Discurso durante a 114ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Reforma da Previdência.

Autor
Mão Santa (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PI)
Nome completo: Francisco de Assis de Moraes Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PREVIDENCIA SOCIAL.:
  • Reforma da Previdência.
Aparteantes
Papaléo Paes.
Publicação
Publicação no DSF de 06/09/2003 - Página 26343
Assunto
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, CONTRIBUIÇÃO, SENADO, APRECIAÇÃO, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL, DEFESA, REALIZAÇÃO, DEBATE, SENADOR, APERFEIÇOAMENTO, PROPOSTA, IMPEDIMENTO, PREJUIZO, POPULAÇÃO, QUALIDADE, SERVIÇO PUBLICO.
  • DEFESA, NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, PROJETO, REFERENCIA, PISO SALARIAL, TRIBUTAÇÃO, APOSENTADO.

O SR. MÃO SANTA (PMDB - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Efraim Morais, que preside esta sessão, Srªs e Srs. Senadores que estão na Casa, brasileiros e brasileiras que assistem a esta sessão de hoje, 05 de setembro, sexta-feira. Quis Deus que o Senado desse hoje este exemplo ao País, na Semana da Pátria, numa sexta-feira! Isso significa como a situação mudou, Presidente Efraim: hoje, sexta-feira, e os Senadores aqui dando uma demonstração da pujança e da representatividade deste Congresso.

Queria usar da palavra, como último orador inscrito, lembrando e me inspirando na Bíblia, que diz que os últimos serão os primeiros, porque vamos tecer comentários sobre o mais significativo tema: a reforma da previdência.

Reforma é algo complicado. Isso está no livro O Príncipe, de Maquiavel. Toda reforma é complicada, Senador Papaléo Paes, porque tira privilégios, e os que vão ganhar não acreditam. É difícil, não pode ser feita de chofre.

Lá em Roma, o grande homem público Sirus Publius já dizia que um julgamento com pressa acelera o arrependimento pelo erro. Isso é o que não vamos fazer aqui. A reforma da previdência chega a esta Casa e será modificada.

Reli um discurso do Presidente Sarney, de quando tomou posse como Presidente desta Casa, não desta vez, mas da vez anterior, e nesse pronunciamento, Senador Eurípedes, o Presidente Sarney, que em 1955 iniciou a sua vida parlamentar - há quase meio século, Senador Efraim Morais, quase o que V. Exª tem de idade, que, por sinal, comemoramos ontem, numa festa que não foi só sua, da sua família e da Paraíba, mas de todo o País, e lá estávamos representando o Piauí -, dizia que este Congresso, de quase 200 anos, é a Casa do debate, da discussão, da controvérsia, e que disso tudo sai a luz. Disse ainda que este Congresso - que já foi fechado por sete vezes, Senador Eurípedes Camargo -, é melhor estar fechado, respeitando-se os homens que estão exercitando o mandato.

Numa dessas vezes em que o Congresso foi fechado - salvo engano, em 1967, diante de uma conturbada mudança no Poder Judiciário -, quis Deus que eu estivesse ao lado do Senador Petrônio Portella quando ele foi entrevistado. E, indagado pela imprensa a respeito, disse ele ser aquele o dia mais triste da sua vida. Mas o Congresso reabriu, com grandeza.

Este Congresso, Senador Augusto Botelho, cujos representantes são trazidos pela força do povo, não pode ser lacaio, vassalo do Poder Executivo. Temos que entender que não é assim a democracia. Entendo, Senador Eurípedes Camargo, na minha humildade - pois Sócrates, o mais sábio, disse: “Sei que nada sei” -, que este não é um Poder. Como também não é nem deve ser o Executivo. Como não é nem deve ser o Judiciário. Entendo que devem ser instrumentos da democracia. O Poder é o povo. O povo é o Poder.

Assim governei o meu Estado. Ensinei esse cântico no Piauí. E aquele povo, com seu poder, trouxe-nos para cá.

Então, como predizia o nobre Senador José Sarney, essa reforma tem de ser discutida, analisada, debatida e modificada. De todos os pronunciamentos, o mais bravo foi o do nobre Senador do Mato Grosso do Sul, Antero Paes de Barros, quando afirmou que, se esta Casa não cumprisse a sua função de aperfeiçoar as leis, S. Exª faria uma emenda à Constituição pedindo a extinção do Senado.

Hoje, sexta-feira, vim aqui e ouvi atentamente vários oradores. Entre eles, um dos Líderes mais autênticos do Partido dos Trabalhadores, o nobre Senador Paulo Paim. S. Exª apresentou, nobre Senador Efraim Morais, treze emendas - por ironia do destino, o número treze é o número do PT. Esse é o entendimento. Eu, particularmente, já apresentei cinco emendas, porque acho que essa reforma da previdência abala, para pior, a estrutura do serviço público do nosso País.

Primeiramente, pergunto: quem a fez? O Ministro Ricardo Berzoini. Senador Efraim Morais, S. Exª não foi prefeitinho como eu, não foi governador e faltou-lhe a humildade. Haverá um verdadeiro desmonte do serviço público. Desmonte, que ocorrerá, primeiro, por conta do teto. 

Senador Papaléo Paes, V. Exª foi prefeito. Deus permitiu que eu fosse prefeito da minha cidade natal, Parnaíba, e governador do Estado do Piauí duas vezes. O Presidente Lula, agora, tornou-se, com as bênçãos de Deus, Presidente da República.

O SR. PRESIDENTE (Efraim Morais) - Senador Mão Santa, peço licença a V. Exª. Prorrogo a sessão por mais oito minutos, até 13h10min, para que V. Exª possa concluir seu brilhante pronunciamento.

Está prorrogada a sessão.

O SR. MÃO SANTA (PMDB - PI) - Agradeço.

Quero falar sobre o primeiro erro: os tetos. O teto do Poder Judiciário está bom - quase R$18 mil -, mas, para o Executivo, jamais poderemos ter como referencial o prefeito, o governador ou o presidente da República. Senador Papaléo Paes, o salário de prefeito, de governador e de presidente é uma ficção, é simbólico. Quando o Presidente Lula deseja viajar, ele solicita um, dois três boeings, viaja e paga tudo. É a estrutura. O governador também a tem. Eu fiz isso.

Então, não se pode ter isso como referencial e achatar, massacrar, acabar, destruir e desmontar toda a estrutura executiva.

Assim, para resolverem seus problemas de folha, os governadores anunciam seus rendimentos, Senador Eurípedes Camargo: R$3,5 mil. E os técnicos, que dedicaram uma, duas, três décadas ao serviço público; diretores de hospitais, como o Distrital, como o do Câncer, no Rio de Janeiro, não vão ficar com um salário de R$2,5 mil. Professores universitários e reitores de universidades estaduais, abaixo. Isso vai provocar um desmonte. O funcionário público mal pago vai, automaticamente, buscar, com a sua competência, um serviço privado.

O Sr. Papaléo Paes (PMDB - AP) - Senador Mão Santa.

O SR. MÃO SANTA (PMDB - PI) - E quando digo isso, Senador Papaléo Paes, não estou defendendo professores, médicos e engenheiros, que merecem, pois há um disparate muito grande entre eles e o teto do Judiciário.

Perguntaria: e o professor que ensinou aos desembargadores, aos juízes, aos ministros do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal? Estão recebendo por volta de R$2,5 mil.

É o desmonte daquilo que serve ao pobre. Senador Eurípedes Camargo, V. Exª, que gosta de pobre, que veio, com seus laços, dos mais necessitados, deve saber que são eles que precisam da escola pública, da faculdade pública, da segurança pública, do hospital público; os ricos não têm problema, pegam o avião, vão para São Paulo, têm as instituições privadas.

São muitas falhas. A demora no serviço público está causando desemprego. O Presidente François Mitterand teve outra visão; por isso, foi reeleito. Ele nos está inspirando e nós o estamos citando. Ele diminuiu o tempo de serviço para gerar vagas.

E mais: esse negócio é comprometedor. Senador Arthur Virgílio, a sua inteligência é grande, pois estuda, mas V. Exª tem que ler A Face Oculta da Reforma Previdenciária. Todos os Senadores têm de ler esse livro. Por trás disso, tudo há uma pirataria - condenam a pirataria dos pobres, dos camelôs - às instituições mundiais neoliberais. São Homens que pertenceram aos fundos - Fundos de Pensão do Banco do Brasil, Fundos de Pensão da Caixa Econômica e da Petrobrás -, homens comprometidos com esse modelo querendo que nasça aqui nessas previdências... Um homem dedicado, um técnico de gabarito não poderá ficar com esse tipo de aposentadoria privada, que vai tirar o dinheiro da produção, encaminhando-o para as especulações bancárias.

É essa a diferença.

Outra falha, Senador Efraim Morais: existe a vida média e a vida saudável. A vida saudável média - o Senador Augusto Botelho, que é medico, sabe - é 52 anos. Está em qualquer livro de saúde pública. A partir daí, é de doença. Os defensores disso, Senador Papaléo Paes, acham que podem diminuir os proventos dos aposentados, que estão em casa e não pagam passagem de ônibus para ir ao trabalho. Mas pagam muito mais remédio, pois saíram da vida saudável. Hoje, temos o Mal de Alzheimer, a arteriosclerose, o diabetes, a insuficiência renal, a hipertensão.

Pior ainda, são as viuvinhas que perderam seus maridos, perderam um companheiro que ajudava na renda familiar. Não sou daqueles que chamam aposentados de vagabundos, não. As aposentadorias no Brasil são tão miseráveis que o aposentado procura outra fonte de renda para somar à renda familiar e ajudar no orçamento doméstico.

São esses os temas que temos que discutir, e não poderemos fazê-lo de chofre. Comparo com a minha formação profissional. Isso é como uma cirurgia. Ninguém vai medir o valor da cirurgia, Senador Augusto Botelho, que é cirurgião, pela velocidade com que é feita - se operou o apêndice em dez minutos, a vesícula em quinze. Vai-se medir pelas conseqüências de saúde, daqui a dez, vinte, trinta anos. É assim, Senador Efraim Morais. Está aí a Constituição dos Estados Unidos há 200 anos; estão aí as leis justas e boas que Deus entregou a Moisés, há mais de dois mil anos. Então, essas leis terão que ser modificadas, aperfeiçoadas, para servirem, por décadas, na melhoria da vida do povo.

E assim também deve ser na Previdência. E esse pobre coitado, Senador Eurípedes Camargo, que não tem uma carteira assinada, por exemplo. É porque ele quer? Não. É porque o Governo está sendo incompetente para criar fontes de trabalho. E eles estão trabalhando, estão lutando. Nós aplaudimos esses bravos homens, os informais, como os camelôs, os que fazem bico, as pequenas indústrias de fundo de quintal. E quando eles se apresentarem à velhice? Nada ampara. No passado, os legisladores buscaram aqueles discriminados, os trabalhadores do campo, que não tinham nada.

Concedo um aparte ao Senador Papaléo Paes.

O Sr. Papaléo Paes (PMDB - AP) - Em respeito ao Presidente da Mesa, serei bastante breve. O discurso de V. Exª preenche todas as nossas expectativas, da nossa formação profissional e da nossa formação cristã. V. Exª faz justiça para com aqueles que trabalharam 35 anos e se aposentam num momento difícil de sua vida devido a sua idade, quando vão precisar cada vez mais de recursos para atender suas necessidades, principalmente na doença, já que o Governo não consegue dar um atendimento digno para os aposentados. Como o Governo quer aprovar as reformas tributária e da Previdência, que causam transformações numa sociedade que vive há anos nesse sistema, usando a força, o rolo compressor, sem que o Senado as discuta? Sou mais uma voz que se soma ao seu discurso. Temos uma responsabilidade muito grande com o nosso País. Faltou V. Exª referir-se àquele ditado que diz que “quem come apressado come cru”, repetido várias vezes por V. Exª. E eu o repito por V. Exª. Muito obrigado.

O SR. MÃO SANTA (PMDB - PI) - Agradeço a V. Exª, mas essa frase foi dita, num momento de inspiração, pelo nosso filósofo Presidente da República ao ilustre Ministro da Educação, que estava ansioso por levar saber a todo povo brasileiro. Essa mesma filosofia, válida para advertir o Ministro da Educação de que deveria ter paciência, foi incorporada por nós.

Sintetizando tudo o que penso, quero dizer que a proposta de emenda constitucional de reforma da Previdência acaba de chegar a esta Casa, após ter sido aprovada pela Câmara dos Deputados, com algumas emendas.

O regime parlamentar brasileiro é bicameral, o que exige que cada uma das Casas Legislativas examine em profundidade as propostas e projetos que a elas são submetidos, à luz das respectivas experiências.

Não faz, portanto, qualquer sentido exigir-se do Senado Federal, uma Casa de grande tradição na vida brasileira, que examine e apenas homologue a PEC da Previdência, de modo superficial, dado que ela já foi amplamente debatida na Câmara.

O Senado caminha firmemente para o bicentenário de existência e, caso adotado esse procedimento, seria uma verdadeira afronta a sua grandiosa história. Seria negar sua competência, seu passado e sua trajetória.

Temos, ao contrário, de proceder a uma análise acurada da proposta oriunda da Câmara dos Deputados. Há nela pontos que inspiram grandes dúvidas, que resultaram na supressão ou mudança de conquistas e garantias sociais e direitos adquiridos ou expectativa de direitos sobre os quais devemos nos debruçar na busca de uma solução mais adequada para o Pais e seus servidores.

Uma emenda constitucional não pode e não deve ser aprovada sem os requisitos essenciais de uma profunda e democrática discussão com a sociedade brasileira. A pressa, nesse caso, mais do que nos outros, é inimiga da perfeição, perfeição essa que deve nortear nossa vida parlamentar.

Eu mesmo tenho várias dúvidas sobre determinados dispositivos aprovados na PEC da Previdência seja na taxação dos inativos, seja na redução dos valores das pensões, seja nas regras de transição para os atuais servidores, seja na instituição da previdência complementar para os futuros servidores. A rigor, a reforma deveria se cingir aos futuros servidores, já que os atuais entraram no serviço público com um contrato que contém e regula seus direitos.

Nesse sentido, recebi da Associação Nacional dos Servidores da Previdência Social - Anasps, entidade que reúne 53 mil dos 88 mil servidores da Previdência Social, solicitação e apelo para que proponha mudanças, o que farei, na proposta constitucional.

Não há justificativa para a taxação dos inativos. É contra o direito previdenciário. Não há nenhum país, com previdência, e a nossa tem 80 anos, com taxação de inativos.

O SR. PRESIDENTE (Efraim Morais) - Por favor, conclua, nobre Senador.

O SR. MÃO SANTA (PMDB - PI) - Já concluirei, Sr. Presidente.

No caso da taxação de inativos, o próprio Palácio do Planalto, segundo reportagem publicada na imprensa, levantou indícios de inconstitucionalidade da proposta. Diversos juristas respeitáveis também acompanharam a nossa linha de pensamento.

A nova fórmula de cálculo de pensões também não me parece feliz e muito menos justa. É preciso examinar detalhadamente as repercussões dessa proposta.

A paridade salarial para os atuais servidores, quando se inativarem, parece-me extremamente perversa. Por um lado, as exigências para que o servidor garanta esse tratamento estão inscritas de forma clara e precisa no texto constitucional: idade mínima no serviço público e no cargo. Entretanto, a concretização da paridade é jogada para regulamentação futura, via legislação ordinária.

A paridade, em todos os casos, deve estar claramente definida na Constituição Federal, sem subterfúgios de qualquer natureza.

Não me convenceu, igualmente, a instituição do fundo de previdência complementar para os servidores. A proposta, conforme aprovada, é pouco razoável, necessitando de substancial mudança.

Esses pontos não esgotam minhas dúvidas e, quero crer, de considerável parte desta casa. Existem outros a merecer a devida atenção das Srªs e Srs. Senadores.

Temo que, tentando resolver um problema de natureza fiscal, acabemos por provocar graves conseqüências para o futuro da administração pública no Brasil.

Parece-me que, neste caso, o episódico pode contaminar o permanente e o excessivo foco naquilo que chamam de vantagens da reforma possa impedir uma visão mais clara dos comprometimentos futuros das medidas ora adotadas de forma tão apressada.

Sr. Presidente, colegas Senadoras e Senadores, o Senado Federal tem um amplo e relevante trabalho a realizar sobre a reforma da previdência. A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania e o Plenário da Casa devem debater à exaustão essa proposta de emenda constitucional, sem açodamentos ou prazos fatais, ouvindo as partes envolvidas e decidindo com ampla liberdade os inevitáveis ajustes a serem procedidos na proposta.

É papel do Senado, e ele há de cumprir fielmente sua nobre missão, olhando, sobretudo, para o futuro do País.

Deus ditou “Os Dez Mandamentos”, rapidamente. Deus! Nós não temos esse poder. Então, temos que nos aproximar, oferecendo à sociedade leis boas e justas, inspiradas nas Leis de Deus.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/09/2003 - Página 26343