Discurso durante a 120ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Necessidade da formulação de política educacional voltada para o setor rural.

Autor
Carlos Patrocínio (PFL - Partido da Frente Liberal/TO)
Nome completo: Carlos do Patrocinio Silveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO.:
  • Necessidade da formulação de política educacional voltada para o setor rural.
Publicação
Publicação no DSF de 16/09/2000 - Página 18744
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO.
Indexação
  • RECONHECIMENTO, PROGRESSO, EDUCAÇÃO, PAIS, NECESSIDADE, GOVERNO, ATENÇÃO, ENSINO RURAL, GARANTIA, EFICACIA, CONTEUDO, APLICAÇÃO, ALUNO, CAMPO, MELHORIA, QUALIDADE, FORMAÇÃO PROFISSIONAL, ATENDIMENTO, DEMANDA, AGRICULTURA, CONCORRENCIA, MERCADO INTERNACIONAL.
  • COMENTARIO, INICIATIVA, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), IMPLEMENTAÇÃO, SOLUÇÃO, DIFICULDADE, ENSINO RURAL.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. CARLOS PATROCÍNIO (PFL - TO) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, herdeiro de uma secular história de desigualdades na distribuição da riqueza e dos bens culturais, o Brasil chega ao fim do milênio carregando um fardo ainda cheio de inúmeros desafios a enfrentar na área da educação. É inegável que muito foi feito nos últimos anos no setor educacional brasileiro para recuperar nosso monumental atraso. Os avanços são notórios e claramente reconhecíveis.

            Temos a satisfação de ver o índice de acesso de nossas crianças ao ensino fundamental chegar muito perto da totalidade. Hoje, temos 96% de crianças de 7 a 14 anos matriculadas na escola. O aumento vertiginoso do número de matrículas no ensino médio indica que há muito mais jovens, hoje, prosseguindo seus estudos, após terminar o ciclo fundamental, do que havia em anos anteriores. As desigualdades regionais, no setor educacional, também estão diminuindo. A Região Nordeste ostentou porcentagem de matrícula no ensino fundamental mais elevada do que a média do conjunto do País. Isso também ocorreu no ensino médio.

            São fatos que atestam o acerto dos rumos tomados pela educação nos últimos anos, particularmente durante a gestão do Ministro Paulo Renato Souza, à frente do Ministério da Educação desde a primeira hora do Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso.

            Mas há um segmento no setor educacional que está a merecer maior atenção de nossas autoridades, dos formuladores de políticas educacionais, dos pensadores e pesquisadores, dos filósofos e dos educadores. Trata-se de nossa escola rural.

            A primeira questão que se levanta é acerca de sua adequação a um mundo novo, ao qual se impôs a força do capitalismo, da tecnologia, da otimização da produção, ao lado de um mercado cada vez mais competitivo e acirrado na busca do melhor produto pelo mais baixo preço. Nesse novo cenário, nos perguntamos se a velha escola rural - isolada, multisseriada, de uma classe só, com uma única professora - continua adequada para atender às necessidades de formação de nossa clientela rural. Essa é a pergunta que nos inquieta no tocante à escola rural.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs Senadores:

            Não foi apenas o mundo urbano que mudou e sofreu modificações espetaculares, numa velocidade espantosa, no último quartel deste século. O campo também mudou. Mudou muito! Talvez não na mesma velocidade com que a assim chamada modernidade chegou às metrópoles e grandes centros urbanos. Mas não podemos mais ver o campo como viam nossos avós, ou mesmo nossos pais.

            Há quem diga que o Brasil já foi um país agrário. Hoje é um país moderno, industrializado, com taxas de urbanização crescentes. Quem vai a uma região agrícola avançada, como a do interior do Estado de São Paulo, por exemplo, em busca das antigas fazendas de café, que correspondiam ao modelo “hacienda”, não mais as encontra. Em seu lugar está a “plantation” de cana-de-açúcar, comandada pelas usinas, num cenário em que predomina vasto aparato tecnológico, imensa maquinaria, uma administração “racional”, gerência especializada, contabilidade de custos típica das empresas modernas.

            Quer dizer que o campo apresenta hoje novo perfil. O homem que trabalha nele também é um outro homem, de quem se requer mais conhecimento, mais escolaridade, mais informação. Em conseqüência, os filhos dos trabalhadores agrícolas também apresentam novos requerimentos de formação e educação. São demandas que desembocam na escola rural e forçam sua transformação.

            A propósito do tema sobre o qual venho discorrendo, gostaria de mencionar algumas reflexões do Senhor Polan Lacki, representante da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação na América Latina. O Senhor Polan Lacki, num de seus escritos, tratou da necessidade de se recuperar o papel da escola rural. Menciono, a seguir, algumas de suas idéias, no único intuito de enriquecer o tema e fomentar o debate.

            Para o referido autor, muitos agricultores não conseguem desenvolver uma agricultura mais eficiente e rentável simplesmente porque não lhes foi ensinado como formular e executar a atividade da forma mais correta, utilizando-se dos recursos de que realmente dispõem na plenitude de sua potencialidade. “Não lhes foi ensinado em seus lares porque seus pais não poderiam ter-lhes transmitido conhecimentos que eles mesmos nunca adquiriram e também não lhos ensinaram na escola”.

            Deve-se considerar que, para a maioria das famílias rurais, a passagem pela escola básica rural, que quase nunca chega até a oitava série, é a única oportunidade de seus filhos adquirirem as competências necessárias para saírem do subdesenvolvimento. Se não aprenderem nessa ocasião como fazer para se tornarem agricultores mais eficientes, possivelmente não terão outra chance na vida.

            Com base nesses pontos, o representante da FAO sustenta a tese de que a educação básica rural deveria ter um caráter mais instrumental, no sentido de proporcionar às crianças conteúdos úteis que possam ser aplicados na correção de suas próprias ineficiências e na solução dos problemas que ocorrem em seus lares e comunidades. Fica claro que, no seu entender, as instituições de ensino rural deveriam passar por uma reengenharia nos conteúdos educativos e nos métodos pedagógicos, no sentido de privilegiar o “ensinar a solucionar problemas, solucionando-os”.

            Eu sei, Sr. Presidente, Srªs e Srs Senadores, que essa não é uma questão tão simples assim. Não há consenso nem junto aos especialistas sobre a forma de se organizar o ensino nas escolas rurais. De antemão, devemos estar atentos para se evitar, a qualquer preço, o reducionismo fácil de se restringir o conteúdo da escola rural aos limites culturais e sociais próprios da realidade agrícola. Não é por morar no campo e freqüentar uma escola rural que seu destino está selado por decreto: vai morar e trabalhar na roça toda vida. Mesmo porque, temos visto, ao longo da história, o anseio humano por melhores condições de vida mover multidões, de lá para cá e de cá para lá, numa intensa mobilidade geográfica que risca os mapas em direções variadas. Esse menino que hoje está no campo pode amanhã estar na cidade.

            Além do mais, ele não vale menos que seu conterrâneo da cidade. Sua escola também deve ser forte nos conteúdos tidos como universais, capazes de elevar os educandos a formas superiores de educação e de capacitá-los a exercer plenamente seu potencial de cidadãos.

            Tirante o risco do reducionismo fácil, acredito que há espaço para melhorarmos as escolas rurais. O Ministério da Educação está ciente dos problemas dessas escolas e inclusive já iniciou a implantação de um programa para superar algumas de suas dificuldades, como a unidocência e a multisseriação. É o programa Escola Ativa, que está trazendo mudanças pedagógicas há muito adotadas nos colégios urbanos.

            Uma dessas mudanças consiste em produzir livros didáticos especialmente formulados para as classes multisseriadas, em que estudantes de diversas séries estudam na mesma sala. Além dessa inovação, os conteúdos são divididos em módulos, o que permite ao aluno retomar o estudo de onde parou. Isso porque é comum, na zona rural, os estudantes deixarem as aulas na época da colheita para ajudar os pais na roça; e, ao voltarem para a escola, já terem perdido o ano. Agora, poderão recomeçar do ponto em que pararam, não precisando repetir todo o ano de novo.

            São inovações importantes, não há dúvida. Mas resta discutir qual o melhor conteúdo a ministrar ao nosso aluno do campo se quisermos que ele seja um produtor rural eficiente e competitivo, em suma, melhor instrumentalizado nas práticas agrícolas e pecuárias. Uma verdade está clara: o campo não é mais o mesmo. Seus requisitos estão atrelados a uma nova ordem econômica e comercial, que exige, com cada vez maior intensidade, produtos de qualidade a preços competitivos. Se quisermos competir no cenário internacional, devemos nos preparar para isso. Mais: temos a obrigação de preparar bem as gerações que nos vão suceder, estejam elas nas cidades ou nos campos.

            Era o que tinha a dizer. Muito obrigado a todos.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/09/2000 - Página 18744