Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE O PROCESSO DE CONCENTRAÇÃO FUNDIARIA NO PAIS.

Autor
Carlos Patrocínio (PFL - Partido da Frente Liberal/TO)
Nome completo: Carlos do Patrocinio Silveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA AGRARIA.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE O PROCESSO DE CONCENTRAÇÃO FUNDIARIA NO PAIS.
Publicação
Publicação no DSF de 14/02/2001 - Página 679
Assunto
Outros > REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • COMENTARIO, APREENSÃO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, CONCENTRAÇÃO, PROPRIEDADE RURAL, AUSENCIA, APROVEITAMENTO, TERRAS, PRODUÇÃO AGROPECUARIA, EFEITO, OCORRENCIA, EXODO RURAL, DESEMPREGO, AUMENTO, VIOLENCIA, ZONA URBANA.
  • ELOGIO, INICIATIVA, JAIME LERNER, GOVERNADOR, ESTADO DO PARANA (PR), CRIAÇÃO, PROGRAMA, FORNECIMENTO, HABITAÇÃO, SIMULTANEIDADE, OPORTUNIDADE, TRABALHO, PRODUÇÃO AGRICOLA, TRABALHADOR RURAL, EFEITO, MODERNIZAÇÃO, PROCESSO, REFORMA AGRARIA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


           O SR. CARLOS PATROCÍNIO (PFL - TO) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a gravidade dos problemas relativos à concentração da propriedade fundiária no Brasil é bem conhecida. Temos, ainda hoje, vastas extensões de terras inaproveitadas e um grande número de brasileiros que desejam viver da produção agropecuária mas não têm acesso à terra. As aspirações não realizadas desse segmento populacional geram graves tensões sociais, situação que se torna tanto mais preocupante na medida em que pode ser instrumentalizada com objetivos políticos.

           A falta de oportunidades no campo acarreta, também, seriíssimas repercussões no meio urbano. Expulsas da zona rural, vagas de migrantes deslocam-se para as cidades em busca de emprego. Quase sempre com pouquíssima ou nenhuma qualificação, esses ex-agricultores praticamente não têm chance no disputado mercado de trabalho de nossos dias. Acabam, portanto, engrossando o cinturão de miséria, favelado em torno das cidades de médio e grande porte, aumentando a pressão por equipamentos urbanos. Muitas vezes, a absoluta falta de perspectiva conduz os filhos desses migrantes à marginalidade criminosa, contribuindo para compor o quadro de alarmante insegurança em que todos vivemos.

            Essa problemática, que pode ser observada nas mais diversas regiões do País, é vivida de forma particularmente aguda pelo Estado do Paraná, apesar da grande pujança da agricultura local, responsável pela maior produção de grãos do País. As mudanças estruturais da economia rural, associadas à política de estímulo à exportação de grãos em detrimento da produção de alimentos por pequenos proprietários, tornaram o Paraná palco daquele que tem sido nada mais, nada menos do que o mais intenso êxodo rural do mundo, no menor espaço de tempo.

            Os números são, de fato, impressionantes, caracterizando uma verdadeira diáspora, identificada em estudos de instituições acadêmicas e órgãos governamentais de pesquisa. Só na década de 70, dois milhões, seiscentas e cinqüenta mil pessoas abandonaram o campo no Paraná. Quase um milhão e meio delas foram empurradas para as periferias das médias e grandes cidades do Estado, onde vivem em péssimas condições, sendo o restante jogada em direção às fronteiras agrícolas do Oeste do Brasil. Em apenas duas décadas e meia, entre 1970 e 1995, a população rural do Estado foi reduzida em mais de 50%, enquanto a população urbana quase triplicou. E, ainda mais estarrecedor: segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE -, de 1995 para 1996 o número de propriedades rurais caiu de 466 mil 397 para 371 mil 881! Um decréscimo superior a 20% em apenas um ano!

           Um dos resultados desse processo foi a criação da figura do trabalhador rural volante, o chamado “bóia-fria”, que migra nas entressafras à procura de trabalho e geralmente encaminha-se para centros urbanos. Privado de um rendimento regular ao longo de todo o ano, o “bóia-fria” fica despojado de condições dignas de vida. Hoje, eles representam nada menos que 27% da população rural paranaense, um vasto segmento social que até recentemente não havia merecido um programa especial voltado às suas necessidades de cidadãos.

           Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, confrontado com esse gravíssimo problema social, o Governador Jaime Lerner, ao iniciar seu primeiro mandato, em janeiro de 1995, lançou o Programa Vila Rural, que combina habitação e produção agrícola.

           Partindo do entendimento de que é impossível dissociar os problemas urbanos dos problemas do campo, e de que é necessário atuar simultaneamente sobre os efeitos e as causas do processo migratório, começou-se a colocar em prática um programa em que assentamentos humanos estão associados a atividades econômicas, visando a assegurar terra, moradia, educação, sustento, trabalho e bem-estar à comunidade.

           Ao evitar a dissociação entre os problemas urbanos e os rurais, o Poder Público garantiu condições para realizar um planejamento global que vincula moradia e trabalho para as famílias; geração de empregos e aquecimento das economias dos Municípios no setor da construção civil; e, ainda, localização ideal dos núcleos rurais em função do planejamento urbano de cada cidade em que se instala. Contribuindo para diminuir o êxodo rural, o Programa confere tempo às cidades para melhor responder às pressões por equipamentos urbanos.

           O programa das Vilas Rurais caracteriza-se como uma reforma agrária moderna, eficaz e não traumática, ao proporcionar ao trabalhador rural e sua família, além de uma habitação e um pedaço de terra, um processo de reeducação e de valorização de sua dignidade humana.

           Uma ampla variedade de cursos e treinamentos vêm sendo oferecidos nos Centros de Convivência Familiar instalados nas Vilas Rurais, objetivando capacitar as famílias não apenas para obterem maior produtividade agrícola, como também aumento de seus rendimentos, mediante o aprendizado de técnicas de transformação da sua produção. Além de alimentos, as Vilas Rurais vêm produzindo vassouras, chinelos, temperos e artesanatos de todo tipo, entre outros produtos. São resultados da transformação dos produtos primários, que garantem uma renda complementar às famílias. Na agricultura de subsistência e também para a venda de excedentes, são produzidos hortaliças, arroz, feijão, milho, ovos, carne suína, mandioca e outros alimentos.

           A elevação dos padrões de consumo, juntamente com a melhoria da higiene e o abastecimento de água tratada, já se reflete em uma sensível melhora nos níveis de saúde dos moradores dos núcleos. Já com o objetivo de assegurar um mercado estável para a colocação dos produtos das Vilas Rurais, a coordenação agrícola e social do Programa trabalha para fechar a cadeia produtiva, estabelecendo acordos com agroindústrias e com o setor de comércio alimentício.

           Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a implantação das Vilas Rurais pelo Governo do Paraná é feita em parceria com as prefeituras de Municípios onde mais intensamente se manifesta o problema do êxodo rural. As Vilas criam um chão para que o trabalhador rural volte a ter suas raízes na terra, asseguram sustento para a família - garantindo trabalho durante todo o ano - e representam uma alternativa na qual a manutenção do homem no campo ocorre com respeito à sua dignidade.

           Os lotes que compõem as Vilas Rurais são definidos e têm cerca de 5 mil metros quadrados, com um módulo de moradia inicial de 44 metros quadrados. A proposta é que o morador faça, com tempo e na medida de suas possibilidades e necessidades, ampliações de acordo com seu gosto pessoal, planejamento familiar e a cultura construtiva de cada região.

           Nas Vilas Rurais, o trabalhador tem abrigo e trabalho, tendo todas as condições de trabalhar nas safras como diarista e de, nas entressafras, cuidar de sua própria atividade, produzindo alimento para sua família e comercializando os excedentes. Para garantir seu sucesso nesse novo modo de vida, os trabalhadores e suas famílias recebem assistência técnica, treinamento para capacitação e insumos, mediante ações de que participam, principalmente, quatro Secretarias de Estado: Habitação; Agricultura e Abastecimento; Criança e Assuntos da Família; e Trabalho.

           Um aspecto que evidencia a inteligente formulação do Programa é o fato de que as Vilas Rurais, sempre que possível, ficam localizadas próximas a distritos rurais, aproveitando a infra-estrutura comercial, escolar e de saúde já existente, como forma de não sobrecarregar as prefeituras com a construção de novos equipamentos e também a fim de garantir trocas sociais na convivência com outros núcleos habitados. A implantação do programa orienta-se, prioritariamente, para regiões com grande concentração de mão-de-obra rural temporária, como o são as regiões produtoras de algodão e cana-de-açúcar, por exemplo.

           As vantagens do sistema de autogestão garante a geração de empregos no mercado de trabalho de cada região, bem como o aquecimento das economias municipais com a venda de materiais de construção. Nos três primeiros anos de funcionamento do Programa Vila Rural, foram gerados 126 mil empregos na construção civil habitacional, e o aquecimento dos mercados locais de materiais ficou entre 20% e 30%.

           Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a iniciativa recebeu premiações, como as conferidas, em 1997, pelas Fundações Ford e Getúlio Vargas. Entre 300 projetos brasileiros de gestão pública e cidadania, o Programa Vila Rural foi premiado como um dos 20 melhores do País. As Vilas Rurais também foram consideradas pelo Programa Comunidade Solidária como um exemplo a ser seguido.

           De fato, o Programa Vila Rural não representa apenas o primeiro projeto massivo de habitação rural do Brasil. Mais do que isso, ele aponta um caminho para qualquer Unidade da Federação que deseje revitalizar sua vocação agrícola, ao mesmo tempo em que busca a consolidação de novas alternativas econômicas e trabalha no sentido de assegurar uma convivência social mais harmoniosa, como via para o desenvolvimento e o bem-estar de sua população.

           Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o processo de concentração fundiária no País aprofunda-se cada vez mais e vai alcançando proporções dramáticas, com repercussões gravíssimas não apenas para os excluídos do campo, mas também para a qualidade de vida nas cidades. É urgente que se faça algo antes que seja tarde. O Programa Vila Rural, ao associar assentamentos humanos e atividades produtivas, dentro de uma proposta economicamente racional, com cunho humanístico e democrático, aparece como uma excelente opção para o enfrentamento desse sério problema.

           Era o que tinha a dizer.

           Muito obrigado.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR CARLOS PATROCÍNIO EM SEU PRONUNCIAMENTO:

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            Modelo17/18/248:33



Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/02/2001 - Página 679