Discurso durante a 134ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem aos cinquenta anos de criação da Petróleo Brasileiro S/A - PETROBRÁS.

Autor
Jefferson Peres (PDT - Partido Democrático Trabalhista/AM)
Nome completo: José Jefferson Carpinteiro Peres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem aos cinquenta anos de criação da Petróleo Brasileiro S/A - PETROBRÁS.
Publicação
Publicação no DSF de 03/10/2003 - Página 29871
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), OPORTUNIDADE, COMENTARIO, EVOLUÇÃO, IMPORTANCIA, EMPRESA ESTATAL, COLABORAÇÃO, MODERNIZAÇÃO, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, DESENVOLVIMENTO TECNOLOGICO, INDEPENDENCIA, PAIS, PRODUÇÃO, PETROLEO, REFORÇO, NACIONALISMO, SOBERANIA NACIONAL, AMPLIAÇÃO, PARTICIPAÇÃO, BRASIL, MERCADO INTERNACIONAL, RECONHECIMENTO, AMBITO INTERNACIONAL, CAPACIDADE, EMPRESA NACIONAL.

O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, prezado amigo e Senador honorário José Eduardo Dutra, Ministra Dilma Rousseff, Senadoras e Senadores, senhoras e senhores, poucas, pouquíssimas pessoas dentre as que me ouvem podem avaliar como se sente alguém como eu na comemoração desse cinqüentenário. Pessoas de qualquer idade podem falar sobre a Petrobras com conhecimento de causa. Basta compulsar livros, relatórios, publicações e elas dirão tudo sobre a empresa. Mas somente pessoas na minha faixa etária podem falar sobre ela tangendo a corda da emoção.

O Brasil em que nasceu a Petrobras, o Brasil do qual nasceu a Petrobras vivia num contexto e numa atmosfera que os contemporâneos hoje não podem avaliar. O País estava em fase de industrialização, mas era ainda predominantemente agrário, necessitado de auto-afirmação e até de aquisição de uma identidade nacional; nós todos, adolescentes ainda, buscávamos um instrumento e um símbolo dessa afirmação e dessa identidade.

Os jovens da minha geração tinham como catecismo dois livros: “A Luta pelo Petróleo”, de Essad Bey, que traçava um panorama do mercado petrolífero em escala mundial, e “O Escândalo do Petróleo”, de Monteiro Lobato.

Naquele tempo, tínhamos como demônios a serem enfrentados e vencidos os trustes internacionais, como chamávamos no jargão da época, principalmente os do petróleo, e eram dois, sobretudo: a anglo-holandesa Shell e a americana Esso. O livro de Essad Bey narrava o que parecia até uma novela policial, que era a história daqueles dois grandes conglomerados a se digladiarem em todo o mundo, provocando guerras, como a do Chaco, entre Bolívia e Paraguai, depondo governos, apoiando títeres, com o respaldo dos seus respectivos governos. E nós tremíamos ante a perspectiva de o Brasil se transformar numa dessas republiquetas petroleiras. O livro de Monteiro Lobato narrava a história da pesquisa e da prospecção do petróleo em nosso País, a luta dos pioneiros, a saga de Oscar Cordeiro, perseguido, ridicularizado como fraudador, até que o petróleo jorrasse em Lobato, por coincidência localidade com o mesmo nome do sobrenome do grande escritor nacional.

Durante o Estado Novo, por essas denúncias, Monteiro Lobato foi preso. E isso o transformou, aos nossos olhos, num mártir perseguido pelos títeres dos trustes internacionais. Era assim que imaginávamos, de forma muito simplista, a realidade.

Faltava uma definição legal para o setor de petróleo em nosso País. E a primeira tentativa veio no Governo Dutra, que, em 1947, mandou para o Congresso o Estatuto do Petróleo, que abria as portas para o capital privado, inclusive estrangeiro. A partir daí, deflagrou-se a campanha nacionalista, tendo como núcleo irradiador o Clube Militar. Os militares eram então extremamente sensíveis ao problema do petróleo. Formaram-se duas correntes: uma, sob a liderança do General Juarez Távora, que defendia a participação de capital privado, e outra, do General Horta Barbosa, que pregava o monopólio estatal.

A partir dali, a campanha ganhou as ruas, a famosa campanha “O Petróleo é Nosso”, da qual participei ainda adolescente. Senti-me um cruzado, um templário com a cruz vermelha no peito, lança em riste, a enfrentar os infiéis estrangeiros que queriam invadir a nossa terra santa.

A campanha ganhou as ruas, as universidades, os quartéis; talvez só haja precedente na campanha abolicionista. É impossível uma pessoa de hoje, Presidente José Sarney - V. Exª também participou dela -, é impossível, repito, alguém de hoje saber o que foi a campanha “O Petróleo é Nosso”.

Em 1951, o Presidente Getúlio Vargas, eleito em 1950, remeteu ao Congresso um novo projeto de lei. Ao contrário do que muitos pensam, vamos restabelecer a verdade histórica. O projeto remetido por Getúlio Vargas, homem apoiado pelas esquerdas, trabalhista, criava uma empresa pública, mas não em regime de monopólio. Como a história se faz por caminhos, às vezes, insuspeitados e até paradoxais, coube a um Deputado da UDN - liberal, conservadora, olhada até como reacionária por muitos -, Olavo Bilac Pinto, de Minas, integrante daquela elite parlamentar, uma elite como até hoje, talvez, não se tenha repetido no Congresso, apresentar o projeto que, vitorioso, criava não uma empresa pública, mas uma sociedade de economia mista e em regime de monopólio. Esse projeto é que se transformou na Lei nº 2.004. Ele foi sancionado em 3 de outubro de 1953.

Estávamos vitoriosos, embora ainda preocupados que a empresa, em seus primeiros passos, fosse atropelada pelos famosos e temidos trustes internacionais do petróleo.

Por coincidência, também coube a mim, combatente da campanha “O Petróleo é Nosso”, quarenta e tantos anos depois, aqui, Senador, votar a favor da quebra do monopólio estatal. Porque eu entendia que o mundo mudara, que o Brasil mudara, que a Petrobras que eu ajudara a criar já tinha se transformado num adulto, com musculatura, capaz de dispensar a muleta do monopólio, para caminhar com os seus próprios passos e enfrentar as multinacionais até no exterior. Votei a favor da quebra do monopólio muito consciente do que fazia.

Por outra coincidência feliz, está hoje à frente da Petrobras, nos seus cinqüenta anos, o meu ex-colega José Eduardo Dutra, a quem eu aprendi, em oito anos de Senado, a admirar, pelo seu espírito público, e a quem certamente não faltará competência para conduzir a empresa nos próximos anos.

Senador José Eduardo Dutra - permita-me que assim o chame -, tenho certeza de que V. Exª saberá conduzir a empresa sem partidarismo, sem corporativismo, porque está cônscio de que a Petrobras é não só um ativo valioso do patrimônio do Estado nacional, mas é, sobretudo, parte integrante do patrimônio sentimental, afetivo, do povo brasileiro. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/10/2003 - Página 29871