Discurso durante a 119ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Implantação de uma política nacional de gestão de resíduos sólidos.

Autor
Papaléo Paes (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AP)
Nome completo: João Bosco Papaléo Paes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SANITARIA. POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Implantação de uma política nacional de gestão de resíduos sólidos.
Publicação
Publicação no DSF de 12/09/2003 - Página 27008
Assunto
Outros > POLITICA SANITARIA. POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • ANALISE, AUMENTO, QUANTIDADE, PRODUÇÃO, LIXO, BRASIL, REGISTRO, DADOS, PESQUISA, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), REFERENCIA, COLETA, CARACTERISTICA, DEPOSITO, RECICLAGEM, INCINERAÇÃO, SELEÇÃO, ATERRO, CONTROLE SANITARIO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, REGIÃO NORTE, ACUMULAÇÃO, RESIDUO, AREA LIVRE, AUSENCIA, PROTEÇÃO.
  • DEFESA, AMPLIAÇÃO, CAMPANHA, REDUÇÃO, REUTILIZAÇÃO, RECICLAGEM, LIXO, NECESSIDADE, POLITICA, GESTÃO, RESIDUO, RESPONSABILIDADE, INDUSTRIA, SOCIEDADE, IMPORTANCIA, SELEÇÃO, COLETA, CONCLAMAÇÃO, EMPENHO, GOVERNO MUNICIPAL, EXPECTATIVA, AGILIZAÇÃO, VOTAÇÃO, PROJETO DE LEI, DEFINIÇÃO, POLITICA NACIONAL, SETOR.

O SR. PAPALÉO PAES (PMDB - AP. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o aumento da quantidade de lixo produzido em nosso País exige avanços contínuos em direção à implantação de uma verdadeira e consistente política nacional de gestão de resíduos sólidos.

O lixo coletado no Brasil soma, a cada dia, cerca de 228 mil toneladas, de acordo com a pesquisa nacional de saneamento básico, realizada pelo IBGE no ano de 2000. se fizermos uma simples operação de multiplicação, teremos 82 milhões de toneladas de lixo urbano geradas em um ano, às quais é necessário dar algum tipo de destinação.

Nosso País tem mostrado, de fato, uma evolução considerável no que se refere à adequação do destino final do lixo. Se na pesquisa nacional de saneamento básico realizada em 1989 se constatava a destinação de quase metade do lixo para os depósitos a céu aberto - os lixões de triste fama -, essa mesma destinação reduziu-se para pouco mais de 21%, de acordo com a mesma pesquisa realizada no ano 2000.

Ainda assim, o IBGE concluiu, ao analisar esses dados, que tão-somente 40,5% do lixo brasileiro têm destinação adequada, considerando desse modo o lixo reciclado, o incinerado de forma controlada e o enviado aos aterros sanitários ou a estações de triagem. Revelam-se, ademais, na mesma pesquisa, grandes disparidades na destinação do lixo em nível regional. A região Norte é a que apresenta a pior situação, com 86,6% de destino final inadequado para o lixo.

A solução do lixão só não é pior do que deixar o lixo acumular-se pelas ruas da cidade, ou a de lançá-lo indiscriminadamente pelos campos. Eles degradam a paisagem, produzem mau cheiro, contaminam o solo e os recursos hídricos superficiais e subterrâneos. acarretam, além disso, um grave problema social, o das milhares de pessoas que sobrevivem em nosso País do que retiram dos lixões, inclusive alimentos.

O lixo urbano já está sendo destinado em sua maior parte aos aterros. O aterro chamado de controlado, que consiste em um simples depósito de lixo que se cobre periodicamente com uma camada de terra, recebe 37% do lixo; aos aterros sanitários é destinada quase a mesma proporção, cerca de 38%.

O aterro impropriamente dito controlado não oferece, decerto, maiores garantias de segurança para o meio ambiente e para a população, embora evite a triste realidade dos catadores. Para que um aterro de resíduos sólidos seja classificado como sanitário, ele deve ser impermeabilizado e contar com sistemas de drenagem para os gases produzidos pela decomposição do lixo orgânico e para o chorume, líquido que resulta também do lixo acumulado.

Até mesmo a destinação dos aterros sanitários está sendo considerada ultrapassada na Europa - para não falarmos na incineração, que era muito utilizada, por exemplo, na França. Este último processo lança no meio ambiente uma grande quantidade de produtos tóxicos, como vem sendo constatado a partir dos malefícios decorrentes da poluição nas proximidades de algumas usinas francesas.

Os aterros sanitários necessitam ocupar uma área considerável, enquanto aguardam a degradação, várias vezes secular, de alguns dos materiais depositados. uma lagoa próxima, de acesso vedado ao público, deve receber o chorume drenado. A população que habita as vizinhanças de uma área onde se pretende implantar um aterro sanitário costuma manifestar resistência à idéia.

Toda essa série de problemas mostra que a melhor solução, Sr. presidente, está contida na chamada política dos três "erres": reduzir, reutilizar e reciclar. Sua adoção não implicará a eliminação do lixo a ser aterrado, mas vai diminuí-lo em proporções consideráveis.

É preciso, em primeiro lugar, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, reduzir a quantidade de lixo que nossa população produz. Mas esta quantidade só tem feito aumentar, impulsionada por um modelo de produção e consumo irracional. Considera-se que uma embalagem bonita, ou de algum modo mais prática, pode ser decisiva para vender o produto. O que vai ser feito dela depois não vem ao caso.

Contra essa tendência, vem ganhando força a idéia de que o produtor deve se responsabilizar por seu produto até o destino final deste como lixo. Essa noção já se tornou imposição legal em diversos países, tendo como resultados, por exemplo, a reformulação dos processos industriais, ou a organização dos fabricantes em cooperativas, para que possam recolher as embalagens de seus produtos ou os próprios produtos quando descartados.

No Brasil, resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) que obrigam os fabricantes a darem um destino ambientalmente adequado a produtos como pneus e baterias têm mostrado eficácia restrita. Daí, a importância de termos não apenas uma lei, Sr. Presidente, mas uma efetiva política de gestão de resíduos sólidos. Veremos, adiante, como nos encontramos em relação à perspectiva de instituição de uma tal política.

A reutilização é uma ótima opção para diminuir a quantidade de lixo, sempre que se puder usar de novo determinado produto, seja na finalidade originalmente prevista, seja em qualquer outra para a qual se mostre adequado, sem precisar ser modificado. Algumas práticas simples podem ser adotadas por todos nós, como usar os dois lados da folha de papel ou reaproveitar as embalagens plásticas. Mas a indústria também pratica a reutilização, com imensa economia - e pode fazê-lo bem mais. O exemplo mais comum é a reutilização do recipiente de determinado produto, desde que aquele seja resistente, como é o caso do vasilhame de vidro.

Temos, por fim, a reciclagem, que implica a transformação do produto já usado, representando opção imprescindível para o bom aproveitamento da riqueza contida no lixo, juntamente com a diminuição do volume desse lixo. Mais da metade dos resíduos sólidos, de acordo com os especialistas, pode ser aproveitado com a reciclagem. No Brasil, temos uma reciclagem bastante eficaz no que toca às latas de alumínio e ao papelão, devida antes ao interesse e à iniciativa dos fabricantes, bem como à fácil disponibilidade da mão-de-obra dos catadores, do que a uma política governamental voltada para tal finalidade.

Se o índice médio de reciclagem do alumínio no Brasil fica em 70%, o reaproveitamento de outros materiais é muito menor: apenas 18% do aço e 12% do plástico são reciclados, por exemplo. O pesquisador da Universidade de São Paulo, Sabetai Calderoni, um dos maiores especialistas brasileiros no assunto, calculou, em 1997, que o Brasil perdia algo em torno de R$ 4,6 bilhões por ano pela falta de uma política abrangente de reciclagem do lixo, como expõe em seu livro, intitulado justamente Os Bilhões Perdidos no Lixo.

Para chegar a essa cifra impressionante, o pesquisador considerou, por exemplo, que, ao se reciclar uma tonelada de papel, são economizados 50% da energia elétrica necessária para sua fabricação, além de 10 mil litros de água e uma média de 17 árvores. A cada cem toneladas de plástico reciclado, economiza-se uma tonelada de petróleo - e assim por diante.

Temos também, com a reciclagem, via de regra, processos menos poluidores para a obtenção dos mesmos produtos: a produção de vidro pela reciclagem diminui a poluição do ar em 20% e a da água em 50%.

Um dos procedimentos que simplifica enormemente a reciclagem é a coleta seletiva do lixo. Crescendo em um ritmo não tão acelerado em nosso País, a coleta seletiva acarreta um outro enorme ganho no combate ao lixo inadequadamente destinado e até mesmo ao conjunto dos danos ambientais. Esse ganho é o do engajamento da população, que pressupõe sua informação sobre os problemas do lixo e sua conscientização sobre a necessidade de cuidarmos de nosso meio ambiente, enquanto ele pode ser ainda preservado. É extremamente recomendável que a prática tão relevante da coleta seletiva seja difundida pelas cidades de nosso Brasil, para o que conclamamos o empenho das autoridades municipais.

Referíamo-nos, há pouco, à necessidade de instituir uma política nacional de resíduos sólidos. É longa, Srªs e Srs. Senadores, a história dos esforços legislativos nesse sentido, no âmbito do Congresso Nacional. Um deles, que ganhou maior repercussão junto à imprensa, foi apresentado originalmente nesta Casa, como Projeto de Lei do Senado nº 354, do ano de 1989 - há 14 anos, portanto. Após aprovação no Senado, foi remetido, em março de 1991, à Câmara dos Deputados, lá permanecendo por mais de uma década. Aos 22 de maio do ano passado, o Deputado Emerson Kapaz, Presidente de uma comissão especial que analisava a proposição e diversos outros projetos de lei que lhe foram apensados, apresentou o meritório projeto de lei substitutivo da Política Nacional de Resíduos Sólidos.

Com esse projeto, são consagrados alguns princípios que devem nortear a gestão dos resíduos sólidos no País, entre os quais queremos destacar o princípio da informação e da participação da sociedade; o princípio da responsabilidade dos produtores; o princípio da gestão integrada dos resíduos; o princípio da prevenção; e o princípio poluidor-pagador.

Não irei alongar-me na explicação de cada um desses princípios, pois acredito que suas denominações já são, em grande parte, esclarecedoras. A questão essencial, no presente momento, é que transcorreu o ano de 2002, findou a Legislatura e o projeto de lei substitutivo não foi votado. É de suma importância que a Câmara dos Deputados não deixe perder-se todo o esforço que resultou no substitutivo do Deputado Emerson Kapaz, o qual não foi reeleito. O novo relator não deve, em hipótese alguma, recomeçar da estaca zero, mas aproveitar o resultado de um esforço coletivo de já tantos anos.

Não terminam aí, entretanto, os ingredientes que compõem a trama intricada da instituição de uma política nacional de resíduos sólidos. É bom que se diga que o projeto de lei originário do Senado em 1989, que veio a resultar no projeto substitutivo do Deputado Emerson Kapaz, tinha um escopo bem mais restrito em sua primeira elaboração. Eis a razão para que o Senador Lúcio Alcântara apresentasse nesta Casa, em 1999, um novo Projeto de Lei, o de nº 265, com o mesmo objetivo de instituir a política nacional de resíduos sólidos. Ressalte-se que, no ano de 1999, ainda estávamos distantes do momento em que o Deputado Emerson Kapaz apresentaria o seu substitutivo, o qual até hoje não foi votado.

Quanto ao projeto de lei do atual Governador do Estado do Ceará, registremos que foi concebido, desde o início, com o objetivo de propiciar ao País uma política de resíduos sólidos abrangente e coerente, em sintonia com os princípios do desenvolvimento sustentável. Foi, há pouco, recebido o relatório do Senador Demóstenes Torres, que se manifesta pela aprovação do PLS nº 265, de 1999, e pela rejeição de dois projetos de lei que lhe estavam apensados. A matéria está pronta para a pauta na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.

Em breve, ambos os projetos, o que tramita na Câmara e o que tramita no Senado vão encontrar-se. Confiamos que as melhores idéias e formulações de um e outro sejam aproveitadas, de um modo que não retarde ainda mais a sua tramitação e a promulgação do projeto definitivo, passando, finalmente, a produzir seus efeitos tão almejados.

Sr. Presidente, considero que o Brasil tem amadurecido para a questão ambiental, de um modo geral, bem como para os graves riscos decorrentes de uma atenção insuficiente para o lixo que produzimos. Falta, entretanto, tomar uma série de medidas importantes relativas a essa questão específica, incluindo, em particular, a instituição de uma política nacional de resíduos sólidos que venha a concatenar as diretrizes de uma gestão adequada do lixo. Essa, Srªs e Srs. Senadores, deve ser, necessária e inadiavelmente, uma contribuição do Congresso Nacional.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/09/2003 - Página 27008