Discurso durante a 74ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE O IMPACTO DA REEDIÇÃO DA MEDIDA PROVISORIA QUE MODIFICA DISPOSITIVOS DO CODIGO FLORESTAL, PROPOSTA PELO CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE - CONAMA, E REJEITADA PELA COMISSÃO MISTA DO CONGRESSO NACIONAL.

Autor
Ernandes Amorim (PPB - Partido Progressista Brasileiro/RO)
Nome completo: Ernandes Santos Amorim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE O IMPACTO DA REEDIÇÃO DA MEDIDA PROVISORIA QUE MODIFICA DISPOSITIVOS DO CODIGO FLORESTAL, PROPOSTA PELO CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE - CONAMA, E REJEITADA PELA COMISSÃO MISTA DO CONGRESSO NACIONAL.
Publicação
Publicação no DSF de 08/06/2000 - Página 12202
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • CRITICA, INICIATIVA, GOVERNO FEDERAL, REEDIÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), ALTERAÇÃO, CODIGO FLORESTAL, FAVORECIMENTO, PAIS ESTRANGEIRO, ESPECIFICAÇÃO, COMPENSAÇÃO, POLUIÇÃO, PAIS INDUSTRIALIZADO, PRIMEIRO MUNDO.
  • COMENTARIO, APREENSÃO, AUSENCIA, VALIDADE, TRABALHO, ZONEAMENTO AGROECOLOGICO, ESTADO DE RONDONIA (RO), MOTIVO, VIGENCIA, PROPOSTA, CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE (CONAMA), MEDIDA PROVISORIA (MPV), ALTERAÇÃO, CODIGO FLORESTAL.

O SR. ERNANDES AMORIM (PPB – RO) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Presidente Fernando Henrique acolheu em reedição da Medida Provisória que modifica dispositivos do Código Florestal, as propostas apresentadas pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente – Conama -, que a Comissão Mista do Congresso que aprecia a matéria havia rejeitado.  

Logo em seguida Sua Excelência viajou a Europa para encontro com líderes mundiais, e nos jornais de hoje é anunciado que o Presidente da França promete que o G7, ou G8, vai continuar a financiar programas de proteção das florestas tropicais brasileiras. Inclusive, nesse sentido, o Ibama está sendo reestruturado com a diminuição de suas atividades no restante do Brasil e o fortalecimento de sua atuação na Amazônia.  

Mas nesse contexto, a verdadeira discussão é a utilização do território nacional enquanto armazém e sumidouro de carbono para retardar a redução da atividade econômica no primeiro mundo, inevitável com a necessária eliminação de fontes de emissão de gases do efeito estufa. E, representando um Estado da Amazônia, não posso aceitar que as políticas púbicas adotadas no Brasil no interesse desses países, não considere também os interesses do Estado que represento, peculiar por sua formação, com migrantes do Sul e Sudeste no sudoeste da Amazônia brasileira.  

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há uma história, e ela deve ser considerada.  

Em 1965 o Código Florestal (lei n.º 4.771/65) proibiu a exploração das florestas primitivas da bacia amazônica, até o Poder Executivo estabelecer planos técnicos de condução e manejo a serem observados em sua utilização (art. 15). E, enquanto não fosse editado o decreto dispondo sobre esses planos, ficou permitido o corte raso – desmatamento -, na Região Norte, e na parte norte da Região Centro-Oeste, desde que fosse mantido com cobertura arbórea pelo menos 50% da área de cada propriedade (art. 44).  

Então, sob essa lei, centenas de milhares de migrantes de todo o Brasil converteram seus bens e suas vidas na expansão da fronteira agropecuária ao longo da Belém – Brasília, e da Cuiabá - Porto Velho, construídas por Juscelino Kubistchek; e também da Transamazônica, aberta no Governo Médici.  

O movimento migratório, concentrado na transição do Planalto Central com a planície do rio Amazonas, impactou de forma diferente as diferentes regiões da Amazônia.  

No Acre, de 1960 até 1991, a população cresceu de 158 mil para 417 mil habitantes. Um índice semelhante ao do Brasil, cuja população dobrou, de 70 milhões para 146 milhões de habitantes naquele período.  

Já no Amazonas, a população cresceu de 700 mil para 2 milhões e 100 mil habitantes, 300%, com concentração da migração em Manaus, onde foram instaladas indústrias e serviços com a Zona Franca. E no Pará o crescimento foi 330%, de 1 milhão e 500 mil habitantes, para 5 milhões.  

Mas o recorde ficou mesmo com Rondônia, onde a população foi elevada de 70 mil habitantes para 1 milhão e 130 mil, de 1960 até 1991. Ou seja, cresceu 16 vezes. Enquanto no Amapá esse crescimento foi de 6 vezes, e em Roraima de 8 vezes.  

A Amazônia é enorme, e é diversa. Inclusive, no Plano Plurianual de Investimentos, é planejada em diferentes eixos de integração e desenvolvimento. O Madeira Amazonas, e o Arco Norte, pouco impactados pela expansão agropecuária, e o Araguaia Tocantins, e o Oeste, onde aquela migração aconteceu.  

Rondônia por exemplo, no Eixo de Desenvolvimento Oeste, começa no Planalto Central, com 800 metros de altitude, e termina a 100 metros, na planície amazônica. Em 1970 tinha 7 mil estabelecimentos rurais, ocupando 20 mil pessoas, com 52 mil hectares destinados a agricultura, 120 mil hectares destinados a pastagens, e um rebanho bovino de 23 mil cabeças. Em 1996, eram 76 mil estabelecimentos rurais, ocupando 350 mil pessoas, com 500 mil hectares destinados a agricultura, e 2 milhões e 900 mil hectares ocupados por pastagens. Aí, o rebanho bovino era de 4 milhões de cabeças.  

No Pará, em 70 existiam 140 mil propriedades, com 550 mil pessoas ocupadas em 500 mil hectares de agricultura, e 2 milhões e 500 mil hectares de pastagens. O rebanho bovino contava 1 milhão de cabeças. E, em 1996, eram 206 mil estabelecimentos rurais, com 900 mil pessoas ocupadas em 1 milhão e 300 mil hectares destinados a agricultura, e 7 milhões e 500 mil hectares de pastagens. E o rebanho, somava 6 milhões de cabeças.  

O valor da produção animal e vegetal do Pará, naquele ano, foi de R$ 1 bilhão; e a de Rondônia, R$ 334 milhões, praticamente igual a do Amazonas, embora com metade de sua população. Devendo ser salientado que a principal atividade econômica do Amazonas é a indústria, em Manaus, e não a produção animal e vegetal. E o Acre, com pouco mais que 1/3 da população de Rondônia, registrou uma produção animal e vegetal de R$ 107 milhões.  

Isso, embora o corte no incentivo da agricultura e da pecuária, e nos investimentos de infra-estrutura, decidido pelos países do G7 para manter o carbono depositado nas florestas, depois que a ciência relacionou a elevação da concentração de carbono na atmosfera com o aquecimento global, e conseqüentes alterações climáticas que ameaçam inundar as grandes cidades litorâneas do hemisfério norte, e transformar em deserto os campos agrícolas da Europa e dos Estados Unidos.  

Aí, entre reduzir a própria emissão de carbono, deixando de queimar o petróleo que produz a energia utilizada no desenvolvimento econômico nesses países, e conter a emissão de carbono que haveria no desmatamento em outros países, promovendo também o seqüestro do carbono existente na atmosfera mediante reflorestamento nos territórios desses países, é claro que optaram pela preservação e recuperação das florestas. Financiando campanhas, a imprensa, Organizações Não-Governamentais, cursos, mestrados, e até mesmo políticos que queriam converter os países tropicais em depósitos e sumidouros de carbono produzido no Primeiro Mundo.  

Mesmo que imobilizando o território nacional na execução dessa política de desenvolvimento sustentado, onde o desenvolvimento fica com eles, e a sustentação fica conosco.  

Então, em 1989 foi acrescentado parágrafo ao art. 44 do Código Florestal, que autorizava o corte raso até a regulamentação de seu art. 15. Esse parágrafo instituiu a figura da reserva legal nas propriedades particulares localizadas na Amazônia, constituída por área de no mínimo 50% de cada propriedade, onde não é permitido o corte raso. E veio dinheiro para demarcar áreas indígenas, criar unidades de conservação, financiar organizações não governamentais, desenvolver projetos de utilização da floresta, desenvolver campanhas, controlar, fiscalizar, quanto mais melhor.  

Nesse contexto, em Rondônia, onde o impacto estava concentrado ao longo da BR 364, foi concebido e desenvolvido um programa de conservação específico, avançado, tendo por base o art. 15 do Código Florestal, que permite a utilização da floresta primitiva da bacia amazônica conforme planos técnicos de condução e manejo estabelecidos por ato do poder público; e o zoneamento ambiental, instrumento da política ambiental previsto desde a Lei n.º 6. 938, de 1981.  

Esse programa, denominado Plano Agropecuário e Florestal de Rondônia, foi submetido à deliberação do Senado Federal, que mediante a Resolução n.º 46, de 1992, autorizou empréstimo de US$167 milhões com o Banco Mundial. Contando ainda com contrapartida da União e do Estado.  

A partir de um zoneamento prévio, os recursos foram utilizados na demarcação de unidades de conservação; na fiscalização e controle; e estudos e pesquisas para uma aproximação na escala exigida; e em ações de governo voltadas ao direcionamento da ocupação humana nas áreas já impactadas. Isso ao longo dos últimos 10 anos.  

Finalmente, em 1994, aquele art. 15 do Código Florestal foi regulamentado com o Decreto n. 1.282, de 1994, que dispõe sobre a exploração das florestas primitivas e demais formas de vegetação arbórea na Bacia Amazônica. A norma desse decreto, portanto, substituiu a norma constante do art. 44 do Código Florestal para a exploração a corte raso da floresta e demais formas de vegetação arbórea da Bacia Amazônica, prevista até sua edição.  

Então, o corte raso passou a ser permitida em áreas selecionadas pelo Zoneamento Ecológico – Econômico para uso alternativo do solo, e desde que o proprietário mantenha uma área de reserva legal de, no mínimo, 50% (cinqüenta por cento) da cobertura arbórea da propriedade.  

Então, há poucos dias, depois de 8 anos de trabalho, foi definido e aprovado na Assembléia Legislativa de Rondônia o Zoneamento Agropecuário e Florestal. Delimitando 35% da área do Estado para unidades de conservação que existiam ou foram implantadas nesses últimos anos; 15% para a exploração florestal e instalação de novas unidades de conservação; e 50% para a exploração florestal e atividade agropecuária, onde já está concentrada.  

Esse zoneamento prevê subzonas conforme as características ambientais e o impacto já existente, com percentuais diferentes, de 20%, 40%, 70% e 80% onde a cobertura florestal deve ser recuperada ou preservada.  

Tudo, mantendo 69% do território do Estado sob cobertura florestal. E de uma maneira possível de acontecer. Não escrito no papel, ou debatido aqui, mas lá, na realidade.  

Mas a proposta do Conama incorporada na Medida Provisória 1956-50, sem qualquer base científica, mas apenas pela imposição de Organizações Não Governamentais, torna o zoneamento ambiental de Rondônia uma letra morta, inaplicável.  

Agora, nada do que valia vale mais.  

Foram gastos RS$ 200 milhões no Planafloro para ordenar a ocupação humana em Rondônia com dinheiro emprestado do Banco Mundial mediante autorização dessa Casa. Agora não vale nada, e se não houver uma providência corretiva a expectativa de ordenamento ambiental de Rondônia deixa de existir. Foi um sonho.  

Um programa inédito no mundo, compreendendo uma área territorial de 240 mil km 2 , 3,5% do território nacional; e uma população de 1 milhão e 500 mil pessoas, 1% dos brasileiros, não significa mais nada.

 

Embora a sociedade civil de Rondônia tenha chegado a esse zoneamento ao longo de 10 anos de trabalho. Tenha concordado, pactuado. Inclusive os agricultores e os proprietários que terão que recompor suas áreas, ou que não mais poderão converter florestas.  

Não é uma lei feita com um mapa na parede. Ou fotos de satélites, mostrando manchas coloridas. Nem uma medida provisória como essa que está aí, que sequer foi examinada na Consultoria Jurídica do Ministério do Meio Ambiente, que nem tem uma interpretação pronta do que está escrito. Uma Medida Provisória que foi encaminhada e assinada sob pressão de e-mails em caixas de correio eletrônico. Cuja motivação nem foi verificada, porque se forem ver - e está lá, nas páginas das Organizações Não-Governamentais -, vão ver que milhares de pessoas de boa vontade atenderam um apelo mentiroso, uma denúncia falsa, onde diziam que deputados e senadores estavam mudando o Código Florestal para reduzir a reserva florestal de 80% para 50% da Amazônia, podendo chegar a 20% em 3 anos.  

Então, chega essa reedição. Que obriga quem obedeceu a lei, e respeitou o limite de 50% para a reserva legal, a passar essa reserva para 80% da propriedade, e recompor a cobertura florestal nativa em até 60% da área que legalmente converteu.  

E, no caso de existir o zoneamento ecológico, pior. O proprietário fica obrigado a recompor com cobertura florestal 50% da área da propriedade, independentemente de qualquer consideração técnica, de qualquer razão científica relacionada àquele ecossistema. Enquanto se não existir o zoneamento ambiental, o proprietário pode compensar toda a reserva legal em outra área, ou podem fazer consórcio, desde que admitido pelo órgão ambiental.  

Quer dizer, o negócio é caso a caso, com a ONG em cima, vigiando, esse deixa, esse não deixa. E a razão de cada caso fica para cada um.  

Isso não é sério. Não pode ser sério.  

Estão tratando com propriedade de pessoas. Com a vida econômica das pessoas e do Estado.  

Rondônia não é Acre. Rondônia não é Amazonas. Não é Roraima. E na questão ambiental saiu na frente, porque impactou primeiro em um programa financiado pelo Banco Mundial, o Polonoroeste. Então foi corrigida pelo próprio Banco Mundial, com o Planafloro. E agora, ao final, querem zerar tudo. Deixar o dito pelo não dito, o feito pelo não feito.  

Não é assim, é preciso um pouco mais de respeito, de estudo, de conhecimento da realidade. Menos ignorância.  

Então, acredito que essa Casa, e os órgãos competentes, deve abrir um espaço para discutir essa questão com os técnicos do Estado que trabalharam no zoneamento ambiental. Até mesmo para ver o resultado do investimento aprovado nessa Casa.  

Muito Obrigado.  

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/06/2000 - Página 12202