Discurso durante a 117ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem a memória da ex-Deputada Federal e ex-Vice-Governadora do Distrito Federal, Márcia Kubitschek.

Autor
Maguito Vilela (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Luiz Alberto Maguito Vilela
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem a memória da ex-Deputada Federal e ex-Vice-Governadora do Distrito Federal, Márcia Kubitschek.
Publicação
Publicação no DSF de 13/09/2000 - Página 18359
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, MARCIA KUBITSCHEK, EX-DEPUTADO, EX VICE GOVERNADOR, DISTRITO FEDERAL (DF), FILHA, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • HOMENAGEM, JUSCELINO KUBITSCHEK DE OLIVEIRA, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, ELOGIO, DATA, ANIVERSARIO DE NASCIMENTO, ATUAÇÃO, POLITICA, BENEFICIO, DESENVOLVIMENTO, BRASIL.

  SENADO FEDERAL SF -

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O SR. MAGUITO VILELA (PMDB - GO. Pronuncia o seguinte discurso.) - Exmº Sr. Senador Antonio Carlos Magalhães, Presidente do Senado da República e do Congresso Nacional, Exmºs Srs. Membros do Corpo Diplomático, Exmºs Srs. Ministros de Estado, Exmº Sr. vice-Governador de Brasília Benedito Domingos, neste ato representando o Governador Joaquim Roriz, Exmº Sr. Deputado Federal Paulo Octávio, Exmªs Srªs Maristela Kubitschek, Anna Christina, Júlia e Alejandra, netas do saudoso e inesquecível Juscelino Kubitschek de Oliveira, Exmº Sr. Humberto de Freitas Machado, Prefeito da minha cidade de Jataí, demais autoridades aqui presentes, Srªs e Srs. Senadores, hoje é um dia de saudade, um dia de lembrança, um dia de luto, mas sobretudo um dia de homenagens. Homenagens justas, sinceras e extremamente merecidas a dois brasileiros que se foram e nos deixaram legados de correção, honestidade, singeleza e, acima de tudo, de amor à pátria: Márcia Kubitschek, falecida precocemente há pouco mais de um mês, e seu pai, Juscelino Kubitschek de Oliveira, o maior estadista brasileiro de todos os tempos, cujo falecimento completou longos e dolorosos 24 anos no último dia 20 de agosto, e que hoje estaria completando 98 anos de idade.

Márcia e Juscelino, juntamente com dona Sarah Kubitschek, são ícones que vieram ao mundo para nos mostrar que a virtude, o caráter e a humildade cristã devem estar presentes em todos os dias de nossa vida, em todos os atos de nossa trajetória de trabalho e ação. Vieram para ensinar ao Brasil que política não se faz com rancor, ódio ou perseguições, mas com idealismo, trabalho e, acima de tudo, desprendimento e espírito público. Vieram para mudar os destinos do Brasil, arrancá-lo de uma apatia submissa, mostrando a todos nós, com um trabalho revolucionário, que éramos e somos uma grande nação, um grande País e que basta apenas sinceridade de propósitos e obstinação para que possamos nos colocar numa posição de destaque no cenário mundial.

Márcia se foi há pouco. Filha que viveu muito próxima do pai, acompanhou as glórias e depois a dureza da perseguição sofrida pelo grande líder: a humilhação, o ódio e o exílio a partir de 64. Márcia foi com ele e ficou quase duas décadas longe do Brasil. Com o seu prestígio pessoal, por lá poderia ter ficado, se tivesse se deixado seduzir pela facilidade e pela acomodação. Não. Honrou a tradição e o exemplo da família. Voltou ao Brasil. Voltou a Brasília e aqui elegeu-se, pelo voto popular, Deputada Federal Constituinte e, depois, Vice-Governadora.

Tive o privilégio de conviver com ela tanto na Câmara Federal, quando fui seu colega de Bancada, quanto no exercício da Vice-Governadoria, na gestão anterior do meu conterrâneo, amigo e correligionário Joaquim Roriz. Sua atuação foi autêntica e coerente. Marcou um período, mostrou que a força, o espírito público e o amor pela sua cidade e pelo Brasil não eram características apenas de seu pai. Márcia Kubitschek marcou sua passagem pela política deixando um exemplo de grandeza e de muita transparência em seus atos.

Em minha convivência com ela pude descobrir uma mulher forte, mas também uma figura humana doce e amiga, mãe exemplar. Márcia se foi precocemente, de maneira dolorosa, como todos os grandes da história mundial. Sofreu em vida os percalços da perseguição e do ódio político. Sofreu com a doença que lhe corroía os órgãos. Partiu para a merecida paz e descanso. Deve estar agora ao lado de seus pais, a nos observar os gestos, a nos vigiar os atos, como que a repetir que o caminho do êxito é a persistência corajosa e abnegada e que o exercício da vida pública só se justifica se for movido pelos mais caros ideais de servir sempre aos mais pobres, aos mais humildes, aos mais necessitados.

Márcia deixou três filhas: Ana Christina, Júlia e Alejandra, todas aqui presentes, a quem somo meus sentimentos sinceros pela perda irreparável e insubstituível. E deixou também uma lacuna enorme na vida pública de Brasília e do Brasil. O Senado, ao reunir-se hoje para prestar-lhe essa homenagem, cumpre uma obrigação cívica e mais do que justa. Que as palavras aqui hoje pronunciadas em sua memória fiquem gravadas na consciência da classe política brasileira e que o exemplo de Márcia Kubitschek sirva de modelo de ação política para todos nós.

Nesta sessão solene de grande importância, gostaria também de prestar a minha homenagem ao grande JK, o maior presidente e estadista que já passou pelo Brasil em todos os seus longos e árduos 500 anos de Hstória. Tenho certeza de que, ao fazê-lo, presto também uma homenagem à Márcia, que sempre fez questão de seguir as pegadas honestas e seguras do pai, e assumia isso com muito orgulho.

Juscelino veio ao mundo no início do século, em 1902. Nasceu em um lar singelo, onde as antigas e austeras virtudes eram praticadas e cobradas com vigor. Na católica Diamantina, forjou seu caráter e seu destino, sob a vigilância rígida e sábia de sua mãe, a professora Júlia. Formou-se médico em Belo Horizonte. Estudou em Paris e Berlim. Mas começou de fato a cumprir sua missão na terra em 1934, quando elegeu-se Deputado Federal por Minas. No Congresso, teve uma atuação destacada e, em 1940, foi nomeado Prefeito em Belo Horizonte.

E foi aí, pela primeira vez no exercício do Executivo, que ele mostrou suas maiores virtudes. Fez uma gestão revolucionária na capital dos mineiros. Remodelou a cidade e a projetou com destaque no cenário nacional. Em 1946, voltou ao Congresso como Deputado Federal Constituinte para depois eleger-se Governador de Minas.

Eleito sob o binômio “Energia e Transporte”, Juscelino não apenas cumpriu todos os seus compromissos de palanque. Foi muito além. Antecipou-se ao futuro, como faria depois no exercício da presidência, alterou a evolução econômica de Minas Gerais, abrindo um novo ciclo histórico, onde seu Estado deixava a situação de civilização semicolonial para assumir a ponta nos amplos caminhos da industrialização.

A candidatura a Presidente pelo PSD, a maior agremiação política da época, surgiu espontânea, impôs-se por si mesma, como um ancoradouro de aspirações e esperanças comuns. E para meu orgulho e de todos os meus conterrâneos, ele escolheu a cidade de Jataí, no sudoeste de Goiás, minha terra natal, para iniciar sua campanha vitoriosa. E não a escolheu por acaso, mas porque Jataí era considerada, naquele período, proporcionalmente, o maior reduto pessedista do Brasil, sob a liderança de um outro médico, colega de JK na Faculdade de Medicina de Belo Horizonte, Dr. Serafim de Carvalho, cuja esposa, Srª Sílvia de Carvalho, encontra-se aqui representada pelo Prefeito municipal.

E foi ali, em minha cidade, de cima de uma carroceria de um caminhão studebaker, dentro de uma oficina mecânica - já que o comício em praça pública não pôde ser realizado em razão de uma forte chuva -, que JK começou sua arrancada para transformar o Brasil, assumindo seus primeiros compromissos, inclusive o principal deles: mudar a capital do Brasil para o Planalto Central.

Tenho aqui em minhas mãos, Sr. Presidente Antonio Carlos Magalhães, a foto histórica desse primeiro comício, no momento exato em que Juscelino Kubitschek de Oliveira assumia o compromisso com a Nação de mudar a Capital. E o nosso Prefeito, acompanhado do Toniquinho - que foi quem fez a pergunta célebre a Juscelino -, passará às mãos de V. Exª, para que essa foto possa compor o acervo do Senado Federal e ser vista e lembrada pelos milhares de brasileiros que por aqui passam, seja em viagens de estudo ou com o simples intuito de passear e conhecer um pouco mais do Brasil.

E JK se elegeu. Do alto de sua autêntica postura de homem de Estado, devotando todo o seu tempo, seu trabalho e sua sabedoria à brava gente brasileira, mais uma vez foi além do que se propôs a fazer, apesar de todas as dificuldades. Até para tomar posse, Juscelino teve que enfrentar uma ameaça de golpe militar. Da dificuldade, porém, emergiu vitoriosa a figura serena do líder, a cordialidade amena do homem obstinado e idealista, o estadista generoso e humano, o governante trajado de idéias novas, ciente de sua responsabilidade.

O político e Presidente JK impôs a sua filosofia. Primou-se pelo diálogo permanente com o povo, combateu o desânimo com trabalho e devolveu o otimismo ao Brasil. Implantou um programa de conteúdo, estabelecendo um novo modelo de desenvolvimento industrial. Mais uma vez, como fizera em Minas, JK abriu um novo ciclo histórico. Sob suas mãos, o Brasil vencia o subdesenvolvimento, alterando os ritmos de nossa evolução, revolucionando a nossa economia.

Apesar das resistência e da oposição ferrenha que enfrentou, o Brasil avançou. O que nos convence é a verdade. O que vale é o fato. O que conta são os números. Os números do governo JK falam por si.

            Entre 1955 e 1961, a produção do aço no Brasil cresceu 100%; a das indústrias mecânicas, 125%; a das elétricas e de comunicações, 380%; a das indústrias de transportes, 600%. A produção industrial como um todo teve crescimento superior a 100%, a taxa de crescimento real foi de 7% ao ano e a renda per capita aumentou numa média de 4% ao ano.

A construção de Brasília cumpriu seus objetivos. Levou o desenvolvimento ao interior, as novas estradas ampliaram as fronteiras agrícolas e até a construção da cidade em si trouxe benefícios com a geração de milhares de oportunidades de empregos.

Como bem definiu JK em seu discurso na inauguração do Palácio da Alvorada: “Não podíamos continuar indefinidamente a ser um grande território manchado de desertos, com uma população, em sua maior parte, colada ao litoral, e as mais ricas zonas de nosso País abandonadas, servindo apenas para referências literárias”.

As ações de Juscelino fizeram com que o brasileiro recuperasse a confiança em si mesmo e a crença no potencial do Brasil, com desdobramentos altamente positivos na cultura, no esporte e no comportamento.

Senhoras e senhores, perdoem-me por essa digressão histórica e sentimental, mas considero-a fundamental. A história sempre nos ensina. E a releitura deste momento auspicioso para o Brasil nos traz à tona modelos mais do que atuais. A coragem com que JK enfrentou as muitas vezes estúpidas exigências do Fundo Monetário Internacional, fazendo uma clara opção pelo desenvolvimento, talvez seja o principal deles. Sem querer fazer críticas aos atuais gestores do País, não tenho dúvidas de que posicionamento semelhante faz-se urgente hoje, agora, para que o Brasil possa retomar o trilho do progresso, com a construção de oportunidades iguais de crescimento para uma maioria que está absolutamente excluída.

Ao terminar, rendo mais uma vez minhas sinceras homenagens a essa família extraordinária que, como disse, veio ao mundo para nos dar os mais puros e corretos exemplos de trabalho, justiça, honestidade e sensibilidade social. A saudade dos que se foram é doída e cabe aos que ficaram a responsabilidade de perpetuar para as futuras gerações de brasileiros esse valioso legado.

Encerro meu pronunciamento lendo a íntegra de um bilhete de JK, escrito de próprio punho em 1961, endereçado a correligionários da minha cidade, no sudoeste goiano, região onde nasci e iniciei a minha trajetória política. Se todos os governantes brasileiros, ao terminarem seus mandatos, tivessem a condição sincera e moral de escrever um texto como este, fatalmente o Brasil estaria muito, muito melhor.

Sinto-me satisfeito em poder proclamar que, na Presidência da República, não faltei a um só dos compromissos que assumi como candidato. Mercê de Deus, em muitos setores realizei além do que prometi, fazendo o Brasil avançar pelo menos 50 anos de progresso em 5 anos de governo. Pudemos ainda despertar as esperanças e energias dos povos americanos para o objetivo comum do combate ao subdesenvolvimento.

Sejam quais forem os rumos da minha vida pública, levarei comigo, ao deixar o honroso posto que me confiou a vontade popular, o firme propósito de continuar servindo ao Brasil com a mesma fé, o mesmo entusiasmo e a mesma confiança nos seus altos destinos.

Juscelino Kubitschek de Oliveira.

            Muito obrigado. (Palmas)

 


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/09/2000 - Página 18359