Discurso durante a 81ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Trabalho informal no Brasil.

Autor
Íris de Araújo (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Íris de Araújo Rezende Machado
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.:
  • Trabalho informal no Brasil.
Aparteantes
Paulo Paim.
Publicação
Publicação no DSF de 21/06/2003 - Página 15946
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.
Indexação
  • ANALISE, SITUAÇÃO, TRABALHO, ECONOMIA INFORMAL, OCORRENCIA, DESRESPEITO, LEGISLAÇÃO TRABALHISTA, PREJUIZO, FINANÇAS, BRASIL, PERDA, VERBA, ARRECADAÇÃO, IMPOSTOS.
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, IMPLEMENTAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, PROGRAMA, REGULARIZAÇÃO, TRABALHO, ECONOMIA INFORMAL, ESPECIFICAÇÃO, FACILITAÇÃO, REGISTRO, EMPRESA, ABERTURA DE CREDITO, REDUÇÃO, CARGA, TRIBUTAÇÃO.

A SRª IRIS DE ARAÚJO (PMDB - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho à tribuna do Senado Federal para tecer comentários sobre a relevante questão do trabalho informal, atualmente um significativo gerador de renda e emprego em nosso País, cuja realidade é evidenciada pelas estatísticas econômicas e que representa um cruel drama humano e social, já que milhões de brasileiros, por falta de opção, ganham seu sustento na informalidade, sem qualquer amparo ou segurança do Estado.

O tema é considerado também um dos vetores a respeito das reformas tributária e da Previdência, que se encontram em debate no Congresso Nacional. A formulação é simples. Na medida em que o Estado busque acoplar ao sistema formal esse amplo segmento à margem da legalidade, muito maiores são as possibilidades de alcançar um melhor equilíbrio nas contas públicas, aí incluído o dilema da busca de alternativas para o complexo previdenciário brasileiro.

Pode-se considerar o trabalho informal como aquele cujas atividades produtivas são executadas à margem da legislação trabalhista vigente, incluindo, assim, os trabalhadores autônomos, os sem carteira assinada e os não-remunerados. Essa visão enfoca o trabalho informal a partir da característica de precariedade da ocupação, já que não se configuram os vínculos trabalhistas, nem o recolhimento de tributos e contribuições previdenciárias.

Numa segunda visão, pode-se definir o trabalho informal como aquele vinculado a estabelecimentos de pequeno porte, em que se confundem capital e trabalho, e que apresentam baixos níveis de produtividade e de estruturação. Os integrantes desse núcleo básico seriam os trabalhadores de pequenas firmas, tanto empregadores como empregados.

Nesse caso, o trabalho informal não é definido pelo respeito ou não ao marco legal, mas pela dinâmica econômica dessas unidades produtivas, que se baseiam essencialmente em uma estratégia de sobrevivência para alguns trabalhadores, que preferem desenvolver o seu próprio negócio, em parceria com familiares e conhecidos.

Esses trabalhadores informais seriam vinculados a um sistema de produção de mercadorias e serviços onde o empregador também trabalha como empregado, podendo fazer uso de ajudantes não-remunerados (geralmente familiares), bem como, também, contratar outros ajudantes, sem carteira assinada, como vemos no caso das microempresas familiares.

Além disso, há as pequenas empresas familiares, como as padarias, confecções, locadoras de vídeo, mercearias e oficinas de reparos, que sobrevivem pela clientela de bairro, em que sua vantagem competitiva permite enfrentar a concorrência. Nelas, convivemos com jornadas de trabalho não reguladas pela lei, com os salários abaixo do mercado e sem uma separação clara entre o rendimento do empregador e a taxa de lucro do empreendimento.

Nessa emaranhada rede de trabalho, vamos encontrar, ainda, a nova modalidade de economia solidária, representada pelas cooperativas de trabalho para produção de mercadorias e prestação de serviços, em que os frutos do trabalho são repartidos entre os trabalhadores.

Finalmente, podemos mencionar, também, dois outros tipos de trabalhadores, os domésticos e os profissionais liberais, que não se encontram incluídos na definição clássica de informais, mas que, em muitos aspectos, compõem um cenário não propriamente formal.

Senador Paulo Paim, gostaria de ouvir o aparte de V. Exª. E aproveito a oportunidade para dizer que fiquei muito gratificada ao ouvir há pouco o seu pronunciamento. E não apenas hoje. V. Exª tem assomado à tribuna repetidas vezes para falar sobre as mudanças na reforma previdenciária.

Senador Paulo Paim, considero extremamente justas as colocações de V. Exª. Espero que haja mudanças, como eu disse no meu primeiro pronunciamento. Elas não tocam apenas a cabeça do brasileiro, mas também o coração.

Creio que a determinação de V. Exª de repetir essa questão e de ter sido muitas vezes mal entendido nas suas colocações é que propiciaram - juntamente com outros parlamentares que fizeram eco à sua voz - ao Governo ouvir e sentir a necessidade dessas mudanças.

O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Senadora Iris, quando V. Exª re refere a “outros parlamentares”, eu queria incluir V. Exª e a Senadora Serys. Tenho conversado muito com diversos Senadores e Deputados, inclusive com ambas, e sempre tive apoio, numa linha não de ser contra tudo e contra todos. V. Exª inclusive disse: “Vamos trabalhar numa linha de alterar o projeto, de melhorá-lo”. Portanto, sinto-me contemplado com a posição de ambas, que é a deste Parlamentar. Espero que Goiás resolva a sua situação para que este Senado não perca V. Exª a partir de julho, já que V. Exª está sendo convocada a retornar ao Estado. Que eles mudem a sua convocação. Toda a vez que V. Exª assoma à tribuna desta Casa -- e isto não é nenhuma “rasgação de seda” --, V. Exª o faz com discursos muito bem-elaborados, construídos, eu sei, com muito carinho. V. Exª sempre aborda assuntos relevantes para o conjunto da população deste País, assim como, também, a Senadora Serys. Por exemplo, agora, V. Exª traz um assunto sobre o qual é impossível não pedir um aparte. Este é um assunto que adoro discutir e, para o qual, buscar alternativas. Mais de 40 milhões de pessoas neste País estão trabalhando no mercado informal, e V. Exª suscita o debate. V. Exª quer que, juntos - entendo assim -, Câmara e Senado, possamos construir alternativas para que, ao mesmo tempo em que podemos gerar novos postos de trabalho, consigamos, no futuro, garantir que essas pessoas tenham direito à aposentadoria. Hoje, estão se defendendo; de uma forma ou de outra, estão recebendo um, dois, três ou quatro salários, mas, se não encontrarmos uma forma de incluí-los na formalidade, no futuro, poderão ser indigentes ou integrar a categoria daqueles que, se tiverem mais de 67 anos e se a renda per capita da família não ultrapassar um quarto do salário mínimo, esses cidadãos receberão a ajuda de um salário mínimo. Em primeiro lugar, ninguém consegue provar que vive com menos de um quarto do salário mínimo. Portanto, V. Exª traz ao debate um assunto fundamental. Estou, inclusive, discutindo com alguns Senadores a expectativa de criarmos uma frente para debater a questão do desemprego e da informalidade. Não quero tomar mais o tempo de V. Exª e, com isso, interromper o brilhante pronunciamento, escrito com muito carinho e com muita responsabilidade por V. Exª, que ficará registrado nos Anais da Casa, na íntegra. Esta é uma contribuição a esse grande debate que teremos que enfrentar. Não é possível sabermos que existe 40 milhões de pessoas na informalidade, sem perspectiva futura promissora, e não fazermos nada. Temos que encontrar um caminho para solucionar esse problema. Faço este aparte mais para cumprimentar V. Exª. Repito: espero que Goiás entenda que a Senadora deve ficar conosco aqui, inclusive para resolver a questão das 40 milhões de pessoas que trabalham no mercado informal. Parabéns a V. Exª pelo pronunciamento. Muito obrigado.

A SRª IRIS DE ARAÚJO (PMDB - GO) - Agradeço ao nobre Senador o aparte referente ao assunto especificamente, uma vez que a palavra de V. Exª se impõe como conhecedor das causas sociais, principalmente daqueles que não têm vez nem voz, os quais estamos sempre defendendo. Mas quero, também, agradecer as referências elogiosas em relação à minha permanência, que me enobrecem profundamente.

Quero dizer que, independentemente do tempo que possa aqui permanecer, de cinco meses, certamente terei aprendido muito pela atuação de V.Exªs; talvez tenha aprendido muito mais do que nos últimos 10 anos. Esse período no Senado foi uma escola, uma experiência maravilhosa e a guardarei para sempre, principalmente em meu coração.

O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Sei que o tempo é pequeno e que V. Exª tem muito a dizer, mas estou muito orgulhoso por saber que V. Exª será relatora do Estatuto do Idoso. Foi o movimento de V. Exª de trazer aqui dois artistas globais que deu o impulso para que a Casa rapidamente aprove o estatuto na Câmara e no Senado. V. Exª será a Relatora do meu projeto, que vai se encontrar com o projeto do Senador Bernardo Cabral, onde haveremos de fazer, no substitutivo, uma grande proposta. Para mim é muito importante que V. Exª seja relatora dessa matéria também.

A SRª IRIS DE ARAÚJO (PMDB - GO) - Muito obrigada, Senador Paulo Paim.

Srª Presidente, o propósito da análise que efetuei sobre a tipologia do trabalho informal era, ao mesmo tempo, configurar sua heterogeneidade e afirmar que, independentemente dela, esses trabalhadores dependem, para sua sobrevivência, da expansão das atividades da economia formal.

Sabemos que, quando há retração do emprego e da renda no setor formal, verifica-se um crescimento e uma queda de rendimentos no setor informal, ao passo que, quando aquele se expande, com ampliação dos salários na renda, abre-se espaço para uma melhor inserção ocupacional dos trabalhadores autônomos ou vinculados a pequenos empreendimentos.

Assim, configura-se uma necessidade de efetiva atuação do Estado no sentido de propiciar condições para uma existência segura e digna para aqueles que enveredaram, livre ou compulsoriamente, pela economia informal, mediante a implementação de alternativas de relacionamento com o Estado, compatíveis com as possibilidades dessa numerosa e importante parcela de nossa população economicamente ativa.

Para tanto, é necessário, em primeiro lugar, mudar o foco da visão sobre essa massa de trabalhadores, da figura de marginais para a figura de componentes do sistema econômico, oferecendo condições de registro de suas atividades e de retribuição tributária dentro das suas possibilidades, fator que responde, seguramente, como razão principal de sua informalidade.

Ao lado disso, seria fundamental disponibilizar uma metodologia alternativa de apoio a toda espécie de trabalho informal, em que seriam consolidados temas como o acesso ao crédito, a capacitação técnica dos beneficiários, os bancos do povo, as incubadoras de empresas e outros, além da organização e da integração entre a sociedade civil e o poder público, de forma a permitir que essas práticas chegassem, de forma efetiva, aos que são atualmente excluídos do mercado de trabalho, do sistema financeiro e das políticas sociais em geral.

Srªs e Srs. Senadores, as tentativas de atrair mais pessoas para o mercado formal de trabalho, flexibilizando-se as leis trabalhistas, são inócuas, porque atacam um mito equivocado de que a informalidade é resultado do alto custo trabalhista.

O problema da informalidade não está nos altos custos de contratação dos trabalhadores e, sim, na origem dos empregadores, pois estes são responsáveis por empreendimentos que têm uma estrutura menor, atuam em mercados mais competitivos e não têm acesso à tecnologia de ponta, o que não lhes dá condições de regularizar sua situação e contratar funcionários.

O fim da informalidade exige soluções complexas, como a redução da carga tributária para o empresariado, mais oportunidades de crédito, melhora na distribuição de renda no País e mais acesso à educação, o que prepararia melhor os empreendedores e ofereceria mais condições de crescimento às empresas.

As medidas adotadas no Governo anterior para reduzir os custos trabalhistas e incentivar a contratação formal, como a criação do banco de horas, dos contratos temporários e da jornada de trabalho parcial, não produziram os efeitos desejados. Uma empresa pequena e informal não vai assinar a carteira dos seus empregados, mesmo havendo uma redução significativa nos custos de contratação, porque simplesmente não tem dinheiro para isso.

O novo Governo anunciou algumas medidas no intuito de estancar o crescimento de empresas informais, por meio de mecanismos que permitam a ampliação da formalidade dos pequenos empreendimentos e dos trabalhadores que ali atuam, simplificando procedimentos e reduzindo tributos.

É fundamental que tais medidas sejam implementadas, porquanto o cenário atual é ainda extremamente preocupante e envolve milhões de brasileiros que não têm outra maneira de ganhar o pão de cada dia senão na modalidade do trabalho informal, ao desamparo do Estado.

Considero extremamente louvável o programa do atual Governo, quando se propõe a criar milhões de novos empregos formais, decorrentes de um novo modelo econômico que propiciaria queda nos custos de produção, reforma tributária e redução dos juros reais da economia.

Da mesma forma, é altamente louvável o programa do primeiro emprego, destinado a contratar jovens de 16 a 21 anos de idade que nunca trabalharam antes, beneficiando 550 mil jovens em sua inserção no mercado formal de trabalho.

No entanto, tão relevante quanto essas preocupações deve ser o cuidado de reestruturar o trabalho informal, para que a máxima de inserção social que está nele intrinsecamente presente se torne uma realidade e resgate a dignidade pessoal e profissional de tantos de nossos compatriotas.

Muito obrigada, Srª Presidente.

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/06/2003 - Página 15946