Discurso durante a 15ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa da criação de mecanismos para assegurar aos produtores agrícolas a oportunidade de pagar os empréstimos contraídos junto aos fundos regionais constitucionais.

Autor
Amir Lando (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RO)
Nome completo: Amir Francisco Lando
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • Defesa da criação de mecanismos para assegurar aos produtores agrícolas a oportunidade de pagar os empréstimos contraídos junto aos fundos regionais constitucionais.
Aparteantes
Antonio Carlos Valadares.
Publicação
Publicação no DSF de 08/03/2002 - Página 1816
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • GRAVIDADE, SITUAÇÃO, PRODUTOR RURAL, REGIÃO AMAZONICA, ESTADO DE RONDONIA (RO), INADIMPLENCIA, DIVIDA, FUNDO CONSTITUCIONAL DE FINANCIAMENTO DO NORTE (FNO), APREENSÃO, PERDA, TERRAS, CRITICA, GOVERNO FEDERAL, OMISSÃO, SOLUÇÃO, PROBLEMA, DENUNCIA, EXCESSO, BUROCRACIA, AUSENCIA, COMBATE, DESIGUALDADE REGIONAL, NECESSIDADE, REVISÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), FAVORECIMENTO, AGRICULTOR.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. AMIR LANDO (PMDB - RO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho a esta tribuna para abordar um tema que importa sobremodo à Região Amazônica e, especialmente, ao Estado de Rondônia.

            Quando o Constituinte de 1988 incluiu no texto da Carta Magna a criação dos Fundos Constitucionais do Norte, Nordeste e Centro-Oeste, a idéia fundamental que alimentou sua construção foi exatamente a de propiciar o desenvolvimento dessas regiões. Sucede, Sr. Presidente, que aquilo que seria um conforto e até um privilégio posto à disposição de regiões sabidamente mais atrasadas e menos desenvolvidas, aquilo que seria um incremento ao desenvolvimento, uma facilitação para os produtores rurais, passou a ser um tormento desde que esses recursos começaram a financiar os produtores rurais.

            Em Rondônia, sobremodo, onde a colonização operou mais fortemente, milhares de agricultores tiveram acesso ao crédito dos Fundos Constitucionais, especialmente do Fundo Constitucional do Norte. No entanto, Sr. Presidente, infelizmente, não houve esse aporte de facilidades que o Constituinte concedeu, nem tampouco que os agricultores sonharam, porque aquilo que deveria facilitar a produção e a fixação do homem à terra passou a ser motivo de tormento, de perda da tranqüilidade. Isso porque os juros, o acessório, passaram a ser um elemento de instabilidade, que, ao invés de fixar, passaram a despejar o produtor da gleba, da terra recebida no processo de colonização ou de reforma agrária.

            Infelizmente, os objetivos não foram alcançados e tem sido um calvário a equação da dívida dos fundos constitucionais. A equipe econômica não teve a sensibilidade de se debruçar sobre uma realidade diferente daquela imaginada, daquela supostamente existente.

            Sabemos que o produtor rural da Amazônia passa por condições adversas, de extrema dificuldade, porque, muitas vezes, o mercado oferece preços escorchantes para os produtos agrícolas, numa região de difícil acesso, onde os atravessadores sempre extraem a maior parte da vantagem, cabendo ao produtor o trabalho, o sacrifício, o esforço; porém, renda quase nenhuma.

            No entanto, os juros abstratamente continuam a fazer contas, a aumentar o saldo devedor, comprometendo, inclusive, a permanência da atividade agrícola de grande parte daqueles que buscaram recursos no FNO. Esses, que seriam os recursos da salvação, tornaram-se verdadeiramente os recursos da perdição.

            É essa realidade que precisa ser encarada. É esse o retrato de uma relação extremamente tortuosa da produção rural, sobretudo na Amazônia. Poderíamos, também, transportar esse quadro de dificuldades para o Nordeste, mas não há dúvidas de que não há a mínima preocupação de se tentar resolver o problema na dimensão do seu conteúdo essencial, daquilo que realmente constituem as condicionantes, as vicissitudes das relações de crédito ou de empréstimos realizadas a partir do FNO, no caso específico da Amazônia.

            Ora, Sr. Presidente, cada vez mais há um emaranhado de leis, de disposições incompreensíveis e inacessíveis. É um verdadeiro tratado do absurdo, sem clareza alguma. Como o nosso agricultor pode compreender de maneira clara e inquestionável o que ele assina, com o que ele se compromete, já que a legislação é um amontoado de remissões, de indicações, uma teia que enreda, às vezes, o mais sábio advogado? Não há uma preocupação de se estabelecerem regras claras.

            O Sr. Antonio Carlos Valadares (PSB - SE) - Permite-me V. Exª um aparte, Senador Amir Lando?

            O SR. AMIR LANDO (PMDB - RO) - Ouço V. Exª com muita alegria, nobre Senador.

            O Sr. Antonio Carlos Valadares (PSB - SE) - Nobre Senador Amir Lando, V. Exª discorre sobre um tema atual, traduzindo a realidade da agricultura em nosso País, principalmente nas regiões mais pobres, como o Norte, o Nordeste e o Centro-Oeste. O Governo prova, com a adoção da Medida Provisória nº 9, que se transformou no Projeto de Conversão nº 1, que não tem qualquer compromisso com o desenvolvimento da agricultura e, conseqüentemente, com os produtores rurais. Desde 1994, quando se iniciava a aplicação do Real, o Governo vem apregoando que teríamos um país sem inflação e sem correção monetária e que várias propostas seriam adotadas no sentido de se reduzirem as dificuldades dos produtores rurais com respeito aos seus financiamentos. Em 1993, foi feita uma CPI Mista do Congresso Nacional que concluiu que a verdadeira causa da quebradeira dos produtores rurais residia na cobrança indevida dos juros - extorsivos e inconstitucionais -, que se tornaram uma verdadeira roubalheira, uma apropriação do Governo sobre a produção rural. Foi daí que, em 1995, foi editada uma nova medida provisória e novos reescalonamentos ou negociações foram feitos para resolver o problema da dívida. No entanto, desde então, medidas provisórias são editadas uma atrás da outra - como disse V. Exª, um cipoal de legislação difícil ou quase impossível de ser entendido pelo produtor rural -, constituindo-se um verdadeiro labirinto de leis, talvez para dificultar o entendimento e os agentes financeiros poderem fazer como quiserem no momento da negociação das dívidas dos produtores rurais. O que se esperava com essa medida provisória era que o Governo conseguisse mexer no estoque da dívida, que está em torno de R$16 bilhões nas três regiões. De que precisariam os produtores para regularizar sua situação perante os agentes financeiros, o Banco do Nordeste e o Banco do Brasil? Precisariam única e exclusivamente que o Governo reconhecesse o erro que foi a cobrança da TJLP de 1995 a 1998. Se houvesse o expurgo da TJLP, tenho certeza absoluta de que o montante dos financiamentos cairia a um patamar em que seria possível a negociação com os produtores rurais. Mas o Governo não quer mexer no estoque da dívida, Senador Amir Lando, porque ele quer levá-lo para os americanos, para o FMI. O Governo quer chegar lá e dizer que tem esse patrimônio. Mas nas mãos de quem? Nas mãos dos pobres, dos coitados dos produtores rurais do Norte, do Nordeste e do Centro-Oeste. Ele quer usá-lo como moeda de troca com o FMI. Enquanto isso, vários são os Municípios cuja população está-se esvaziando, porque a atividade agrícola está sendo abandonada, tornou-se inviável por causa desses financiamentos absurdos, dessa cobrança indevida que está sendo feita pelo Banco Central. Aliás, o Banco Central deveria fiscalizar os agentes financeiros. Por outro lado, aqueles que tomaram dinheiro no FAT - foi o caso dos mineiros e dos nordestinos - estão em situação muito pior, porque não são contemplados por essa medida provisória. V. Exª tem razão quando toca nesse assunto. Precisamos estudar essa medida provisória, que passou não sei quanto tempo na Câmara dos Deputados. Os seus prazos foram ultrapassados e agora ela vem ao Senado para ser aprovada a toque de caixa e repique de sino, sem que tenhamos condição de estudá-la convenientemente. Ainda há tempo para consertarmos tudo isso, com o apoio de V. Exª e de muitos que estão trabalhando nessa medida provisória, para tentar aperfeiçoá-la e resolver, de uma vez por todas, o drama que hoje vivenciamos no campo em todo o Brasil. Muito obrigado a V. Exª. Parabéns pelo seu pronunciamento.

            O SR. AMIR LANDO (PMDB - RO) - Senador Antonio Carlos Valadares, V. Exª dá uma contribuição inestimável a essa reflexão que abordo tangencialmente nesta manhã, mas que abordo exatamente buscando as razões, a finalidade essencial desses fundos constitucionais. Os fundos não foram concebidos para, mais uma vez, se tornarem capital especulativo. Não era para serem um volume de recursos, para gerar mais recursos exclusivamente, mas para fomentar o desenvolvimento das nossas regiões, sabidamente pobres e necessitadas.

            E é claro que se tem que olhar as dificuldades, porque o produtor, sobretudo da Amazônia, uma região ínvia, de difícil acesso aos mercados, acaba tendo um produto cujos preços são inferiores aos do Centro-Sul. Como se aplicar a TJLP na Amazônia na mesma circunstância em que se a aplica no Centro-Sul?

            A finalidade desse fundo era diminuir os desníveis regionais, não era a especulação. Porém ele se tornou mais uma massa de recursos especulativos, porque sabemos que é juro demais para a renda de menos do agricultor, sobretudo do Estado de Rondônia. E nós, em relação à Amazônia, estamos melhor do que outros Estados.

            Então, V. Exª pode perceber a incongruência da metodologia, da concepção errônea que se quer aplicar. Em vez de incentivar, estamos matando, numa linguagem bem simples e coloquial, a atividade agrícola, porque muitas, centenas, milhares de agricultores estão perdendo as suas terras, estão vendendo-as, na iminência de o banco executar as dívidas. Estão saindo fora de um problema, de um problema que se formou a partir da contratação desses recursos.

            O Sr. Antonio Carlos Valadares (PSB - SE) - V. Exª me permite?

            O SR. AMIR LANDO (PMDB - RO) - Com todo o prazer. Penso que o tema envolve realmente discussão, um diálogo nacional, um diálogo das nossas regiões. E o que é mais importante é mostrar para a Nação brasileira o equívoco de tudo isso.

            Ouço novamente V. Exª.

            O Sr. Antonio Carlos Valadares (PSB - SE) - A partir de 1995, o Governo entendeu que, para conseguir o equilíbrio fiscal no Brasil, precisava resolver o problema das dívidas dos Estados e dos Municípios. Assumiu, então, por conta e risco, em nome da sociedade brasileira, o endividamento dos Estados e dos Municípios. E V. Exª participou desses debates aqui, em seu segundo mandato. Posteriormente, com a crise financeira que se abateu sobre os bancos, o Governo investiu R$20 bilhões para salvá-los - alguns deles falidos, completamente falidos. O que estamos pedindo não é um Proer para a agricultura, para os produtores rurais. O que nós queremos é que o Governo retire as gorduras, aquilo que foi cobrado indevidamente, como a TJLP, porque aí, sim, ele estará resolvendo, em definitivo, o problema do endividamento rural, que ele fica sempre procrastinando, empurrando para a frente, levando com a barriga. Essa medida provisória talvez seja a última oportunidade de o Governo Fernando Henrique Cardoso prestar um serviço à Nação, porque a produção rural no nosso País, que vem sendo prejudicada, foi a responsável pela manutenção do real, pela queda dos índices de inflação, pela geração de empregos.

            O SR. AMIR LANDO (PMDB - RO) - A âncora verde!

            O Sr. Antonio Carlos Valadares (PSB - SE) - Ora, é fundamental resolver esse problema, tão fundamental como o do endividamento, por exemplo, dos Estados e Municípios, que o Governo assumiu. O que nós queremos não é que ele assuma a dívida dos agricultores, é que retire aquilo que foi cobrado indevidamente, como a TJLP de 1995, o que vai corresponder a mais ou menos um expurgo de 40% na dívida. Ora, se a dívida está em torno de R$16, de R$12 bilhões - embora nem toda essa dívida seja de 1995, mas de 1998 para cá -, e há um rebate de 40% da TJLP cobrada indevidamente, esse expurgo vai corresponder a R$4,8 bilhões. Para beneficiar um setor que contribui com tanto sacrifício para o desenvolvimento do País, como a agricultura, isso não é nada. Na realidade, esse dinheiro não foi tirado da sociedade. O Governo o tirou dos agricultores, porque cobrou uma taxa exorbitante, a TJLP, dizendo que, no Brasil, havia inflação - e ele prega, em todos os cantos, que temos, no Brasil, a economia desindexada. Se a economia é desindexada, não há que cobrar correção monetária de pobres agricultores das nossas regiões.

            O SR. AMIR LANDO (PMDB - RO) - V. Exª tem toda razão. Eu nem desejaria, nesta abordagem, entrar nos números, nas contas, mas talvez seja muito importante nos debruçarmos exatamente nos números, com a exatidão que a matemática oferta.

            A minha idéia é abrir um caminho de concepção, exatamente para possibilitar o expurgo do indevido. Não é o expurgo do devido, daquilo que na concepção legal dos fundos estava implícito.

            O Sr. Antonio Carlos Valadares (PSB - SE) - Mesmo porque, Senador, os juros continuariam sendo cobrados. O que estamos pedindo é o expurgo da TJLP, da correção.

            O SR. AMIR LANDO (PMDB - RO) - Exatamente. Do excesso, do indevido, daquilo que o agricultor, que o produtor rural, sobretudo, que é o mutuário desse processo, não deve e, conseqüentemente, não devendo, não pode pagar. E não pode pagar pela circunstância, como eu disse, de que a rentabilidade do produtor rural, nessas regiões, é mínima e ele não pode suportar isso.

            E o que está acontecendo? Em vez da fixação do homem à terra, está acontecendo o despejo, pela execução, sobretudo, que os agentes financeiros estão fazendo na região do meu Estado, no caso, Rondônia.

            Isso é lastimável. É incompreensível.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha).

            O SR. AMIR LANDO (PMDB - RO) - Vou concluir, Sr. Presidente. Realmente essa medida provisória não resolve quase nada. Essa medida provisória, mais uma vez, engoda; mais uma vez, engana; mais uma vez, cria uma falsa expectativa. O artigo 7º, sobretudo, precisa ser revisto. Para dar essa idéia de perdão, a concepção de que o alongamento da dívida tem que ser, necessariamente, incluído, atendendo a todos os devedores integralmente e seu saldo devedor, inclusive aquele que é inadimplente por força das circunstâncias, aquele que, eventualmente, fraudou esses empréstimos. Podemos analisar um caso ou outro. Mas a concepção é que, realmente, o artigo 7º precisa atender a integralidade do saldo devedor, em primeiro lugar; em segundo lugar, atender também os inadimplentes.

            O que se quer é realmente, neste momento, a idéia da complacência, a idéia de estender uma oportunidade para que o agricultor, para que o produtor rural, sobretudo do Estado de Rondônia, possa voltar a trabalhar com tranqüilidade e não esteja ameaçado constantemente pela perda da propriedade. Porque o Fundo Constitucional do Norte, no caso específico, foi concebido para dar a tranqüilidade, para propiciar o desenvolvimento da nossa região e não para despejar os produtores rurais, os mutuários, que entraram nesse processo escabroso, injusto, incorreto, pagando juros que não são devidos e que fazem o saldo devedor aumentar de maneira intolerável.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


            Modelo15/19/2410:39



Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/03/2002 - Página 1816