O SR. CARLOS BEZERRA (PMDB - MT) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, o bairrismo por vezes se confunde com sentimentos vinculados a um narcisismo regional sem controle, resvalando para uma conotação largamente negativa. No entanto, há muito que os psicólogos e sociólogos se empenham na tarefa de relativizar a aplicação do conceito para um sentido mais positivo, de reforço da auto-estima, do reconhecimento do valor próprio. Nessa linha, gostaria hoje de valer-me de certa porção daquilo que se convencionou chamar bairrismo para justificar meu orgulho em relação à cidade de Sinop, localizada no norte do Mato Grosso.

            Vou explicar: meu orgulho se deve ao recente anúncio de que aquela cidade, em caráter de quase ineditismo, está implantando o projeto Promotoria Comunitária. Trata-se de uma iniciativa extremamente democrática de levar promotores de Justiça da respectiva comarca aos bairros residenciais, invertendo a ordem tradicional da prestação do serviço. Em outras palavras, desde setembro último, representantes do Ministério Público estão se deslocando até os bairros mais longínquos, com o objetivo de atender os moradores carentes. Com mais ênfase, prestam atendimento nas áreas de direito do consumidor, meio ambiente, direitos da criança e questões jurídicas variadas. 

            Mais concretamente, os promotores visitam semanalmente as associações de moradores da cidade, comprometidos com a tarefa de dirimir dúvidas da legislação junto aos habitantes, buscando soluções para seus problemas. Numa entrevista recente, a promotora de Mato Grosso, Elisamara Singles, da Comarca de Sinop, declarou que os casos não resolvidos localmente serão devidamente encaminhados para que a pessoa tenha seu problema resolvido em curto espaço de tempo. Acrescentou, ainda, que a meta é aumentar em 50% o número de atendimentos ao público.

            Do ponto de vista da previsão de rotina, estabeleceu-se, então, que o Projeto Promotoria Comunitária se caracterizaria pelo deslocamento semanal de representantes das Promotorias para as regiões mais carentes de Sinop. Na oportunidade, os agentes da instituição fariam o registro de questionamentos pessoais em relação ao andamento processual nas áreas cíveis e criminais. Visando a melhor racionalização do serviço, foi elaborado um calendário de atendimento aos bairros, a partir do qual se fará ampla divulgação à comunidade para que os objetivos sejam plenamente alcançados. Sem dúvida, uma parcela significativa da sociedade brasileira, no geral, desconhece as ações da Promotoria por falta adequada de informações sobre o funcionamento da máquina pública e dos deveres do Estado. A partir de agora, a população também terá acesso a tais informações pelo telefone, discando o serviço 0800.

            Na verdade, o programa do Ministério Público já havia sido previamente implantado em outras duas cidades do Mato Grosso, Cuiabá e Várzea Grande. Eram experiências tipicamente piloto, que serviriam como modelo a ser seguido por outras cidades do Estado. Sinop saiu à frente, inaugurando com sucesso um modelo de serviço público que privilegia, inexoravelmente, a aproximação do Estado de Direito e a sociedade. Além disso, presta-se a avaliar a receptividade do trabalho dos promotores junto à sociedade, bem como esclarecer ao cidadão o trâmite dos processos cíveis e criminais na Justiça.

            Historicamente, a iniciativa do Ministério Público de Mato Grosso remonta à elaboração do Plano de Ação Estratégica para o biênio 2001/2002, quando se definiu como política prioritária a intensificação do trabalho na área social do Estado. Nesse contexto, delineou-se que, além de reforços na área da Vigilância Sanitária, nos Conselhos Municipais de Saúde e na Educação, dever-se-ia destinar um volume de investimentos significativos ao serviço “disque-cidadania” em todo o Mato Grosso.

            Centralizado em Cuiabá, o serviço “disque-cidadania”, que opera desde o final dos anos 90, ocupou lugar de destaque na Promotoria de Defesa da Cidadania, na medida em que colhia, registrava e tratava as informações recebidas de todas as partes do Estado, encaminhando-as devidamente aos destinatários correspondentes. Segundo estimativas recentes, existe uma demanda de aproximadamente 5 mil pessoas por mês, portando queixas que se estendem desde denúncias de irregularidades na prestação de serviços públicos até ofensas a direitos da coletividade.

            Por isso mesmo, consciente de que a lei deve ser interpretada como meio de transformação social e modo de operacionalização democrática, a Promotoria do Mato Grosso concluiu que não haveria como priorizar o trabalho comunitário senão pela facilitação do acesso da comunidade à instituição e pelo ataque aos gargalos nos setores público e privado no exercício da cidadania. Mais que isso, defendeu uma concepção de envolvimento comunitário cuja natureza exigisse espírito altruísta, abnegação e compromisso com a causa social, por meio do trabalho em equipe multidisciplinar.

            Dito e feito, os resultados só tendem a comprovar a prosperidade das relações entre a sociedade matogrossense e o Ministério Público. Na convicção de que o Projeto Promotoria Comunitária honra-nos muito como cidadãos do Mato Grosso, não me incomoda sequer uma vírgula a crítica que, porventura, se possa aventar sobre certo bairrismo sentimental que carregaria em meu discurso. Pelo contrário, bairrismo para mim em relação ao Mato Grosso é sinônimo sincero de apreço e orgulho de meu Estado.

            Era o que tinha a dizer.

            Muito obrigado. 

            Modelo17/27/243:36