Discurso durante a 28ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

REFLEXÕES SOBRE A REALIDADE INDIGENA.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INDIGENISTA.:
  • REFLEXÕES SOBRE A REALIDADE INDIGENA.
Publicação
Publicação no DSF de 05/04/2000 - Página 6407
Assunto
Outros > POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • APRESENTAÇÃO, REQUERIMENTO, SOLICITAÇÃO, DESTINAÇÃO, HORA, EXPEDIENTE, SENADO, COMEMORAÇÃO, DIA NACIONAL, INDIO.
  • CONCLAMAÇÃO, SENADOR, REALIZAÇÃO, ANALISE, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, COMUNIDADE INDIGENA, PAIS.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB – CE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, recolhi, aqui no plenário, algumas assinaturas suficientes para formalizar um requerimento para que, na sessão do dia 19 de abril, dedicássemos a Hora do Expediente à comemoração do Dia do Índio. Ainda que não seja muito favorável a esse tipo de comemorações, porque penso que corremos o risco de banalizá-las; mas, como estão em curso uma série de festividades pelos 500 anos de descobrimento do Brasil, pensei que seria perfeitamente razoável e justo que falássemos ou refletíssemos sobre a questão indígena.  

Aliás, como me dizia há pouco a Senadora Heloisa Helena, ao fazer a gentileza de subscrever este requerimento, podemos indagar: comemorar o quê? Em resposta, Sr. Presidente, poderíamos dizer que o objetivo seria e é exatamente o de refletir sobre a tragédia indígena ao longo desses 500 anos.  

Todavia, antes disso, fui advertido pela Secretaria Geral da Mesa, na pessoa do seu diligente Secretário, Dr. Raimundo Carreiro, de que não há mais como fazermos realizar essa sessão de homenagens no mês de abril, porque já estão agendadas outras três comemorações, o número máximo que o Regimento prevê.  

Então, pensei: os índios, mais uma vez, foram cassados. Não há mais Ordenações Filipinas nem Afonsinas, nem Manuelinas; não existe mais a Coroa Portuguesa, mas o Regimento, na sua isenção, veda mais de três sessões de comemoração, mesmo que se restrinjam à Hora do Expediente.  

Sr. Presidente, aproveito a oportunidade deste pronunciamento, agradecendo desde já aos signatários do requerimento, que temos de aproveitar essas comemorações dos 500 anos para refletirmos sobre essas questões. Pretendo agora me valer do 13 de maio, falando sobre os negros, outra etnia que sofreu durante todo esse período. Assim, peço que o Sr. Raimundo Carreiro reserve o dia 13 de maio para comemorarmos, na Hora do Expediente, a Abolição da Escravatura, Abolição talvez entre aspas, pois, a nosso ver, foi muito mais uma mudança do status, passando os negros de propriedades a seres humanos, do que propriamente a abertura de um novo caminho de cidadania para os negros.  

Foram justamente essas etnias que pagaram a conta desses 500 anos. Os historiadores mais sérios estimam que havia cerca de cinco milhões de indígenas quando os portugueses chegaram aqui; hoje, existem aproximadamente duzentos mil. Vale ressaltar que, conforme recentemente pude ler em informativos da Funai, a taxa média de natalidade das populações indígenas está acima da média nacional. Isto talvez nos indique a possibilidade de que esse contingente venha a crescer nos próximos anos.  

De outra parte, não concordo com aqueles que têm uma visão fechada do processo histórico de evolução da sociedade brasileira ao longo desses 500 anos. Temos que analisar tudo isso.  

Há pouco tempo comemorávamos o centenário de Gilberto Freyre. É preciso que analisemos tudo isso no contexto em que esses fatos ocorreram, com essa chegada dos portugueses ao Brasil, com essa união da Coroa com a Cruz, naquela preocupação de dilatar o Império e a fé, em que se excederam. Tiveram, vamos dizer assim, um comportamento que hoje temos a isenção, a tranqüilidade, para indicar como foi incorreto do ponto de vista político e étnico.  

Sr. Presidente, essa reflexão, que devemos aproveitar para fazer ao longo deste ano sobretudo, não deve ser vista como algo distante, frio e asséptico. E conhecendo todos esse fatos, como eles se deram ao longo desses anos, quem sabe podemos aproveitar para corrigir os rumos e fazermos também uma espécie de mea culpa do que tem sido feito contra essas etnias durante todo esse tempo.  

Não é um problema simples ou fácil de se resolver. Por mais que se ofereçam áreas amplas, reservas para que os índios possam dispor de espaço para se comportarem de acordo com a sua índole essencialmente nômade, que tem de lidar com grandes espaços e áreas, por mais que façamos isso, nunca se pode evitar esse contato com as outras etnias.  

Conseqüentemente, a partir daí, há toda uma possibilidade de mudança de hábitos, de atitudes, de fragilização do próprio indígena diante de outras culturas, o que termina, inclusive, por acarretar males, às vezes doenças, que o tornam extremamente vulnerável.  

Sr. Presidente, já que não poderemos fazer essa comemoração, façamos, pelo menos, um momento de reflexão sobre os indígenas brasileiros.  

Uma série de iniciativas estão sendo desenvolvidas a par do que podíamos chamar de comemorações oficiais, que visam justamente valorizar os indígenas e os negros brasileiros, os excluídos de um maneira geral, aqueles que estão à margem da civilização, do mercado, das oportunidades de trabalho, fora das escolas, doentes, enfermos, muitas vezes sem perspectivas, sem esperança, e que, infelizmente, constituem um contigente enorme da sociedade brasileira. Temos de insistir nisso para que, dessa comemoração, quem sabe, possamos extrair algumas atitudes que reflitam o respeito da sociedade brasileira para com esses contigentes da nossa população.  

Sr. Presidente, era o que eu tinha a registrar neste momento, para que não pareça que o Senado Federal é indiferente às populações indígenas, autóctones, àqueles que aqui estão há milhões de anos.  

Muito obrigado.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/04/2000 - Página 6407