Discurso durante a 139ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Apelo ao Poder Executivo para intervenção diplomática no Oriente Médio com vistas a contribuir para a consecução da paz.

Autor
Tião Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Sebastião Afonso Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INTERNACIONAL. POLITICA EXTERNA.:
  • Apelo ao Poder Executivo para intervenção diplomática no Oriente Médio com vistas a contribuir para a consecução da paz.
Publicação
Publicação no DSF de 21/10/2000 - Página 20839
Assunto
Outros > POLITICA INTERNACIONAL. POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • ANALISE, CONFLITO, ORIENTE MEDIO, AMBITO, HISTORIA, POLITICA, ECONOMIA, PETROLEO, RELIGIÃO, DEFESA, DEBATE, SENADO, CONGRESSO NACIONAL, POSIÇÃO, RELAÇÃO, POLITICA INTERNACIONAL.
  • SOLICITAÇÃO, ITAMARATI (MRE), ENCAMINHAMENTO, CONTRIBUIÇÃO, PAZ, ORIENTE MEDIO.

  SENADO FEDERAL SF -

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O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os recentes e sangrentos acontecimentos do Oriente Médio não apenas ampliam o grau de tensão que vem afligindo aquela região, em quase todo o transcurso deste belicoso século XX, sobretudo em suas últimas cinco décadas. Afora a enorme dimensão do drama humano, que mutila e ceifa a vida de milhares de pessoas, esses episódios envergonham a própria Humanidade, na demonstração incontrastável de nossa absurda incapacidade de dialogar, de encontrar saídas negociadas e justas em situações dessa natureza.

No momento em que explodem bombas e, com elas, o mínimo de racionalidade, sem a qual nenhuma civilização permanece de pé, é inadiável, é imperiosa a ação da comunidade internacional no sentido de, preliminarmente, promover-se o imediato cessar das hostilidades e, passo seguinte, reabrirem-se as negociações com vistas à paz duradoura. Esse há de ser um esforço coletivo, em que se mesclam grandes e médios Estados, países emergentes e organismos supranacionais. O que não se admite é a omissão ou a olímpica indiferença de quem, geograficamente afastado da área conflagrada, ouse imaginar-se imune aos efeitos de um quadro de guerra ou de uma situação potencialmente explosiva e eternamente irresolvida.

Afinal, o que está em jogo não é mera disputa territorial entre palestinos e israelenses; trata-se, isto sim, de enorme desafio à comunidade mundial, quer pela forte dependência de todos ao petróleo produzido na região, de modo que uma desestabilização ali atinge globalmente a economia, quer no que respeita à nossa própria capacidade, ou não, de superar divergências, por mais graves que sejam, sem fazer uso da força. Por essas razões, de todas as partes do mundo, devem emanar manifestações de firme condenação ao quadro de beligerância e, ao mesmo tempo, sugestões que levem à definitiva resolução das pendências.

Por isso, Sr. Presidente, trago o tema ao debate nesta Casa. Nada mais justo que o Senado da República, em que pese a extensa agenda nacional, da qual não pode - e nem deve - fugir, volte o seu olhar para uma questão internacional da magnitude dessa que, no momento, revolve as entranhas da histórica Palestina. Aliás, de um Parlamento identificado com as demandas do seu tempo, exige-se dinamismo e flexibilidade suficientes para incorporar às suas funções básicas e tradicionais - legislar, fiscalizar e falar - os novos papéis que lhe são conferidos pela realidade contemporânea. Nessa perspectiva, em um mundo que se transforma velozmente, com a economia adquirindo feições cada vez mais acentuadamente globais, com a célere circulação de capitais, de bens e de informações, nada mais adequado falar-se de um Parlamento capaz de acompanhar e de entender essa nova realidade e, expressando legitimamente os interesses nacionais nele representados, posicionar-se em face das questões mundiais mais relevantes. Isso é imperativo.

Reconheço a imensa dificuldade para se traçar um quadro sintético do Oriente Médio, dada a extrema complexidade que o envolve. Afora os aspectos históricos, étnicos, geopolíticos, culturais e econômicos que, com maior ou menor intensidade, sempre afloram, há que se levar na devida conta um elemento complicador adicional: a religião. Não nos esqueçamos de que se trata da região-berço das três maiores religiões monoteístas existentes no mundo: o Judaísmo, o Cristianismo e o Islamismo. Emblema maior dessa situação, a cidade de Jerusalém, considerada sagrada pelas três religiões, não por acaso transformou-se no pivô da atual crise.

Não obstante as dificuldades de compreensão oferecidas por um cenário tão confuso como esse, no qual o reducionismo esquematizador, definitivamente, não é bom conselheiro, há que se tentar uma solução para o impasse que já dura tanto tempo. Parto do princípio de que a existência do Estado de Israel, formalmente criado pela ONU em 1948, em processo que contou com a ativa participação brasileira - com Osvaldo Aranha presidindo a Assembléia-Geral que tomou a histórica decisão - e fortemente contingenciado pelo clima de consternação mundial advindo do genocídio perpetrado pelo nazismo contra milhões de judeus, não é mais alvo de contestação. Assim, a motivação essencial das guerras entre árabes e israelenses de 1948, 1956 e 1973, de contestação ao Estado Israelense, não mais tem sentido nos dias de hoje. A propósito, vale lembrar a ousada ação do Presidente Sadat, do Egito, em 1978, fazendo de seu país o primeiro Estado árabe a assinar um acordo de paz com Israel.

Entretanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, uma questão crucial permanece em aberto. Refiro-me a um lar nacional para os palestinos, o que a própria resolução da ONU que criou Israel mencionava, ao determinar a partilha do território para que nele fossem instalados os dois Estados. Seja pela desunião dos Estados árabes, seja pela força internacional de lobbies contrários à idéia ou ainda pelas circunstâncias do jogo político mundial que sempre viu no Oriente Médio uma área estratégica, o certo é que o Estado da Palestina ainda hoje não se materializou.

A partir de 1993, com os acordos celebrados em Oslo, na Noruega, israelenses e palestinos iniciaram a abertura do caminho que poderia levar à paz. Os governos trabalhistas israelenses - justiça se lhes faça - acenaram com algumas concessões, como a retirada de suas tropas de parte dos centros urbanos palestinos em Gaza e na Cisjordânia, culminando com o oferecimento da soberania palestina em determinadas áreas de Jerusalém Oriental.

O fracasso desse processo de paciente construção da paz deveu-se, fundamentalmente, à ação de radicais que, diga-se de passagem, jamais aceitaram a via da negociação pacífica. Entre os palestinos, a liderança madura e prudente de Yasser Arafat é contestada pelo Grupo Hamas. Entre os israelenses, a direita reacionária, vinculada à ortodoxia religiosa, atua violentamente para impedir a aproximação do país aos palestinos. Os assassinatos do egípcio Sadat e do judeu Rabin foram dramáticos capítulos a mais nessa trajetória.

O extremismo, aliás, é o caminho para se entender a atual crise. Mais uma vez, Ariel Sharon, líder da direita em Israel, politicamente representado pelo Partido Likud, protagoniza mais uma ação sinistra, ele que há 18 anos comandou o massacre palestino em dois campos por eles ocupados no sul do Líbano. Pois, agora, exatamente no último dia 28 de setembro, esse mesmo Sharon visita a Esplanada das Mesquitas o local mais sagrado de Jerusalém para palestinos e judeus, em ato público e ostensivo, recebido pelos palestinos como provocação. Ao protestarem, os palestinos foram alvo da violenta ação militar dos israelenses; reagindo, deram chance a que novos atritos se multiplicassem.

Faço, por fim, um apelo ao Executivo brasileiro. Nossa Chancelaria, tida e havida como altamente profissional, com uma longa história de prudência e cautela, precisa movimentar-se no sentido de oferecer algum tipo de contribuição para o encaminhamento da questão que convulsiona, uma vez mais, o Oriente Médio. Há que se ter a coragem de falar, de sugerir, de se expor, afinal. Um País com a nossa dimensão territorial e populacional, que se coloca entre as maiores economias do mundo, que assume certa liderança no subcontinente americano, não se pode dar ao luxo de encolher-se num momento de tamanha gravidade. Que o Brasil acione os mecanismos de que dispõe, para que sua voz seja ouvida! Um País como o nosso precisa ter e expressar seu “ponto de vista internacional”, para usar a famosa frase de San Tiago Dantas.

Manifesto meu sincero desejo de que o Congresso Nacional faça a sua parte. Que ele acompanhe atentamente o desenrolar dos acontecimentos e, no limite de sua capacidade, ajude o Brasil a posicionar-se bem ante a crise que se abate sobre o Oriente Médio. Como todas as pessoas de boa vontade, acredito que a paz se constrói paciente e coletivamente, pela via da negociação e sempre, sempre assentada nos princípios da justiça!

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/10/2000 - Página 20839