Discurso durante a 148ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Necessidade urgente de viabilização da Lei 9.454, de 7 de abril de 1997, que institui o número único de Registro da Identidade Civil e dá outras providências.

Autor
Romero Jucá (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RR)
Nome completo: Romero Jucá Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Necessidade urgente de viabilização da Lei 9.454, de 7 de abril de 1997, que institui o número único de Registro da Identidade Civil e dá outras providências.
Publicação
Publicação no DSF de 24/10/2003 - Página 33344
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • ANALISE, HISTORIA, CULTURA, BRASIL, VALORIZAÇÃO, DESCUMPRIMENTO, LEGISLAÇÃO, IMPUNIDADE, PREJUIZO, PAIS, REPUTAÇÃO, EXTERIOR, FALTA, CONFIANÇA, CIDADÃO, JUSTIÇA.
  • COMENTARIO, LEGISLAÇÃO, VENCIMENTO, PRAZO, VALIDADE, CARTEIRA DE IDENTIDADE, FALTA, APLICAÇÃO, UNIFICAÇÃO, REGISTRO CIVIL, CRIAÇÃO, CADASTRO, AMBITO NACIONAL.
  • NECESSIDADE, URGENCIA, APLICAÇÃO, LEGISLAÇÃO, UNIFICAÇÃO, CADASTRO, REGISTRO, IDENTIFICAÇÃO CIVIL.

O SR. ROMERO JUCÁ (PMDB - RR. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, venho hoje a esta tribuna tecer alguns comentários a respeito do descumprimento das leis em nosso País e dos prejuízos que tal prática causa às instituições, à própria sociedade, à imagem do País no exterior e aos nossos interesses políticos e econômicos mais importantes.

Temos de admitir que toda essa insubordinação contra o formalismo da organização social faz parte do nosso caldo de cultura, cujas raízes são profundas e foram geradas nos primórdios de nossa formação nacional.

Como podemos imaginar, tudo começou em 1500, com o descobrimento e com o processo de colonização, baseados unicamente em interesses pessoais, em aventureirismo, em armações políticas, em tráfico de influência, em troca de favores, em troca de perdão por crimes cometidos na Corte, e em episódios de corrupção que estão registrados nos arquivos de nossa história.

No Brasil português e católico, diferentemente dos Estados Unidos dos protestantes que desembarcaram para construir uma nação, as instituições nacionais e o edifício social foram construídos sobre bases passageiras e superficiais.

Por outro lado, o processo de ocupação e de formação do Brasil refletia exatamente os primeiros sinais de decadência do chamado império português, que já não conseguia firmar uma posição de altivez nas relações mundiais de poder à época, sobretudo em relação à Inglaterra, que começava a assumir a liderança absoluta em todos os mares. Em síntese, os descobridores portugueses que aqui aportaram não tinham a menor intenção de fundar uma nova pátria.

Passada essa primeira fase de nossa formação, pouca coisa mudou nos séculos seguintes como veremos mais adiante. Na época de D. Pedro I, por exemplo, as questões burocráticas e as questões de Estado eram decididas pelos atores mais poderosos da Corte, um pequeno grupo de privilegiados, cujos interesses meramente paroquiais se sobrepunham ao resto da sociedade.

Documentos históricos atestam claramente que as elites imperiais dominavam completamente o sistema burocrático e exerciam esse poder de decisão em benefício único de suas conveniências. A mesma correlação de forças perdurou durante todo o período de D. Pedro II.

A partir do início do século XX até o momento atual, assistimos à instalação e consolidação do regime republicano, com seus altos e baixos, intercalado com regimes de força e, finalmente, estamos em plena terceira revolução industrial, ou seja, na era da globalização, da modernização, do conhecimento, da informática e das comunicações digitais sofisticadas. Todavia, apesar desse fantástico salto tecnológico, o nosso sistema de organização burocrática e institucional, a tendência natural à desobediência civil e outros traços culturais negativos, herdados do passado, continuam mais vivos do que nunca.

Como vimos, os tempos mudaram, as relações de poder mudaram, a economia mudou, as relações sociais mudaram, mas as leis nacionais não gozam de qualquer credibilidade perante a maioria da população e não são cumpridas.

Os cidadãos simplesmente não acreditam na aplicação das leis e, quando estas são aplicadas, acham que beneficiam unicamente os ricos e os poderosos e, mais ainda, consideram o Estado como conivente com toda essa situação que leva à desorganização, ao desrespeito, à impunidade e à desmoralização da democracia.

Lamentavelmente, diante dessa realidade, a nota que recebemos dos países mais desenvolvidos que vêm tratar de negócios aqui no Brasil é das mais baixas. Para eles, não lidamos muito bem com a nossa legislação e somos totalmente coniventes com o descumprimento das leis e com a desorganização que eles chamam, de maneira preconceituosa, de tropical. Vale dizer que esse tipo de comportamento tem prejudicado bastante a nossa pretensão de buscar posição de destaque no cenário internacional.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, esses comentários iniciais têm ligação direta com o assunto que coloco em pauta neste pronunciamento.

Por incrível que pareça, se no Brasil de hoje as leis em vigor fossem devidamente aplicadas, cumpridas e respeitadas, as carteiras de identidade que os cidadãos brasileiros utilizam no dia-a-dia não teriam mais qualquer valor. Mais grave ainda é que quase ninguém sabe disso, e somos um País de 180 milhões de habitantes.

Pois bem, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ao crivo da lei, se a sua aplicação fosse mesmo para valer, as carteiras de identidade de todos os cidadãos brasileiros realmente não teriam mais valor e já faz algum tempo. Conforme o texto da lei, elas estão vencidas desde o dia 8 de abril de 2002. Juntamente com elas, outros documentos também pereceram.

O diploma a que me refiro é a Lei n° 9.454, de 7 de abril de 1997, que “Institui o número único de Registro de Identidade Civil e dá outras providências”.

Segundo estudo da Consultoria Legislativa do Senado Federal que me chegou à mão, “ao instituir o número único de identidade civil para os cidadãos brasileiros, a referida Lei determinou a instituição do Cadastro Nacional de Identificação Civil, destinado a conter o número único de Registro Civil, acompanhado dos dados de identidade de cada cidadão, atribuindo ao Poder Executivo a competência de definir a entidade que centralizaria as atividades de implementação, coordenação e controle do Cadastro Nacional de Registro de Identificação Civil, que se constituiria em órgão central do Sistema Nacional de Registro de Identificação Civil, a par dos órgãos regionais”.

Como recomenda o referido estudo, “foi prevista, ainda, a inclusão de provisão de meios necessários na proposta orçamentária do órgão central do sistema, acompanhada de cronograma de sua implementação e manutenção”. Mais ainda, “a Lei determinou que o Poder Executivo providenciasse, no prazo de cento e oitenta dias, a sua regulamentação, bem como o início de sua implementação no prazo de trezentos e sessenta dias, sendo estipulado um prazo máximo de cinco anos, da sua promulgação, para a perda da validade de todos os documentos de identificação que estivessem em desacordo com ela (grifo do autor).”

Finalmente, o Consultor responsável pelo estudo conclui o seguinte: “Como a Lei foi promulgada em 7 de abril de 1997 e o prazo de cinco anos expirou em 7 de abril de 2002, causaria imensa perplexidade a perda de validade de todos os documentos de identificação utilizados pelos brasileiros em todas as suas relações com a sociedade e com os organismos governamentais e privados, caso a Lei produzisse seus efeitos concretos, isto é, tivesse plena eficácia.”

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, gostaria de finalizar este pronunciamento dizendo que a Lei nº 9.454 necessita urgentemente ser viabilizada e devidamente aplicada, para poder proporcionar aos cidadãos, ao Governo, às instituições e às entidades privadas, um sistema mais eficiente de identificação.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/10/2003 - Página 33344