Discurso durante a 98ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

COMEMORAÇÃO DOS 40 ANOS DO MOVIMENTO LEGALIDADE, QUE GARANTIU A POSSE DO VICE-PRESIDENTE JOÃO GOULART APOS A RENUNCIA DO PRESIDENTE JANIO QUADROS. TRANSCURSO, NO PROXIMO DIA 24, DOS 47 ANOS DA MORTE DO EX-PRESIDENTE GETULIO VARGAS.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA NACIONAL. HOMENAGEM.:
  • COMEMORAÇÃO DOS 40 ANOS DO MOVIMENTO LEGALIDADE, QUE GARANTIU A POSSE DO VICE-PRESIDENTE JOÃO GOULART APOS A RENUNCIA DO PRESIDENTE JANIO QUADROS. TRANSCURSO, NO PROXIMO DIA 24, DOS 47 ANOS DA MORTE DO EX-PRESIDENTE GETULIO VARGAS.
Publicação
Publicação no DSF de 23/08/2001 - Página 18189
Assunto
Outros > POLITICA NACIONAL. HOMENAGEM.
Indexação
  • COMENTARIO, HISTORIA, BRASIL, MOVIMENTAÇÃO, INICIATIVA, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), GARANTIA, POSSE, JOÃO GOULART, VICE-PRESIDENTE DA REPUBLICA, EPOCA, RENUNCIA, JANIO QUADROS, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, DEFESA, ESTADO DEMOCRATICO, ANALISE, ATUAÇÃO, LEONEL BRIZOLA, EX GOVERNADOR, FORÇAS ARMADAS, CONGRESSISTA, IMPLANTAÇÃO, PARLAMENTARISMO, INDICAÇÃO, TANCREDO NEVES, PRIMEIRO-MINISTRO, IMPORTANCIA, MOBILIZAÇÃO, SOCIEDADE CIVIL.
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE MORTE, GETULIO VARGAS, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, COMENTARIO, HISTORIA, BRASIL, ELOGIO, IDONEIDADE, VIDA PUBLICA.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, pela coincidência das datas, falarei sobre dois momentos históricos do Brasil contemporâneo.

Comemoramos os quarenta anos da Legalidade, movimento nascido no Rio Grande do Sul, tendo à frente o então Governador Leonel Brizola, que garantiu a posse de João Goulart na Presidência da República. Após a renúncia de Jânio Quadros - a qual, no dia 25, completa mais um aniversário -, os Ministros militares empossaram o Sr. Mazzilli na Presidência e determinaram o impedimento de João Goulart de assumi-la. Esse movimento, chamado Legalidade, foi um dos episódios mais épicos, mais bonitos e mais dignificantes da História brasileira. Foi um desses momentos em que, na luta pela democracia, esta saiu vencedora. Lamentavelmente, nestes últimos cento e tantos anos, vivemos tão poucos períodos de democracia, entrecortados de tantos períodos de arbítrio e de violência.

Coincidentemente, no dia 24 de agosto, comemoramos os quarenta e sete anos do suicídio do Presidente Getúlio Vargas, da sua derrubada e do Golpe Militar de 1954, que se repetiria dez anos depois, com a derrubada de Jango, em 1964.

A vitória de Jânio Quadros empolgou o Brasil. Eu não votei nele. Eu era um jovem Vereador do PTB de Caxias de Sul e votei no candidato do meu Partido, o General Lott. Mas votei com a alma dolorida, porque me parecia que Jânio Quadros empolgava pela sua cultura, pela sua capacidade, pela sua competência.

Votei no velho General. Sete meses depois, o impacto da renúncia de Jânio Quadros. Até hoje os historiadores não conseguiram encontrar a verdade histórica da sua renúncia. Particularmente, acho que o seu secretário particular cometeu um gesto de incompetência política a toda prova. Jânio Quadros, dizem alguns, um pouco alcoolizado, ou não - não sei -, entregou a carta de renúncia ao seu secretário, que veio ao Senado e a entregou ao Presidente da Casa. Aquela carta de renúncia do Presidente Jânio Quadros poderia servir de instrumento para sei lá o quê, mas o seu secretário particular nunca poderia tê-la entregado ao Presidente do Senado, que reuniu o Congresso, leu-a e considerou vaga a Presidência da República. Foi uma surpresa. O Brasil inteiro, boquiaberto. Como João Goulart, que era o Vice-Presidente da República, estava em viagem oficial à China, os três ministros militares - com a maior cara de pau - argumentaram que Jango não reunia as condições para ser Presidente da República e deram posse ao Presidente da Câmara dos Deputados. Parecia mais um golpe, tão tradicional, tão clássico como o que aconteceu em 1954, quando Getúlio foi levado ao suicídio e entregaram o Governo para o Sr. Café Filho e depois para o Sr. Carlos Luz.

Na verdade, na verdade, surgiu um movimento no Rio Grande do Sul. No início, parecia um protesto, uma rebeldia, o direito de espernear daqueles que perderam. Mas o Dr. Brizola, que requisitou a Rádio Guaíba para os porões do Palácio Piratini, estabeleceu a chamada cadeia da Legalidade. Com o tempo, ele fez com que rádios do Rio Grande e de todo o Brasil transmitissem em cadeia, e lançou um movimento pela resistência física, democrática, convocando todas as forças a se unirem em torno da determinação de que quem teria que assumir a Presidência da República seria o Presidente João Goulart, e rejeitando o golpe dos três ministros militares.

Foi um movimento muito bonito.

Eu, jovem Vereador em Caxias, participei do movimento. Inclusive - como é que vou me esquecer! - até as milícias civis foram organizadas. Distribuíram-se armas aos cidadãos. Em Caxias, por exemplo, organizamos as milícias e, durante três horas por dia, jovens e pessoas de idade, homens e mulheres que se apresentavam como voluntários faziam exames, exercícios e recebiam orientações por parte dos militares de Caxias do Sul. Fiéis à Legalidade, preparavam-se para o que desse e viesse.

É impressionante como houve unanimidade no Rio Grande do Sul. É impressionante como todos os partidos, velhos e tradicionais adversários - adversários de 54, que tramaram o golpe e a morte de Getúlio, que fizeram o Golpe de 54 - se uniram, e todo o Rio Grande do Sul, por intermédio de todas as suas forças, políticas, militares, eclesiásticas, religiosas, uniu-se em torno da campanha da Legalidade. Deve-se esse mérito ao Governador Brizola, que teve uma atitude da maior competência, da maior coragem e da maior capacidade.

Houve momentos dramáticos nesse acontecimento, como, por exemplo, quando não se sabia qual seria o comportamento do General Machado Lopes, Comandante do 3º Exército, sobre quem pairava a dúvida se aderiria ou não ao movimento da Legalidade. Quando o Chefe da Casa Militar da Presidência da República mandou bombardear o Palácio Piratini, o Dr. Brizola, sua esposa, D. Neusa, e uma série de auxiliares se negaram a sair do Palácio. E ali ficaram, preparando-se para o que desse e viesse, mesmo que o Palácio fosse bombardeado. De repente, correu a notícia de que o General Machado Lopes, Comandante do 3º Exército, dirigia-se ao Palácio Piratini - e as informações eram de que ele se dirigia ao Palácio para depor e prender o Governador Brizola. Ficaram todos preparados. O Dr. Brizola preparou-se para resistir. Havia, naquele momento, a expectativa de um conflito entre a Brigada Militar e a Tropa do 3o Exército. Mas, para surpresa geral, para alegria de todos, o General Machado Lopes tinha ido era prestar solidariedade. Disse que o 3o Exército, por unanimidade, estava solidário com o movimento da Legalidade, pela posse de João Goulart na Presidência da República. Foi um momento de grande euforia, de grande festa.

A partir daí, sentiu-se que o movimento estava a crescer e criava-se a expectativa da chegada de Jango para ver o que aconteceria. Jango, como disse, estava na China e iniciou um longo percurso de volta, sem ainda saber o que estava acontecendo no País. Na volta ao Brasil, passou por Montevidéu, onde desceu e recebeu os Parlamentares do Congresso Nacional que foram com ele dialogar.

O Congresso Nacional, sentindo a vitória do movimento da Legalidade, sentindo que era absolutamente inviável impedir a posse de João Goulart, pois poderia haver um movimento de confronto, com conseqüências imprevisíveis, houve por bem fazer um entendimento. Assim, sem mais nem menos, em uma madrugada, foi implantado o Parlamentarismo no Brasil.

Eu sempre fui parlamentarista. Desde criança, no Rio Grande do Sul, temos a idéia da importância, do significado do parlamentarismo. Mas que triste hora escolheram para implantar o parlamentarismo! Exatamente como uma forma de tampão para uma crise.

Tancredo Neves foi indicado pelo Congresso Nacional para se dirigir a Montevidéu e conseguir de João Goulart que ele aderisse e aceitasse a tese do parlamentarismo. Tancredo foi a Montevidéu e falou com o Dr. João Goulart, que então foi a Porto Alegre. Nunca vi tanta gente à frente do Palácio Piratini como naquela noite. O Dr. João Goulart chegou a aparecer na sacada do Palácio, acenou para o povo, mas não falou, pois ainda não tinha tomado nenhuma decisão. Houve uma certa decepção popular - reconheço - naquele momento. Travou-se então um longo debate entre Brizola e João Goulart. Brizola defendendo a tese de que Jango não deveria se sujeitar, pois lhe tinham cortado o mandato, lhe tinham cortado a autoridade, que ele havia sido eleito Presidente no sistema presidencialista e deveria ser empossado nesse mesmo sistema. Em meio às conversações, parece que Jango não aceitou. Entrou no avião que trouxe as autoridades para Brasília, e aqui foi empossado. Aceitou o regime parlamentarista e indicou o Presidente Tancredo Neves como seu Primeiro-Ministro.

Penso que recordar esse movimento é muito importante. Recordar a capacidade da classe civil, a começar pelo comando de Brizola no Rio Grande do Sul, recordar, enfim, a adesão que teve esse movimento é muito importante. Mostrar, quando se tem uma causa justa, uma liderança competente, que um trabalho pode ser feito é igualmente muito importante. Afinal de contas, os ministros militares já tinham dado o golpe, dito que o Jango não assumia, e o Moura Andrade já tinha empossado o Raniere Mazzilli como Presidente da República - não como presidente interino, mas como Presidente da República. Ele tinha sido empossado como Presidente. A rigor, o fato estava consumado. A rigor, não se tinha mais o que fazer.

No entanto, a sociedade civil organizada, a mobilização dos brasileiros, a começar pelo Rio Grande do Sul - as faculdades de Direito, as OABs, as Igrejas -, a sociedade, numa total e absoluta unanimidade, fez com que os militares tivessem que recuar, baixar a cabeça, e o Congresso teve que voltar atrás, anular a posse já dada ao presidente da República, dando posse ao verdadeiro Presidente, Dr. João Goulart.

É claro que houve o parlamentarismo. Creio que o Tancredo Neves foi um Primeiro Ministro de primeira grandeza, mas a verdade é que, desde o início, ninguém queria o parlamentarismo: a UDN não queria, porque tinha um candidato a presidente, que era o Lacerda; o PSD não queria, porque tinha um candidato a presidente, que era o Juscelino; ninguém queria o parlamentarismo. E foram boicotando e boicotando tanto que, quando chegou a hora da eleição para deputado, o que fizeram? Aprovaram um artigo, no regime parlamentarista, dispondo que todo cidadão que quisesse se candidatar a deputado deveria largar o cargo. Ministro, por exemplo, tinha que deixar o ministério para se candidatar a deputado. Tancredo Neves era primeiro-ministro, mas era deputado. Havia uma eleição, ele tinha que se candidatar a deputado, mas, para ser candidato a deputado, ele teve que renunciar ao ministério. E todos os que eram candidatos a deputado não podiam aceitar o novo ministério. E foi assim que se esvaziou o parlamentarismo. E o parlamentarismo caiu.

Porém, trago aqui a lembrança de uma data de festa: quero reconhecer a competência e a capacidade do Dr. Leonel Brizola como Governador do Rio Grande do Sul; da Assembléia Legislativa, pela sua unanimidade; pelas classes armadas do Rio Grande do Sul, o 3º Exército, que deu um exemplo extraordinário de unidade e de entendimento. Ali, posso dizer que, a exemplo de 1930, o Rio Grande do Sul esteve unido.

E falo também pela coincidência: hoje, na Câmara dos Deputados, houve uma sessão solene em homenagem aos 47 anos de morte do Dr. Getúlio Vargas. Não sei por que não se fez no Senado, mas uso a palavra para trazer o meu respeito, a minha saudade e a minha admiração à figura de Getúlio Vargas.

Um momento fantástico viveu este País em 24 de agosto de 1954. Acho difícil encontrar, nos acontecimentos da política brasileira, um instante em que a Nação brasileira, em questão de um minuto, mudou tanto do ódio para o amor e do amor para o ódio. E foi a primeira vez, neste País, que ocorreu uma campanha orquestrada de toda a grande imprensa, comandada por Carlos Lacerda, para desmoralizar o Presidente da República.

A pretexto de um acidente ocorrido entre um segurança de Getúlio, que teria atirado em Lacerda, pisando em seu pé e matando um coronel da Aeronáutica, o Coronel Vaz, houve uma mobilização exigindo a deposição de Getúlio Vargas.

Getúlio lutou, esforçou-se, mostrando a sua inocência, determinando a apuração de tudo que havia acontecido. A Aeronáutica retirou do Congresso Nacional a apuração - havia uma CPI para apurar o episódio - e criou a República do Galeão. E lá, na República do Galeão, passaram a ouvir, atemorizadas, assustadas, as pessoas implicadas na questão.

Ali, naquele momento, não se preocupavam em buscar os responsáveis pela morte do Coronel Vaz ou os responsáveis pelo tiro no Sr. Lacerda. Ali se buscava, àquela altura, a deposição de Getúlio Vargas. Desde 1950, eles não admitiam a vitória, desde então não passava pela garganta dos militares e das elites da UDN que aquele Getúlio Vargas, que tinha sido deposto, que tinha sido mandado embora, que tinha ido para o exílio de Itu, que eles imaginavam que nunca mais voltasse, terminaria voltando numa vitória espetacular, derrotando todos eles. Isso eles não podiam aceitar, e o movimento foi fantasticamente intenso. Foi um dos movimentos mais terríveis, com o objetivo de demolir a imagem de um homem e desmontar um governo, comandado pelo Sr. Lacerda e companhia contra Getúlio Vargas. Ao final, quando Getúlio Vargas disse que se licenciava até que a verdade fosse apurada e os culpados encontrados, o seu Ministro da Guerra, que, na verdade, o estava traindo, negociando com os inimigos, disse, com a maior franqueza e a maior frieza: “Não, agora os militares não aceitam mais a sua licença; eles querem a sua renúncia e, na verdade, o senhor não voltará mais”. Nesse momento, Tancredo Neves, um jovem Ministro da Justiça, com pouco mais de 30 anos, pede a palavra ao Dr. Getúlio e diz: “Presidente, o senhor me nomeie Ministro da Guerra agora, e demito toda essa gente e garanto a sua posse”. Foi quando Getúlio agradeceu, meditou e deve ter chegado à conclusão própria, deu a sessão por encerrada - sessão do Ministério que durou toda a madrugada - e retirou-se para seu quarto, onde veio a se suicidar, deixando o bilhete: “Nada mais posso fazer pelo povo brasileiro. À sanha dos meus inimigos, deixo o legado da minha morte”. Deixou uma carta testamento, que até hoje se encontra na esmagadora maioria das cidades brasileiras, repetida no bronze, e que foi realmente um legado emocionante de conteúdo e de atualização.

Quando morreu Getúlio Vargas, Carlos Lacerda estava fazendo um movimento espetacular, que traria de São Paulo milhares e milhares de carros, automóveis e ônibus, convocando todos para invadirem o Catete e exigirem a queda de Getúlio Vargas. Quando o Repórter Esso noticiou a sua morte, foi impressionante a modificação que houve no Brasil. Em Porto Alegre, foi um terror. Nunca, nem antes e nem depois, houve uma revolta popular tão grande, tão intensa e tão profunda. Queimaram o Diário de Notícias, queimaram a Rádio Farroupilha, um dos instrumentos principais contra Getúlio Vargas. Queimaram a sede da UDN. Fizeram uma demonstração de mágoa, sentimento, dor e revolta que foi algo impressionante.

No Rio de Janeiro, então, não se conta. Naquela cidade, aquele povo, que ainda estava sob impacto daquelas notícias fantásticas de corrupção e outras a respeito do Dr. Getúlio Vargas, parece que acordou. Aquele povo sofreu, chorou, prestou um tributo até hoje não comparável, quando todo o Rio de Janeiro, a população inteira, do Catete ao Aeroporto Santos Dumont, levava, a pé, o caixão do Dr. Getúlio Vargas. Eu era criança, mas consegui uma carona em Porto Alegre e fui a São Borja assistir ao enterro do Dr. Getúlio Vargas. Pouco tempo depois, assistiria também ao enterro do Dr. João Goulart.

Ouvi ali o discurso de Tancredo, o discurso de Jango e, basicamente, aquele que nunca vou esquecer, que constitui uma das páginas mais fantásticas de minha vida: o discurso de Oswaldo Aranha. Prevendo que talvez fosse o candidato do PTB, Oswaldo Aranha fez um discurso desses a que assistimos uma vez na vida e outra na morte.

Morre Getúlio Vargas. É interessante assinalar que, no inventário deixado por Getúlio - ele, que durante 15 anos foi ditador e, por 4 anos, Presidente da República -, ficaram para seus filhos apenas as suas terras em São Borja, herdadas de seu pai. Aliás, bem menos do que herdou do pai, porque no Movimento de 1930 e em diversos outros, ele vendeu aos seus irmãos parcelas das suas terras. Portanto, repito, o que ele deixou aos filhos foi muito menos do que ele tinha recebido da herança de seu pai. Isso ficou provado. Nenhum bem, nenhum apartamento, nenhuma casa, nenhum sítio, nem no Rio de Janeiro, nem em Porto Alegre, nem no Rio Grande do Sul, nem em lugar nenhum. E a imprensa falava na fortuna fantástica, no mar de dinheiro que teria sido acumulado pelo Dr. Getúlio Vargas ao longo dos 20 anos em que foi Presidente da República. Aliás, quem ler o diário de Getúlio Vargas constatará quão impressionante é essa escola de homens positivistas como foi ele, como foi Júlio de Castilho, como foi Borges de Medeiros. Impressionante como essas pessoas têm o sentido do dever, da dignidade, da correção, da seriedade, da firmeza. Eles não saem um centímetro para lado nenhum. Borges de Medeiros foi assim. Júlio de Castilho foi assim. Dr. Getúlio Vargas, durante toda a sua vida pública, foi exatamente assim.

Por isso, Sr. Presidente, quando estamos às vésperas dos 47 anos da morte de Getúlio e quando, coincidentemente, estamos festejando os 40 anos da legalidade, presto homenagem à memória de Getúlio e presto homenagem à legalidade e àqueles que, como o Dr. Brizola, fizeram a legalidade.

Eu poderia completar, Sr. Presidente: em 1954, o suicídio de Getúlio; em 1961, a legalidade; em 1964, a deposição de João Goulart. Impressionante como, com tudo aquilo que se fez, com a movimentação de forças que dobrou a grande imprensa e fez Jango assumir, essa gente não ficou parada. A UDN, militares e companhia continuaram a agir, para finalmente conseguir aquilo que a UDN nunca conseguiu pelo voto: chegar ao poder. Derrotaram o Brigadeiro, derrotaram o Brigadeiro novamente, nunca conseguiram eleger um Presidente. Queriam fazê-lo pelo golpe. Fizeram isso matando Getúlio, mas não levaram porque Lott garantiu que as coisas acontecessem. Fizeram isso derrubando Jango, mas aí, sim, levaram: os militares ganharam.

O que sobra da triste nostalgia disso tudo é que os militares levaram. Contudo, assim como cassaram o Juscelino do lado de cá, cassaram Carlos Lacerda do lado de lá - o Lacerda que pensou que, dado o golpe, as Forças Armadas fariam o golpe para a UDN e para ele. Bem-feito! As Forças Armadas deram o golpe, mas, na hora, disseram: “Por que vamos botar esse cara, se podemos ficar nós?” E foram cinco generais que se perpetuaram no poder, fazendo com que a velha UDN terminasse por desaparecer, sem nunca ter conseguido chegar ao Governo.

Sr. Presidente, encerro meu pronunciamento, levando meu pleito de saudade à memória de Getúlio Vargas e levando meu pleito de carinho e admiração à figura do Dr. Leonel Brizola, porque temos de reconhecer que é nele que se deve configurar todo o respeito, toda a admiração e toda a saudade pelo movimento da legalidade, pois foi ele seu inspirador, o grande lutador e o grande vencedor.

Muito obrigado, Sr. Presidente. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/08/2001 - Página 18189