Discurso durante a 80ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE A HIDROVIA PARAGUAI-PARANA, QUE SERVIRA DE TRANSPORTE FLUVIAL ENTRE MATO GROSSO E MATO GROSSO DO SUL.

Autor
Carlos Bezerra (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MT)
Nome completo: Carlos Gomes Bezerra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE TRANSPORTES. :
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE A HIDROVIA PARAGUAI-PARANA, QUE SERVIRA DE TRANSPORTE FLUVIAL ENTRE MATO GROSSO E MATO GROSSO DO SUL.
Publicação
Publicação no DSF de 28/06/2001 - Página 14313
Assunto
Outros > POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • ANALISE, DESENVOLVIMENTO, HIDROVIA, LIGAÇÃO, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), BENEFICIO, REDUÇÃO, CUSTO, TRANSPORTE, CRESCIMENTO ECONOMICO.
  • NECESSIDADE, REALIZAÇÃO, RELATORIO, IMPACTO AMBIENTAL, PROVA, VIABILIDADE, HIDROVIA.

O SR. CARLOS BEZERRA (PMDB - MT) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em meu Estado, Mato Grosso, vem-se dando uma importante discussão em torno do desenvolvimento da hidrovia Paraguai-Paraná, polêmica que merece a atenção de todo o País. Está em jogo o trecho em que o rio Paraguai pode servir, e já vem servindo, de via de transporte fluvial entre as cidades de Cáceres, no Mato Grosso, e Corumbá, no Mato Grosso do Sul.

Ora, o Pantanal, conhecido no Brasil e internacionalmente, tanto pela sua riqueza como por sua vulnerabilidade ambiental, é patrimônio que interessa aos dois Estados tratar com todo o cuidado, no sentido de preservá-lo. A navegação é fundamental para a atividade econômica da região. Entre as duas necessidades, eu acredito, Senhor Presidente, que é possível, dentro de critérios cuidadosos, atender a ambas. É possível alimentar o progresso, sem destruir o meio ambiente, e desenvolver a hidrovia.

No atual estágio da discussão, examina-se a implantação de um terminal de embarque de soja em Morrinhos, ao sul de Cáceres e situado dentro da área pantaneira. Elabora-se sobre isso um Relatório de Impacto Ambiental - RIMA. O terminal de Morrinhos evitaria o tráfego de comboios de balsas no trecho de mais difícil navegação, onde é maior o atrito entre o fluxo dos comboios e o meio ambiente, isto é, as margens do rio habitadas pela fauna peculiar do Pantanal.

Cabe aqui lembrar, em rápidas palavras, a importância da navegação para o escoamento da produção de soja de Mato Grosso. Meu Estado, o maior celeiro de soja do País, produz, por ano, 9 milhões de toneladas de grãos. Sem a hidrovia, essa produção precisa atravessar, em caminhões, 1.400 quilômetros, até ser embarcada em Porto Velho, Rondônia, para seguir para o norte, via rio Madeira e, depois, rio Amazonas. Um só comboio leve de 6 barcaças transporta, para o sul, para os portos de Corumbá e da Argentina e Uruguai, 6.000 toneladas de grãos, o equivalente à capacidade de transporte de 200 jamantas.

Note-se bem, Sr. Presidente, um só comboio substituindo 200 grandes caminhões, gastando 1/10 do combustível que eles gastam, cortando pela metade o custo de fazer chegar o produto a pontos de embarque para o mercado internacional!

Por esse motivo, já se alimentou para a navegação no rio Paraguai projetos bem mais ambiciosos do que os atuais. Um primeiro programa de desenvolvimento da hidrovia, de 1,2 bilhão de dólares, previa obras ambiciosas de adaptação do rio à navegação. O Banco Interamericano de Desenvolvimento - BID chegou a oferecer financiamento ao projeto. No entanto, a proposta despertou grande resistência dos meios ambientalistas e o BID retirou seu apoio.

Hoje, a sociedade, nos dois estados interessados na hidrovia, apóia a idéia de que o tráfego no rio Paraguai deve ser limitado. A navegação é que tem que se adaptar ao rio e suas peculiaridades. Como de resto já vem se adaptando: comboios de soja já trafegam pelo rio, comboios “magros”, por assim dizer, limitados a barcaças de 1.000 toneladas e a velocidades de 10 quilômetros por hora, adaptadas aos sinuosos canais do rio, às vezes de apenas 30 metros de largura navegável. Isso é bem inferior aos padrões utilizados nas inúmeras hidrovias conhecidas pelo mundo a fora: entre outras, nos Estados Unidos, as do Mississipi, Colúmbia, Ohio, Tenessee; na França, do Sena, do Ródano; na Alemanha, do Reno; na Rússia, do Volga. E dezenas de outras. Nenhum país com a extensão territorial do Brasil pode abrir mão de hidrovias. E nem as pode dispensar Mato Grosso, isolado no coração da América do Sul, longe dos portos de mar, dispondo dos rios de que dispõe. Ainda mais que o transporte fluvial, a rigor, é uma benesse para o meio ambiente, poupador radical que é de combustível fóssil, não renovável e poluidor, que contribui para o efeito estufa. O transporte hidroviário é ambientalmente limpo.

A opção por um tráfego leve no rio Paraguai, no trecho em que ele atravessa o Pantanal, se justifica. Realmente, ali é o tráfego que deve se adaptar às características do rio e da região. Tanto Mato Grosso como Mato Grosso do Sul muito vêm investindo no ecoturismo e na preservação do Pantanal. Efetivamente, ele é uma grande riqueza a preservar. Declarada, no fim do ano passado, Patrimônio Natural da Humanidade, a região abriga 650 espécies de aves e 230 de peixes. É o que há de mais deslumbrante na flora e na fauna brasileiras. Mas é exuberância frágil, dependente da típica alternância pantaneira de seca e de cheias. Os cuidados se justificam.

No entanto, a experiência mostra que a navegação leve, hoje já praticada, não afeta o meio ambiente. E a necessidade econômica se basta com essa navegação limitada. Afinal, mesmo um único comboio de 6.000 toneladas por dia totaliza, num ano, mais de 2 milhões de toneladas, volume substancial e significativo. E os planos envolvendo o terminal de Morrinhos nem vão a tanto: contemplam apenas 1 milhão de toneladas por ano. Mas esses planos demonstram ser indispensável o terminal.

A oposição dos ambientalistas ao terminal de Morrinhos, entretanto, é muito forte. Eles vêm obtendo liminares judiciais que bloqueiam o empreendimento. Ora, a solução, creio, é desenvolver estudos, objetivos e serenos, que levem a um RIMA que sirva de base a decisões sensatas sobre a implantação do terminal.

Os ambientalistas temem que se acabe por instituir, passo a passo e sorrateiramente, um intenso tráfego hidroviário no Pantanal. Eles têm razão no aspecto de que as coisas têm que ser feitas às claras e derivadas de consenso razoável. Por outro lado, os que querem o desenvolvimento econômico e social do Mato Grosso receiam que os estudos do RIMA estejam sendo retardados para que não se chegue a decisão alguma sobre o terminal de Morrinhos. Ora, bloquear os estudos é uma intolerável deslealdade para com o povo de Mato Grosso.

Sr. Presidente, essa discussão deve ser levada às claras e lealmente. Os estudos do RIMA devem ser acelerados pelo Ministério dos Transportes. Se, por um lado, não podemos mais tolerar no Brasil um desenvolvimento que destrua o meio ambiente, não podemos, por outro lado, ser vítimas de uma paralisia social imposta por uma espécie de fundamentalismo religioso.

Estou convencido, Sr. Presidente, de que podemos ter, simultaneamente, progresso e respeito pelo meio ambiente. Esse, certamente, haverá de ser o caso da navegação fluvial no rio Paraguai, no trecho que atravessa o Pantanal. Muito obrigado!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/06/2001 - Página 14313