Discurso durante a 109ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a violência no Brasil.

Autor
Mauro Miranda (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Mauro Miranda Soares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Considerações sobre a violência no Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 11/09/2002 - Página 17590
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • APREENSÃO, SOCIEDADE, AUMENTO, VIOLENCIA, ZONA URBANA, DEFESA, NECESSIDADE, COMBATE, SITUAÇÃO, PAIS, ESPECIFICAÇÃO, GARANTIA, PROTEÇÃO, SEGURANÇA, ESTABELECIMENTO DE ENSINO, ESTABELECIMENTO COMERCIAL, RESIDENCIA.
  • REGISTRO, DADOS, CRESCIMENTO, VIOLENCIA, AMBITO INTERNACIONAL.
  • COMENTARIO, OMISSÃO, GOVERNO, PROVIDENCIA, REDUÇÃO, VIOLENCIA, PAIS, REGISTRO, NECESSIDADE, MELHORIA, EDUCAÇÃO, CRIANÇA, INVESTIMENTO, PROTEÇÃO, INFANCIA, PREVENÇÃO, PROBLEMA.

O SR. MAURO MIRANDA (PMDB - GO) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, minha presença na tribuna do Senado Federal prende-se, nesta oportunidade, à necessidade de, mais uma vez, expor a V. Exªs minhas considerações sobre tema que considero dos mais relevantes e urgentes dentro do cenário da vida nacional, a ponto de se constituir, indubitavelmente, na tônica maior das preocupações de nossa sociedade.

Refiro-me à questão da violência urbana.

A violência se tornou parte de nosso cotidiano. Nunca se falou tanto em violência e em como combatê-la, e, infelizmente, a sensação de insegurança nunca foi tão presente.

As pessoas mudam seus itinerários, evitam sair à noite, colocam grades e alarmes em suas casas; e os mais ricos blindam seus automóveis. Esse medo, ainda, deixou de ser característico das grandes cidades e se espalhou também entre as cidades interioranas, de porte médio, antes vistas como oásis de tranqüilidade e de segurança.

Junto à violência urbana, estão outras violências: como as que se fazem contra as mulheres, crianças, idosos, homossexuais, negros, nordestinos e outros grupos sociais. Todas são tão graves quanto a violência urbana e necessitam de medidas apropriadas para seu controle e erradicação, uma vez que há uma forte correlação de causa e efeito entre estas e a violência manifestada nas áreas públicas.

O combate à violência deve, necessariamente, conter diretrizes para solucionar cada uma das formas de violência citadas, pois o fim da violência nas ruas só será alcançado com o fim da violência dentro de casa, dentro da escola, dentro da empresa e em outros ambientes onde se manifesta.

A violência deve ser entendida como um fenômeno decorrente de processos sociais que levam pessoas e grupos, instituições e sociedades a se agredirem mutuamente, a tomarem à força a vida, o psiquismo, os bens ou o patrimônio alheio, um dos problemas que mais aflige a humanidade nos dias de hoje. É um fenômeno universal. Não é particular a um país, a determinadas regiões, a cidades grandes ou pequenas, a uma ou outra raça ou religião, a condições socioeconômicas.

Existem cidades com índices elevados de violência, como Nova York, Los Angeles, Paris, localizadas em países com alta renda per capita. Na Inglaterra, país de economia estável, povo tranqüilo, ordeiro, polícia desarmada, pouca desigualdade social, a criminalidade aumentou 26% no ano de 2000. Os Estados Unidos, país mais rico do mundo, que gasta bilhões de dólares em segurança, alardeiam somente tímidos progressos no combate ao crime e à violência; há cerca de 1 milhão e 200 mil pessoas nas penitenciárias e um número crescente de adolescentes delinqüentes, que vivem se matando nas escolas.

Na África, as tribos se matam, e milhares de crianças são sacrificadas. Na Bósnia, os brancos se matam. Na Irlanda, católicos e protestantes estão há anos em conflito permanente. Na Argélia, inocentes são sacrificados diariamente. Neste momento, de forma ainda mais cruel e violenta, judeus e palestinos se digladiam.

A sociedade indignada vê o governo e seus órgãos de segurança como incapazes de combater o problema. Exige providências no sentido do aumento dos efetivos policiais e quer vê-los nas ruas, garantindo proteção nas escolas, nos bancos, nas lojas e, se possível, até nos seus lares.

E, o que é sociologicamente mais grave, constata também que a maioria das pessoas que vivem em condições desumanas, nas favelas, invasões e lixões, não é violenta. Crimes bárbaros, assaltos, estupros são praticados por jovens de classe média ou alta, muitas vezes contra os próprios pais ou familiares.

As instituições governamentais e não-governamentais, nacionais e internacionais, vêm se reunindo em comissões, congressos e seminários, discutindo e trabalhando o tema da violência, com resultados decepcionantes.

Por que tanta violência, perguntam todos? Por que jovens de boas condições sociais se tornam criminosos, inclusive homicidas?

A pergunta deve ser outra. A questão a ser debatida é a revisão conceitual da política de segurança pública, migrando do atual conjunto de ações preconizadas, prioritariamente destinadas a combater a violência; e relegando a segundo plano a real linha de solução do problema, combatendo preventivamente os fatores determinantes do comportamento anti-social dos indivíduos violentos ou infratores.

Certamente e também infelizmente, devemos implementar medidas corretivas de curto prazo, até mesmo emergenciais, no sentido de redimensionar e prover eficácia à ação ostensiva e corretiva das forças de segurança, para que se dê um basta na violência extrema que já vemos configurada em algumas cidades brasileiras, mas isso não será suficiente e senão um paliativo para a questão da violência, uma vez que, como numa doença, não se podem extinguir as conseqüências sem debelar as causas.

As autoridades devem se convencer de que todos os atos violentos são perpetrados por pessoas e que, por isso, a prevenção, numa política de longo prazo, passa pela boa formação do caráter e da personalidade dos indivíduos, o que só será conseguido protegendo-se as crianças, desde a mais tenra infância, dos fatores que possam ocasionar desvios no seu comportamento.

Devemos investir na proteção infantil, período em que se forma o caráter e a personalidade, com um novo modelo de pré-escola, em que possam suprir as necessidades emocionais das crianças para o bom desenvolvimento de sua personalidade, com o concurso de pediatras, psiquiatras infantis, psicólogos, educadores, assistentes sociais, sociólogos, antropólogos e outros.

Precisamos investir em saúde materno-infantil e em proteção à família, em seu sentido mais amplo, garantindo os recursos mínimos necessários à sua sobrevivência, evitando que o lar se torne um cenário de comportamentos inadequados e agressivos, que formam um exemplo de péssimos valores morais e sociais, redundando na criminalidade e na violência entre os jovens.

Os fabulosos recursos consumidos pelo Estado, sem o retorno esperado, nos mostraram, sem dúvida, que o combate à violência, sem programas dirigidos à prevenção, é inócuo, e que ela continuará crescendo, para desespero de nossa sociedade.

Assim, ainda que tenhamos que sofrer a pressão da violência atual, devemos dedicar uma parcela de tais recursos para a formação de uma base social compatível com as necessidades de proteção infantil, para que possamos legar aos nossos filhos um futuro menos violento e mais humano.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/09/2002 - Página 17590