Discurso durante a 87ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

HOMENAGEM DE PESAR PELO FALECIMENTO DO ESCRITOR JORGE AMADO, OCORRIDO ONTEM, EM SALVADOR/BA.

Autor
Lauro Campos (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Lauro Álvares da Silva Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • HOMENAGEM DE PESAR PELO FALECIMENTO DO ESCRITOR JORGE AMADO, OCORRIDO ONTEM, EM SALVADOR/BA.
Publicação
Publicação no DSF de 08/08/2001 - Página 15888
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, JORGE AMADO, ESCRITOR, ESTADO DA BAHIA (BA).

O SR. LAURO CAMPOS (Bloco/PDT - DF. Para encaminhar a votação. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, hoje posso falar pelo meu Distrito Federal, porque os meus outros dois companheiros, representantes de Brasília, aqui não se encontram. Posso também falar em nome do meu Partido, o PDT, Partido que me recebeu com tanto carinho, Partido onde eu me sinto tão bem.

Eu gostaria de poder chorar uma lágrima maior, mas a minha modéstia só produz, como tudo o que sai de mim, coisas pequenas. Se pudesse, eu choraria lágrimas mais grossas. Jorge Amado foi, para mim, a surpresa de quem encontra um outro mundo. Mineiro, e mineirão mesmo, cheio de preconceitos e de limitações, respeitador de tabus, contra os quais iria lutar depois, saí, uma vez, quando não era comum esse turismo, para conhecer a Bahia. E o fiz, escutando o chamamento de alguém com quem nunca pessoalmente convivi: Jorge Amado. Foi ele quem me despertou a curiosidade pela Bahia. Eu queria sentir o cheiro, ver as cores, sentir a euforia espontânea da Bahia. Eu queria conhecer um outro dia de religiosidade que não fossem aqueles dias tristes da velha Vila Rica, da nossa Ouro Preto, encapuzada, entristecida, silente e ensimesmada. Lá na Bahia, conheci um outro conteúdo do catolicismo. Que beleza um Finados na Bahia! Que beleza um janeiro, quando o povo lava a escadaria como se estivesse lavando a sua própria alma!

Fiquei lá em Itapoã trinta inesquecíveis dias, reconhecendo aquilo que Jorge Amado já havia, com a magia de seu espírito e com a agilidade de sua pena, transformado em curiosidade insopitável.

Jorge Amado não poderia deixar de ser socialista, não poderia deixar de ser comunista. Mas, quando ele o foi - e foi deputado pelo Partido Comunista, deputado cassado -, ao deparar com a rigidez, com as paredes frias, com as informações longínquas daquilo que estava acontecendo, por exemplo, no dito socialismo real, na União Soviética, a sensibilidade humana de Jorge Amado não poderia ser engaiolada dentro da rigidez daqueles princípios e daquela prática em grande parte desumana.

De modo que a sua humanidade, o seu socialismo humano, a sua visão de um futuro digno do homem, amplo, livre, em que a liberdade realmente fosse a liberdade de alimentar, de fazer sexo, de amar, de se entusiasmar, em que a liberdade fosse a liberdade política da expressão, sem peias, essas liberdades que sempre animaram Jorge Amado não encontraram, e não poderiam encontrar, espaço, não poderiam respirar dentro do Partido Comunista Brasileiro, no qual entrou e do qual foi um militante. Obviamente um militante constrangido, um militante menor, não tão grande quanto foi em outros domínios em que a liberdade para o seu espírito, para a sua criação, se mostrava infinita.

Agradeço o espaço que me foi dado. Eu estava ali, disposto a escutar os importantes e sensíveis pronunciamentos que me antecederam, mas não poderia deixar de dizer essas palavras.

Penso que, no final deste mundo encantado de Jorge Amado, ele se transformou em um de seus personagens. Será que não foi Jorge Amado que, rodeado de seus amigos cachaceiros que foram assistir ao seu funeral, levantou-se de seu caixão e saiu por aí, brincando de baiano, engrandecendo a Bahia e o Brasil?

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/08/2001 - Página 15888