Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações sobre o agronegócio e sua importância para o desenvolvimento regional brasileiro.

Autor
Íris de Araújo (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Íris de Araújo Rezende Machado
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • Considerações sobre o agronegócio e sua importância para o desenvolvimento regional brasileiro.
Aparteantes
Leonel Pavan, Ney Suassuna.
Publicação
Publicação no DSF de 02/07/2003 - Página 16819
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • COMENTARIO, DESIGUALDADE REGIONAL, BRASIL, AUSENCIA, ELABORAÇÃO, PLANO, DESENVOLVIMENTO, INTERIOR, PAIS, ESPECIFICAÇÃO, REGIÃO NORTE, REGIÃO NORDESTE, REGISTRO, AGRAVAÇÃO, SITUAÇÃO, DECISÃO, GOVERNO FEDERAL, IMPEDIMENTO, ESTADOS, OFERECIMENTO, BENEFICIO, NATUREZA FISCAL, TENTATIVA, ATRAÇÃO, INVESTIMENTO, ESTABELECIMENTO, INDUSTRIA, REGIÃO.
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, AGROPECUARIA, AGRICULTURA, CRESCIMENTO ECONOMICO, BRASIL, REGISTRO, EFEITO, MULTIPLICAÇÃO, INDICE, ECONOMIA, ESPECIFICAÇÃO, AUMENTO, PRODUTO INTERNO BRUTO (PIB), SUPERAVIT, BALANÇA COMERCIAL, CONTRIBUIÇÃO, REDUÇÃO, DESIGUALDADE REGIONAL, MIGRAÇÃO, TRABALHADOR RURAL, CIDADE.

A SRª IRIS DE ARAÚJO (PMDB - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho tratar, hoje, nesta tribuna, da recorrente questão dos desequilíbrios regionais e de como o incentivo ao agronegócio pode representar uma solução consistente para a superação de tais desequilíbrios.

Entra ano, sai ano e os problemas econômicos e sociais brasileiros continuam os mesmos.

O setor público, sufocado por imensa dívida, não mais demonstra capacidade financeira para investir. O orçamento público, que foi, por décadas, o principal motor do desenvolvimento, deixou de sê-lo. Por sua vez, continuamos vulneráveis nas contas externas, e qualquer pequeno surto de crescimento, cada vez mais difícil de se obter, ameaça provocar crise no balanço de pagamentos. Da mesma forma, prosseguimos sem qualquer política orgânica para induzir o desenvolvimento nas regiões mais pobres e atrasadas, e as desigualdades regionais permanecem imensas.

Esse é um dos pontos centrais da crise brasileira e um verdadeiro desafio a ser vencido nessa nova etapa da vida nacional. As disparidades entre as regiões brasileiras criam um sistema dramático de relações sociais e econômicas. Os centros mais desenvolvidos, localizados no Sul-Sudeste, funcionaram, ao longo da história recente, como centro de atração de brasileiros famintos à procura de oportunidades. As conseqüências desse processo estão sendo literalmente explosivas. Elas contribuíram para formatar as metrópoles com suas graves e terríveis injustiças, que geram a fome, o desemprego, a violência, a criminalidade e a injustiça social.

Assim, o subinvestimento público e a ausência de políticas de desenvolvimento do interior brasileiro fazem com que persista o conhecido quadro de êxodo rural, de inchaço das grandes cidades, realimentando o círculo vicioso da miséria e da pobreza, tanto no meio rural quanto no meio urbano.

Sr. Presidente, falta realmente uma estratégia para impulsionar o desenvolvimento das regiões mais afastadas dos grandes centros urbanos. Essa realidade torna-se ainda mais grave à medida que continua, pelo menos temporariamente, fechada a tradicional saída representada por investimentos públicos em grandes obras de infra-estrutura, como estradas, hidrelétricas e açudes. Diante dessa realidade de contenção quase absoluta dos recursos públicos em função da crise sem precedentes na economia, os Governadores vinham lançando mão de um dos poucos instrumentos eficazes para atrair investimentos privados para seus Estados: a concessão de incentivos fiscais.

A proposta de reforma tributária enviada pelo Poder Executivo à apreciação do Congresso Nacional tem como uma de suas metas justamente acabar com a pouca margem de ação a que os Estados poderiam recorrer mediante a chamada guerra fiscal. Significa que, efetivamente, os métodos que vinham sendo utilizados para atração de empreendimentos industriais ficam tremendamente prejudicados, o que representa menos investimentos no interior brasileiro e, portanto, menos empregos e menos oportunidades.

Em face dessa realidade, Senador Ney Suassuna - a quem concederei com o maior prazer um aparte -, quero manifestar a angústia própria daqueles que habitam o interior brasileiro e hoje se encontram praticamente de mãos atadas diante da ausência de políticas realmente eficazes que nos conduzam à necessária e inadiável descentralização do crescimento econômico, justamente para impedir que continue a prosperar esse cenário de injustiças e desigualdades.

Por gentileza, Senador Ney Suassuna, eu gostaria de ouvi-lo.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Nobre Senadora, V. Exª aborda um problema que traz no bojo tanta irracionalidade que às vezes ficamos sem entendê-lo. Se não, vejamos: uma empresa que esteja operando em um Estado como Rio de Janeiro ou São Paulo, por exemplo, por ser antiga, não pode se beneficiar de nenhuma isenção tributária. Se ela é nova, negocia e consegue, porque a mesma arma usada pelos Estados do Nordeste, do Centro-Oeste e do Norte - dar isenção -, é usada pelos Estados do Sul. Por estar numa área urbana muito valorizada, o terreno dessa empresa representa um grande capital, mas, mesmo assim, ela enfrenta dificuldades porque não tem capital de giro.

Além de não obter isenção e não dispor de capital de giro, ela ainda convive com sindicatos extremamente atuantes, os quais cobram todas as benesses possíveis. Essa empresa sai de lá e vai para um Estado do Centro-Oeste, onde recebe isenção tributária e não sofre pressão do sindicato. Então ela se capitaliza. Como consegue isso? Ela vende aquela área urbana valorizada por um valor suficientemente alto para fazer capital de giro. Aí está a incongruência maior: após dez anos - normalmente esse é o prazo de isenção conseguido em outro Estado -, se aquela empresa retornar ao Estado de origem, conseguirá isenção, porque é uma empresa nova que está chegando. São coisas que não conseguimos entender. A verdade é que se o Governo tivesse um crédito fácil e um incentivo maior, se nós do Nordeste e do Centro-Oeste pudéssemos e soubéssemos usar mais o BNDES - isso passou a ser uma prerrogativa do Sudeste -, não haveria a migração de empresas, que passam dez anos num lugar e mudam para outro. Isso em parte é bom porque qualifica essa nova mão-de-obra e capitaliza essas empresas como acabei de dizer, mas cria a situação injusta de a empresa estar “com a mala nas costas”, mudando de Estado para Estado. O ruim é que não conseguimos verbas em outro canto, e o empresariado fica entre a cruz e a espada. O que pode fazer para conseguir capital de giro? V. Exª pode ver, apenas nessa pequena descrição - eu poderia aumentar o quadro, mostrando que existem muitas outras incongruências -, nessa pequena mudança de um Estado para outro, que há muita injustiça, mas também muitas benesses podem ocorrem, como, por exemplo, a venda do imóvel. Isso permite a muitas empresas se capitalizarem, a se modernizarem e, então, concorrerem no mercado externo e trazerem divisas para o Brasil, uma vez que, com máquinas novas e modernas, o custo diminui, permitindo a concorrência com o exterior. Parabéns pelo discurso. Eu me solidarizo com V. Ex.ª.

A SRª IRIS ARAÚJO (PMDB - GO) - Nobre Senador Ney Suassuana, V. Exª continua, como sempre, engrandecendo não só os discursos que pronuncio, mas também os de outros Senadores. Tenho observado a presença de V. Exª neste plenário. V. Exª faz observações muito próprias no momento em que proferimos o discurso, mostrando que tem muito conhecimento. Por isso, peço à Mesa que seja incorporado ao meu pronunciamento o aparte de V. Ex.ª.

Srªs e Srs. Senadores, é nesse contexto que se realça ainda mais a solução para os problemas de desenvolvimento regional, representada pelo agro-negócio, que, neste plenário, tem sido tão debatido ou explicado, de forma muito positiva. Aí compreendida a agricultura, a pecuária e a transformação industrial que sofrem os produtos naturais dessas duas atividades primárias.

O agronegócio, há anos - eu ouço isso há bastante tempo, desde que Íris Rezende era Ministro da Agricultura -, é uma ilha de prosperidade contínua e sustentada no meio do mar de incertezas e de soluços de crescimento dos demais setores da economia nacional. Tal pujança do agronegócio - em expansão ano após ano, faz muito tempo, como eu acabei de dizer - demonstra que cada real aplicado no campo tem o potencial comprovado de se multiplicar e trazer resultados. Isso representa muito, em um momento em que o setor público tem muito pouco para investir e precisa, portanto, fazer render ao máximo os escassos reais de que dispõe, depois de pagas despesas como transferências constitucionais, pagamento de pessoal e pagamento do serviço da dívida pública.

Hoje, após tantos percalços vividos pela economia brasileira, afetada por seguidas crises internacionais na última década, o agronegócio segue seu caminho de sucesso. A agropecuária responde por mais de 7% do PIB nacional. Por sua vez, o agronegócio contribui com mais de 40% das exportações brasileiras, o que é um número eloqüente. Analisando somente as estatísticas dos dois últimos anos, verificamos que o saldo comercial do agronegócio tem ficado em torno de US$20 bilhões. Como o saldo comercial dos demais setores da economia tem sido negativo, não fosse pelo superávit do agronegócio, teríamos tido déficit na balança comercial, em 2001 e 2002.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o investimento público direcionado para o interior brasileiro tem o poder de atacar todos os principais problemas nacionais, a começar pela fome e pela miséria, que nos preocupam imensamente a todos.

É da terra que vem o alimento que garante a vida. A terra é a mãe de todas as mães e devemos valorizá-la imensamente! Inadmissível não compreender determinadas essências de uma nação. Qualquer governante realmente voltado para a promoção da justiça social deve, primeiramente, atacar de maneira implacável o cenário das desigualdades. No caso brasileiro, elas residem basicamente nas gritantes disparidades regionais que superlotam as cidades do Sul-Sudeste. Este fenômeno urbano gera a violência cotidiana que se espalha como um rastilho de pólvora lá fora, vendendo a imagem de um Brasil cuja única lei que impera é a das armas dos bandidos.

Chega, Sr. Presidente! Está na hora de se promover uma positiva e decisiva volta às origens, volta ao interior, volta ao campo. Para isso, o Governo precisa dar a direção e as devidas motivações representadas por incentivos que, sem dúvida, vão multiplicar-se tremendamente.

Em primeiro lugar, o investimento no campo tem alto impacto de crescimento, como já está sobejamente demonstrado. Repito que, em época de poucos recursos públicos disponíveis para investimento, há necessidade de direcioná-los para as atividades com maior efeito multiplicador em termos de renda e de emprego. O imenso potencial ainda não explorado do setor agropecuário traz retorno garantido, como tem ocorrido continuamente nos últimos anos.

Em segundo lugar, pela força exportadora do campo, o investimento público direcionado para o agronegócio é importante também para diminuir a vulnerabilidade externa de nossa economia, Senador Leonel Pavan, vulnerabilidade que é entrave à capacidade de a economia brasileira crescer. Investimento no agronegócio gera divisas, aumentando muito o saldo positivo da balança comercial.

E, em terceiro lugar, o mais importante: o investimento público direcionado ao agronegócio é direcionado também naturalmente para o interior brasileiro, para as regiões mais afastadas dos grandes centros urbanos. Na total ausência de políticas públicas desenvolvimentistas voltadas à superação dos desequilíbrios regionais, tal investimento representaria um revigoramento, uma injeção de ânimo nas regiões mais atrasadas. Como conseqüência, o homem do campo teria estímulo para permanecer em seu lugar de origem, e as grandes cidades brasileiras, inchadas e desfiguradas pela miséria e pela violência, teriam menos um problema com que lidar, que é a migração do meio rural.

Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não vejo, no horizonte, solução mais óbvia, mais eficiente, mais rápida para os gravíssimos problemas econômicos e sociais por que passamos no momento!

O Brasil quer crescer? Invista-se no campo!

O Brasil quer fortalecer a Balança de Pagamentos? Invista-se no campo!

O Brasil quer proporcionar desenvolvimento mais equilibrado entre suas regiões e fixar o homem rural em sua comunidade de origem? Invista-se no campo!

O Sr. Leonel Pavan (PSDB - SC) - Permite-me V. Exª um aparte?

A SRª IRIS DE ARAÚJO (PMDB - GO) - Ouço com muito prazer o aparte de V. Exª, que sempre abrilhanta os meus pronunciamentos.

O Sr. Leonel Pavan (PSDB - SC) - Cumprimento a nobre Senadora por esta brilhante explanação, principalmente por sua preocupação com o êxodo rural devido à falta de investimento no homem do campo. Hoje mesmo fiz um pronunciamento para que os Governos Estaduais e o Federal olhassem com maior atenção a agricultura familiar, que mais gera empregos, mais produz e, no entanto, tem as menores áreas de terra. Hoje, infelizmente por falta de investimento, nobre Senadora Iris, por falta de infra-estrutura no campo, por falta de incentivo, por falta de lazer e de incentivo à cultura, os filhos dos homens do campo estão procurando as capitais e os centros urbanos, na esperança de encontrar emprego. Por falta de universidades e, às vezes, de escolas com ensinos fundamental e médio, por falta de saúde, habitação, incentivo, eles procuram os centros urbanos, iludidos pelo canto da sereia, na expectativa de encontrar emprego e ter uma vida fácil. Porém, como não têm uma profissão definida, não são carpinteiros, pedreiros, costureiras, ou seja, não têm o conhecimento do métier das regiões urbanas - eles conhecem apenas a questão agrícola -, muitos ficam desempregados, sem casa e, às vezes, ingressam na marginalidade, criando um enorme problema social para o País. Em Santa Catarina, nobre Senadora, o Governador Luiz Henrique, do PMDB, Partido de V. Exª - que apoiei -, criou o projeto de descentralização. Existem 29 subgovernadorias naquele Estado, a fim de que a comunidade fique mais próxima do Governo, para que se invista mais em turismo, educação, saúde, habitação, agricultura, cultura, lazer e para que o jovem tenha vontade e esperança de trabalhar na sua região, na sua cidade. Santa Catarina está implantando esse projeto, a exemplo do que já ocorre em países da Europa, como Holanda, Alemanha, Itália e outros. V. Exª se preocupa com uma questão que abordei hoje em meu pronunciamento e que, ontem, alguns Senadores também descreveram. A nobre Senadora usa o microfone sempre preocupada com a área social, com a mulher, com a criança, com o agricultor. V. Exª é a Senadora dos desassistidos do nosso Brasil, das camadas sociais mais prejudicadas. Os pronunciamentos que faz são fantásticos e mantêm abertos os olhos do Governo, para que trate com maior abrangência os problemas sociais. Por isso, quero cumprimentá-la. O Brasil sairá da crise no dia em que olharmos para os homens do campo, para a família do campo. Toda a população brasileira terá comida na mesa no dia em que o Governo começar a investir não nos latifundiários, nos grandes empresários do campo, mas no homem do campo e na sua família, no agricultor, naquele que trabalha 24 horas por dia, durante os 30 dias do mês. O agricultor precisa de incentivo, e não de um empréstimo de R$400,00 ou R$600,00, porque esse valor não paga sequer uma parcela de uma tobata. Ele precisa de incentivo, de educação e de saúde para que seu filho dê continuidade ao que iniciaram seus avós e seus pais há muitos anos. Senadora Iris de Araújo, parabenizo V. Exª pelo pronunciamento que faz. Requisitarei cópia para encaminhar às famílias agrícolas, a fim de que conheçam o pensamento de uma Senadora de Goiás que se preocupa com todo o Brasil. Parabéns!

A SRª IRIS DE ARAÚJO (PMDB - GO) - Agradeço, nobre Senador Leonel Pavan, o aparte. Com muito prazer, enviarei a S. Exª cópia do meu pronunciamento, desde que, em seu conteúdo, seja incorporado o pronunciamento de V. Exª, que muito contribui, pelo seu conhecimento, para meu discurso. A Mesa está me avisando que devo terminar. Certamente, Senador, eu concordo quando V. Exª aponta o êxodo rural como uma das causas da marginalidade e da violência em nosso País. Pessoas deixam sua comunidade no campo à procura de uma ilusão na cidade grande, ilusão essa que muitas vezes a televisão, inconscientemente, em seu afã de levar o lazer, oferece. Essas pessoas, em sua inconseqüência, sem saber exatamente o que vão encontrar, dirigem-se para a cidade e acabam por ter grandes dificuldades em se adaptarem ao sistema urbano.

Assim, estamos criando talvez uma fábrica de marginais. Por isso temos procurado detectar o problema na origem, para combater com eficiência não só os efeitos, mas também as causas. E uma das causas é a que V. Exª acabou de apontar. Por isso, faço este pronunciamento. Concluo agora.

O interior brasileiro tem sido responsável pelas boas notícias, bem raras, sobre a economia brasileira. Por que negligenciá-lo? Por que preteri-lo no momento em que se definem os investimentos públicos, em favor da indústria dos Estados mais ricos?

Tenho certeza de que, caso mude essa mentalidade urbana e pretensamente industrialista - digo pretensamente em razão do alto grau de tecnologia que hoje está inserido no agronegócio - assistiremos a uma verdadeira revolução no desenvolvimento e prosperidade do País!

É essa a mudança e a autêntica revolução que o povo brasileiro tanto espera.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/07/2003 - Página 16819