Discurso durante a 68ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Estranheza da aceitação, pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de convite para viajar a França em aviação cedido pela BOEING. Registro de manchetes publicadas na imprensa nacional, nos últimos dias, apontando a piora dos indicadores econômicos e às frases bizarras atribuídas ao Presidente da República.

Autor
Arthur Virgílio (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.:
  • Estranheza da aceitação, pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de convite para viajar a França em aviação cedido pela BOEING. Registro de manchetes publicadas na imprensa nacional, nos últimos dias, apontando a piora dos indicadores econômicos e às frases bizarras atribuídas ao Presidente da República.
Publicação
Publicação no DSF de 03/06/2003 - Página 14063
Assunto
Outros > PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.
Indexação
  • MANIFESTAÇÃO, DESAPROVAÇÃO, CONDUTA, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ACEITAÇÃO, OFERTA, VIAGEM, PAIS ESTRANGEIRO, FRANÇA, UTILIZAÇÃO, AERONAVE, EMPRESA ESTRANGEIRA, CONCORRENTE, EMPRESA NACIONAL, EMPRESA BRASILEIRA DE AERONAUTICA (EMBRAER).
  • LEITURA, TRECHO, PUBLICAÇÃO, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE S.PAULO, GAZETA MERCANTIL, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), CORREIO BRAZILIENSE, DISTRITO FEDERAL (DF), O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), REGISTRO, DIFICULDADE, SITUAÇÃO, ECONOMIA NACIONAL, AUMENTO, DESEMPREGO, POSSIBILIDADE, CRISE, AGRICULTURA, INSUFICIENCIA, SALARIO, REDUÇÃO, OFERTA, CREDITOS, GOVERNO FEDERAL.
  • CRITICA, INCOERENCIA, CONTRADIÇÃO, DIFICULDADE, INTERPRETAÇÃO, DECLARAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, IMPUTAÇÃO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, RESPONSABILIDADE, PROBLEMA, BRASIL, DEFESA, ALTERAÇÃO, CONDUTA, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, PRESIDENTE DA REPUBLICA.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM. Como Líder.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, pouco antes de assumir o Governo, Lula e sua equipe de transição apregoaram aos quatro ventos candentes palavras de protesto, diante da anunciada contratação de plataformas da Petrobras, para a exploração de petróleo no exterior: tudo bem, pode até ser correto se ficar provado que não haverá aumento de custos nem defasagem tecnológica.

Agora, na viagem do Presidente a Evian, na França, para o encontro do G-8, Sua Excelência e sua comitiva viajam num luxuoso Boeing BBH, versão executiva do conhecido 737: tudo mal, nem muito correto, estrategicamente falando.

Na verdade, como diz o jornal O Estado de S.Paulo, na edição do dia 30 de maio, essa cortesia da Boeing tem um preço: 50 milhões de dólares, já que a empresa americana está tentando vender uma unidade para o Governo do Brasil. A matéria emite a opinião de um ex-diretor da Embraer cujo nome, por questões éticas, foi preservado. Diz ele, a propósito da aceitação da cortesia da Boeing: Faltou sensibilidade. O selo da Presidência estará a bordo de um produto concorrente, na fuselagem do avião e a bordo, o selo da República Federativa do Brasil; ou seja, o selo brasileiro num avião da Boeing que se prepara para lançar um outro avião, em consórcio com o setor aeronáutico russo, o Russian Regional Jet (RRJ), sem dúvida, para concorrer com o brasileiro EMB 170/190, que, se convertido para transporte presidencial, teria autonomia intercontinental.

A sensibilidade a que se refere o ex-dirigente da Embraer pode ser traduzida com a simples informação de que o novo modelo russo da Boeing será apresentado, em duas semanas, em um salão aeroespacial em Le Bourget, na França.

Mais ainda. Lula vai experimentar, também como cortesia do mesmo tipo, uma versão especial do Airbus A3-19. Será por ocasião de sua viagem à Europa, em julho.

Vamos aos preços:

O Boeing que vai levar o Presidente a Evian custa 50 milhões de dólares; o Airbus, 32 milhões de dólares; o EMB 170/190, na versão especial, de autonomia intercontinental, custa 30 milhões de dólares. Trata-se de avião de forte aceitação no mercado externo. Só com a companhia aérea USAirways, a Embraer fechou contrato para a venda de 85 aviões. Na versão comercial, o EMB 170/190 custa US$24 milhões.

Fica aqui o registro para manifestar, no mínimo, estranheza, diante de critérios que parecem inadequados:

Antes era o mar, no caso das plataformas da Petrobras; agora estamos no ar, em meio a preços estratosféricos, além de uma clara demonstração de desapreço a uma empresa aeronáutica brasileira, que se está transformando, pelo valor de seus dirigentes, pesquisadores e técnicos, num grande player internacional. Que tal um pouco de prudência, não só para navegar, mas também para voar? Cortesia com o chapéu alheio é o que não convém”.

            Sr. Presidente, à altura de cinco meses do Governo do Presidente Lula, temos erros e acertos e, com toda clareza, temos o fim da chamada lua-de-mel.

Chamo a atenção para algumas manchetes de jornais, algumas notas dos últimos três ou quatro dias:

Dia 30 de maio, Folha de S.Paulo: “Exportações caem e já não carregam o País”.

Dia 30 de maio, Folha de S.Paulo também: “PIB tem o pior desempenho dos últimos três trimestres”.

Mesmo jornal, no mesmo dia: “Banco Central culpa reajuste de salário por manter juro”. E isso apesar de os trabalhadores não estarem obtendo exatamente a reposição passada. Não estão obtendo. Todos têm negociado, praticamente sem exceção, reajustes salariais menores do que a inflação passada.

Ainda Folha de S.Paulo, no mesmo dia: “Consumo das famílias tem sétima queda seguida”.

Correio Braziliense, no dia 30 de maio: “Governo de surtos”. Aí diz que o surto da semana é o das más notícias econômicas: “O desemprego na maior cidade do País bateu um recorde histórico, a renda encolhe 6.8%, no primeiro trimestre, e a atividade industrial diminuiu”.

Dia 30 de maio, Folha de S.Paulo: “Agricultura pára...”, o que significará liquidar com as perspectivas de curto prazo no Brasil. A agricultura tem sido o motor a sustentar a nossa economia. É a manchete: “A agricultura pára se a economia não crescer”.

E aqui vemos, no dia 31 de maio, o Presidente do PT, ex-Deputado José Genoíno, comparando o manifesto da esquerda do PT à nota da Fiesp. Ele consegue atacar tanto os companheiros ditos à sua esquerda, quanto os empresários que tanto encantamento têm demonstrado pelas primeiras políticas implantadas pelo Governo Lula.

Dia 31 de maio: “Bola de neve de críticas preocupa o Governo”. Governo democrático tem que gostar das críticas, não se preocupar com elas. Em O Estado de S.Paulo, diz o Deputado Ivan Valente, do PT de São Paulo - vejam que não é nem um líder da Oposição -, em longa entrevista ao jornal, que “não haverá espetáculo de crescimento”.

Folha de S.Paulo, dia 31: “Oferta de crédito não pára de cair no País”.

Luís Nassif, coluna do dia 31 de maio: “Ataque de nervos”. Ele imagina que está bastante atacado de nervos o Banco Central brasileiro.

O Globo, de 31 de maio: “MST invade fazenda experimental do Governo”. Isso não é novidade, é cotidiano.

E aqui, Sr. Presidente, entro com as quatro últimas notas. Uma, do dia 2 de junho, da Gazeta Mercantil: “A estagnação da economia”. Um longo artigo, mostrando como o País, em sua economia real, parou.

Folha de S.Paulo, dia 1º de junho: “Júpiter seria culpado por juros, diz a Astrologia”. Diz que o Governo adentra pelo perigoso terreno do sobrenatural, abandonando o contato com a realidade cada vez mais. E no mesmo jornal, Folha de S.Paulo: “Deus vira obsessão nos discursos de Lula”. Diz o artigo que sociólogos estão preocupados com traços de messianismo que começam a se manifestar na personalidade dessa nossa figura tão estimada, que é o Presidente Lula.

Atribuo ao cansaço, à exaustão, toda essa falta de governo, toda essa falta de presença cotidiana em dirigir os destinos do País, toda essa perplexidade com acertos macroeconômicos, mas muita timidez, e também com equívocos terríveis no microeconômico, com inércia, com inação administrativa comprovada, afirmações, pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do tipo: “A dura realidade é que todos temos um pouco de louco dentro de nós”, quando se referiu, como se fossem loucos, aos portadores de deficiências mentais. Depois diz algo que eu não sabia e que aprendi com Sua Excelência: “No Brasil inteiro, todo mundo fala português, do Oiapoque ao Chuí”. Depois diz, filosofando, em 1º de maio: “Na vida de um ser humano acontecem muitas coisas que normalmente ele não prevê que vão acontecer”. Mais ainda: “Nenhum ser humano é cem por cento bom e nenhum ser humano é cem por cento mau”. E diz algo fantástico sobre as reformas: “Todo mundo tem o direito de ser contra, a favor ou muito pelo contrário”. Há uma fantástica: “Nem eu nem o Presidente Toledo teríamos o tamanho que temos hoje se tivéssemos nascido pequenos”. Sua Excelência constata que, assim como o Presidente Toledo, nasceu pequeno e depois cresceu, como costuma acontecer com as demais pessoas. Aí diz: “O importante foi a coragem de nascer”. Então, o Presidente, como o Presidente Toledo, teve o seu nascimento como o primeiro gesto de coragem da sua vida corajosa - e eu testemunhei, ao seu lado, vários momentos de coragem. Nasceu não por um gesto da natureza, mas por um ato da sua coragem pessoal. Prossegue: “Como dizia Lampião, em 1927, neste País, quem tiver 30 contos de réis não vai para a cadeia”.

Sua Excelência diz: “Alguém vai perder com as reformas? Vai. Alguém vai pagar mais? Vai. Mas é assim a vida. Jesus Cristo foi crucificado para salvar a humanidade”. E ainda: “À medida que a gente vai tendo acesso à saúde, a dentista, a gente vai percebendo que não há ninguém 100% feio nem ninguém 100% bonito. Ou seja, todo mundo pode ser melhorado”. Depois, num ato falho, referindo-se ao povo como se fosse gado, Sua Excelência diz: “Abre a porteira, Gonçalves. [Dias, chefe da segurança]” Diz o jornal que “a comparação da cerca de proteção com o curral causou constrangimento”.

E mais: na tal cerimônia com as pessoas que sofriam de deficiência mental, citou três vezes a palavra “loucos” e tratou essas pessoas como portadores de transtornos mentais. Depois, referindo-se ao Vice-Presidente José Alencar, disse: “Nossa história se juntou como um caso de amor profundo, como Romeu e Julieta”. E novamente ele fala do Presidente Toledo, uma coincidência. Diz o Presidente Lula: “O término do nosso mandato terminam juntos”. Seria estranho, Sr. Presidente, se o término começasse. O término dos mandatos terminam juntos. De fato, estou aqui embasbacado.

Em 21 de maio, em Balsas, ele disse - e isso é fantástico: “Graças a Deus, a humanidade é feita de homens e mulheres covardes e corajosos”. Faltou dizer: Graças a Deus, a humanidade é feita de homens e mulheres covardes, corajosos e mais ou menos. Teria sido, talvez, mais exato, porque as pessoas não são tão assim e nem tão assado.

Atribuo tudo isso a duas coisas: ao cansaço e à perplexidade diante de um poder que talvez lhe esteja sendo pesado a essa altura. E mais ainda, se posso lhe fazer alguma recomendação, recomendo que o Presidente sente para governar, que o Presidente sente serenamente e tome atitudes de homem de Estado. Viaje muito, sim, para divulgar o País, para defender nossos interesses. Viaje pelo Brasil, sim, para não perder contato com o seu povo, não ficar isolado no Palácio. Mas, procure sentar, ouvir, meditar muito sobre o perigo que é o improviso para quem tem a responsabilidade de ser Presidente da República de um grande país como o Brasil e de regime presidencialista.

Portanto, quanto menos gafes daqui para frente, quanto menos coisas bizarras forem pronunciadas pelo Senhor Presidente, melhor para todos nós, em função do próprio bom nome do País. Talvez todo esse quadro esteja transtornando o Presidente. Já não basta ficar falando em herança maldita, já não basta ficar falando do que recebeu. Os indicadores estão todos piores. Sem exceção, estão todos piores. Se verificarmos o social, o Governo simplesmente não consegue pagar 645 mil bolsas-escola. E diz o MEC que isso se deve ao cadastro. Mas esse mesmo cadastro, tão defeituoso, não impediu que o Governo passado pagasse normalmente as bolsas-escola, ou seja, é hora também - se eu pudesse fazer uma última sugestão - de evitar desculpas, escapismos, evitar colocar sempre a culpa em quem está atrás.

Sempre digo que existiram dois Presidentes da República que não tiveram como colocar a culpa nos seus antecessores: Marechal Deodoro da Fonseca, porque não teve antecessor, foi o primeiro Presidente do Brasil; George Washington, que também não teve antecessor, pois foi o primeiro Presidente da República norte-americana. Os demais, sempre, em algum momento, usaram ou até abusaram do que imaginaram fosse o direito deles de colocar a culpa em antecessores.

Está na hora de assumir responsabilidades, sentar para governar, meditar sobre o que se fala, evitar gafes, evitar coisas bizarras, evitar o folclórico, falar com muita seriedade e, sobretudo, dar respostas em cima de um quadro. A política atual, a meu ver, é injustificada, pois, em função até do bom trabalho feito pelo Ministro Palocci, todas a precondições estão postas para se começar uma redução de juros. Se não se começa para valer um gesto mais ousado, este País poderá mergulhar numa recessão sem precedentes e com muito poucas possibilidades de se sair bem a curto prazo, até porque o mundo à volta não emite sinais de prosperidade. O mundo à volta emite sinais entre amarelos e vermelhos, entre alerta e perigo.

Portanto, é hora de o Presidente fazer um balanço e, quem sabe, começar para valer a fase sensata e sóbria de um Governo que todos nós queremos que dê certo, a bem do nosso povo, a bem da nossa sociedade, do nosso futuro, da nossa história.

Muito obrigado, Sr. Presidente. Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/06/2003 - Página 14063