Discurso durante a 124ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Defesa da conclusão da Barragem do Castanhão, no Ceará.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL. HOMENAGEM. IGREJA CATOLICA.:
  • Defesa da conclusão da Barragem do Castanhão, no Ceará.
Publicação
Publicação no DSF de 02/10/2001 - Página 23434
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL. HOMENAGEM. IGREJA CATOLICA.
Indexação
  • DEFESA, CONCLUSÃO, OBRA PUBLICA, BARRAGEM DO CASTANHÃO, MUNICIPIO, JAGUARIBARA (CE), ESTADO DO CEARA (CE), BENEFICIO, IRRIGAÇÃO, CONSTRUÇÃO, USINA HIDROELETRICA, DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
  • ANUNCIO, INICIATIVA, ORADOR, APRESENTAÇÃO, PROJETO DE LEI, ALTERAÇÃO, DENOMINAÇÃO, BARRAGEM PADRE CICERO, HOMENAGEM, VULTO HISTORICO.
  • LEITURA, ELOGIO, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, EPOCA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), POSSIBILIDADE, ALTERAÇÃO, DECISÃO, IGREJA CATOLICA, SUSPENSÃO, ORDENAÇÃO, CICERO ROMÃO BATISTA, SACERDOTE.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (Bloco/PSDB - CE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, todo o Ceará acompanha e espera, na mais positiva das expectativas, a conclusão definitiva das obras da Barragem do Castanhão. Pode-se dizer, sem medo de cometer exagero, tratar-se de obra essencial, sonhada há pelo menos um século. Com efeito, é de 1910 o início dos estudos técnicos - geológicos e topográficos - necessários à construção daquele açude.

            Nas últimas décadas do século XX, justamente no contexto de retomada da tese da transposição das águas do Rio São Francisco para as regiões semi-áridas do Nordeste, foram encomendados os estudos preliminares do Projeto Castanhão. Assim, em 1985, foi elaborado o anteprojeto da Barragem. Mais dez anos e, vencida a etapa inicial de elaboração dos projetos, finalmente foram iniciados os serviços de construção.

            São muitas as razões que fazem desse projeto algo essencial para a economia cearense, a começar por seus efeitos diretos sobre a qualidade de vida de milhares de pessoas. Para que se tenha uma idéia do real significado da obra, basta lembrar que, em plena operação, a Barragem do Castanhão estará possibilitando a irrigação de 43 mil hectares de terra, fertilizando as áreas do Chapadão do Castanhão e da Chapada do Apodi.

            Há que se considerar, ainda, o fato de que, após sua conclusão, a Barragem desempenhará papel estratégico para a garantia de abastecimento de água da região metropolitana de Fortaleza. Além de controlar as cheias no Baixo Vale do Jaguaribe, a obra estimulará a pesca, estimando-se uma produção na ordem de 3,8 mil tonelada/ano de pescado.

            Por fim, mas não menos importante, sabe-se que a Barragem do Castanhão possibilitará a instalação de usina hidrelétrica, com capacidade de gerar 22,5 megawatts, sem falar na criação de pólo turístico, envolvendo os Municípios circunvizinhos e constituindo-se em fonte de trabalho e renda.

            Ouso afirmar, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ser a Barragem do Castanhão muito mais do que grandiosa obra de engenharia. Ali, os milhões de metros cúbicos de água armazenada, as toneladas de ferro e cimento utilizadas, a extensa área beneficiada, tudo isso se subordina a uma causa maior: a redenção de uma terra e de uma gente que, pacientemente, esperou pelo olhar e pela atenção do Poder Público.

            Aproveito o fato de estar o Senador Ramez Tebet presidindo a sessão nesta tarde, para registrar que de S. Exª sempre obtivemos a melhor acolhida e apoio para o projeto, seja como Relator do Orçamento da União em um dos últimos exercícios, seja quando de sua passagem, ainda que breve, porém profícua, pelo Ministério da Integração Nacional.

            Os novos horizontes de exploração econômica que se abrem justificam todo o investimento.

            Ademais, a partir do momento em que a Barragem estiver funcionando plenamente, morta e sepultada para sempre, restará a velha imagem do rio Jaguaribe - no dizer de Demócrito Rocha -, “uma artéria aberta por onde escorre e se perde o sangue do Ceará”. Isso não mais acontecerá porque suas águas passarão a ser racionalmente aproveitadas, fecundando o solo, gerando energia e produzindo riquezas. Esse o sentido maior da obra.

            Em função de tudo isso, tomei a iniciativa de apresentar projeto de lei a esta Casa, denominando de “Barragem Padre Cícero” a Barragem do Castanhão, situada no Município cearense de Jaguaribara, sem deixar de reconhecer que nomes igualmente ilustres e vinculados à própria história da barragem também poderiam receber esta homenagem.

            O povo de Jaguaribara ganhará uma nova e moderna cidade, com habitação confortável para todos, escolas, igrejas, ruas bem traçadas, cem por cento de abastecimento de água e de saneamento básico, hospital, posto de saúde e tudo mais, numa grandiosa obra levada a efeito pelo Governo do Estado, sob a liderança do Governador Tasso Jereissati.

            Ao fazer esta homenagem, não tive outra intenção senão a de reconhecer o mérito de um dos mais extraordinários personagens que a história do meu Estado conheceu, dando seu nome a uma obra de monumental alcance econômico e social.

            Sendo verdade que a Barragem do Castanhão é obra redentora para a região, nada mais adequado que também sirva para homenagear aquele que penetrou na alma do sertanejo, buscando compreendê-la por inteiro; alguém que, a seu modo, procurou semear conforto espiritual e melhorar o padrão de vida dessa gente que de tudo carecia.

            Não é fácil definir Padre Cícero Romão Batista. Filho de comerciante, nasceu a 24 de março de 1844, no Crato. Fortemente influenciado pela leitura que fez da vida de São Francisco de Sales, aos 12 anos proferiu voto de castidade. Em 1870, contra a vontade de parte da hierarquia católica de então, ordenou-se sacerdote.

            Começava ali, a partir de Juazeiro do Norte - cidade fundada por ele e doravante marcada por sua forte presença e de onde jamais ela se afastará -, uma trajetória invulgar, em que se misturam a exuberante fé, a crescente devoção dos fiéis mais humildes, o exercício da política, o permanente confronto da religiosidade popular e as normas ditadas por Roma.

            A própria Igreja Católica, em 1898, decide-se por reabrir o processo que culminou na suspensão dos votos sacerdotais de Padre Cícero. Conforme matéria publicada pela revista Época, edição de 1º de outubro:

 

Se os teólogos da Congregação para a Doutrina da Fé entenderem que a sentença canônica do passado foi exagerada e o reintegrarem ao clero, o líder espiritual cultuado por 40 milhões de devotos no país poderá ser conduzido à categoria de beato, tal como o jesuíta José de Anchieta e o religioso paulista Frei Galvão.

            É, portanto, Sr. Presidente, uma revisão daquele processo em que a hierarquia da Igreja Católica, não compreendendo a grande liderança popular e a afinidade que se estabelecia entre o pastor e a população a que ele servia, resultou na suspensão da Ordem do Padre Cícero, fato que será agora reexaminado, mediante esse processo reaberto pelo Cardeal Hatzinger, da Congregação para a Doutrina da Fé. Tenho a grande esperança de que ele vá mostrar o quanto erraram os que, naquela época, aplicaram contra o Padre Cícero uma pena tão brutal, que foi a suspensão de Ordens.

            Na verdade, esse extraordinário fenômeno do Padre Cícero, com o passar do tempo, não esmaece, não reduz de importância, de dimensão; ao contrário, é cada vez mais importante. Já não se trata de uma figura só do Ceará e do Nordeste brasileiro. Há por todo o Brasil, hoje, uma verdadeira devoção e um culto a sua figura, pela sua piedosa atuação, pelos prodígios que realizou e pela profunda identificação das almas mais simples da nossa gente com a sua forma de viver e atuar.

            Sr. Presidente, não se pode negar essa força da vinculação de Padre Cícero com sua gente. Os relatos populares sobre seus feitos praticamente começam a aparecer quando do início de suas atividades sacerdotais. Assim, desde o séc. XIX, corria de boca em boca a notícia do jovem padre que chegava em lombo de jegue a lugares inóspitos para distribuir comida, que acenava com a terra prometida no sertão cearense, que doutrinava, que apresentava propostas que ainda hoje guardam grande atualidade no apoio aos excluídos, aos humildes, aos infelizes, aos miseráveis, fosse na concessão de terras para assentamento de agricultores, fosse na prestação de serviços continuados de assistência social. Enfim, ele era alguém que levava alento e assistência religiosa a uma região castigada por uma das piores secas de que se tinha conhecimento.

            Fica de Padre Cícero não apenas a imagem de um homem poderoso, mas sobretudo a imagem de um homem piedoso e profundamente identificado com a pobreza, que decifrou os códigos políticos de sua época e, a partir deles, obteve melhoras significativas para a população. Fica, também, especialmente entre as massas com quem sempre soube dialogar, o legado de quem construiu escolas, açudes e fábricas. Fica a lembrança de alguém que combateu sempre a injustiça e a miséria, que pregou o reflorestamento das nossas matas e da caatinga e se preocupou em oferecer trabalho a ex-escravos desamparados.

            Eis a razão da homenagem, para a qual espero o apoio dos nobres Colegas: perenizar o nome de Padre Cícero Romão Batista na obra grandiosa que os Governos Federal e do Ceará se esforçaram por edificar, cientes de sua importância e de seu significado. Trata-se de decisão justa, sobretudo por realçar os laços que sempre uniram o sacerdote de Juazeiro à sua terra e à sua gente. Afinal, nunca é demais lembrar que Padre Cícero atingiu em vida uma dimensão que supera rótulos e transcende modelos.

            Muito obrigado.


            Modelo16/29/2412:38



Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/10/2001 - Página 23434