Discurso durante a 42ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Importância do incentivo ao cinema nacional.

Autor
Íris de Araújo (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Íris de Araújo Rezende Machado
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA CULTURAL.:
  • Importância do incentivo ao cinema nacional.
Publicação
Publicação no DSF de 23/04/2003 - Página 8332
Assunto
Outros > POLITICA CULTURAL.
Indexação
  • DENUNCIA, FALTA, ACESSO, MAIORIA, POPULAÇÃO, BENS CULTURAIS, REGISTRO, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, SUBCOMISSÃO, CINEMA, COMUNICAÇÕES, INFORMATICA, REALIZAÇÃO, AUDIENCIA, SECRETARIO, MINISTERIO DA CULTURA (MINC), PRODUTOR.
  • ANALISE, DADOS, PRODUÇÃO, INDUSTRIA NACIONAL, CINEMA, DIFICULDADE, EXIBIÇÃO.
  • CRITICA, GOVERNO ESTADUAL, ESTADO DE GOIAS (GO), FALTA, INCENTIVO, CINEMA, MUNICIPIOS, INTERIOR.
  • SOLICITAÇÃO, SENADOR, CAMPANHA, INSTALAÇÃO, LOCAL, EXIBIÇÃO, CINEMA, MUNICIPIOS, INTERIOR, VALORIZAÇÃO, CULTURA, BRASIL, TURISMO, CRIAÇÃO, EMPREGO, INDUSTRIA CINEMATOGRAFICA.

A SRª IRIS DE ARAÚJO (PMDB - GO ) - Sr. Presidente Srªs e Srs. Senadores, ainda menina, eu via filmes selecionados pelo padre de minha cidade e foi assim, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que o encanto das imagens na sala escura me tornou - para sempre - uma apaixonada pelo cinema. Foram os filmes - às vezes até mais do que as aulas de geografia ou história - que me revelaram povos distantes, línguas estranhas, cenários naturais diferentes daqueles da região onde eu vivia

Mas, quando falo da minha inclusão entre os privilegiados cinéfilos, não é apenas para reviver um momento mágico de minha vida. E, sim, para clamar contra a exclusão de 100 milhões de brasileiros, que hoje não podem entrar numa sala de cinema.

Diante dos graves problemas que o Brasil enfrenta, pode parecer que estou falando de perfumaria. Quando o governo e a sociedade se unem para tentar saciar a fome de milhões de brasileiros, é natural que se considere a cultura e a produção cinematográfica como uma questão secundária.

Mas nem só de pão vive o homem. Na canção Comida, que já faz sucesso há mais de uma década, os Titãs expressam uma reivindicação que é de todos: a gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte... Ou seja: para saciar a fome dos brasileiros, é preciso trabalhar em muitas frentes, porque há também fome de livros, fome de cinema, de música, de artes plásticas

Caro Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o povo brasileiro vive num verdadeiro estado de subnutrição cultural.

E é aqui, no já por mim muito amado espaço do Senado Federal, que tenho tido a oportunidade de me aprofundar no conhecimento das razões da nossa fome de cinema, muito especialmente ao participar da Subcomissão Permanente de Cinema, Comunicação e Informática, na qual tenho a honra de ocupar a vice-presidência.

Essa subcomissão, que já funciona há quatro anos, possui um riquíssimo acervo de informações construído em audiências públicas de representantes de todos os segmentos da área de produção cinematográfica brasileira. Trata-se de um esforço de melhor conhecer, para melhor contribuir no combate à fome de cinema dos brasileiros. Na última audiência, em que estiveram presentes o Secretário-Geral do Ministério da Cultura, Sr. Juca Ferreira, e a presidente do Congresso Brasileiro de Cinema, a produtora paulista Assunção Hernandez, tivemos um verdadeiro alerta para a necessidade imperiosa de transformarmos essa situação, contribuindo inclusive para criação de muitos e melhores empregos para os nossos jovens.

Os números impressionam.

Mais de 80% da produção cinematográfica brasileira está concentrada no eixo Rio/São Paulo. E esse percentual já reflete conquistas do cinema regional, como o baiano, o cearense, e, muito especialmente o gaúcho, que tem se expandido muito nos últimos anos, como o filme Houve uma vez dois verões, de Jorge Furtado, que eu pensara ser filme francês.

Mas, mesmo os filmes produzidos no eixo Rio/São Paulo, têm escassas possibilidades de serem vistos pela grande maioria dos brasileiros. Isto porque, no Brasil, segundo levantamento do Congresso Brasileiro de Cinema, 93% das sessões das nossas salas de exibição é espaço dedicado aos filmes norte-americanos! O que quer dizer que, para os produtores brasileiros, resta competir para ocupar os restantes 7%. É por isso que a área de distribuição e exibição de filmes se tornou conhecida como o “gargalo” do cinema brasileiro: só chegam ao público aqueles que conseguirem passar pelo funil... Dos mais de 70 filmes produzidos por brasileiros no ano passado, apenas 32 - menos da metade - contam com garantia de exibição.

Há, no Brasil, uma demanda reprimida de mais de 6 mil novas salas de exibição. Para uma população de 170 milhões de habitantes, contamos com apenas 1600 salas de cinema; que, por sua vez, estão concentradas nas capitais ou em cidades de grande e médio porte. Nas pequenas cidades, a situação é muito pior: mais de 80% dos municípios brasileiros não têm uma única sala de projeção cinematográfica.

E, aqui, desejo criticar a política de pouca consistência que vem sendo levada pelo governo de Goiás, o meu Estado.

Há quatro anos, o governo de Goiás ganha espaço na mídia pela realização do FICA/Festival Internacional de Cinema Ambiental, que, em si, é uma bela idéia, se não fosse por um detalhe: nossa antiga capital, a Cidade de Goiás, que sedia o festival, não tem ainda um projetor. Assim, quando termina o FICA, as pessoas que se encantaram com os filmes voltam a ver... navios! Sim, porque terminada a festa, embrulha-se o projetor alugado, que vai embora e só volta para o próximo festival.

Caro Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, imaginem a frustração de uma cidade que sedia um festival mas não tem um projetor de cinema! E o que pensarão do Brasil os visitantes estrangeiros que, nas conversas com os seus colegas brasileiros, certamente ficam sabendo do fato.

Mas, voltemos à questão inicial sobre a importância ou não de socorrermos o cinema brasileiro. A intensa luta dos nossos cineastas já nos mostrou que cinema também é questão de segurança nacional. 

Somos um país formado por rica e variada origem étnica. A tal ponto que, para muitos estudiosos, em lugar de cultura, já podemos falar numa civilização brasileira, tão rica é a nossa diversidade étnica e cultural e a nossa unidade como nação.

No mundo de hoje, é certamente a produção audiovisual que documenta e divulga nossa multiculturalidade. Pergunto aos senhores, caro Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores: como podemos os brasileiros fortificar nossa identidade cultural, se não pudermos contar com a nossa imagem e a nossa cultura nas telinhas da tevê e nas telas do cinema? Esta abstinência está nos levando a substituir os nossos valores, as nossas tradições e a nossa cultura pela cultura daqueles povos que aprendemos a conhecer no cinema. Apropriando-me de expressão que ouvi da produtora Assunção Hernandez, é como se alguém se olhasse no espelho e visse refletido um rosto estranho.

Há ainda muito o que dizer, mais ainda o que fazer nesta área. Mas, por hoje, quero conclamar minhas colegas Senadoras e meus colegas Senadores a fim de que, para além do que já estamos fazendo, cada um de nós, no seu Estado, use sua influência política para estimular a instalação de mais e mais salas de cinema. Naturalmente, com projetores... Nada de luxo: um modesto cine “poeira”, um teto, tela, projetor, cadeiras. Temos 5 559 municípios. Se instalarmos um único cinema nos 80% que não têm sala de exibição, mais todos os outros onde faltam salas nas periferias, já estaremos pertinho de atender à demanda das 6 mil salas...

Vamos despertar nos nossos governadores e prefeitos a paixão pelo cinema, especialmente o brasileiro que, divulgando a nossa cultura e os nossos cenários naturais, há de contribuir para o desenvolvimento dos nossos negócios, especialmente o turismo. O turismo, caros Senadores e Senadoras, é o ramo de negócio que mais se desenvolve no mundo inteiro. Só para dar um exemplo, hoje, de cada 10 novos empregos criados, 1 vem da área do turismo ecológico. E o turismo, em geral, é um ramo de negócio que se abre para jovens e velhos, homens e mulheres, com muita ou pouca escolaridade, ou seja: é uma frente inesgotável de empregos. E o cinema é um grande divulgador de nossas riquezas naturais e culturais. O cinema é uma agência de turismo informal que atrai clientes no mundo inteiro.

Além disso, o mercado audiovisual é também frente de criação de formação de mão-de-obra, oferta de conhecimento e criação de empregos nas novas frentes da moderna economia globalizada.

Obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/04/2003 - Página 8332