Discurso durante a 96ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

HOMENAGEM A MAÇONARIA BRASILEIRA PELO DIA DO MAÇOM.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PFL - Partido da Frente Liberal/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • HOMENAGEM A MAÇONARIA BRASILEIRA PELO DIA DO MAÇOM.
Publicação
Publicação no DSF de 21/08/2001 - Página 17425
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, DIA NACIONAL, MAÇONARIA, ELOGIO, CONTRIBUIÇÃO, HISTORIA, BRASIL.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores; Sr. Grão-Mestre-Geral do Grande Oriente do Brasil, Sr. Laelson Rodrigues; Sr. Presidente da Confederação da Maçonaria Simbólica do Brasil e Grão-Mestre da Grande Loja de Brasília, Sr. Kalil Chater; Sr. Samir Hatem, Grão-Mestre do Grande Oriente Estadual de Roraima, através do qual saúdo todos os Grãos-Mestres Estaduais do Grande Oriente do Brasil; Sr. Kildo Albuquerque Andrade, Grão-Mestre da Grande Loja de Roraima, na pessoa de quem quero saudar todos os Grãos-Mestres das Grandes Lojas de todos os Estados do Brasil; Veneráveis-Mestres e demais autoridades maçônicas presentes; quero iniciar as minhas palavras agradecendo ao Grande Arquiteto do Universo, que é Deus, pela oportunidade que nos concede de estarmos aqui hoje reunidos para homenagear a Maçonaria Brasileira.

Como Maçom, filho de Maçom e pai de Maçom, sinto-me um privilegiado por já pertencer à sublime Ordem Maçônica há três gerações. Mais satisfação ainda de ter o requerimento de minha autoria e de outros Srs. Senadores sido aprovado pelo Plenário da mais alta Casa Legislativa do País, por unanimidade, o que demonstra o respeito que o Senado tem pela maçonaria, para neste dia registrarmos as homenagens a uma Instituição que no passado e no presente muito tem contribuído para forjar cidadãos justos e operosos na busca de promover o soerguimento da humanidade.

Ao se aproximar mais um Sete de Setembro, é natural que reflitamos sobre nossa trajetória de País independente, de uma Nação que se esforça por se constituir plenamente. Passados cento e setenta e nove anos daquele ato histórico de D. Pedro I - um Maçom -, nunca é demais buscar compreender como o conseguimos e o que fomos capazes de edificar ao longo de todo esse tempo.

Por certo que muito há o que celebrar, sendo inúmeras as conquistas a serem comemoradas. De igual modo, presente está em todos nós a nítida consciência acerca do muito que há de ser feito. Com efeito, vencemos o enorme desafio de manter a integridade territorial do Brasil, quando a fragmentação foi a tônica de nossos co-irmãos latino-americanos. Conseguimos promover o milagre da miscigenação, sendo, ainda hoje, um País conhecido pela maneira aberta e fraterna com que recebe imigrantes de todas as partes do mundo.

Mais: com todos os falares que singularizam cada uma de nossas regiões, fizemos da língua portuguesa o grande instrumento a nos congregar, a nos fazer sentir um só povo, uma só nacionalidade. Pela força de nossa gente, de sua extraordinária capacidade de produzir e de transformar riquezas, chegamos ao limiar do Século XXI como uma das maiores economias do mundo.

Nada disso, certamente, cega nossos olhos em relação às inúmeras deficiências que ainda nos cercam. A lembrança de milhões de compatriotas vivendo em condições deploráveis, ao lado de índices sofríveis nos campos da educação, da saúde, da habitação e dos transportes, entre outros, é alerta permanente para que prossigamos na tarefa iniciada há quase dois séculos, carregando conosco a certeza de que a construção de uma nação, como a que todos sonhamos, não é trabalho simples e há de ser sempre ação coletiva, solidária.

Esse é, sem dúvida, o grande legado que nos deixaram homens e instituições que levaram às últimas conseqüências seu desejo de ver o Brasil livre, soberano, liberto de quaisquer amarras coloniais. Homens e instituições que não temeram correr os mais pesados riscos em busca da emancipação do Brasil em face do domínio metropolitano. E, quando se fala desse tipo de ação destemida, na qual a própria vida estaria em jogo, tendo por objetivo único e exclusivo a independência da Pátria, ninguém, absolutamente ninguém, teve participação mais ativa e decisiva do que a Maçonaria Brasileira.

Impossível, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, imaginar a História do Brasil sem a presença maiúscula das sociedades maçônicas em sua evolução. Fortemente organizada na Europa ao longo do século XVIII, não por acaso o “Século das Luzes”, a Maçonaria colocou-se na linha de frente da luta contra os regimes absolutistas e, com isso, foi decisiva para a derrubada do “Antigo Regime” e o advento do mundo contemporâneo. Liberdade, Igualdade e Fraternidade: eis o norte a guiar seus passos na conquista de um tempo novo, a sepultar governos autoritários e as mais variadas manifestações de intolerância.

Foi esse espírito libertário que, ainda no século XVIII, chegou ao Brasil, então Colônia portuguesa. Seguramente, a penetração em terras brasileiras das associações maçônicas deveu-se, em larga medida, à ação de jovens brasileiros que freqüentavam universidades européias, especialmente a Faculdade de Medicina de Montpellier, reconhecida como um dos principais pólos maçônicos franceses. O certo é que, quando se pensa em movimentos comprometidos com a ruptura dos laços de dominação metropolitana sobre o Brasil, como as foram as Conjurações Mineira, de 1789, Carioca, de 1794, e Baiana, de 1798, em todos eles o ideário de liberdade propugnado pela Maçonaria esteve presente.

A partir da transferência do Estado português para o Brasil, coordenado e executado com o apoio do Grande Oriente Lusitano, em 1808, aprimoram-se as condições para a independência. Uma vez mais a Maçonaria assume posição de destaque, como se vê na Revolução Pernambucana de 1817: dos trezentos e dezessete réus levados a julgamento por envolvimento na insurreição, sessenta e dois eram formalmente acusados de serem maçons. E afirma-se que, naquele momento, D. João, ao receber a lista com esses sessenta e dois maçons, teria assim se manifestado: “Foram esses que me salvaram”.

Historiadores atestam que, por essa época, a Maçonaria, contando em seus quadros com professores, funcionários públicos, comerciantes, fazendeiros e padres, identificava-se plenamente com o contexto de luta que empreendia em prol da emancipação política do Brasil. Tendo em Pernambuco, Bahia e Rio de Janeiro seus mais importantes focos de atuação, a Maçonaria fazia o papel de principal divulgadora na Colônia nos princípios iluministas, vale dizer, das teses liberais e libertadoras. Não por outra razão, seriam constantes as perseguições aos maçons, identificados por sua atuação nos movimentos revolucionários de cunho emancipacionista.

De igual modo, Sr. Presidente, foi vital a presença maçônica na evolução dos acontecimentos que tiveram no 7 de Setembro de 1822 sua culminância. Lembro, a propósito, entre outros notáveis personagens, a figura ímpar de Joaquim Gonçalves Ledo, Venerável da Loja Comércio e Artes do Rio de Janeiro, não apenas agindo decisivamente para que a independência ocorresse, mas elaborando um projeto nacional para o Brasil, essencialmente, liberal e republicano. O crescimento do movimento maçônico no Brasil, no início dos anos 1820, foi tão acentuado que o próprio Príncipe Regente Dom Pedro nele ingressou, chegando a ser o seu o grão-mestre, com o nome de Guatimozim, tendo assumido o compromisso da independência do Brasil numa sessão maçônica no dia 20 de agosto, poucos dias antes da data pública e formal do famoso Grito do Ipiranga.

Independentemente de opiniões divergentes no interior da Maçonaria - Gonçalves Ledo e José Bonifácio, o “Patriarca da Independência”, por exemplo, tinham visões distintas de como se deveria organizar o Brasil pós-emancipação -, o certo é que a sociedade maçônica se constituiu, naquele momento, no centro da mobilização e de união das diversas forças políticas comprometidas com a independência. A esse respeito, vale lembrar que o mais importante jornal engajado na luta emancipacionista, o Revérbero Constitucional Fluminense, tinha como redatores os maçons Januário da Cunha Barbosa e o já citado Gonçalves Ledo.

Fortemente perseguida no reinado de D. Pedro I, paradoxalmente, por não concordar com muitos atos do Imperador, a Maçonaria brasileira ressurge, na década de 1830, no quadro da aguda crise que culminou na abdicação do Imperador e que se prolongou na sucessão de revoltas que, explodindo nas mais variadas regiões do País, deu o tom do período regencial.

À medida que o século XIX avançava, passado o período mais crítico das divergências internas, expressas na coexistência de duas grandes Ordens, a Maçonaria passou a ser o alvo de poderosos ataques de uma Igreja Católica que se tornava acentuadamente conservadora, ultramontana, apesar de existirem inúmeros padres no seio da Maçonaria. Na raiz desse confronto, em que a Maçonaria assume claramente sua vocação de defensora do racionalismo e da liberdade de consciência, estava a “Questão Religiosa” ou, mais apropriadamente, a “Questão Episco-maçônica”, primeira grande fissura a fazer ruir o edifício da Maçonaria. Assim, tal como ocorrera no movimento da independência, a Maçonaria se antecipava no esforço de se instituir no País o regime republicano, identificado como absolutamente necessário à vitória do progresso, do racionalismo, do liberalismo e da liberdade religiosa e não do monopólio de uma única religião estatal.

Nesse período, outro grande feito da Maçonaria se tornaria realidade: foi a abolição da escravidão no nosso País. Todos os grandes abolicionistas foram maçons, desde Feijó, em 1834, até José do Patrocínio. Castro Alves, o cantor dos escravos, ao lado de Rui Barbosa, em São Paulo, também eram maçons. O movimento abolicionista apresenta, em seu meio século de lutas, os seguintes marcos luminosos, todos liderados por maçons:

1 - Padre Antonio Feijó, em 1831;

2 - Lei Eusébio de Queiroz, de 4 de setembro de 1850, extinguindo o tráfico de escravos;

3 - Projeto maçônico de Rui Barbosa, na Loja América, de São Paulo, em 4 de abril de 1870;

4 - Lei Visconde do Rio Branco, de 28 de setembro de 1871, Lei do Ventre Livre;

5 - Fundação da Confederação Abolicionista, no Rio de Janeiro, em 1883;

6 - O Ceará e o Amazonas libertam os escravos de seus territórios em 1884; Lei Saraiva - Cotegipe, de 28 de setembro de 1885, Lei do Sexagenário;

7 - O Clube Militar diz, em 1887, à Princesa Isabel, que o Exército não mais aprisionaria escravos foragidos;

8 - A Lei Áurea, de 13 maio de 1888, dia de domingo. Era presidente do Conselho João Alfredo Correia de Oliveira, também maçon.

Ao encerrar essa breve análise, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ilustres autoridades maçônicas, meus irmãos, meus senhores e minhas senhoras, ressalto a capacidade demonstrada pela maçonaria brasileira ao longo de todo o período republicano, de transformar-se, acompanhando a marcha do tempo e as características inovadoras da modernidade. Entre essas transformações, parece-me essencial a multiplicação do número de lojas pelo País afora e uma espécie de “federalização” da instituição. Enquanto, no Império, a capital, o Rio de Janeiro, praticamente monopolizava a ação da Maçonaria; na República, ela fortalece-se nas mais distintas Unidades da Federação. Do Caburaí, em Roraima, o ponto extremo norte do País, ao Chuí, o extremo sul brasileiro, no Rio Grande do Sul; das nascentes do Rio Moa, na Serra da Cantamana, no Acre, ponto extremo oeste, à Ponta do Seixas, na Paraíba, ponto extremo leste do Brasil, a Maçonaria está presente, alerta e atuante.

Mas, acima de tudo, a Maçonaria soube atravessar a História do Brasil - História que, aliás, ela tanto ajudou a construir - e chegar aos nossos dias com invejável coerência. Seus sacrossantos princípios, assentados na verdade, na justiça, na liberdade, na fé em Deus e na capacidade criadora dos homens, no amor e na proteção à família, na intransigente defesa da Pátria, permanecem intactos e rijos.

É isso que a faz atemporal. É isso que a torna insubstituível.

Muito obrigado. (Palmas)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/08/2001 - Página 17425