Discurso durante a 37ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

PREOCUPAÇÃO COM AS INCORREÇÕES DETECTADAS NO DICIONARIO DE ESPECIALIDADES FARMACEUTICA - DEF. APELO AO MINISTRO DA SAUDE PARA CELERIDADE NA PUBLICAÇÃO DA RELAÇÃO NACIONAL DE MEDICAMENTOS ESSENCIAIS.

Autor
Carlos Patrocínio (PFL - Partido da Frente Liberal/TO)
Nome completo: Carlos do Patrocinio Silveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • PREOCUPAÇÃO COM AS INCORREÇÕES DETECTADAS NO DICIONARIO DE ESPECIALIDADES FARMACEUTICA - DEF. APELO AO MINISTRO DA SAUDE PARA CELERIDADE NA PUBLICAÇÃO DA RELAÇÃO NACIONAL DE MEDICAMENTOS ESSENCIAIS.
Publicação
Publicação no DSF de 18/04/2000 - Página 7534
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • COMENTARIO, INEXATIDÃO, PUBLICAÇÃO, DESCRIÇÃO, MEDICAMENTOS, OMISSÃO, INFORMAÇÃO, EFEITO, SUBSTANCIA MEDICINAL, POSSIBILIDADE, RISCOS, DOENTE, DENUNCIA, MANIPULAÇÃO, LABORATORIO FARMACEUTICO.
  • APREENSÃO, OBSTACULO, MEDICO, OBTENÇÃO, INFORMAÇÃO, MEDICAMENTOS, BRASIL.
  • SOLICITAÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA SAUDE (MS), AGILIZAÇÃO, PUBLICAÇÃO OFICIAL, RELAÇÃO, MEDICAMENTOS.

O SR. CARLOS PATROCÍNIO (PFL/TO) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nesta virada de século, o avanço científico e tecnológico ocorre com tal velocidade que se torna imperativa a necessidade permanente de ordenar, racionalizar e difundir informações aos profissionais das mais diferentes áreas do conhecimento humano.  

No caso específico dos profissionais da área de saúde, a necessidade de atualização sobre medicamentos e seu uso reveste-se de importância ainda maior, pois a prescrição de uma determinada droga pode provocar no paciente uma reação adversa medicamentosa (RAM), comumente chamada efeito colateral, cujas conseqüências podem ser desastrosas, e até letais.  

Com a finalidade de informar esses profissionais, cuja atividade consiste em lidar cotidianamente com vidas humanas, existem, nos mais diferentes países, compêndios e dicionários de especialidades farmacêuticas, que trazem, entre outras, a descrição dos fármacos, sua composição química, forma de atuação no organismo e possíveis reações adversas.  

Estatísticas produzidas no Uppsala Monitoring Center , na Suécia, o órgão que concentra informações de 52 países sobre RAMs para a Organização Mundial da Saúde, mostram que 21% das vítimas de efeitos colaterais de medicamentos precisam ser internadas, sendo os idosos e as crianças os pacientes mais vulneráveis ao problema.  

Senhoras e Senhores Senadores, nos últimos meses, o jornal Folha de S. Paulo vem publicando várias matérias denunciando falhas e omissões de informação detectadas no DEF – Dicionário de Especialidades Farmacêuticas, considerado uma espécie de "bíblia" dos medicamentos em nosso País. São essas denúncias que me levam a ocupar, neste momento, a tribuna desta Casa.  

Esse dicionário, com uma tiragem de 242 mil exemplares, é publicado por uma editora privada, financiado pela Associação Brasileira da Indústria Farmacêutica – Abifarma, e gratuitamente distribuído a médicos e farmacêuticos de todo o Brasil.  

Segundo reportagem publicada pela Folha, em 20 de fevereiro, intitulada "Bíblia" usada por médicos do Brasil omite efeitos colaterais dos remédios , "as informações contidas no DEF são publicadas mediante pagamento do fabricante do medicamento".  

Isso significa que, em nosso País, se o laboratório farmacêutico não pagar, a "bíblia" apresentará apenas uma descrição "resumida" do medicamento.  

Senhor Presidente, em um país gigantesco como o Brasil, em que um grande número de profissionais de saúde trabalha longe dos grandes centros, considero extremamente preocupantes as conseqüências do fornecimento "sucinto" de informações sobre medicamentos. Os médicos que fizerem prescrições baseando-se nas informações contidas no DEF desconhecerão os possíveis efeitos colaterais de determinados remédios, assim como o comportamento dos mesmos quanto associados a outras substâncias.  

A preocupação torna-se ainda mais pertinente quando se conhece o resultado de uma pesquisa realizada pela Universidade Federal de Pernambuco: 52% dos médicos entrevistados consultavam o dicionário e consideravam o DEF um "guia terapêutico".  

Estudo obtido pela Folha, que compara o dicionário brasileiro com publicações semelhantes dos Estados Unidos, por exemplo, revela que o DEF é muito mais incompleto. A comparação detecta que só um terço dos verbetes do dicionário brasileiro contém informações sobre posologia e reações quando há associação com outros medicamentos.  

Considero, porém, mais grave a omissão do DEF quanto aos efeitos colaterais de 25 dos 44 remédios mais vendidos no País. O guia não informa, por exemplo que os remédios feitos a partir da substância diclofenaco potássico, mesmo os mais vendidos, podem causar anafilaxia – reação alérgica aguda que pode levar à morte. Omite também que os anti-hipertensivos que têm como princípio ativo o captopril podem acarretar taquicardia, insuficiência renal e até impotência.  

Senhoras e Senhores Senadores, parece evidente que os médicos brasileiros têm dificuldades de obter informações isentas sobre medicamentos. Sabemos que essas informações são absolutamente imprescindíveis, pois todo produto farmacêutico envolve risco, havendo necessidade de se conhecer se os benefícios de sua utilização superam esse risco.  

O fato de o Dicionário de Especialidades Farmacêuticas, aqui publicado com financiamento da Abifarma, omitir efeitos colaterais graves dos medicamentos merece crítica veemente, pois pode facilitar a venda de determinados produtos, atendendo interesses de seus fabricantes e não dos consumidores brasileiros.  

Segundo o médico João Augusto Cabral de Barros, da Universidade Federal de Pernambuco e da Sociedade Brasileira de Vigilância de Medicamentos – SOBRAVIME, e também membro do Comitê Consultivo da Ação Latino-Americana para a Saúde Internacional, faltam nos medicamentos vendidos no Brasil informações sobre reações adversas (56,8%), sobre dosagem ( 38,6%), sobre interações (40,9%), indicações (13,6%), contra-indicações (29,5%), overdose (38,6%), mecanismos de ação (54,5%) e efeitos farmacológicos (40,9%).  

Infelizmente no País não há como se calcular com precisão o custo das internações motivadas por efeitos colaterais dos remédios, pois não existe um sistema de informação detalhando o motivo pelo qual os pacientes foram internados e a faixa etária dos hospitalizados. Além disso, as RAMs não são catalogadas pelo Ministério da Saúde como causa específica de internação, como ocorre em outros países.  

Nos Estados Unidos, por exemplo, o FDA estima que as internações provocadas pelas RAMs têm um custo de 3 bilhões de dólares e estudos realizados na Alemanha revelam que essas reações adversas aumentam o tempo de permanência no hospital em 8,7 dias, em média.  

Senhoras e Senhores Senadores, felizmente, muitos desses efeitos colaterais são, de certa forma, previstos por médicos e farmacêuticos. Isso não elimina, porém, a necessidade de existir em nosso País uma publicação oficial para servir de guia aos nossos profissionais de saúde. Como médico, tenho consciência, de que é absolutamente necessário e urgente o Ministério da Saúde tomar providências para suprir essa lacuna.  

O próprio diretor da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, Gonzalo Vecina Neto, reconhece que no Brasil não há guias médicos com a mesma qualidade dos existentes em outros países. Ele admite ser uma "falha" o fato de o Governo não ter até hoje uma publicação dessa natureza, possibilitando assim que o DEF se tenha transformado em "fonte universal de informações dos médicos" brasileiros.  

Para o Dr. Vecina Neto, o fato de os laboratórios omitirem informações ao DEF (ainda que não sejam obrigados por lei a declará-las) é "lesivo" à categoria. Segundo ele, "o médico é mal formado em farmacologia nas universidades e acaba sendo formado nesse assunto apenas pelos visitadores dos laboratórios".  

Senhoras e Senhores Senadores, há outras denúncias que aqui não mencionei, pois tornariam muito extenso este pronunciamento. Felizmente, as autoridades estão cientes da gravidade dos fatos e providências já estão sendo tomadas, devendo dar ensejo a uma lei para regulamentar o setor.  

Segundo a Vigilância Sanitária, encontra-se em fase de elaboração a publicação de um formulário terapêutico que deverá apresentar a descrição de todos os medicamentos da Relação Nacional de Medicamentos Essenciais – RENAME, lista que contém todos os produtos considerados importantes do ponto de vista de saúde pública.  

Ao concluir, quero fazer um apelo ao Ministro da Saúde, José Serra, para que apresse a publicação desse formulário terapêutico para que os profissionais de saúde de nosso País possam contar com uma obra com informações isentas e seguras sobre os medicamentos existentes no mercado farmacêutico brasileiro.  

Era o que tinha a dizer, Senhor Presidente.  

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/04/2000 - Página 7534