Discurso durante a 25ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

REGISTRO DE ESTUDO REALIZADO PELA VICE-GOVERNADORIA DO CEARA, QUE REAFIRMA AS VANTAGENS DA FORMAÇÃO DE CLUSTERS - EMPRESAS QUE INTEGRAM SUA PRODUÇÃO POR MEIO DA INSTALAÇÃO DE FABRICAS NUM MESMO ESPAÇO GEOGRAFICO.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INDUSTRIAL.:
  • REGISTRO DE ESTUDO REALIZADO PELA VICE-GOVERNADORIA DO CEARA, QUE REAFIRMA AS VANTAGENS DA FORMAÇÃO DE CLUSTERS - EMPRESAS QUE INTEGRAM SUA PRODUÇÃO POR MEIO DA INSTALAÇÃO DE FABRICAS NUM MESMO ESPAÇO GEOGRAFICO.
Publicação
Publicação no DSF de 31/03/2001 - Página 4527
Assunto
Outros > POLITICA INDUSTRIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, ESTUDO, INICIATIVA, BENI VERAS, VICE-GOVERNADOR, ESTADO DO CEARA (CE), AUTORIA, ALFREDO LOPES, ENGENHEIRO, ASSESSOR, ASSUNTO, EVOLUÇÃO, INDUSTRIA, POSTERIORIDADE, GLOBALIZAÇÃO, OCORRENCIA, INTEGRAÇÃO, EMPRESA, BENEFICIO, COMPETIÇÃO INDUSTRIAL.
  • ANALISE, VIABILIDADE, INDUÇÃO, PODER PUBLICO, FORMAÇÃO, COOPERATIVA, INDUSTRIA, REGISTRO, EXPERIENCIA, ESTADO DO CEARA (CE).

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (Bloco/PSDB - CE ) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho acusar o recebimento de um estudo realizado pela Vice-Governadoria do Ceará; portanto, por iniciativa de nosso ex-Colega aqui no Senado Federal, o competente Vice-Governador do Ceará Beni Veras. O estudo foi escrito pelo engenheiro-agrônomo Alfredo Lopes, assessor do Vice-Governador, e trata de um assunto microeconômico e empresarial da maior importância para o desenvolvimento, que é a formação dos chamados clusters.1

É interessante o rumo a que vão levando as transformações no mundo da produção. Por um lado, as fronteiras econômicas dos estados-nação vão ficando cada vez mais permeáveis, as estratégias de produção contemplam não mais os mercados locais, mas o mercado mundial, e isso tanto para a escolha de fornecedores quanto para a de mercados consumidores.

Uma planta industrial da Hewllet Packard, na Califórnia, por exemplo, fica cada vez mais parecida com uma espécie de maquiladora, de mera linha de montagem de componentes importados. Na montagem de determinado produto, digamos uma impressora para computador, chegam peças da Tailândia, da Polônia, da Coréia do Sul, do México, fabricadas ou por unidades fabris da própria Hewllet Packard nesses países ou de fornecedores associados, não importa. Essas peças são juntadas, monta-se a impressora e daí é exportada para o mundo todo. Outro exemplo, mais perto de nós, é de nossa empresa fabricante de jatos, de enorme sucesso no mundo empresarial, a Embraer. Parte do êxito da Embraer em manter preços competitivos advém do fato de que trabalha com vários componentes importados, isto é, compra onde o bom é mais barato. Assim, por exemplo, o modelo de jato ERJ 145s traz as asas da Espanha, o estabilizador vertical do Chile, a parte traseira da fuselagem da Bélgica, e o interior da cabine dos Estados Unidos.2

É por isso, por essa globalização da produção, necessária para a competitividade das empresas, que não mais faz sentido a nostalgia que alguns ainda sentem do tempo em que o Brasil se protegia do resto do mundo mediante altas tarifas de importação. Hoje, se tivéssemos as altas tarifas que já ostentamos no passado, uma empresa como a Embraer não poderia existir.

Mas o ponto ao qual queria chegar é que, se, por um lado, os mercados se expandem para abarcar o mundo como um todo, atravessando as fronteiras dos estados nacionais; por outro lado, reafirmam-se as vantagens competitivas de empresas que integram sua produção, num mesmo setor econômico, por meio da instalação de suas plantas fabris num mesmo espaço geográfico. São os chamados clusters. Essa forma de organização, em conglomerado cooperativo no mesmo espaço geográfico, é especialmente vantajoso para médias e pequenas empresas, que assim podem usufruir de economias de escala às quais não teriam acesso caso estivessem produzindo isoladamente.

A proximidade geográfica e a cooperação entre empresas de um mesmo ramo da economia maximiza fatores competitivos que são, cada vez mais, valorizados pelo mundo empresarial. Por exemplo, o relacionamento estreito entre empresas e fornecedores; a motivação adicional advinda de pertencer a um mesmo espaço cultural, via de regra com uma cultura empresarial comum; a facilidade maior para formar parcerias em que se compartilham riscos, custos de produção, inclusive custos de treinamento para a mão-de-obra. Em suma, duas palavras talvez pudessem sintetizar a importância dos clusters: cooperação e complementaridade. Digamos assim que um cluster é uma espécie de cooperativa industrial.

O estudo da Vice-Governadoria do Ceará apresenta também uma informação promissora: a de que o prazo de maturação de um cluster, que era, em média, de uns 50 anos na primeira metade do século, prazo necessário para que atingisse seu apogeu; esse prazo hoje está bastante reduzido. Fica aí por volta de uns 10 anos.

Enfim, embora nem sempre a formação de um cluster possa ser totalmente induzido pelo Poder Público, quando não há pelo menos um embrião de atividade econômica em determinada região, -- e essa limitação o estudo também aborda, -- o fato é que a criação de incentivos e condições institucionais para o surgimento de clusters, em especial em regiões deprimidas economicamente, pode ser estratégia altamente válida e profícua para deslanchar o desenvolvimento. Ainda mais porque, como disse há pouco, a formação de clusters são altamente vantajosas para médias e pequenas empresas. E também para microempresas, para empresas familiares, é claro.

No Ceará, o estudo cita um exemplo de cluster induzido pelo Estado, por meio de compras governamentais. É o cluster de moveleiros do povoado de São João do Araru, no Município de Morada Nova.

São João do Araru é uma localidade que, em 1987, já contava com antiga tradição, por parte da mão-de-obra local, em trabalhar bem a madeira. Lá existiam também três serrarias. Assim, quando a Secretaria de Indústria e Comércio do Ceará teve a idéia de encomendar carrinhos de mão feitos de madeira, em vez de importá-los do Sudeste e do Sul, para servir às frentes de trabalho que ocorriam na região em função da seca, encontrou em São João do Araru já um embrião de atividade econômica nessa especialidade. Devido às encomendas de carrinhos de mão de madeira, as serrarias de São João do Araru passaram de três para cinco. Quando a atividade declinou por conta do fim das frentes de trabalho, a Prefeitura de Fortaleza, em 1989, encomendou à associação de produtores de São João do Araru carteiras escolares, e a atividade voltou a crescer. O SEBRAE teve relevante participação no processo, orientando os produtores. Com pouco tempo, o cluster de moveleiros foi-se sofisticando e passou a fabricar outros produtos, como móveis rústicos para casas de praia, hotéis, pousadas e restaurantes, diminuindo sua dependência das compras do governo. O processo de produção especializou-se: alguns produtores extraíam a madeira; outros faziam seu beneficiamento inicial; outros faziam os móveis. A cooperação e a complementação fizeram dos produtores moveleiros de São João de Araru um verdadeiro cluster. Infelizmente, segundo o estudo, o cluster moveleiro de São João do Araru regrediu nos últimos anos, em razão das ações legais de antigos fornecedores moveleiros do Sul do País, que alegaram que o Governo do Estado do Ceará havia dispensado licitação para adquirir o mobiliário do cluster local, configurando, de acordo com eles, concorrência desleal.

Existe outro estudo sobre clusters elaborado por técnica do Banco do Nordeste do Brasil,3 que é citado no estudo que venho comentado, e que faz um mapa do Estado do Ceará, localizando a viabilidade de potenciais clusters em função de atividades preexistente. Assim é que são identificadas cinco áreas do Estado nas quais haveria condições de se desenvolver clusters nos setores de ourivesaria e bijuteria; de metalurgia; de couro de bovinos, calçados e artefatos; de couro de caprinos, calçados e artefatos; e de construção e manutenção de embarcações, beneficiamento de peixes, crustáceos, industrialização de algas e fabricação de artefatos para pesca. Esta aí uma possibilidade a ser explorada para o desenvolvimento do Ceará, por meio da indução realizada pelo Poder Público.

Termino aqui minha intervenção de hoje na tribuna, lembrando que já temos, no Brasil, casos de clusters de muito êxito, inclusive êxito exportador, como é o conhecido cluster no setor de calçados existente no Vale dos Sinos, Rio Grande do Sul. Lá são pequenas empresas, muitas delas familiares, que, por meio da cooperação e da complementação de atividades, fazem daquela uma história de sucesso. Por que não dispor de associações de produtores desse tipo em outros lugares do País?

Portanto, -- esta é a conclusão a que quero chegar ao final deste discurso, -- a alternativa da organização em clusters deve ser contemplada pelos formuladores de políticas públicas indutoras de desenvolvimento e de geração de renda, em diversas comunidades por este Brasil afora. É alternativa moderna, eficiente, que pode trazer muito bons resultados em nossa luta pelo desenvolvimento.

Mais uma vez, dou meus parabéns à Vice-Governadoria do Ceará, na pessoa do ex-Senador Beni Veras, por estar chamando a atenção do Poder Público para esse fértil campo a ser explorado.

Era o que tinha a dizer.

      NOTAS:

           1 LOPES NETO, Alfredo. Alguns exemplos e reflexões sobre clusters no Brasil. Vice-Governadoria do Ceará e SEBRAE/FUNCAP, Fortaleza, 2001, mimeo.

           2 THEIR ORDER BOOKS ARE BULGING AND THEY ARE LAUNCHING EVER MORE MODELS. HOW HIGH CAN REGIONAL JET MAKERS FLY? The Economist, reportagem transcrita pela Agência Reuters, 17.03.01, internet.

           3 AMORIM, Mônica Alves. CLUSTERS como estratégia de desenvolvimento industrial do Ceará. Banco do Nordeste, Fortaleza, 1998.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/03/2001 - Página 4527