Discurso durante a 125ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Importância da Lei 10.257, sancionada em 10 de julho deste ano, que cria o Estatuto da Cidade.

Autor
Mauro Miranda (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Mauro Miranda Soares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE DESENVOLVIMENTO URBANO.:
  • Importância da Lei 10.257, sancionada em 10 de julho deste ano, que cria o Estatuto da Cidade.
Publicação
Publicação no DSF de 03/10/2001 - Página 23800
Assunto
Outros > POLITICA DE DESENVOLVIMENTO URBANO.
Indexação
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, LEGISLAÇÃO, CRIAÇÃO, ESTATUTO, CIDADE, ORGANIZAÇÃO, POLITICA URBANA, MELHORIA, SEGURANÇA PUBLICA, SANEAMENTO BASICO, QUALIDADE DE VIDA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. MAURO MIRANDA (PMDB - GO) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em 10 de julho deste ano, o Presidente da República sancionou a Lei n.º 10.257 que criou o Estatuto da Cidade. A regulamentação dos arts. 182 e 183 da Constituição Federal estabeleceu, finalmente, as diretrizes gerais da política urbana. A importância da Lei ultrapassa seu conteúdo, pois é uma conquista do Parlamento, uma vez que dele originária, nele discutida, nele votada e nele aprovada.

            Tão habituados estamos em abdicar de nossa função legiferante para o Executivo que devemos nos regozijar quando um ordenamento jurídico de tal importância é totalmente elaborado dentro de nossos muros.

            A denominação de Estatuto da Cidade originou-se de um projeto de lei apresentado pelo saudoso Senador por Brasília, Pompeu de Souza. Aprovado nesta Casa, tornou-se a base para inúmeras discussões, debates, seminários e audiências públicas sobre o assunto. Todos os demais projetos apresentados sobre a matéria foram a ele apensados, incluindo a interessante proposição do Deputado Raul Ferraz.

            Tendo sido Prefeito do município de Vitória da Conquista, na Bahia, o Deputado Raul Ferraz soube usar com proficiência seu vasto conhecimento sobre o uso do solo urbano e a aplicação dos instrumentos de política urbana no parcelamento, edificação ou utilização compulsórios do solo.

            O País estava a reclamar uma normalização da política urbana. De 1940 para cá, o crescimento populacional urbano foi de tal natureza que as cidades mais procuradas pelos migrantes transformaram-se em verdadeiros caos. Não há crescimento organizado e lógico. As grandes metrópoles brasileiras enfrentam graves problemas para acomodar a população urbana, que hoje já abrange 80% dos brasileiros, alcançando 88,7% na região Sudeste, 78,4% na Sul e 63,6% na Nordeste. São Paulo, com 10 milhões de habitantes; Rio de Janeiro, com 5,6 milhões; Salvador com 2,3 milhões; e Belo Horizonte e Fortaleza, com 2,1 milhões cada, são os municípios mais populosos.

            Não é à toa que tais cidades enfrentam graves problemas, como os de segurança, educação, saúde e saneamento. Mesmo concentrando atividades industriais, esses centros não têm capacidade de emprego para todos seus habitantes. Como a maioria dos migrantes não têm escolaridade ou experiência profissional, acabam aceitando subempregos ou vão para a economia informal. Os rendimentos miseráveis os levam a morar nas periferias dos grandes centros, que terminam se transformando em favelas ou em regiões com habitações precárias, à margem de córregos, charcos ou em perigosas encostas de morros. Favelas, mocambos, palafitas, alagados, loteamentos clandestinos proliferam, sem que as autoridades, por motivos diversos, possam impedir seu surgimento.

            Os governos estaduais não têm recursos para enfrentar o problema, e os moradores acabam por depositar os dejetos ao ar livre ou os canalizam para córregos ou represas próximos, aumentando a já tão grande poluição urbana e provocando doenças. As regiões metropolitanas crescem sem nenhum planejamento, e a confusão se estabelece.

            O Estatuto da Cidade veio para pôr fim a essa desordem e para equacionar os problemas advindos do mau uso do solo. A questão da moradia agravou-se com a extinção pura e simples do Banco Nacional de Habitação (BNH), sem que outro órgão fosse criado para substituí-lo. Por sua vez, terminar com o Ministério do Desenvolvimento Urbano, único Ministério voltado para os problemas urbanísticos, foi um erro, que poderá ser corrigido com o rigoroso cumprimento da nova lei.

            Se a reforma agrária conta com inúmeros defensores, a reforma urbana vem sendo desprezada. Há poucos especialistas no assunto, daí o abandono em que vive o homem na periferia das grandes cidades. Sem ter como sustentar, com o mínimo de dignidade, sua família, o homem acaba por se entregar à bebida ou aos pequenos crimes. A violência cresce. As crianças, abandonadas pelos pais acabam nas ruas esmolando, roubando ou servindo ao tráfico de drogas.

            Mas não é só a classe pobre a atingida. A classe média, com seus minguados salários, vê-se empurrada para moradias cada vez menores, e a classe mais privilegiada, obrigada a morar em verdadeiras fortalezas a fim de se proteger, perdendo o contato com a realidade brasileira.

            Pelo exposto, acreditamos que o Estatuto da Cidade possa melhorar a caótica questão urbana de nossas cidades, especialmente das mais populosas. O novo ordenamento jurídico deve obedecer a uma política de combate à especulação, redirecionando o modelo econômico de urbanização do espaço interior das cidades, além de trazer inúmeros outros benefícios.

            O plano diretor será a peça fundamental para a administração do município, em cumprimento, finalmente, ao que determina o parágrafo 2º do artigo 182 da Constituição Federal: "a propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressa no plano diretor".

            As normas de ordem pública e interesse social que regulam o uso da propriedade urbana serão adotadas em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar do cidadão, bem como do equilíbrio ambiental.

            O Estatuto da Cidade, minucioso, cuidou de todos os aspectos da política urbanística incluindo parcelamento, edificação ou utilização compulsórios; Imposto Predial Territorial Urbano (IPTU) progressivo no tempo; desapropriação com pagamento em títulos; usucapião; concessão de uso especial para fins de moradia; direito de superfície e de preempção; outorga generosa do direito de construir; operações urbanas consorciadas; transferência do direito de construir e estudo de impacto de vizinhança.

            Estamos convictos de que o Estatuto da Cidade foi um grande passo na organização de nossas cidades, trazendo, para suas populações, ordem e possibilidade de melhor qualidade de vida, especialmente para as classes menos favorecidas que habitam as periferias dos grandes centros.

            Era o que tinha a dizer. Muito obrigado.


            Modelo16/21/248:46



Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/10/2001 - Página 23800