Discurso durante a 10ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE O DIA INTERNACIONAL DA MULHER.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE O DIA INTERNACIONAL DA MULHER.
Publicação
Publicação no DSF de 10/03/2001 - Página 2776
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, DIA INTERNACIONAL, MULHER, ELOGIO, EMPENHO, BUSCA, ESPAÇO, MERCADO DE TRABALHO, COMBATE, DISCRIMINAÇÃO, REIVINDICAÇÃO, MELHORIA, ATENDIMENTO, SAUDE.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Dia Internacional da Mulher enseja muito mais do que uma simples homenagem às mulheres de todo o mundo, uma proveitosa reflexão sobre a condição feminina e sobre o papel que elas representam na sociedade moderna.

Hoje, naturalmente, nós nos debruçamos sobre essa questão com uma perspectiva bastante diversa daquela que predominava até algumas décadas atrás; e, mais diversa ainda, daquela que originou o Women’s Day, data que assinalava o criminoso assassinato de 129 operárias de uma indústria de tecelagem em Nova Iorque, em 1857, por terem deflagrado greve, visando à redução da jornada de trabalho e a melhores salários. Desde então, a luta pela emancipação da mulher se intensificou, sendo decisiva a instituição do Dia Internacional da Mulher - 8 de março, data do massacre das operárias americanas - por ocasião da II Conferência Internacional das Mulheres Socialistas, ocorrida em Copenhague, em 1910.

As conquistas obtidas pelas mulheres, naturalmente, constituem motivo de justa comemoração; mas, se comprovam os resultados positivos de uma luta sem tréguas, que se expandiu por todo o planeta, contrastam com a dura realidade da condição feminina, especialmente em algumas sociedades que não conseguiram superar a discriminação e o preconceito.

Nos casos mais graves, a mulher tem sido vítima de violências sórdidas. Relatório do Fundo das Nações Unidas para a População, editado no ano passado, demonstrava que na Papua Nova Guiné 67% da população feminina já tinham sido agredidas fisicamente por seus parceiros, seguindo-se Bangladesh, com 47%, e a Índia, com 40%. Embora com índices menores, a violência contra a mulher foi registrada também nos países mais desenvolvidos, como o Canadá (29%), os Estados Unidos (22%) e a Suíça (21%).

O preconceito e a intolerância explicam também a primitiva e bárbara prática da mutilação genital, com extirpação total ou parcial do clitóris, visando a controlar a sexualidade feminina. Os dados da ONU revelam a existência de nada menos que 130 milhões de mulheres e meninas mutiladas, com maior concentração na Ásia e no oeste da África. Na Somália, praticamente todas as mulheres - 98% - são mutiladas.

Na Ásia ocorre, ainda, a maioria dos casos de tráfico, quase sempre visando à prostituição, que também constitui, por si, um problema da maior gravidade. A cada ano, 10 mil mulheres de países vizinhos se dirigem à Tailândia, em busca de melhores oportunidades, e acabam por se prostituir. Na Índia, mais de 5 mil meninas e adolescentes acabam tendo o mesmo destino, todos os anos.

No Paquistão, 300 mulheres foram assassinadas, em 1997, por “motivos de honra”, e na Índia, milhares de mulheres são mortas, todos os anos, por não terem dotes suficientes para o casamento.

Estima-se que dois milhões de meninas, entre 5 e 15 anos, entram no mercado da prostituição anualmente, em todo o mundo. Vítimas da ignorância e do preconceito, as mulheres sofrem também com maior intensidade os problemas de saúde. As doenças sexualmente transmissíveis afetam as mulheres com maior freqüência do que os homens, como comprova o surgimento de 333 milhões de casos a cada ano. Não bastassem todos esses casos, a precariedade da assistência à saúde da mulher também faz vítimas: a cada minuto morre uma mulher, por complicações na gravidez ou no parto.

Essa, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, é a face mais visível da discriminação. A face menos visível ou menos contundente, mas nem por isso menos grave, se revela na desigualdade de oportunidades, na menor remuneração para trabalhos de natureza idêntica aos desempenhados por homens, na discriminação dos direitos humanos, na representação política distorcida, que privilegia o universo masculino.

A diretora do Fundo das Nações Unidas para a População, Nafis Sadik, afirmou em fins do ano passado que é preciso convencer os homens a aceitar a igualdade e os governos a adotarem políticas que propiciem a participação da mulher em todos os aspectos da vida. Ressalvando que “os homens também precisam de ajuda”, ela disse que para a mulher “tudo é mais difícil, dos cuidados com a saúde aos direitos humanos”.

Como exemplo, citou o fato de que milhares de mulheres jovens, no norte da Nigéria, são abandonadas após o casamento, quando têm seus corpos deformados pela gravidez. Para demonstrar que a discriminação existe também nos países ricos, comentou o fato de que as pílulas anticoncepcionais foram proibidas por mais de 30 anos no Japão, enquanto o Viagra foi liberado em apenas quatro meses.

No Brasil, os progressos da condição feminina têm sido significativos, embora ainda falte muito para uma situação de plena igualdade. Basta dizer que, na população adulta, 18,7% das mulheres têm 11 anos de estudo (segundo grau completo), contra 14% da população masculina, mas, apesar disso, a mulher recebe, em média, apenas 60% da remuneração paga aos homens. Essa discriminação assume aspecto ainda mais preocupante quando se sabe que, a cada dia, cresce o número de famílias chefiadas por mulheres: de 14,65%, em 1980, esse índice chegou a 22% há três anos.

Essa mudança se explica em parte pela crise econômica, já que os homens não mais conseguiam sustentar seus lares unicamente com seus rendimentos; mas se explica também pelo fato de que as mulheres têm buscado sua inteira realização pessoal e profissional.

A emancipação da mulher teve impacto no perfil da família brasileira - hoje, de cada quatro núcleos familiares, um é chefiado por mulher - tanto quanto no mercado de trabalho. Duas décadas atrás as mulheres representavam apenas 11% da População Economicamente Ativa: hoje, sua participação sobe a 40%. Essas conquistas, obviamente, foram acontecendo de forma gradativa, mas sem retrocessos. Algumas datas recentes, e outras nem tanto, são significativas desse processo de emancipação: em 1918, Maria José de Castro Rabelo Mendes tornou-se a primeira mulher aceita na carreira diplomática; em 1932 as mulheres brasileiras conquistaram o direito ao voto; no ano seguinte, Carlota Queiroz seria eleita a primeira deputada federal no País; em 1977, a escritora Rachel de Queiroz se elegeu membro da Academia Brasileira de Letras.

Dois anos depois, Eunice Michiles seria eleita a primeira Senadora brasileira - e aqui abro parênteses para me congratular com nossas colegas Senadoras, hoje em número de cinco e num futuro próximo, certamente, com maior representação; em 1982, Esther de Figueiredo Ferraz seria a primeira mulher a assumir um ministério - o da Educação; Roseana Sarney, em 1994, se tornaria a primeira governadora de um Estado brasileiro; a escritora Nélida Piñon seria a primeira mulher a presidir a Academia Brasileira de Letras; e em 14 de dezembro último, indicada pelo Presidente Fernando Henrique, Ellen Gracie Northfleet se tornaria a primeira mulher ministra do Supremo Tribunal Federal, órgão máximo do Poder Judiciário.

Essas datas, Sras. e Srs. Senadores, são emblemáticas de uma evolução contínua, que se manifesta cotidianamente no mercado de trabalho, na vida familiar e na esfera política.

Na comemoração ao Dia Internacional da Mulher, fica evidente que temos muitos motivos para festejar, visto que a mulher, a cada dia, dá novos e importantes passos no caminho de sua plena realização. De outro lado, é forçoso reconhecer que ainda resta muito a trilhar para que essa obra de grande envergadura, que é a emancipação feminina, se complete, rendendo bons frutos não apenas para as mulheres, mas para toda a sociedade que sonha com o pluralismo democrático e com a fraternidade universal.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/03/2001 - Página 2776