Discurso durante a 114ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários à notícia publicada no jornal o Estado de S.Paulo, sobre a revogação de decreto de desapropriação de terreno em Minas Gerais. Críticas ao Dr. Rolf Hackbart, novo presidente do Incra. (como Líder)

Autor
Arthur Virgílio (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Comentários à notícia publicada no jornal o Estado de S.Paulo, sobre a revogação de decreto de desapropriação de terreno em Minas Gerais. Críticas ao Dr. Rolf Hackbart, novo presidente do Incra. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 06/09/2003 - Página 26318
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), CRITICA, ATUAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REVOGAÇÃO, DECRETO FEDERAL, DESAPROPRIAÇÃO, TERRA PUBLICA, DESTINAÇÃO, INSTALAÇÃO, SEDE, JUSTIÇA FEDERAL, PREFERENCIA, CONCESSÃO, BENEFICIO, INICIATIVA PRIVADA, CONSTRUÇÃO, SUPERMERCADO.
  • SOLICITAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, ESCLARECIMENTOS, PREFERENCIA, CONCESSÃO, TERRA PUBLICA, INICIATIVA PRIVADA.
  • CRITICA, CONDUTA, PRESIDENTE, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA), OPOSIÇÃO, DECRETO FEDERAL, AUTORIZAÇÃO, VISTORIA, TERRAS, SITUAÇÃO, INVASÃO, MANIFESTAÇÃO, INTERESSE, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO, POSSIBILIDADE, AGRAVAÇÃO, VIOLENCIA, CAMPO.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM. Como Líder. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, trago ao conhecimento da Casa e da Nação dois assuntos que julgo graves e relevantes.

O primeiro deles envolve o aspecto ético, do qual não nos podemos descuidar. Quem está no Governo deve tomar conta de si próprio e quem está na Oposição tem que tomar conta de quem está no Governo.

O jornal O Estado de S. Paulo de hoje estampa uma notícia, que havia chegado ao meu conhecimento ontem, sob o título: “Lula revoga decreto de desapropriação e irrita juízes em Minas”.

O Presidente Lula editou dois decretos, um deles desapropriando determinado terreno que serviria de sede para a Justiça Federal, que se ressente de melhor equipamento para trabalhar. Depois, Sua Excelência, sem maiores explicações, revogou o decreto e o beneficiário disso é o Grupo Pão de Açúcar, que pretende construir um hipermercado no local. Ou seja, o hipermercado levou a melhor na disputa com a Justiça e foi forte o bastante para obter um decreto judicial.

Aqui, há algumas particularidades interessantes, Sr. Presidente:

Os juízes, que se dizem perplexos e inconformados, “denunciam, ainda, suposta lesão ao patrimônio público, porque a Justiça teria prejuízos de difícil reparação, uma vez que já investiu R$1,16 milhão na contratação dos projetos básico e executivos da obra.”

            Mais ainda: dizem os sessenta e quatro Magistrados em questão que a reversão é medida raríssima e se espantam mais - e eu me espanto com eles - quando remetemos as nossas análises ao art. 1º e único do segundo decreto de Lula, o da revogação, que, supostamente, beneficiaria o poderoso Grupo Pão de Açúcar, porque comunica a revogação simplesmente, sem apresentar os motivos da reconsideração presidencial.

O Juiz José Henrique Guaracy Rebelo, da 18ª Vara Federal de Belo Horizonte, que já formalizou Ação Popular contra o Presidente Lula e o Ministro Márcio Thomaz Bastos, declarou: “Nunca vi em toda a minha vida profissional (10 anos como magistrado e 13 como procurador do Estado) o Poder Público revogar um decreto para atender interesses do expropriado, ou seja, interesses particulares”.

Mais ainda, S. Exª diz algo que não precisaria, por ser secreto o caráter do voto neste País, e abro aspas novamente porque faço questão de dizer que quem votou em Lula foi S. Exª, não eu: “Votei no Lula e fiz campanha para ele, mas estou convencido de que fomos vítimas de um estelionato eleitoral.”

Concordo quanto ao estelionato eleitoral, mas, quanto a ter votado no Presidente Lula, eu o fiz em 1989, contra Fernando Collor, no segundo turno, depois da derrota de Covas. Quem votou em Lula agora e, portanto, colaborou para que o estelionato eleitoral se implantasse, ou, quem sabe, foi vítima dele diretamente - porque o povo brasileiro foi vítima também, direta ou indiretamente - foi o Juiz Guaracy.

Na matéria, o Ministro da Justiça diz que está tudo muito legal e correto, apresentando um relatório a respeito da improcedência da reclamação feita pelos Juízes, mas o fato é que a chamada Companhia Brasileira de Distribuição - leia-se Pão de Açúcar - adquiriu os imóveis com o objetivo específico de neles construir um hipermercado.

Informaram-me, também, que constava uma pessoa já criticada por mim aqui, ligada ao Governo, mas como não tenho certeza, não vou citar o nome desse advogado de posição dúbia, que jogaria em várias posições. Apenas cobro esclarecimentos do Governo e, na medida em que o faço, passo rapidamente ao segundo ponto para dizer que lamento muito que, após tanto desatino cometido na área do Incra, inclusive com a entrega da instituição e de praticamente todas as suas seccionadas ao MST, o novo Presidente do Incra tenha assumido e criticado a medida provisória que virou lei antiinvasão, aquela que não permite que se faça vistoria em terras invadidas no prazo de dois anos, ou seja, provocou uma brutal reação das pessoas que estão potencialmente prejudicadas por isso. No fundo, no fundo, curva-se ao que deseja o MST, que estranhamente disse que não confiava nele, mas tem todas as razões para o fazer, porque parece que o Dr. Rolf Hackbart não vai ser capaz de conter a mazorca e a anarquia no campo, ele que disse que não muda nada na relação entre Governo e MST.

Tenho visto gente que fracassa na administração depois de um mês, depois de três ou quatro anos, mas anunciar fracasso com 48 horas, assumir num dia, dizer tolice no mesmo dia e, no dia seguinte, incitar a persistência do clima de instabilidade no campo parece-me ser um recorde que está sendo batido pelo novo Presidente do Incra, em cuja atuação dirigirei o máximo de atenção devido ao quadro quase que irreversível de anarquia que se implantou no campo brasileiro.

Se alguém me perguntar se o Presidente Lula, em algum momento, usou o MST como massa de manobra, direi: quem sabe, mas o MST o usou também. Se alguém me perguntar se o Presidente Lula tem controle sobre o MST: não tem. Se alguém me perguntar se o Presidente do Incra ou o Ministro da Reforma Agrária, ao qual é vinculado o MST, têm controle: não têm. Se alguém me perguntar se hoje em dia dá para o Stédile deter esse clima no campo, eu lhe digo: não dá, o Stédile não o detém, pois se trata de um processo dinâmico, que criou pernas próprias e que custará muito à economia brasileira se não houver uma efetiva vontade política do Governo Federal no sentido de pôr cobro a uma ameaça verdadeira.

Então, faço a denúncia e exijo a resposta ética - e tenho certeza de que o Governo haverá de dá-la com presteza - a respeito do beneficiamento possível do Pão de Açúcar contra a Justiça Federal.

Em segundo lugar, ao encerrar, lamento as duas únicas atitudes que vi tomadas pelo Presidente do Incra: a de dizer que não muda a relação com o MST e a de que vai rever a medida provisória que tem sido uma forte contenção às invasões, proibindo a vistoria, no prazo de dois anos, de terras invadidas.

Muito obrigado a V. Exª.

Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/09/2003 - Página 26318