Discurso durante a 63ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

DEFESA DA APROVAÇÃO DO PROJETO DE LEI DO SENADO 60, DE 2000, QUE ALTERA O ARTIGO 1 DA LEI 8.072, DE 25 DE JUNHO DE 1990, PARA INCLUIR NA RELAÇÃO DE CRIMES HEDIONDOS OS CRIMES SEXUAIS CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES.

Autor
Carlos Patrocínio (PFL - Partido da Frente Liberal/TO)
Nome completo: Carlos do Patrocinio Silveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO PENAL.:
  • DEFESA DA APROVAÇÃO DO PROJETO DE LEI DO SENADO 60, DE 2000, QUE ALTERA O ARTIGO 1 DA LEI 8.072, DE 25 DE JUNHO DE 1990, PARA INCLUIR NA RELAÇÃO DE CRIMES HEDIONDOS OS CRIMES SEXUAIS CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES.
Publicação
Publicação no DSF de 01/06/2001 - Página 10912
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO PENAL.
Indexação
  • GRAVIDADE, VIOLENCIA, VITIMA, CRIANÇA, ADOLESCENTE, ESPECIFICAÇÃO, EXPLORAÇÃO SEXUAL, REGISTRO, JULGAMENTO, BRASIL, ORGANISMO INTERNACIONAL, VIOLAÇÃO, DIREITOS, INFANCIA.
  • JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, CARACTERIZAÇÃO, CRIME HEDIONDO, EXPLORAÇÃO SEXUAL, MENOR.

O SR. CARLOS PATROCÍNIO (PFL - TO) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho a esta tribuna tratar de uma matéria que pertence ao rol daqueles temas, relacionados à natureza humana, que causam perplexidade e revolta, mas que precisam ser enfrentados sem complacência e a respeito dos quais a sociedade deve manifestar-se de modo contundente, de forma a não deixar dúvida quanto ao repúdio e à indignação que causam.

            Agredir uma criança é um ato tão abominável que não encontra tolerância nem mesmo no submundo do crime. Os presídios têm celas especiais para assassinos ou violentadores de menores. Se o agressor tiver um laço de sangue com a vítima, sua chance de sobrevivência na cadeia diminui inapelavelmente. Criminosos desse tipo costumam ser minoria, mas isso não significa que as crianças brasileiras estejam livres de atrocidades cometidas pelo pai, padrasto, tia ou avó. Estatísticas americanas indicam que, em todo o mundo, pelo menos 1% da população de crianças e adolescentes de cada país sofre algum tipo de violência doméstica. No Brasil, que tem quase 50 milhões de crianças até 14 anos, isso significa 500.000 casos ao ano. Ou quase um por minuto. Estima-se que, em 70% dos casos, o agressor seja mãe ou pai biológico. Em 90% dos casos, a violência acontece dentro de casa. Nos casos de abuso físico, 60% são praticados pela mãe ou madrasta. Em abusos sexuais, mais de 90% dos registros trazem o padrasto ou o pai como acusado.

Essa forma de violência - o abuso sexual - é a mais terrível, Srªs e Srs. Senadores, pois nem sempre é evidente. Os sinais da violência física normalmente são aparentes e acabam por denunciar a condição do violado. O mesmo não acontece com o abuso sexual. Convencer uma criança a contar sua história de sofrimento é um trabalho que exige delicadeza, paciência e determinação. Há quem passe toda uma vida escondendo da mãe, dos irmãos, do marido e dos filhos a violência que sofreu ainda na infância. A maioria rompe esse ciclo ao chegar à adolescência, quando o abuso já vem sendo praticado há vários anos. Por outro lado, nem sempre a criança encontra apoio e proteção. É comum que seu primeiro depoimento seja encarado com desconfiança e incredulidade. Alguns casos são tão inacreditáveis que levam a essa atitude.

A revista Veja, em sua edição de 15 de março, em reportagem sobre a violência contra crianças, relata o caso de Aline. Aline tem apenas 7 anos. Aos 6, enfrentou um demorado interrogatório. Sozinha, em depoimento a dois promotores e um juiz de menores do Rio de Janeiro, contou em detalhes como seu pai a dopava com tranqüilizantes e, no banco traseiro de um carro, dava início a uma interminável sessão de sevícias sexuais.

Trouxe a plenário esse exemplo escabroso para melhor fundamentar a pergunta que lhes quero fazer, Srªs e Srs. Senadores, haverá, no mundo, alguma ação criminosa que, mais que essa, faça jus à rotulação de “hedionda”?

Se entendemos como crimes hediondos aqueles que ferem, de maneira cruel e violenta, a integridade da pessoa humana e que desrespeitam os mais elementares princípios da convivência em sociedade, e que, portanto, são inafiançáveis e insusceptíveis de graça ou anistia, não podemos ignorar a natureza torpe dos crimes sexuais cometidos contra crianças e adolescentes.

Não podemos ignorar, também, que a incidência desse tipo de crime tem aumentado assustadoramente no País, atingindo todas as classes sociais e diversificando suas formas de manifestação.

No final do ano passado, acompanhamos estarrecidos, uma ação, do Ministério Público do Rio de janeiro, de repressão à pedofilia na Internet, que ganhou o nome de “Catedral Rio”, em alusão à operação internacional realizada no ano passado pela Interpol em 12 países do mundo, que apreendeu os equipamentos de 27 usuários da rede mundial, no Rio, que a usavam para troca de imagens pornográficos de crianças e adolescentes. Entre os suspeito estão médicos, estudantes de medicina, geólogos, contadores, empresários e até um pastor evangélico. As imagens divulgadas por meio da rede eram tão chocantes que deixaram a equipe do Ministério Público impressionada: algumas crianças, que aparecem fazendo sexo com adultos, aparentam ter menos de 5 anos!

Cresce, também de forma assustadora, a exploração da prostituição infantil. A situação chegou a tal ponto que, diariamente, se vêem publicadas nos classificados dos jornais anúncios de programas que oferecem, claramente, menores para a prática sexual.

São muitas, variadas e complexas as razões que contribuíram para o aumento da exploração e da violência sexual cometidas contra crianças e adolescentes em nosso País. Vão desde o empobrecimento da maioria da nossa população até a impossibilidade de a legislação brasileira acompanhar os avanços tecnológicos alcançados nos últimos anos, deixando fora de controle os chamados crimes “virtuais”.

Em razão desse quadro, os organismos internacionais têm destacado o Brasil como violador dos direitos da infância.

Conforme sentença divulgada pela Ordem dos Advogados do Brasil, seccional de São Paulo, em 22 de março de 1999, o Tribunal dos Povos condenou os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário brasileiros pela violação dos direitos da criança e do adolescente.

Logo, em seguida, o Congresso Nacional aprovou e o Senhor Presidente da República sancionou, transformando na Lei nº 9.975, de 23 de junho de 2000, o Projeto de Lei que acrescenta dispositivo ao Estatuto da Criança e do Adolescente e prevê a pena de quatro a dez anos de reclusão para quem submeter criança ou adolescente à prostituição ou à exploração sexual. Trata-se de um pequeno avanço que não podemos deixar de citar e aplaudir.

Diante da alta incidência de crimes sexuais contra crianças e adolescentes e da gravidade de suas conseqüências não só para os indivíduos atingidos como para o conjunto da sociedade, propomos que a corrupção e o uso de menores, constantes do art. 218 do Código Penal e dos arts. 240 e 241 do Estatuto da Criança passem a constar do rol dos crimes hediondos.

Dessa forma, conclamamos os ilustres Pares para a aprovação do Projeto de Lei nº 60, de 2000, que altera o art. 1º da Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990, para incluir na relação dos crimes hediondos os crimes sexuais contra crianças e adolescentes.

            Não queremos, com isso, lançar mão de um recurso meramente retórico, mas assinalar, de forma contundente, nosso repúdio a práticas moralmente condenáveis, que afetam o desenvolvimento dos indivíduos e que comprometem o convívio social e familiar.

Muito obrigado.

 

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            DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR CARLOS PATROCÍNIO EM SEU PRONUNCIAMENTO, INSERIDO NOS TERMOS DO ART. 210 DO REGIMENTO INTERNO.

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/06/2001 - Página 10912