Discurso durante a 129ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas ao reajuste dos derivados de petróleo, anunciado pelo Governo Federal.

Autor
Carlos Wilson (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/PE)
Nome completo: Carlos Wilson Rocha de Queiroz Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA AGRICOLA.:
  • Críticas ao reajuste dos derivados de petróleo, anunciado pelo Governo Federal.
Publicação
Publicação no DSF de 06/10/2001 - Página 24143
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, REAJUSTE, DERIVADOS DE PETROLEO, GASOLINA, ADIÇÃO, ONUS, ECONOMIA POPULAR, AUMENTO, CUSTO DE VIDA, SIMULTANEIDADE, AMPLIAÇÃO, LUCRO, OLIGOPOLIO, COMPANHIA DISTRIBUIDORA.
  • QUESTIONAMENTO, INCOERENCIA, GOVERNO FEDERAL, SUSPENSÃO, PROGRAMA, UNIFORMIZAÇÃO, CUSTO, PRODUÇÃO, CANA DE AÇUCAR, REGIÃO NORDESTE, PREJUIZO, PRODUTOR RURAL, INDUSTRIA NACIONAL, ALCOOL, DIFICULDADE, CONCORRENCIA, MERCADO EXTERNO.
  • NECESSIDADE, CUMPRIMENTO, DISPOSITIVOS, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, REDUÇÃO, DESIGUALDADE REGIONAL, INVESTIMENTO, CANA DE AÇUCAR, AMPLIAÇÃO, PRODUÇÃO, ALCOOL, REGIÃO NORDESTE, INCENTIVO, EXPORTAÇÃO.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. CARLOS WILSON (PTB - PE) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, figura, hoje, com destaque, em todos os jornais do País, o novo aumento concedido pelo Governo Federal aos derivados do petróleo, cabendo à gasolina uma majoração de 3,11 %.

            Nada, a nosso ver, justifica este ônus adicional imposto à economia popular, quando inúmeras e sólidas razões de interesse público recomendariam, enfaticamente, sua não adoção neste momento.

            Em primeiro lugar, não há argumentos econômicos em favor de tal aumento, haja vista a conjuntura internacional de queda consistente nas cotações do petróleo.

            Por outro lado, a oportunidade escolhida para a medida não podia ser mais inadequada, dadas as cada vez mais tenazes pressões sobre a nossa moeda, cuja desvalorização, em face do dólar, já supera 40% apenas este ano.

            Ora, em tal quadro, o aumento da gasolina, ao desaquecer ainda mais nossa já combalida economia, equivale quase a desviar o combustível do abastecimento de nossa frota para levá-lo à fogueira do aumento do custo de vida.

            Assim, além desse efeito prejudicial ao bolso do consumidor brasileiro em geral, a alta dos derivados do petróleo em nada aproveita, de outro lado, o nosso produtor de álcool, alternativa de combustível nacional, não poluente e não renovável.

            Ao contrário, mantido o preço do álcool nos atuais 64 centavos de reais, o litro, chega a mais de 180% a diferença que o separa do preço da gasolina, diferença que, antes do aumento, e já excessiva, era de 173%.

            Com isso, as distribuidoras oligopolizadas, organizadas na condição de únicas e obrigatórias compradoras de todo o álcool produzido no País, vendem o produto, adquirido barato, adicionando-o à gasolina, como se gasolina fosse, sem nada repassar deste seu lucro extra ao produtor.

            Desse modo, quando o governo anuncia o aumento de 3,11% para a gasolina está, de fato, escamoteando uma majoração real ainda maior, já que a parcela de 22% agregada ao mix posto à disposição do consumidor e correspondente ao álcool, não está tendo nenhum acréscimo de remuneração.

            Como resultado, o consumidor, além de pagar mais, acaba pagando gato por lebre.

            Em conseqüência, perde o cidadão, alcançado em seu bolso, perde o produtor nacional de álcool, que ajuda a financiar, sem contrapartida, esta “mais valia” disfarçada da gasolina e perde a sociedade até mesmo as modestas esperanças atuais de crescimento econômico de 2%, em 2001, estimado pelo Governo Federal.

            Em compensação, se se pode chamar isso de compensação, ganham as distribuidoras, basicamente as chamadas 05 (cinco) irmãs (BR Distribuidora, Ipiranga, Shell, Esso e Texaco), atravessadoras insaciáveis; em menor medida, os varejistas; e, sobretudo, o próprio Governo Federal, engordando suas receitas tributárias sobre a comercialização dos produtos.

            Aliás, verdade seja dita, o Setor Sucroalcooleiro como um todo, sobretudo o do Nordeste, não tem merecido por parte das autoridades federais tratamento condizente com sua importância para a economia regional.

            Só em Pernambuco, o setor responde pela existência de 130 mil empregos diretos, número que atinge 300 mil trabalhadores, se considerarmos o conjunto do Nordeste.

            Além disso, o negócio sucroalcooleiro regional tem tido desempenho dos mais competitivos em termos internacionais, ocupando o Nordeste a segunda posição entre os menores custos de produção entre todas as 108 regiões mundiais produtoras de açúcar e álcool, só perdendo, aliás, para o próprio centro-sul do país, o que dá a medida da posição brasileira de vanguarda neste assunto.

            Na atual conjuntura de crise energética particularmente aflitiva no Nordeste, o setor comparece de forma positiva, não só mostrando-se auto-suficiente em face do próprio consumo, mas também colaborando com o aproveitamento comercial de sua geração excedente de energia, produzida pela combustão do bagaço da cana no processo industrial.

            Em Pernambuco, por exemplo, as usinas ligadas ao Sindicato das Indústrias do Açúcar e do Álcool (SINDAÇUCAR) já fornecem energia proveniente da biomassa num volume de 30 megawats mês à Companhia Energética do Estado (CELPE), quantidade suficiente para atender 80 mil consumidores residenciais da Empresa durante um ano.

            E o potencial de geração de excedentes dos canaviais, correspondentes a cerca de 04 milhões de toneladas/ano de biomassa, pode atingir até 100 megawats, e, portanto, três vezes o que hoje injetado nas redes de transmissão de energia elétrica em Pernambuco.

            Isso sem falar no papel estratégico do açúcar na pauta de exportações do Estado, em que participa com 40% do volume total de suas exportações, de cerca de 500 milhões de dólares por ano.

            No entanto, apesar da veemência de todos esses números, ilustrativos do papel do agronegócio do açúcar e do álcool para o Nordeste, o Governo Federal mantêm-se insensível até as mais elementares demandas do setor, negando-se, inclusive, a cumprir suas próprias obrigações e compromissos legais.

            É o caso, particularmente angustiante para os produtores da região, da suspensão, desde 1998, dos recursos devidos ao setor e constantes do PROGRAMA DE EQUALIZAÇÃO DOS DE CUSTOS DE PRODUÇÃO DE CANA-DE-AÇÚCAR PARA A REGIÃO NORDESTE.

            Trata-se, não de um favor, mas de um incentivo federal existente há mais de 30 anos e destinado, como o nome indica, à uniformização dos custos de produção da cana-de-açúcar em todo o País, visando à obtenção de um preço único nacional, capaz de manter o nível de competitividade do produto no mercado externo.

            Conforme as características e necessidades regionais são definidos volumes contingenciados da produção, a serem contemplados com o incentivo, que, no caso do Nordeste, é de 5,07 reais por tonelada de cana.

            Tal valor, já defasado, diga-se de passagem, conforme estudos técnicos recentes da Fundação Getúlio Vargas, deveria estar hoje por volta de R$9,00 ou R$10,00.

            Além disso, trata-se de operação que vinha sendo realizada com êxito e em total acordo com as normas da OMC estipulada sobre a matéria, e, portanto, perfeitamente inserida na chamada cláusula “de minimis” da entidade.

            Cerca de 15 mil fundos agrícolas nordestinos, capilarmente distribuídos por 240 municípios do Nordeste - a base canavieira da agricultura nordestina - se beneficiavam com o incentivo, inexplicável e caprichosamente suspenso pela Agência Nacional do Petróleo, em 1998.

            Hoje, a situação financeira dos produtores nordestinos, em função disso, beira o colapso e ameaça diretamente as suas exportações.

            O segmento sucroalcooleiro da região vive uma economia de guerra.

            De um lado, é atingido indiretamente pelo terrorismo internacional que se abateu sobre a sede da bolsa de valores americana, contribuindo para dificultar e desorganizar as operações brasileiras de colocação do açúcar no mercado dos Estados Unidos.

            De outro lado, o governo brasileiro mantém há dois anos o embargo dos incentivos devidos ao PROGRAMA DE EQUALIZAÇÃO DA CANA-DE-AÇÚCAR, apesar de toda a base técnica, econômica e legal para a continuidade de sua aplicação, chegando-se com isso, à paradoxal situação em que a omissão governamental diante das necessidades de sobrevivência da indústria nordestina de álcool resulta mais letal que a atuação negativa do próprio terrorismo internacional em relação ao comércio externo do açúcar.

            O mais grave de tudo isso é que o próprio Governo Federal, através do Decreto n.º 3890, de 17 de agosto de 2001, deu a si mesmo o prazo de 90 dias para providenciar a transferência para o Ministério da Agricultura e Abastecimento da gestão dos programas e operações em curso relativas ao álcool combustível, bem como da administração dos recursos destinados ao suporte financeiro do PROGRAMA DE EQUALIZAÇÃO.

            Transcorrido já metade deste prazo, nenhuma eficácia foi dada a esse dispositivo regulamentar, mantendo-se, agora ao arrepio da lei, a mesma política madrasta para com o nosso já descapitalizado produtor.

            Assim, não posso deixar de registrar aqui, ao expressar as justas reivindicações do setor sucroalcooleiro nordestino, mais essa contradição entre o discurso e a prática do Governo Federal.

            Se, de uma parte, o Presidente Fernando Henrique dramatiza a ênfase no incremento às exportações brasileiras, parodiando o “Grito do Ipiranga”, através da consigna “Exportar ou Morrer”, de outra parte, deixa nosso exportador competitivo e eficiente à mingua dos recursos que por direito lhe são devidos, não só em virtude de lei e de decreto, mais até por dever de elementar bom senso.

            Com isso, o poder público, por sua ação, ao aumentar os derivados do petróleo e, por sua omissão, quanto ao PROGRAMA DE EQUALIZAÇÃO DOS CUSTOS DE PRODUÇÃO DA CANA-DE-AÇÚCAR DO NORDESTE, deixa de dar conseqüência prática, no caso concreto, a nada menos que 4 princípios fundantes da ORDEM ECONÔMICA, perfilhados pela Constituição Federal vigente, em seu art. 170, quais sejam, o da redução das desigualdades regionais, o da defesa do consumidor, o da defesa do meio ambiente e o da busca do pleno emprego.

            Desavindo com tantos princípios constitucionais que lhe incumbiria respeitar, arrisca-se a administração federal a confrontar-se, afinal, com outro princípio, o único titularizado com exclusividade pelos cidadãos, o do art. 14 da Constituição Federal, o da soberania popular, exercida pelo voto universal, direto e secreto.

            Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


            Modelo15/20/2411:28



Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/10/2001 - Página 24143