Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Rebate declaração do presidente do PT, Sr. José Genoíno, que acusou o Poder Judiciário de estar concedendo liminares para reintegração de posse de terras desapropriadas como "retaliação" pela reforma da Previdência. (como Lider)

Autor
Demóstenes Torres (PFL - Partido da Frente Liberal/GO)
Nome completo: Demóstenes Lazaro Xavier Torres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
JUDICIARIO.:
  • Rebate declaração do presidente do PT, Sr. José Genoíno, que acusou o Poder Judiciário de estar concedendo liminares para reintegração de posse de terras desapropriadas como "retaliação" pela reforma da Previdência. (como Lider)
Publicação
Publicação no DSF de 11/07/2003 - Página 17755
Assunto
Outros > JUDICIARIO.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DECLARAÇÃO, PRESIDENTE, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), ACUSAÇÃO, MEMBROS, JUDICIARIO, CONCESSÃO, LIMINAR, PROCESSO, REINTEGRAÇÃO DE POSSE, PROPRIEDADE RURAL, OBJETIVO, OPOSIÇÃO, PROPOSTA, EXECUTIVO, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL, REPUDIO, DESRESPEITO, PODERES CONSTITUCIONAIS, PREJUIZO, ESTADO DE DIREITO.

O SR. DEMÓSTENES TORRES (PFL - GO. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, V. Exª tem sido testemunha das críticas que tenho feito cotidianamente ao Poder Judiciário brasileiro, especialmente àqueles vícios que considero que temos que varrer para conseguirmos fazer com que a Justiça volte a ter credibilidade no Brasil.

Trouxe aqui aquele episódio que aconteceu no Tribunal Regional Eleitoral de Goiás, onde uma chicana acabou destituindo, na véspera, o Presidente José Lenar; falei sobre o nepotismo e diversos outros problemas que enfrenta o Poder Judiciário. Sou um crítico, sim, para a melhoria do Judiciário, penso que temos que trabalhar para, efetivamente, conseguirmos dar agilidade a esse Poder e fazer com que o Juiz de Direito e também o Promotor de Justiça que está no Ministério Público possam recuperar aquele prestígio que uma autoridade que decide deve ter.

Sr. Presidente, hoje fiquei extremamente preocupado com o que está acontecendo com o Poder Executivo Federal. Posso dizer que aquele Poder foi acometido de uma espécie de síndrome de Ofélia, aquela que só abre a boca quando tem certeza. Por quê? Porque, a cada dia mais, novas bobagens vêm aparecendo, e hoje o fenômeno alcançou a cúpula do Partido dos Trabalhadores: o jornal a Folha de S.Paulo publicou, na primeira página, declaração do Sr. José Genoíno, Presidente do Partido dos Trabalhadores, segundo a qual Juízes de Direito do Brasil estão dando liminares em retaliação ao projeto que altera a Previdência Social no Brasil, o que é um verdadeiro absurdo.

Recebi dezenas de telefonemas e preparei, para não me exaltar nem me exceder na linguagem, um discurso que vou ler sobre o Estado Democrático de Direito, que todos nós temos que aprender a defender. Temos que aprender a conviver com as divergências, conviver com os pontos de vista contrários e não acusar as instituições, porque senão estaremos dando espaço para que o totalitarismo possa tomar conta do nosso cotidiano.

É o seguinte o que escrevi:

O Brasil constitui-se em uma democracia que tem como fundamento básico o absoluto respeito ao Estado Democrático de Direito, assim entendido a independência e a harmonia entre os Poderes Judiciário, Executivo e Legislativo. O artigo primeiro da Carta de 1988 estabelece os seguintes fundamentos: a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, o pluralismo político e o sistema representativo para o exercício do poder emanado do povo.

A Constituição fixa como objetivos fundamentais da República a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, a garantia do desenvolvimento nacional, a erradicação da pobreza e da marginalização, a redução das desigualdades sociais e regionais e a promoção do bem de todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

O inciso IV do art. 5º da Carta Maior estabelece a livre manifestação do pensamento, mas definitivamente não autoriza a expressão da bobagem, especialmente quando emanada do Presidente de um partido político que gerencia o centro do poder. O Dr. José Genoíno foi de uma incalculável infelicidade ao afirmar que integrantes do Poder Judiciário estariam concedendo liminares em processos de reintegração de posse como retaliação à Reforma da Previdência, ora em tramitação na Câmara dos Deputados.

Se por um lado a liberdade de expressão é um dos esteios do Estado de Direito, não é menos verdade que o respeito às instituições constitui-se em outro fundamento da democracia. Ao que parece, o Partido dos Trabalhadores sofre de Síndrome de Bentinho, personagem de Machado de Assis, uma vez que se comporta sempre como um cônjuge enganado toda vez que há dificuldades no andamento do processo político. O posicionamento do Dr. Genoíno marca a segunda chantagem pública do Partido dos Trabalhadores ao Poder Judiciário. A atitude temerária me leva a crer que os integrantes do Governo Lula pretendem tutelar o Poder como forma de atingir a unanimidade.

Definitivamente o Judiciário não é uma casta insuscetível de críticas - temos que criticá-los -, mas não se pode aceitar ofensas gratuitas e levianas com vista a limitar o exercício da jurisdição. Trata-se de uma parcela da soberania do Estado, indelegável, executada em seu nome, de forma impessoal e imparcial. Uma sentença judicial é uma manifestação do Estado e não do indivíduo que a prolata.

            O arcabouço jurídico brasileiro é pródigo em medicamentos recursais capazes de amparar a insatisfação da parte sucumbente. Caso algum juiz tenha agido motivado pela parcialidade, cabe ao prejudicado procurar a via recursal adequada, seja na esfera administrativa ou judicial. Não se pode imaginar que uma hipotética decisão irregular ou ilegal possa conspurcar todo o Poder Judiciário. O apelo da parte pelo todo é um dos vícios que alimentam a autocracia, sustentam a intolerância política e criam margem à desestabilização institucional.

O Presidente do Partido dos Trabalhadores carece de uma lição de humildade, cumulada com noções básicas de Direito Público. Só assim vai entender os meandros do funcionamento do Estado Democrático de Direito e colaborar com a contenção do Febeapá dos tempos hodiernos. Tenho certeza de que o Dr. José Genoíno envidará a tempo as escusas necessárias.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/07/2003 - Página 17755