Discurso durante a 129ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Indignação com a atitude do presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, que lhe negou o uso da palavra na reunião de ontem, que discutia a reforma da previdência. (como Líder)

Autor
Almeida Lima (PDT - Partido Democrático Trabalhista/SE)
Nome completo: José Almeida Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO. PREVIDENCIA SOCIAL.:
  • Indignação com a atitude do presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, que lhe negou o uso da palavra na reunião de ontem, que discutia a reforma da previdência. (como Líder)
Aparteantes
Arthur Virgílio, César Borges, Heloísa Helena, Mão Santa, Tasso Jereissati.
Publicação
Publicação no DSF de 26/09/2003 - Página 29086
Assunto
Outros > SENADO. PREVIDENCIA SOCIAL.
Indexação
  • REGISTRO, ATUAÇÃO, EDISON LOBÃO, PRESIDENTE, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO JUSTIÇA E CIDADANIA, OBSTACULO, ATUAÇÃO PARLAMENTAR, ORADOR, GARANTIA, REGIMENTO INTERNO, MANIFESTAÇÃO, VOTO EM SEPARADO, RELATORIO, PROPOSTA, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL, PREJUIZO, DEMOCRACIA, ANUNCIO, INGRESSO, MANDADO DE SEGURANÇA, ANULAÇÃO, DECISÃO, MOTIVO, VIOLAÇÃO, DIREITOS.
  • CRITICA, ATUAÇÃO, SENADOR, DIFAMAÇÃO, ORADOR, POSTERIORIDADE, SAIDA, REUNIÃO, COMISSÃO.
  • LEITURA, REGISTRO, ANAIS DO SENADO, MENSAGEM (MSG), INTERNET, CIDADÃO, DENUNCIA, INJUSTIÇA, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL, PREJUIZO, FUNCIONARIO PUBLICO.

O SR. ALMEIDA LIMA (PDT - SE. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, inicialmente, agradeço a V. Exª ter me concedido o direito ao exercício do meu mandato de Senador, cujo direito, ontem, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, foi cerceado, lamentavelmente, por decisão do Presidente daquela Comissão, Senador Edison Lobão.

            Venho à tribuna desta Casa exatamente para registrar a minha indignação com os fatos ocorridos na noite de ontem naquela Comissão, quando, de forma discriminatória, o Presidente, atendendo a requerimento de Lideranças do Governo, cerceou-me um direito que já havia sido deferido a aproximadamente cinco outros Senadores e que está previsto no art. 132, § 6º, do Regimento Interno.

Art. 132 Lido o relatório, desde que a maioria se manifeste de acordo com o Relator, passará ele a constituir parecer(...)

§ 6º Os membros da comissão que não concordarem com o relatório poderão:

I - dar voto em separado(...)

Esse direito, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, de dar o voto em separado, embora por mais de uma vez manifestada a minha intenção, me foi negado num ato arbitrário que não se viu sequer no período da ditadura militar. Porém, parece-nos que, hoje, algumas Lideranças desta Casa têm saudade daquele período, talvez até porque dele tenham participado tão efusivamente.

Outra não poderia ser a minha atitude. Registrei meu protesto e disse claramente ao Presidente que, como vivemos num Estado Democrático de Direito, que é dividido em três Poderes e essa divisão pressupõe exatamente a distribuição de funções e competências, porque não mais vivemos no período do absolutismo, em que o rei imperava sozinho, dadas as salvaguardas constitucionais, eu iria, por considerar o meu direito ferido e lesado, ao Poder Judiciário tentar anular as decisões, as deliberações tomadas a partir daquele instante em que o meu direito sofreu a lesão.

A própria Constituição reza, no art. 5º, que nenhuma violação a direito poderá deixar de ser apreciada pelo Poder Judiciário. Por isso, estou ingressando com um mandado de segurança. Já que tive o exercício do mandato cerceado, não pude mais permanecer naquela reunião, pois, se assim tivesse procedido, estaria ratificando, legitimando os atos ali praticados a partir daquele instante.

            Assim, insurgi-me contra aquela decisão e procedo, a partir de hoje, como acabei de manifestar.

            Concedo a V. Exª um aparte, Senador César Borges.

O Sr. César Borges (PFL - BA) - Eu lhe agradeço o aparte. Na verdade, quero me solidarizar com V. Exª. A noite de ontem foi triste para esta Casa, que assistiu, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, a atos que não deveriam, efetivamente, ter acontecido. V. Exª tem toda a razão em fazer o seu indignado protesto. Lamentamos sua ausência porque sei que seu voto seria contrário àquela posição inflexível, àquela posição imperial do Relator, Senador Tião Viana, que não citou uma emenda sequer das mais de trezentas apresentadas pelos Srs. Senadores para modificar, melhorar e enriquecer a reforma da Previdência. Por uma manobra, eu diria, regimental, ou anti-regimental, V. Exª teve cerceado seu direito, quando tinha condições de prolatar um voto em separado que todos nós da Comissão esperávamos. Na verdade, foi uma medida de violência. Até lhe perguntei hoje por que V. Exª não estava presente para dar o voto contrário, mas agora eu o entendo e lhe dou razão: era uma forma de protesto, de consignar sua revolta e sua indignação diante daquele ato lamentável, e, inclusive, tive oportunidade de, no encaminhamento da votação da questão de ordem, protestar. Apesar de tecer elogios à conduta do Presidente da Comissão, Senador Edison Lobão, que realmente foi de uma correção ímpar, no entanto, naquela questão, S. Exª acatou questão de ordem de um assunto que era uma cláusula pétrea que não deveria ser acatada, porque V. Exª, como qualquer outro Senador que tivesse voto em separado, estava lastreado no Regimento para prolatar o seu voto. Portanto, só quero me solidarizar com V. Exª e esperar que não se repitam mais nesta Casa momentos como aquele. Muito obrigado, Senador Almeida Lima.

O SR. ALMEIDA LIMA (PDT - SE) - Agradeço, Senador César Borges, a solidariedade de V. Exª. Permita-me incorporar o seu aparte ao meu pronunciamento.

Mas, Sr. Presidente, Srs. Senadores, houve um instante na sessão de ontem ao qual quero me referir com absoluta cautela.

Após minha saída da CCJ, diante do ato de protesto que estabeleci, de madrugada, já em minha residência, ouvi, pela Rádio Senado, um orador que, após se certificar de minha ausência naquela Comissão, com voz soturna, apropriada ao horário, aludia, sem citar o meu nome, ao meu voto, desqualificando-o por ser contra a reforma previdenciária, por penalizar o trabalhador inativo. Segundo o orador, o Governador do meu Estado é favorável à reforma previdenciária e tem interesse na sua aprovação.

A cultura popular também na minha terra, ao traduzir sua sabedoria, sentencia, entre outros aspectos, que toda ausência é atrevida.

Foi na minha ausência que o orador, soturno, construiu aquela peça de maldade. Fácil a identificação, pela voz e pelo engendramento, contumaz na forma e na hora de fazer: na calada da noite e na ausência da vítima, impossibilitando a reação pronta e eficaz. Sempre procedeu assim. Não importa muito a opinião em si, isolada. Importa saber que o comportamento sempre foi assim, em todos os tempos, desde seu início. O seu berço político foi embalado pela mão da ditadura, cresceu cevado pelas elites do tempo de chumbo. Dissimulada, a voz que me atingia hoje pela madrugada, na minha ausência, sofisma, com carteirinha de neo-socialista. Não se faz mais socialista como antes, ou como alguns de antes, históricos, coerentes, combatentes, de todas as ditaduras e arbitrariedades, brasileiras ou não. O “socialismo” praticado pela voz soturna da madrugada não passa de um riacho assoreado por onde o povo transita de calças arregaçadas, vazio. É o socialismo, entre aspas, de resultado, resultado sempre eleitoreiro. Voto contra a reforma da Previdência por convicção. A voz soturna vota a favor por conveniência. E esta é a diferença.

Recebi um e-mail de uma senhora chamada Dalva Maria Cibeira Perpétuo da Rocha Freire, do Rio de Janeiro. Pela oportunidade, eu gostaria de lê-lo:

Venho acompanhando o desenrolar da obra pública de V. Exª na construção de nosso País e, embora não tenha sido vossa eleitora por residir no Estado do Rio de Janeiro, escrevo-lhe, muito respeitosamente, para solicitar-lhe, caso lhe seja possível, intervir nesta reforma previdenciária que está sendo apresentada ao Senado.

Através dos últimos meses, assisto ao funcionalismo público, principalmente no que se refere ao do Executivo, ser responsabilizado por todas as mazelas enfrentadas pelo país. Omissos na culpabilidade do ônus do agravamento da atual situação econômica presenciei no decorrer dos últimos Governos vergonhosas providências, que não só não solucionaram os problemas que vivenciamos, como acresceram muitos agravos ao dia-a-dia dos cidadãos brasileiros, conquanto estes privilegiavam o capital em detrimento da população, que não possui a maestria de equacionar suas necessidades com os seus cada vez mais parcos recursos.

Visando buscar uma mudança, nosso povo votou no Presidente eleito. Com surpresa constatei pela mídia, em múltiplas vezes, que o discurso mudou e vi chocada a defesa permanente e ardorosa de posições historicamente combatidas pelo partido, o que agride o discernimento e a boa-fé de todos nós que almejávamos a tão alardeada mudança.

Esta culpabilidade já estabelecida por default ao funcionalismo leva-me, meu prezado Excelentíssimo Senhor Senador, a assistir a afrontas e desrespeitos a princípios estabelecidos, como os dos “princípios do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada”, que gerarão um grande número de ações na Justiça, serem discutidos com açodamento, como se a vida de nós, funcionários públicos, não tivesse sido já penosamente castigada durante os últimos anos. Necessidades momentâneas de crescimento da arrecadação vêm gerando conflitos da mais variada natureza em famílias de aposentados, que se tornam, em razão de altos índices de desemprego, suporte do núcleo familiar.

Enquanto temos que aceitar o desconcertante percentual de 1% mais abono de R$60,00, sou sabedora que os porteiros do prédio, apenas no ano em curso, receberão por dissídio percentual superior a 15%, o que demonstra a inadequação do índice aplicado.

As decisões que ora serão tomadas nas carreiras de novos profissionais do setor público propiciam a estes, que serão beneficiados pelos Planos da Previdência, o conhecimento antecipado das cláusulas previstas para suas aposentadorias e do impacto que este terá em suas vidas.

A nós já aposentados estão sendo negadas quaisquer chances de qualquer tipo de opção, que não a total aceitação do fato consumado. Fica esquecido também que nós não tivemos o direito ao FGTS, o que propicia uma poupança para os trabalhadores do Setor Privado. Parece-me que alguns dos procedimentos discutidos são altamente injustos até pela penalização já sofrida pelos muitos anos consecutivos de ausência de reajustes.

Nem todos os funcionários públicos, Excelentíssimo Senhor Senador, são marajás, assim como nem todos tiveram os tão aludidos privilégios e sim árduas jornadas e pesadas responsabilidades. Junto com esta funcionária aposentada estará certamente a maioria dos funcionários públicos. Os direitos que adquiri em minha carreira profissional exigiram sacrifícios imensos, estudos exaustivos e sacrifícios indiscutíveis, em uma época em que a valorização do trabalho da mulher era altamente discutível, o que nos obrigava a sermos com freqüência superiores a nossos pares.

Ora como toda população fazemos nossos planos e orçamentos considerando pressupostos estabelecidos quando optamos pela nossa aposentadoria. Como o Governo Federal, também temos que ter receita(s) que permitam que cumpramos nossas metas (o pagamento dos nossos compromissos), desde que não é privilégio deste ter que satisfazê-las. E se estas não podem ser aumentadas, já que não temos como o governo o poder do falado rolo compressor, após 32 anos de contribuição sob salários de uma analista de sistema (que eram bem acima do mercado, já que os anos iniciais o exercício desta profissão demandava uma dedicação bem acima da média das demais), já idosa, deficiente física (necessitando efetuar gastos adicionais), sozinha, diabética, vivendo de aluguel (dependente de aval), terei eu meu caro excelentíssimo Sr. Senador, de me ver obrigada a engolir, além de reajustes dignos, o risco da não paridade, ambos acordados pelo próprio Governo Federal que se vê agora, travestido de algo impossível de ser analisado, no direito de questioná-la, e a continuidade desta contribuição que efetuei por toda minha vida profissional e de acordo com as exigências da legislação?

Caro Excelentíssimo Senhor Senador Dr. Almeida Lima venho ciente do quanto preza ver ser respeitado o direito e o valor do povo brasileiro, que V. Excelência se manifeste em nosso nome e não deixe que esta Casa de tradicional história se cale, enquanto somos feridos por conchavos políticos e pressões questionáveis em uma pressa da qual se pode dizer ser no mínimo inadequada. Não há mais Excelentíssimo Senhor Senador como absorver a voracidade com a qual o Governo Federal vem se fazendo presente em nossas vidas e bolsos.

Não menciono a Reforma Tributária que caminha e pela qual inexoravelmente iremos também pagar. Aonde mora, Excelentíssimo Senhor Senador Dr. Almeida Lima, o tão proclamado social do atual Governo? Não deveria este morar ao lado de pessoas como nós que, desprovidos de culpa da chance de termos tido a possibilidade de estudar, ainda que com indescritível esforço, ajudamos desde nossa juventude a construir esse País de dimensões continentais, dando-lhes os melhores anos de nossas vidas? Não deveria também morar ao lado de nós, que ainda desprovidos de culpa, termos nossas vidas prolongadas, em idade, pelos avanços da Ciência? Será caríssimo Excelentíssimo Senhor Senador que constatado o problema não poderiam ser buscadas soluções alternativas que não pressionassem mais cidadãos que já se encontram nos limites da incapacidade de absorver a fúria na necessidade de mais um aumento da arrecadação? Por que seremos sempre nós (os mesmos) a pagar a conta? Sinto-me usada e, agora não mais necessária, vejo-me ser descartada como algo não apenas inútil, mas mais que isto inconveniente.

Excelentíssimo Senhor Senador Dr. Almeida Lima, rogo-lhe que com as bênçãos de Deus use de vossa brilhante presença e ética existência para falar em nome desta signatária e de outros tantos que não ousam, como aqui o faço, a tentar o caminho, que como sou obrigada a admitir difícil de um contato com V. Excelência (sic).

Com meus sinceros e profundos respeitos,

Dalva Maria Cibeira Perpetuo da Rocha Freire.

Trata-se de uma cidadã do Estado do Rio de Janeiro. Li sua mensagem na semana retrasada e entendi ser oportuno trazê-la para registro nos Anais desta Casa e conhecimento de toda a população brasileira. É um relato que, de fato, não apenas trata de si próprio mas, basicamente, da situação de todos os servidores e trabalhadores do País.

Porém, como já fiz a leitura de um e-mail, permito-me ler o segundo que diz:

Excelentíssimo Senhor Senador,

Uma pessoa excelentíssima não pode aprovar nenhum tipo de calote!

Uma pessoa excelentíssima não pode dar nenhum tipo de péssimo exemplo para 175 milhões de brasileiros!

Os atuais servidores públicos estatutários assumiram compromissos com a sociedade brasileiras, em troca dos compromissos que a sociedade brasileira assumiu com eles.

Se a sociedade brasileira não cumprir os compromissos que assumiu com os atuais servidores públicos estatutários, a sociedade brasileira estará dando um calote nos atuais servidores públicos estatutários!

Tenho certeza absoluta de que Vossa Excelência é uma pessoa excelentíssima, razão pela qual não irá aprovar nenhum tipo de calote!

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Almeida Lima, faltam 25 segundos para terminar seu tempo, e eu gostaria de participar do seu belo pronunciamento.

O SR. ALMEIDA LIMA (PDT - SE) - Concederei o aparte, Senador.

Concluindo a leitura:

Tenho certeza absoluta de que Vossa Excelência é uma pessoa excelentíssima, razão pela que não irá dar nenhum tipo de péssimo exemplo para 175 milhões de brasileiros! (sic)

Preferiria retirar o excelentíssimo, mas o mantenho.

Tenha a certeza de que não irei decepcionar, não agora que estou no papel de oposição a este Governo. Mas não decepcionei, tenho certeza, quando fui governo, como prefeito de Aracaju, no trato dos interesses dos servidores públicos daquele município, onde, sem falsa modéstia, sou querido. E é essa a autoridade moral que este Governo não possui para, publicamente, afirmar, de forma, que, quando esteve na Oposição, tinha um discurso e, quando chegou ao Governo, manteve o discurso na prática.

Concedo um aparte ao Senador Mão Santa e, em seguida, à Senadora Heloísa Helena.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Almeida Lima, V. Exª significa muito para esta Casa, significa o saber jurídico de Rui Barbosa, que disse que só a Lei, o Direito, a Justiça, é o caminho da salvação. Esta reforma da previdência, Senador Almeida Lima, cada um leva para onde vai sua formação profissional. A minha é de médico-cirurgião. A Senadora Heloísa Helena é companheira do Che Guevara, que disse: “Se és capaz de se encher de indignação diante de qualquer injustiça no mundo, és companheiro e companheira”. S. Exª é uma brilhante enfermeira e professora. Quando há muitos medicamentos, significa que a doença é muito ruim. É isso que quero traduzir para o Palácio, para o Presidente Lula e para os que o cercam. Quando há muitos remédios - o que no Direito significa emenda -, é como o câncer, chamavam, eu ia como cirurgião, fazia-se cobaltoterapia, quimioterapia, até macumba. É difícil enfrentar. É essa a reforma, tão ruim, tão malfeita e tão desgraçada que tem 300 medicamentos de doutores da legislação, leis boas e justas para melhorar a sociedade. Não aceitar nenhum medicamento é muita insensatez, muita ignorância, a ignorância ousada de não respeitar os Poderes. François Mitterrand, antes de morrer, já não podendo escrever, chamou seu companheiro - que ganhara o Prêmio Nobel - para ajudá-lo a escrever, porque ele queria deixar um ensinamento, após governar por 14 anos a França. Ele teve uma página como Lula, conseguiu com dificuldade chegar à Presidência, mas depois encantou o verdadeiro estadista. Presidente Lula, que está viajando, compre esse livro e leia, pois tem ensinamentos. A mensagem era a de que se ele voltasse ao poder, fortaleceria os contrapoderes. É preciso respeitar este Poder para aqui nascerem leis boas e justas, inspiradas nos 10 mandamentos das leis de Deus.

            O SR. ALMEIDA LIMA (PDT - SE) - Concedo um aparte à Senadora Heloísa Helena.

A Srª Heloísa Helena (Bloco/PT - AL) - Senador Almeida Lima, sinto-me na obrigação de apartear V. Exª e igualmente prestar minha solidariedade. Também tive a oportunidade de estar ontem na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, e vimos, com a mais absoluta clareza, como a intolerância, a truculência e a arrogância da chamada “neomaioria” da Casa é capaz de rasgar o Estatuto, rasgar a Constituição e a legislação que estabelece as normas da Casa e da sociedade, para simplesmente se apresentar como grande, como poderosa. Foi isso que aconteceu ontem. Não existem argumentos suficientes para mostrar com clareza para a sociedade que a reforma da previdência, que todos nós sabemos que é uma grande farsa, uma grande fraude política, é uma farsa intelectual - e não entrarei no debate, porque daqui a pouco quero falar sobre isso -, para mostrar que a reforma da previdência é boa, é justa. Mas ontem na CCJ, justamente a Comissão a quem recorremos sobre qualquer dúvida regimental, a quem apelamos quando existe divergência no entendimento, na compreensão, na análise do Regimento Interno da Casa, rasgou-se o Regimento. Não é a primeira vez que isso acontece. Claro que são episódios diferentes, porque alguns que lá estavam a atacar o Regimento, a atacar o nosso direito como Parlamentar, e pelo menos com alguns deles eu convivo há três anos na Casa, com brigas gigantescas, Senador Almeida Lima, são pessoas que batiam no PT de manhã, de tarde e de noite, pessoas que debochavam do Lula, com quem eu brigava o tempo todo, e hoje são os “neoqueridinhos” do Governo. Mas isso faz parte da vida. Agora, o que aconteceu ontem na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania eu espero que não aconteça mais. Até entendo que a subjetividade humana seja muito complexa. Até entendo que as pessoas se encantem rapidamente com o poder. Isso não é brincadeira, não! O “cabra”, depois que pisa no tapete do Palácio, fica contaminado, encantado. Agora, rasgar o Regimento Interno e a Constituição significa transformar o Senado e a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania em um medíocre anexo arquitetônico do Palácio do Planalto. Por isso, Senadores, tenho dito várias vezes - e os Senadores que aqui estão também tiveram a oportunidade de lá estar até às 6 horas da manhã de hoje -, com tanta clareza de alma: aprendi tanto! Olha, Senador César Borges, de família pobre, de mãe analfabeta, eu aprendi uma coisa maravilhosa: ajoelhar, a gente só se ajoelha para pedir força Àquele lá de cima para não se ajoelhar nem se dobrar para ninguém aqui da Terra. Portanto, é bom que todos saibam que eu sei que é uma farsa política muito grande, uma fraude intelectual muito grande essa suposta reforma da previdência. Agora, rasgar o Regimento, a Constituição, passar o rolo compressor, o trator, como aconteceu ontem, é muito feio, não serve à democracia do nosso País. Eu quero prestar a minha solidariedade a V. Exª. Ontem também quase não me deixaram nem falar, como me assegura o art.112 do Regimento, porque o Governo me tirou da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, e nem sou titular nem suplente da Comissão, mas tenho o direito, como qualquer Parlamentar. Mas ontem a arrogância estava tão grande, a muitos cegando, que eles usavam o mesmo artigo do Regimento para dizer uma coisa diferente. Para V. Exª ver como realmente a arrogância é capaz de cegar aqueles despreparados que se lambuzam diante de um banquete, achando que o banquete para eles eterno será. V. Exª tem a minha solidariedade, porque o que houve ontem não vi nem nos anos mais difíceis que enfrentei aqui nesta Casa com o rolo compressor, quando eu era Líder da Oposição e do PT nesta Casa, enfrentando o Governo Fernando Henrique, um Governo irresponsável, mas, sinceramente, eu nunca tinha visto o que eu vi ontem na Comissão de Constituição e Justiça. Eu sei que é doloroso para V. Exª, que é grande a dor sente. Mas tenha certeza que a minha é muito maior, por V. Exª, por mim, pelos Srs. Senadores, mas, de forma muito especial, pela democracia brasileira. Nada confronta mais o aprimoramento da democracia representativa do que a vigarice política, do que o abismo que se constrói entre o que se fala, o que se compromete e as ações concretas, depois que se chega ao poder. Mas, é como diz aquela velha máxima: se queres realmente conhecer alguém, dá-lhe o poder e aí serás capaz de decifrar qualquer mistério, sujo ou limpo, das respectivas almas. Então, transmito a minha solidariedade a V. Exª. Tenha certeza de que, se triste está, eu estou muito mais pelo episódio de ontem.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Permite-me V. Exª um aparte, Senador Almeida Lima?

O SR. ALMEIDA LIMA (PDT - SE) - Embora o meu tempo já esteja esgotado, é extremamente confortante ouvir V. Exª, Senador Arthur Virgílio. Eu peço a benevolência da Presidência para conceder este aparte a V. Exª e depois ao Senador Tasso Jereissati.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Eu ouvia o seu discurso e o aparte proferido pela Senadora Heloísa Helena. De fato, V. Exª retrata a expressão da verdade. De acordo com o Regimento e seguindo regras do jogo estabelecidas, não por nós, mas por legisladores anteriores a nós, usou-se de um recurso para a Oposição participar de maneira mais afirmativa do debate, o recurso do voto em separado, usado por um sem número de oradores anteriores a V. Exª. Na vez do Senador José Jorge, aconteceu a truculência do Governo. E diziam mais: que o Senador José Jorge não poderia falar porque teria voto igual ao do Senador Leonel Pavan. Explicamos nós que, primeiro, nada impede que os dois façam voto igual, até para reforçar uma posição; segundo, que um falaria se o outro não falasse. Porque tínhamos uma tática, e temos nós, da Oposição, o direito de ter uma tática. Ou seja, V. Exª estaria fora e teria, portanto, de ter o seu direito assegurado logo em seguida, se fosse verdade que tinham eles o direito de agir como agiram, e não tinham em relação ao Senador José Jorge, que foi violentado. Com V. Exª, então, foi dupla a atitude de violência por parte do Governo. Tenho dito a figuras que prezo e com as quais dialogo, que fazem parte das hostes governistas, que a pior forma de se relacionar com uma Oposição é esta: a da violência, a da truculência, a de usar longa manu, a de, enfim, procurar obter vitórias imediatas, como a de Pirro, porque deterioram uma relação. E, depois, quando o Governo mais precisa de pessoas efetivamente capazes do espírito público, é nessas horas que os que servem pressurosamente a todos os Governo não ficam conosco ou não ficam com os senhores do atual Governo. Essa é uma lição dita, aprendida por alguém que já governou e que já ajudou a governar e que precisa ser aprendida e apreendida por quem hoje está aprendendo a governar, precisamente o Presidente Lula e seus aliados fiéis. Este é um fato: certas pessoas são imutáveis. Azar o meu que perdi o Governo e, assim, perco também certas companhias. Certas pessoas estão sempre no Governo, nunca deixam de estar no Governo. Esse é um fato. Portanto, o que houve foi lamentável sob todos os aspectos. V. Exª teria de ter sido o último a falar. Se o Governo considera que essa regra é excessiva, no dia seguinte poderia convocar uma reunião de Líderes para ver se é ou se não é. Mas o processo não poderia ter sido interrompido daquela maneira, porque supostamente alguém do Governo estava irritado, porque queriam aprovar de qualquer jeito, até tal hora. O fato é que, depois da truculência feita, levamos a reunião por mais oito horas e dez minutos. A imprensa me dizia que a reunião foi longa, dezessete horas. E eu: “Vamos corrigir: vinte horas e dez minutos”. Ela começou às 10 horas da manhã. Se não havia quórum, o problema era de quem não deu quórum. O processo de assinatura, para mim, é o início da reunião. Quando alguém chega lá e apõe a sua assinatura, é o processo inicial aquele. E às seis horas e dez minutos o Governo teve uma vitória que não reflete o Plenário, que reflete aquele quadro da Comissão, a idéia de que se esgarçou uma relação, de que não fez bem para o convívio entre os contrários, que têm de procurar conviver bem por aqui. De qualquer maneira, eu ouvia o que a Senadora Heloísa Helena dizia, complementando o seu discurso, e lhe dou inteira razão. V. Exª foi bravo quando leu o que pôde do seu voto em separado, nos cinco minutos que a Mesa lhe concedeu, até por tolerância do Presidente Edison Lobão, que procurou se comportar com equilíbrio naquele quadro todo. Mas foi uma noite memorável do ponto de vista da capacidade de alguns de resistir, e foi uma noite com nódoas, porque, francamente, se eu pudesse - conselho dizem que é para vender, não para dar - dar um conselho, eu o daria ao Governo: dialogue com franqueza, evite certas ajudas. Não recuse apoio, mas não fique dependente de certas ajudas. Sou doutor nessas ajudas; já recebi demais. Digo para o Governo que não aprofunde erros e defeitos do meu Governo, não aprofunde erros e equívocos do meu Governo. Quer copiar a política econômica, copie, mas não os erros. Não precisa copiar tudo o que o Governo fez de equivocado na política, inclusive na composição de suas alianças. Se tem que compor alianças para a sua governabilidade, que o faça, mas procure não ficar dependente delas. Procure não criar uma relação que eu vi, em algum momento, de certa forma, prejudicar o andamento e a performance do Governo ao qual sou fiel até hoje - conforme V. Exª é testemunha. Sou fiel ao Presidente Fernando Henrique até hoje. É um detalhe que vem da minha própria forma de ser, do modo como meu caráter foi forjado e como eu procuro expô-lo aos meus amigos, aos meus adversários e à Nação. Portanto, meus parabéns a V. Exª e saiba que não está sozinho. V. Exª está com aqueles que admiram a sua combatividade, que admiram o Estado de Direito e a idéia de um Congresso marcado por posições independentes e altivas. Como estou inscrito, se V. Exª quiser prosseguir - não sei se é possível -, cedo o meu tempo para que V. Exª fale mais. Para tanto, abro mão da minha inscrição, do tempo que tenho, para que V. Exª possa falar, porque é importante o que V. Exª está dizendo à Casa. Muito obrigado.

O SR. ALMEIDA LIMA (PDT - SE) - Senador Arthur Virgílio, agradeço o aparte.

Concedo dois minutos ao Senador Tasso Jereissati, que manifestou interesse em apartear, mas, ao final, não prolongarei meu discurso, apenas agradecerei aos Senadores que me apartearam.

O SR. PRESIDENTE (Augusto Botelho) - Peço ao Senador que seja breve, porque as Senadoras Patrícia Saboya Gomes e Heloísa Helena estão aguardando para usar da palavra.

O Sr. Tasso Jereissati (PSDB - CE) - Sr. Presidente, serei muito breve. Senador Almeida Lima, eu não poderia deixar de me solidarizar com V. Exª no episódio ocorrido ontem à noite devido a um gesto de truculência da Maioria para impedir o uso livre da palavra, que me parece ter sido o que de mais grave ocorreu ontem. Já vi o uso da força para impedir o voto, o uso da força aqui dentro para empurrar determinadas situações, mas para impedir o uso legítimo da palavra por um Senador foi a primeira vez. Imagino como V. Exª se sente neste momento, a sua revolta. Quero dizer que V. Exª tem a nossa solidariedade, a nossa compreensão e o nosso apoio. Acredito, se serve de estímulo, que esse episódio será exemplar para que não voltem a ocorrer atitudes como aquela, porque os que assim agiram indiretamente pensando que estão ajudando o Governo hoje devem estar tendo consciência de como prejudicaram a relação entre o Governo e esta Casa.

O SR. ALMEIDA LIMA (PDT - SE) - Agradeço as manifestações de solidariedade de V. Exªs, Senador César Borges, Senador Mão Santa, Senadora Heloísa Helena, Senador Arthur Virgílio e Senador Tasso Jereissati. Incorporo os apartes de V. Exªs ao meu pronunciamento. Tenho certeza de que essa solidariedade mais do que a mim é uma solidariedade ao Estado Democrático de Direito e, sobretudo, à autonomia e à independência do Poder Legislativo, do Congresso Nacional, e do Senado Federal.

Senadora Heloísa Helena, é verdade, estamos na Oposição, somos Minoria, mas não seremos pequenos, porque não nos ajoelharemos, em hipótese nenhuma, diante do arbítrio e desse Governo. Portanto, de pé, e não de joelhos, nós iremos combater com toda a força, com toda a veemência, com todo o espírito cívico e patriótico, as agressões que esse Governo tenta impingir à sociedade brasileira e, mais de perto, aos servidores públicos e aos trabalhadores deste País.

Sr. Presidente, muito obrigado pela benevolência.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/09/2003 - Página 29086