Discurso durante a 125ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários a respeito da reunião da Comissão de Constituição e Justiça com o Ministro da Previdência, oportunidade em que foi debatida a reforma previdenciária.

Autor
Mão Santa (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PI)
Nome completo: Francisco de Assis de Moraes Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PREVIDENCIA SOCIAL.:
  • Comentários a respeito da reunião da Comissão de Constituição e Justiça com o Ministro da Previdência, oportunidade em que foi debatida a reforma previdenciária.
Aparteantes
Paulo Paim.
Publicação
Publicação no DSF de 20/09/2003 - Página 28455
Assunto
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, REUNIÃO, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO E JUSTIÇA, PRESENÇA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA PREVIDENCIA SOCIAL (MPS), DEBATE, ESCLARECIMENTOS, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL.
  • CRITICA, PROPOSTA, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL, PREJUIZO, TRABALHADOR, PROTESTO, ATUAÇÃO, GOVERNO, TENTATIVA, AGILIZAÇÃO, APROVAÇÃO, IMPOSIÇÃO, DIFICULDADE, DISCUSSÃO, PROJETO DE LEI.

O SR. MÃO SANTA (PMDB - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Antonio Carlos Valadares, Srªs e Srs. Senadores que estão na Casa, brasileiros e brasileiras que assistem a esta sessão de 19 de setembro, sexta-feira, do ano de 2003, por meio da televisão e da rádio do Senado, assisti, na quarta-feira, a uma das reuniões mais vibrantes e participativas da Comissão de Assuntos Sociais, que me parece ser a que tem maior número de Senadoras e Senadores: 29. Estavam presentes quase 40 Srs. Senadores, incluídos os membros da Comissão de Assuntos Econômicos que lá se encontravam, para debater com o Ministro Ricardo Berzoini a reforma da previdência. Isso porque a reforma que aqui chegou só é discutida, regimentalmente, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Estranham-me o fato e a ignorância audaciosa - isso está na formação de médico-cirurgião que trago, a mesma que Juscelino trouxe a Brasília, ao Brasil e a esta Casa. Mas nunca havia visto tantos participantes em uma reunião: membros da CAE e outros Senadores desta Casa que não participam da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, onde estão ocorrendo os debates.

Com a presença do Ministro Ricardo Berzoini, a reunião - que costuma ter o seu início marcado para às 14 horas e 30 minutos - teve início às 10 horas, com as luzes dos Srs. Senadores, que tentavam dar uma contribuição para a reforma previdenciária, que agride o direito adquirido. V. Exª, homem da Justiça e do Direito, sabe que agride também o que a Justiça pede ao jurista, que é um ordenamento jurídico perfeito. Lá estavam as melhores inteligências deste País, que estão no Senado, como os Senadores Arthur Virgílio, Paulo Paim, Tasso Jereissati, César Borges, Garibaldi Alves Filho. Eu mesmo apresentei sugestões.

O interessante, Senador Arthur Virgílio, é que já estava tudo feito. O Relator já tinha seu parecer pronto. Aquilo a que estávamos assistindo era uma comédia, um drama. Centenas e centenas de emendas - que, na Ciência Médica, chamamos de remédios, Senador Antonio Carlos Valadares, e que no mundo jurídico são chamadas de emendas - foram apresentadas diante de uma doença grave, de uma reforma precipitada. No entanto, nenhuma foi aceita para minorá-la - nenhum medicamento, que, no mundo jurídico, conhecemos como emenda.

Aqui vim para aconselhar o Presidente, em respeito a Paulo Paim, Senador que fez o primeiro pronunciamento. S. Exª foi buscar o saber da França, daquele povo que foi às ruas e gritou por “liberdade, igualdade e fraternidade” - grito que derrubou todos os reis, todos os regimes absolutistas e fez nascer a democracia que estamos vivendo. O Senador Paulo Paim falava do milagre da França em propiciar emprego, e é justamente essa democracia que quero dizer que o Governo está entendendo mal.

Senador Paulo Paim, para inspirar o Presidente da República - generoso, que tem o apoio da Nação e as esperanças do povo, que, espero, não sejam enterradas nessa reforma precipitada que aqui chega -, eu buscaria Mitterrand, que, no final de sua vida, convidou um amigo intelectual que havia ganho o Prêmio Nobel da Paz e pediu-lhe ajuda para deixar seus últimos ensinamentos ao mundo civilizado democrático. Depois de governar a França por 14 anos, no final de sua vida, com câncer, dizia que ensinava aos futuros governantes a fortalecerem os contrapoderes. Senador Arthur Virgílio, atente à mensagem de Mitterand: se ele pudesse voltar, fortaleceria os contrapoderes. É isto que solicitamos ao Presidente da República: respeito, e que fortaleça este Poder, que deve fazer leis boas e justas. Ruy Barbosa, que foi Senador, disse que o único caminho da salvação são a lei e a justiça. Senador Paulo Paim, essa lei tem que ser boa e justa.

Só temos a lamentar quando pessoas que rodeiam o Presidente da República, míopes, quase cegas, “cubanizadas”, querem fazer deste País uma Cuba. Senador Antonio Carlos Valadares, Cuba tem parlamento, que se reúne. Querem fazer disso aqui uma Cubazinha, Senador Arthur Virgílio. É um desrespeito o que estão fazendo. V. Exª esteve presente à reunião, assim como o Senador Paulo Paim, que simboliza o melhor do trabalhismo brasileiro. Foram apresentadas trezentas emendas - como os juristas as chamam; nós, médicos, chamamos de remédio - para melhorar essa reforma, que está trazendo tanta desgraça a este País, a esta gente. Essa reforma é um tormento para os que trabalharam, para os aposentados, para as viuvinhas, para o povo, para o pobre, para o desempregado. Está havendo um desmonte do serviço público. E o serviço público é que vai garantir ao pobre a saúde, por meio do hospital público, o estudo, a alfabetização.

Não se alfabetiza, Presidente Lula, invadindo-se o Congresso Nacional, mudando o cartão postal, fazendo propaganda. Alfabetiza-se, Senador Paulo Paim, com a escola pública, com o serviço público, respeitando os professores e as professoras, dando-lhes melhores garantias e benefícios. Este País quer mudar essa bandeira, fazendo este plenário igual ao de Cuba.

O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Senador Mão Santa, permite-me um aparte?

O SR. MÃO SANTA (PMDB - PI) - Senador Paulo Paim, eu só queria dizer que fui a Cuba, e lá eles têm também um parlamento. Eles dizem que é uma democracia. O que não tem é partido, Senador Antonio Carlos Valadares, mas eles elegem deputados. A última eleição foi: para Presidente, Fidel Castro, com 300 votos - eram 300 deputados -, e, para Vice, o irmão de Fidel Castro, também com 300 votos.

É como querem fazer aqui, Senador Arthur Virgílio. Que esta Casa não aceite as emendas, que são medicamentos para a salvar a população desta grande doença, que é essa PEC que para cá veio. Digo que essa PEC, Senador, é um pecado, um estelionato e um crime contra o serviço público dos brasileiros.

Concedo o aparte ao Senador Paulo Paim.

O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Senador Mão Santa, respeito-o por suas posições históricas. Recentemente, inclusive, não estando presente numa reunião que debatia a previdência - estava no meu gabinete -, ouvi e vi V. Exª fazer uma série de referências elogiosas ao meu trabalho. Quero, de público, agradecer a V. Exª. Conheço também a sua história, e tenho certeza de que o povo do Piauí muito se orgulha da sua caminhada de ex-Governador, hoje Senador. Quero me referir a duas questões, para não tomar muito o seu tempo. Em primeiro lugar, também estive em Cuba, cujo povo respeito muito. O povo de Cuba fez a sua opção por um sistema de governo, que não é a do povo brasileiro, que escolheu um sistema democrático. O Presidente Lula submeteu-se às urnas, como cada um de nós, dentro das regras do jogo, e hoje é o nosso Presidente da República. Sei que V. Exª o reconhece como tal. O mesmo ocorre no Rio Grande do Sul, onde perdemos as eleições com o companheiro Olívio Dutra, hoje Ministro. Lá o meu Governador é Germano Rigotto, do PMDB, porque foi eleito democraticamente pelo voto e é o Governador de todos os gaúchos. É nessa linha que faço este aparte a V. Exª, dizendo que tenho apreço pela sua caminhada, pela sua história - isso lhe falo pessoalmente e também de público -, mas discordo quando V. Exª coloca que a intenção do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva é transformar o País em uma outra Cuba. E por que a minha discordância? Repito: o povo de Cuba fez a sua opção, e eu respeito. Nós fizemos outra opção, pelo sistema democrático. Mas quero falar é sobre a reforma da previdência. Tenho conversado muito com V. Exª e, quanto mais converso com V. Exª, mais o respeito. Como respeito aqui, de forma carinhosa e respeitosa, a Senadora Lúcia Vânia, pelas suas posições firmes, mas sempre de diálogo e de entendimento; o Senador Antonio Carlos Valadares; o sempre Líder Arthur Virgílio, que tem colaborado muito fazendo uma oposição dura, firme, mas sabe se posicionar quando o melhor para o País está em jogo, como no caso do Estatuto do Idoso. Não estou fazendo rasgação-de-seda, mas dou este depoimento de público. Para o relatório do Estatuto do Idoso avançar, disseram-me que eu teria que falar com o Senador Arthur Virgílio. Eu disse que tinha a certeza de que S. Exª colaboraria para desobstruir a pauta em defesa dos idosos. De pronto, quando o procurei, respondeu-me: “Não só assino como quero que me dê mais dados, porque é uma matéria pela qual tenho o maior carinho, o maior respeito”. A mesma coisa ocorreu com a Senadora Lúcia Vânia. Quando lhe pedi que relatasse em plenário, S. Exª me disse que iria relatar na Comissão, inclusive para valorizá-la, mas, tendo em vista o pedido e por se tratar de uma matéria amplamente discutida, que tinha o apoio de todos os setores, que faria o relatório em plenário, o que muito a orgulharia. Na questão da PEC da Previdência, tenho a visão de que, apesar de não ter acatada nenhuma das trezentas emendas apresentadas, o Relator sinalizou a todos nós, a todos aqueles que atuam nesse campo - e os Senadores que estão no plenário todos atuam -, que nós teremos um processo de negociação até a votação final pelo Plenário. Estou convencido de que emendas de V. Exªs, Senador Valadares, Senadora Lúcia Vânia e Senador Artur Virgílio, serão aprovadas por este Plenário. Eu diria mais: acredito que haveremos de construir esse grande entendimento. Eu dizia ontem para o Presidente Lula que vou torcer e vou trabalhar para a reforma da previdência. Entendo que essa é a posição da maioria dos Senadores. Não é questão de oposição ou situação, mas o importante é que consigamos fazer um entendimento e aprovar as emendas possíveis na questão do subteto, dos inativos, da transição, da paridade, enfim, de uma série de pontos com os quais sei que V. Exª concorda. Sei que as posições de V. Exª são firmes e claras, e, com essa dureza, ao mesmo tempo em que o Governo diz não aceitar nenhuma das trezentas emendas, V. Exª diz: “Não, senhor, teremos que construir um entendimento em cima de algumas dessas emendas”. Respeito a firmeza de V. Exª, porque entendo que é daqueles que tem posição firme e clara, mas vai estar sempre aberto ao diálogo, ao entendimento, com vistas ao que for melhor para o País. Por isso comprimento V. Exª.

O SR. MÃO SANTA (PMDB - PI) - Agradeço, assim como todo o País, não essa participação, mas o trabalho que o Senador Paulo Paim tem feito ao longo da sua vida política para a melhoria da vida do trabalhador brasileiro.

O que quis dizer ao citar Cuba é que lá - e tem gente que tem essa visão só de Cuba: o povo escolheu - eu conheço. Não estou aqui para fazer análise, mas estou falando desse parlamento, porque há muitas diferenças. Lá o parlamento funciona dessa maneira, se reúne, é outra conversa. Mas, este Parlamento tem uma altivez que não precisamos buscar nos homens do passado - e bastaria citar Ruy Barbosa -, não precisamos viver do passado. Os homens presentes, que estão aqui, são cientes das suas responsabilidades.

Mas quero deixar claro o meu entendimento. Entendo que, para onde vamos, levamos a nossa formação profissional. Daí o Senador Paulo Paim ser valorizado, porque leva a experiência de uma vida profissional honrosa, de trabalhador, de operário, de homem cujas virtudes e capacidade de trabalho o povo reconheceu; por isso o trouxe para cá. O caminho de S. Exª foi longo e sinuoso: operário, metalúrgico, Secretário-Geral da CUT, apenas com curso ginasial - não digo isso com desdouro, mas porque não teve, como eu e outros que estão aqui, as facilidades de famílias abastadas para fazer um curso superior; mas teve quatro mandatos de Deputado Federal que valem mais do que dois cursos superiores. Então, V. Exª enriquece o nosso pronunciamento.

Porém, na minha profissão, Senador Paulo Paim, quando se tem muito medicamento é porque a confusão é grande, a doença é complicada. E assim vejo essa reforma: é complicada. Maquiavel já dizia que toda reforma é complicada. Tira privilégios, e ninguém vê o que vem de bom; ninguém acredita. Quando há muitos remédios para uma doença é porque nenhum é bom, mas esses medicamentos variados são necessários. Quando uma só técnica cirúrgica é seguida por todos, aquela é perfeita. Então, se um tiro não dá certo, como queria o ex-Presidente Collor, devemos aceitar e ter a paciência de várias medidas, vários instrumentos inspirados pelos Senadores para trazer o benefício.

Portanto, essas são as nossas palavras aqui.

Estou defendendo o servidor público, porque sou e fui servidor público. Sou médico-cirurgião aposentado pela Previdência Social e entendo que a sociedade não pode funcionar sem um serviço público. Não buscamos aqui quantidade de votos, porque, na população do Brasil, os servidores representam um percentual pequeno; no entanto, o servidor público tem força para melhorar a vida da nossa sociedade. É ele que vai garantir aos mais humildes, aos mais necessitados, aos mais sofridos, sem esperança, a esperança do saber da escola.

As escolas públicas eram boas. Eu me formei numa faculdade de Medicina pública, na Universidade Federal do Ceará, e recordo o estoicismo, a seriedade, a abnegação dos professores, dos funcionários públicos. Fiz a minha pós-graduação de cirurgia em um hospital público, no Hospital do Servidor do Estado e do Ipase, e senti a vida, a responsabilidade, o altruísmo, o estoicismo do servidor público para melhorar a vida de todos os habitantes deste País, principalmente dos mais necessitados, humildes e sofridos.

Então, é essa a nossa defesa, para que possamos aqui continuar a tradição de luta desta Casa e oferecer ao povo do Brasil leis boas e justas.

Ficam aqui as minhas palavras finais como um convite a todos aqueles que se sintam prejudicados, porque há esperança. Dom Quixote de La Mancha, no livro de Cervantes, ensinando Sancho Pancha a governar, dizia que só não tem jeito para a morte. Então, ainda há jeito, e somando-nos todos e fazendo respeitar esta Casa, poderemos aproveitar as experiências e oferecer ao povo brasileiro uma reforma que traga melhores dias para a sociedade tão sofrida do nosso País.

Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/09/2003 - Página 28455