Discurso durante a 109ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Cobranças ao Ministro da Saúde do reajuste das tabelas do Sistema Único de Saúde para os centros de hemodiálise.

Autor
Gilvam Borges (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AP)
Nome completo: Gilvam Pinheiro Borges
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Cobranças ao Ministro da Saúde do reajuste das tabelas do Sistema Único de Saúde para os centros de hemodiálise.
Publicação
Publicação no DSF de 07/09/2001 - Página 21282
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • ANALISE, IMPORTANCIA, SAUDE, REGISTRO, NECESSIDADE, ASSISTENCIA, POPULAÇÃO CARENTE, CRITICA, GOVERNO FEDERAL, ABANDONO, SETOR, NEFROPATIA GRAVE, AVALIAÇÃO, INSUFICIENCIA, RECURSOS, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), TRATAMENTO, DOENÇA.
  • ANALISE, NECESSIDADE, REAJUSTE, TABELA, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), OBJETIVO, AUMENTO, INVESTIMENTO, SETOR, TRATAMENTO, NEFROPATIA GRAVE.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. GILVAM BORGES (PMDB - AP. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, segundo a propaganda oficial, os índices sociais vêm melhorando nos últimos anos. A educação e a saúde, principalmente, são citadas com insistente freqüência como setores que têm recebido atenção especial por parte do Governo, com resultados sempre apresentados como animadores. Haveria, assim, um progresso efetivo nas condições de vida das populações mais pobres. Nas palavras do próprio Presidente da República, o Brasil iria “de mal a menos mal”.

            A dura realidade, porém, está às vezes muito distante do país rosado da propaganda. Quem vive longe dos palácios conhece a verdade, sobretudo as pessoas que necessitam de assistência permanente de saúde para a preservação da própria vida. Sabe, por exemplo, que um dos setores mais abandonados pelo Governo, pelo menos no campo do Ministério da Saúde, é o da hemodiálise, que se encontra em crise dramática. Tudo porque o Governo, segundo a Associação Brasileira dos Centros de Diálise e Transplante (ABCDT), nos últimos sete anos, concedeu um único e insuficiente reajuste da ordem de 5%, e mais recentemente, precisamente na sexta-feira passada, 10%, ainda insuficientes, mantendo a tarifa paga a esses centros para atendimento pelo Sistema Único de Saúde (SUS) em R$93,58 para os centros de diálise que não se enquadraram nos termos da Portaria nº 82, da lavra do Sr. Ministro José Serra, cujas exigências inviabilizam, na prática, qualquer procedimento com vistas ao seu atendimento. É de se ressaltar que, no período, a inflação ultrapassou os 110% e parte dos custos de operação e manutenção dos centros está atrelada ao dólar, que não pára de subir.

            É verdade que o Sr. Ministro José Serra rebate essas acusações, alegando que o setor recebeu, sim, um reajuste de cerca de 30% no período, sendo 5% em 1999, além de receber gratuitamente do Governo a ciclosporina, medicamento essencial para o combate à rejeição, nos casos de transplantes. Parece haver aí um caso de diferença de interpretação, pois o setor entende esse reajuste como simples reposição de perdas e escuda-se no própria texto da Portaria nº 2.321/95 do Ministério da Saúde, assinada pelo então Ministro, Dr. Adib Jatene, que fala em “fator de recomposição”.

            O fato, porém, é que esse valor, mesmo com o recente aumento, está claramente defasado. As conseqüências do abandono e do descaso com a saúde pública podem ser avaliadas por quem ler a reportagem publicada no Correio Braziliense, no dia 16 de julho deste ano, por meio da qual tomamos conhecimento do terrível dilema diário enfrentado pelos médicos do Hospital de Base. Dia após dia, eles têm que escolher, dentre os pacientes que demandam seus serviços, aqueles que terão a chance de sobreviver, pois não há máquinas de hemodiálise para todos. Algumas vezes esses médicos optam por fazer “meio tratamento” em cada paciente, aliviando um pouco o sofrimento de todos, mas não resolvendo os problemas de nenhum.

            Ninguém estudou Medicina, Sr. Presidente, para ter esse poder de decisão de vida ou morte sobre as pessoas. Alguns médicos se submetem à psicoterapia para suportarem a pressão sobre suas consciências, embora racionalmente saibam que não são culpados de nada.

            O pior, no caso da remuneração às clínicas de hemodiálise, Srªs e Srs. Senadores, é que o Governo se mostra incoerente. Isso porque o valor que ele cobra dos planos de saúde para o mesmo tipo de atendimento realizado nos hospitais públicos aos pacientes segurados, pela Tabela Única Nacional de Equivalência de Procedimentos - TUNEP, publicada no Diário Oficial da União de 18 de abril de 2000, é de R$160,81. Cerca de 72% a mais. Nada de se admirar que o setor esteja pleiteando reajuste. Trata-se de uma simples questão de justiça.

            Todos os centros e clínicas do setor, segundo informação do Dr. Washington Luiz Correia, Presidente da ABCDT, estão endividados e não poderão receber novos clientes se a situação não se alterar. Pergunta-se: como se adequar à Portaria do Ministro José Serra, se o mesmo insiste em não reajustar os valores atualmente praticados? A comparação da tarifa paga pelo Ministério da Saúde com as vigentes em países vizinhos proporciona uma idéia do descompasso desse valor. Convertido para a moeda americana, o valor pago pelo SUS eqüivale a cerca de US$37,00. A média paga pelos outros países do Mercosul é de US$145,00. Isso, é claro, para não mencionarmos que o valor nos Estados Unidos é de US$180,00, na França US$270,00 e no Japão US$330,00.

            O valor médio do custo básico de cada sessão de hemodiálise no Brasil, estimado para a ABCDT pelos consultores econômicos José Roberto Araújo Cunha Júnior e Heron do Carmo, é de R$143,00, ou cerca de 53% a mais que a tarifa paga pelo SUS, e o titular da pasta da Saúde concede parcos 10% àqueles poucos centros que estão de conformidade com sua Portaria e nada aos que mais necessitam do reajuste. Lembremos ainda que os equipamentos e insumos empregados são, em grande parte, importados, e - ainda importante - que a mão-de-obra deve ser altamente especializada. Aspectos que pesam bastante sobre os custos.

            O problema é que são os pacientes os maiores prejudicados pela pauperização das clínicas de hemodiálise. E não se pense que é pouca gente: de acordo com os números da Associação, 47 mil pacientes renais crônicos são atendidos regularmente pelos centros de diálise, mas as estimativas são de que haveria cerca de 115 mil brasileiros com doença renal que necessitariam do tratamento, ou seja, haveria 68 mil pessoas que não têm acesso ao tratamento ou não o recebem.

            Há mais, Sr. Presidente, infelizmente há muito mais. Quando olhamos os índices de pacientes de terapia renal substitutiva no Brasil, vemos que há uma grande defasagem entre as unidades federadas. Nos Estados mais desenvolvidos, como Paraná, São Paulo, Minas Gerais, o Distrito Federal, o Rio Grande do sul e o Rio de Janeiro, esses índices passam do valor de 240 pacientes para cada milhão de habitantes, chegando a quase 350 no Rio de Janeiro e no Rio Grande do Sul.

            No outro extremo, em Sergipe, na Paraíba, no Maranhão e nos Estados da Região Norte, esses índices não chegam a 75 pacientes por milhão de habitantes, estando mesmo em cerca de 20 por milhão de habitantes no Pará. Comparados à média nacional, em torno dos 210 pacientes por milhão de habitantes, esses índices não deixam margem a dúvidas. Não é que nesses Estados a saúde renal da população esteja melhor, mas trata-se realmente de caso de subcontagem por incapacidade de diagnosticar. Quando for possível fazer os diagnósticos e contabilizar todos os casos existentes, essa conta vai explodir.

            Recaptulemos, Srªs e Srs. Senadores, os pontos básicos, para não perdermos a noção do escândalo: primeiro, a capacidade instalada dos centros de hemodiálise é insuficiente para atender os que demandam esse tratamento, e mais ainda para a população que precisaria dele e está totalmente excluída; segundo, os centros existentes estão sendo inviabilizados por seu progressivo endividamento, dada a recusa do Governo em conceder reajuste para a tabela de serviços do SUS sequer para valores compatíveis com a TUNEP, que o Governo cobra dos planos de saúde privados; terceiro, há uma grande subavaliação das necessidades, que projeta um crescimento explosivo da demanda para o futuro.

            Não se trata de defender os interesses corporativos de um setor de negócios, como pretende o irado e antipático Ministro da Saúde, em entrevista aos meios de comunicação, na qual anunciava a interrupção das negociações com os representantes das clínicas. Trata-se de defender a vida de milhares de brasileiros, pacientes crônicos de um quadro mórbido terrível, necessitados de dispendioso tratamento contínuo. Vidas que não podem esperar, pois amanhã será tarde.

            Já era hora de nosso Ministro da Saúde deixar um pouco de lado seu mau humor, a sua antipatia aliada, hoje, à incompetência, a sua obediência cega aos ditames dos czares da era econômica, que só conhecem o verbo “cortar”. Penso estar mais do que clara a injustiça que vem sendo cometida contra as clínicas de hemodiálise, e a urgência da correção do valor dos seus serviços na tabela dos SUS. Cobremos isso do Governo, Sr. Presidente.

            Faço um apelo ao Ministro José Serra, deixando de lado a sua antipatia e o seu mau humor que visite os hospitais. Sr. Presidente, são 115 mil pacientes! Penso que deveremos responsabilizar o Ministro pelo sucateamento do setor público; ele está cometendo um crime, e vem demonstrando grande incompetência.

            Fiquei horrorizado quando visitei o Hospital de Base. Diante da situação que me deixou estarrecido, procurei a associação e solicitei informações para fazer este pronunciamento de hoje.

            Precisamos responsabilizar o Ministro José Serra, para que dê a atenção devida e observe os crimes que está cometendo como responsável da Pasta. É uma vergonha a saúde neste País, e precisamos ver isso tudo com responsabilidade. Não fazer com a mídia nacional, como ele faz, tentando passar uma imagem que não é verdadeira. Vejo, nas filas dos hospitais, o retrato da incompetência. Portanto, Sr. Presidente, tiro de lado o mau humor e a antipatia do Ministro e passo a questionar-lhe a competência.

            Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.


            Modelo17/27/247:32



Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/09/2001 - Página 21282