Discurso durante a 91ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reavaliação das renúncias fiscais pelo governo Lula.

Autor
Antonio Carlos Valadares (PSB - Partido Socialista Brasileiro/SE)
Nome completo: Antonio Carlos Valadares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FISCAL. MANIFESTAÇÃO COLETIVA.:
  • Reavaliação das renúncias fiscais pelo governo Lula.
Aparteantes
Mão Santa, Roberto Saturnino.
Publicação
Publicação no DSF de 07/08/2003 - Página 22458
Assunto
Outros > POLITICA FISCAL. MANIFESTAÇÃO COLETIVA.
Indexação
  • CRITICA, VIOLENCIA, MANIFESTAÇÃO, FUNCIONARIO PUBLICO, PROTESTO, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL.
  • COMENTARIO, DIVULGAÇÃO, DOCUMENTO, GOVERNO FEDERAL, ABRANGENCIA, DIRETRIZ, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, MELHORIA, BEM ESTAR SOCIAL, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, PROPOSIÇÃO, REAVALIAÇÃO, POLITICA, CONCESSÃO, INCENTIVO FISCAL, APRESENTAÇÃO, DADOS, RECEITA FEDERAL, PREJUIZO, UNIÃO FEDERAL, ISENÇÃO FISCAL, AUSENCIA, ARRECADAÇÃO, IMPOSTOS, IMPOSSIBILIDADE, INVESTIMENTO PUBLICO, COMPROMETIMENTO, PAGAMENTO, DIVIDA PUBLICA, OCORRENCIA, INJUSTIÇA, SISTEMA TRIBUTARIO, EXCESSO, COBRANÇA, CONTRIBUINTE, NECESSIDADE, RACIONALIZAÇÃO, GASTOS PUBLICOS, IMPORTANCIA, REFORMA TRIBUTARIA, IGUALDADE, DISTRIBUIÇÃO, OBRIGAÇÃO TRIBUTARIA.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a minha presença na tribuna do Senado nesta tarde tem como objetivo falar sobre um tema que considero da mais alta relevância, pois tem alguma referência com a reforma tributária: é a renúncia fiscal.

Antes, porém, a exemplo do Senador Eduardo Suplicy, gostaria de fazer uma ponderação e, ao mesmo tempo, defender a classe dos funcionários públicos. Temos certeza de que o quebra-quebra da vidraçaria do Senado Federal nada tem a ver com os funcionários públicos. Suas lideranças jamais iriam orientar os adeptos deste movimento, que considero legítimo, a empreenderem ações violentas contra o Congresso Nacional, pois essas ações tipificam uma conduta antidemocrática, antiética, um mal exemplo para todas aquelas pessoas que desejam, com base na Constituição, participar de movimentos coletivos em defesa dos seus direitos. Por isso, apresento, neste instante, uma ponderação a todos aqueles que se infiltram nesses movimentos para perturbar a ordem pública e desmoralizar o Poder Legislativo, numa demonstração que considero equivocada de que há uma revolta tão grande, a ponto de os agressores, como não podem atingir os Deputados, atingirem as vidraças que os protegem.

Portanto, a minha solidariedade ao Poder Legislativo, ao Congresso Nacional, que foi ofendido na sua honra - volto a dizer -, não por iniciativa dos funcionários públicos, aos quais devoto a minha admiração, a minha solidariedade em tudo aquilo que disser respeito à defesa dos seus interesses e dos seus direitos. Posso até não concordar com todos os seus reclamos, mas defenderei sempre o direito que eles têm de se organizar, fazer passeatas e protestar contra aquilo que não concordam. No entanto, não posso concordar, como democrata que sou, com esse tipo de irresponsabilidade cometida por pessoas desavindas que se infiltraram nesse movimento legítimo e democrático.

Agora, vamos diretamente ao assunto, Sr. Presidente.

Como eu disse, o assunto é renúncia fiscal. A divulgação do documento intitulado Roteiro da Agenda de Desenvolvimento, que contém diretrizes para o crescimento sustentável com melhoria do bem-estar social e da distribuição de renda, anuncia a proposta de que o Governo Lula reavaliará a política atual de concessão de incentivos fiscais com tributos federais e criará mecanismos para maior controle dos resultados e da eficiência dos incentivos concedidos.

Não é pouco o que a União perde, anualmente, com tributos federais não arrecadados, em razão dos incentivos fiscais. Segundo levantamento divulgado pela Receita Federal, o montante da renúncia fiscal com tributos federais - só com tributos federais, Srs. Senadores - será da ordem de R$23,9 bilhões, neste ano, o ano de 2003. Ora, esses quase R$24 bilhões correspondem a 1,7% do PIB do País, a 10,64% do total de impostos e de contribuições federais que a sociedade paga, bem como - prestem bem atenção - a quatorze vezes o volume de recursos previstos para serem gastos, neste ano, com o programa Fome Zero!

A comparação pode ser feita também com os gastos do setor Saúde. Veja bem, Sr. Presidente, a Receita Federal estima o valor de R$23,9 bilhões em renúncia fiscal, enquanto que a previsão orçamentária, com os créditos, soma R$27 bilhões e, até o dia 4 de julho, foram empenhados aproximadamente R$14 bilhões.

Assim, é sobre essa montanha de dinheiro público - R$24 bilhões! -, que se direciona a atenção do Governo. Nada mais razoável, nada mais justo.

Sr. Presidente, na ótica dos governantes, o principal problema do atual sistema tributário consiste na sua incapacidade de arrecadar os recursos suficientes para equilibrar o orçamento. Passamos por conjuntura em que os recursos públicos para investimento são cada vez mais escassos, pois parcelas cada vez maiores do Orçamento-Geral da União restam comprometidas para pagar a pesada dívida pública. Este ano, segundo informações fornecidas pelo próprio Líder do Governo e pelo Ministro José Dirceu, ao Governo restam apenas R$4 bilhões para investimento, enquanto R$24 bilhões são para a renúncia fiscal.

Por sua vez, a sociedade encontra-se exaurida em sua capacidade de pagar impostos: pessoas físicas, pessoas jurídicas, empresários e funcionários públicos, massacrados que estão por esta carga tributária que - nunca é demais repetir -, se situa em nível de países desenvolvidos com avançado estado de bem-estar social. Aqui, no Brasil, a carga tributária já passa dos 35% do PIB, com tendência a aumentar ainda um pouco mais.

As pessoas, embora pressionem pelos serviços públicos (saúde, educação, segurança pública), não se mostram dispostas a contribuir, na mesma proporção, para o financiamento desses mesmos bens e serviços, porque não há uma contrapartida positiva, proporcional. Com a deterioração generalizada dos serviços públicos essenciais do País, há pouco ou nenhum estímulo para suportar o atual ônus fiscal, sendo, portanto, mínimas as possibilidades de aceitação de aumentos no nível da carga tributária.

Informativo do Conselho Federal dos Contabilistas nos informa que “as autoridades fazendárias têm afirmado que, para cada real arrecadado, um real é sonegado. Dessa forma, se fossem eliminadas a evasão fiscal e a sonegação, a carga tributária real poderia ser, adequadamente, mensurada sobre um PIB maior e mais próximo da realidade. Em razão destas distorções, alguns contribuintes têm arcado com uma carga fiscal extremamente elevada, o que torna totalmente injusto o atual sistema tributário. Alguns pagam muito e muitos pagam pouco. Apesar disso, o que se constata é uma crescente voracidade fiscal que aumenta os tributos a cada vez que se cria uma nova necessidade de recursos”.

Portanto, Sr. Presidente, nesse contexto, a racionalização do gasto público torna-se fundamental. De cada real deve ser extraído o maior resultado possível em termos de bem-estar social. Cada gasto deve ser reavaliado, e prioridades devem ser definidas. No caso das renúncias fiscais, são 24 bilhões de reais por ano, em relação aos quais, em sua maioria, ninguém tem a menor idéia do impacto que estão tendo para promover as finalidades que justificam tais renúncias. É necessário descobrir! Como costuma dizer o próprio Presidente: vamos abrir a caixa preta da renúncia fiscal. Para onde está se esvaindo esse dinheiro?

No momento em que o País está preparado para fazer a reforma tributária, é necessário ter em mente que a ampliação da base de incidência dos tributos poderá proporcionar um aumento global da carga tributária, mas com redução sensível da carga individual. O que quero dizer, Sr. Presidente, é que a tributação deve alcançar o maior número possível de contribuintes, desde que fique mais bem distribuída do que a atual, pois onde todos pagam, e se paga proporcionalmente aos rendimentos, todos pagam menos e todos pagam satisfeitos, desde que os serviços sejam bem prestados.

Srªs e Srs. Senadores, a ampliação da base de incidência dos tributos pode ocorrer pela melhor disciplina da renúncia fiscal, pois é inegável, por exemplo, que essa renúncia fiscal é um eficiente instrumento de desenvolvimento regional. Entendo que a renúncia fiscal é uma exceção, não pode ser uma regra. Vejamos o caso da Sudene: ainda que muitas falhas cometidas precisem ser corrigidas, os responsáveis punidos e ressarcidos os cofres públicos, para a Região Nordeste, os incentivos fiscais da Sudene representaram o grande fator de desenvolvimento. Certamente, com a recriação da Sudene, novos benefícios fiscais deverão ser implementados pelo Governo Lula para promover o desenvolvimento sustentável da Região Nordeste e dar sustentação financeira e econômica àquela região, que precisa sair de vergonhosa desigualdade.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador...

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE) - Senador Mão Santa, em um minuto terminarei o meu pronunciamento e certamente irei ser brindado com o aparte de V. Exª.

No mesmo sentido, as leis de incentivo à cultura e ao desenvolvimento científico e tecnológico constituem elemento essencial para o fomento da atividade cultural e tecnológica em nosso País. Em meio a essa tentativa de melhor disciplinar as renúncias fiscais, é imperioso ficar atento para se considerar a peculiaridade desse mecanismo, que se aparta da lógica da arrecadação e que se inscreve como importante elemento da política cultural e científica.

Ora, a legislação de política cultural, desde a conhecida Lei Sarney e da Lei Rouanet, demonstrou como essa iniciativa é vencedora, apesar da drástica redução cultural no período do Governo Collor. Os números de investimentos no setor cultural nestas últimas décadas são bastante significativos e os resultados estão estampados na mídia, no cinema, nas rádios, nas obras de preservação de nosso patrimônio cultural.

Eu não poderia encerrar o meu pronunciamento sem antes ter o prazer de dar um aparte ao companheiro de lutas em favor da saúde e do desenvolvimento do Nordeste, o brilhante Senador Mão Santa.

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT - RJ) - E depois a mim, Senador Antonio Carlos Valadares. Peço-lhe encarecidamente.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE) - Pois não, Senador Roberto Saturnino. Será um prazer muito grande ouvi-lo também.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Caro Senador Antonio Carlos Valadares, V. Exª enriquece esta Casa e demonstra preocupação com os impostos, problema muito importante e antigo - Cristo já os havia enfrentado com aquela frase: “Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”. Isso tudo foi estudado. V. Exª, que faz parte do bloco de apoio ao Governo, tem que comprar um livro do grande estudioso e economista italiano Vilfredo Pareto. Senador Antonio Carlos Valadares, os italianos, que souberam fazer o Renascimento por meio das grandes descobertas, tais como a bússola, a pólvora e a imprensa, foram grandes líderes e também fizeram descobertas na economia. Isso tudo foi estudado. O que digo é que a ignorância é audaciosa. Pareto estudou e tem uma tese verídica. Governei o Piauí baseado nessas condições e o equilibrei. Pareto defende a tese de que, em qualquer atividade humana, principalmente nas atividades econômicas, 20% produzem 80% das riquezas. Isso ocorre em qualquer sociedade. Neste Parlamento, apenas 20% se dedicam e lideram. Portanto, o correto é a fiscalização e o imposto sobre os 20% grandiosos, que produzem 80% da arrecadação. Dez por cento pagam voluntariamente e o restante, ou seja, 70%, são os que não podem pagar impostos, os desempregados, os subempregados, os que não conseguiram entrar no mercado de trabalho. Isso tudo é muito simples e os estudiosos estão se equilibrando com essa tese de economia universal de Pareto - fiscalizar os poderosos e os ricos. Esses é que estão salvos e estão pedindo subsídios. Agora se dá o IPI para os automóveis. Por que não se dá para os pequenos trabalhadores, os que fazem os pequenos objetos, artesanatos, os que fazem a geladeira, a bicicleta, etc? Pareto já estudou isso e ofereceu o resultado ao mundo. Acho que isso deve ser acrescentado ao pronunciamento de V. Exª para iluminar a nossa equipe econômica.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE) - Agradeço a V. Exª. Considero que suas palavras vêm fortalecer o raciocínio que desenvolvi ao longo deste discurso, notadamente porque, quando falamos em justiça tributária, queremos incluir principalmente aqueles que podem pagar imposto. Os que não podem pagar imposto têm que ser preservados e participar da distribuição de renda do País por meio de políticas sociais consistentes.

Concedo a palavra ao nobre Senador Roberto Saturnino.

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT - RJ) - Senador Valadares, quero cumprimentar V. Exª por mais esse criterioso, oportuno e inteligente pronunciamento. V. Exª toca com lucidez nesse tema do sistema tributário brasileiro, que é complexo e delicado, porque envolve interesses muito grandes e legítimos. E V. Exª o faz com muita propriedade, chamando a atenção para a questão da renúncia fiscal, que, efetivamente, é uma drenagem de dezenas de bilhões de reais dos cofres públicos para alimentar atividades que são úteis e merecedoras, sim, desse tratamento. V. Exª diz muito bem quando diz que o importante é haver critério, é fazer-se uma revisão criteriosa de todos os incentivos que têm sido concedidos. O Governo está procedendo dessa forma, pois, na verdade, o incentivo fiscal é necessário para o desenvolvimento das regiões menos enriquecidas, para o desenvolvimento da ciência e da tecnologia e para o desenvolvimento das atividades culturais. Neste ponto, gostaria de aproveitar o lúcido pronunciamento de V. Exª para chamar a atenção desta Casa para uma questão que está sendo debatida na reforma tributária a respeito dos incentivos fiscais estaduais, das receitas do ICMS para atividades culturais. É importante que esses incentivos sejam mantidos. A atividade cultural praticamente não conta com recursos públicos orçamentários - menos de 1% -, mas é extremamente importante para a formação da nossa própria nacionalidade, para não falar da sua influência sobre a economia. A atividade cultural se alimenta quase que exclusivamente de renúncia fiscal, e é importante que haja renúncia fiscal federal, como é o caso da Lei Rouanet e da Lei Sarney, mas também aquela legislação estadual que permite o incentivo fiscal do ICMS para fins culturais. Cumprimento V. Exª pelo brilhante pronunciamento.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE) - Sr. Presidente, vou encerrar o meu pronunciamento, mas antes quero agradecer ao Senador Roberto Saturnino, nobre companheiro da base do Governo, nosso ex-Prefeito do Rio de Janeiro e um grande técnico em Economia, que tem muito a nos ensinar. Para nós, Senador Roberto Saturnino, a palavra de V. Exª constitui um grande incentivo. Os estudos de V. Exª, realizados durante todo esse tempo de mandato como Senador da República, não só agora como no passado, revelam um conhecimento pormenorizado da economia brasileira e, acima de tudo, um compromisso com o social e com a cultura, contrário às disparidades sociais. Obrigado a V. Exª, nobre Senador Roberto Saturnino.

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, DISCURSO DO SENADOR ANTONIO CARLOS VALADARES.

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O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (PSB - SE) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores: na tarde de hoje, gostaria de levantar um ponto sobre questão que se relaciona com a racionalização dos gastos públicos no Brasil: a questão das renúncias fiscais. Começo este discurso por louvar a preocupação que tem demonstrado o Governo Federal com esta questão.

A divulgação do documento intitulado Roteiro da Agenda de Desenvolvimento, que contém diretrizes para o crescimento sustentável com melhoria do bem-estar social e da distribuição de renda, anuncia a proposta de que o Governo reavaliará a política atual de concessão de incentivos fiscais com tributos federais e criará mecanismos para maior controle dos resultados e da eficiência dos incentivos concedidos.1

Não é pouco o que a União perde, anualmente, com tributos federais não arrecadados, em razão dos incentivos fiscais. Segundo levantamento divulgado pela Receita Federal, o montante da renúncia fiscal com tributos federais será da ordem de 23,9 bilhões de reais este ano!2 Ora, esses quase 24 bilhões de reais, -- lembra-nos os principais jornais do País, -- correspondem a 1,7% do PIB do País, a 10,64% do total de impostos e de contribuições federais que a sociedade paga, bem como a 14 vezes o volume de recursos previstos para serem gastos, neste ano, com o Programa Fome Zero!3

A comparação pode ser feita também com os gastos do setor Saúde. Veja bem, Sr. Presidente, a Receita Federal estima o valor de 23,9 bilhões de reais em renúncia fiscal, enquanto que a previsão orçamentária, com os créditos, somam 27 bilhões e até o dia 4 de julho foram empenhados aproximadamente 14 bilhões de reais.

Assim, é sobre essa montanha de dinheiro público, -- 24 bilhões de reais!, -- que se direciona a atenção do Governo Federal. Nada mais razoável, nada mais justo.

Sr. Presidente, na ótica dos governantes, o principal problema do atual sistema tributário consiste na sua incapacidade de arrecadar os recursos suficientes para equilibrar o orçamento. Passamos por conjuntura em que os recursos públicos para investimento são cada vez mais escassos, pois parcelas cada vez maiores do Orçamento Geral da União restam comprometidas para pagar a pesada dívida pública. Por sua vez, a sociedade encontra-se exaurida em sua capacidade de pagar impostos, massacrada que está por carga tributária que, -- nunca é demais repetir, -- se situa em nível de países desenvolvidos com avançado Estado de Bem-Estar Social. Aqui, no Brasil, a carga tributária está por volta de 35% do PIB, com tendência de aumentar ainda um pouco mais.

As pessoas, embora pressionem pelos serviços públicos, não se mostram dispostas a contribuir, na mesma proporção, para o financiamento desses mesmos bens e serviços. Com a deterioração generalizada dos serviços públicos essenciais no País, há pouco ou nenhum estímulo para suportar o atual ônus fiscal, sendo, portanto, mínimas as possibilidades de aceitação de aumentos no nível da carga tributária.

Informativo do Conselho Federal dos Contabilistas4 nos informa que “as autoridades fazendárias têm afirmado que, para cada real arrecadado, um real é sonegado. Dessa forma, se fossem eliminadas a evasão fiscal e a sonegação, a carga tributária real poderia ser, adequadamente, mensurada sobre um PIB maior e mais próximo da realidade. Em razão destas distorções, alguns contribuintes têm arcado com uma carga fiscal extremamente elevada, o que torna totalmente injusto o atual sistema tributário. Alguns pagam muito e muitos pagam pouco. Apesar disso, o que se constata é uma crescente voracidade fiscal que aumenta os tributos a cada vez que se cria uma nova necessidade de recursos”.

Portanto, nesse contexto, a racionalização do gasto público torna-se fundamental. De cada real deve ser extraído o maior resultado possível em termos de bem-estar social. Cada gasto deve ser reavaliado, e prioridades devem ser definidas. No caso das renúncias fiscais, são 24 bilhões de reais por ano, em relação aos quais, em sua maioria, ninguém tem a menor idéia do impacto que estão tendo para promover as finalidades que justificam tais renúncias. É necessário descobrir!

No momento em que o País está preparado para fazer a Reforma Tributária, é necessário se ter em mente que a ampliação da base de incidência dos tributos poderá proporcionar um aumento global da carga tributária, mas com redução sensível da carga individual. O que quero dizer - faço questão, Sr. Presidente de deixar claro esse meu posicionamento - é que a tributação deve alcançar o maior número possível de contribuintes, desde que fique mais bem distribuída do que a atual, pois onde todos pagam, e se paga proporcionalmente aos seus rendimentos, todos pagam menos!

Srªs e Srs. Senadores, a ampliação da base de incidência dos tributos pode ocorrer pela melhor disciplina da renúncia fiscal, pois é inegável, por exemplo, que essa renúncia fiscal seja um eficiente instrumento de desenvolvimento regional. Vejamos o caso da SUDENE - ainda que muitas falhas tenham acontecido, que precisam ser corrigidas, os responsáveis punidos e ocorra o ressarcimento dos cofres públicos, para a Região Nordeste, os incentivos fiscais da SUDENE representaram o grande fator de desenvolvimento.

No mesmo sentido, as leis de incentivo à cultura e ao desenvolvimento científico e tecnológico constituem em elemento essencial para o fomento da atividade cultural e tecnológico em nosso País. Em meio a essa tentativa de melhor disciplinar as renúncias fiscais, imperioso ficar atento para se considerar a peculiaridade deste mecanismo, que se apartada da lógica de arrecadação e que se inscreve como importante elemento da política cultural e científica.

Ora, a legislação de política cultural, desde a conhecida Lei Sarney e da Lei Rouanet demonstrou como essa iniciativa é vencedora, apesar da drástica redução cultural no período do governo Collor. Os números de investimentos no setor cultural nessas últimas décadas são bastantes significativos e os resultados estão estampados na mídia, no cinema, nas rádios, nas obras de preservação de nosso patrimônio cultural.

Portanto, quando se fala em renúncia fiscal e política cultural, bom é verificar que a sua finalidade é fomentar nas empresas uma “cultura de investimento cultural”, além da necessidade de se direcionar recursos públicos para o setor cultural.

Sem dúvida alguma, pensando no Brasil grande, a renúncia fiscal necessita ser perfeitamente regulada, utilizada no momento certo e em adequada conveniência, notadamente nesses tempos de poucos recursos para uma demanda social crescente, pois se deve levar em consideração seu impacto para a política cultural brasileira, além de servir de instrumento para o desenvolvimento regional, muito embora não deva ser o único e nem o principal mecanismo dessa política de desenvolvimento regional!

Era o que tinha a dizer.


           1 R$ 23,9 BI EM RENÚNCIA FISCAL. O Globo, 30.06.03, Economia, p. 15.


           2 Idem.


           3 Idem.


           4 Reforma Tributária, 2º edição, 2003, p. 21



Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/08/2003 - Página 22458