação de alimentos industrializados ou preparados. Com leis mais bem definidas, restaurantes, bares, supermercados e outros estabelecimentos que trabalham com comidas industrializadas ou preparadas, deixariam de jogar fora as suas sobras e estas serviriam para amenizar a fome de quase 40 milhões de brasileiros que vivem abaixo da linha de pobreza.  

Combater o desperdício na cadeia alimentar, é contribuir para promover uma mudança cultural de todos e de todas as partes envolvidas na produção de alimentos.  

Era o que tinha a dizer.  

Muito obrigado.  

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/03/2000 - Página 5228