Discurso durante a 16ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Omissão de informações da Caixa Econômica ao Senado Federal, sobre contrato com a Gtech. A semelhança do projeto de regulamentação dos bingos da Abrabin com o apresentado pelo Ministério do Esporte.

Autor
Antero Paes de Barros (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/MT)
Nome completo: Antero Paes de Barros Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. JOGO DE AZAR.:
  • Omissão de informações da Caixa Econômica ao Senado Federal, sobre contrato com a Gtech. A semelhança do projeto de regulamentação dos bingos da Abrabin com o apresentado pelo Ministério do Esporte.
Publicação
Publicação no DSF de 16/03/2004 - Página 7030
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. JOGO DE AZAR.
Indexação
  • COMENTARIO, DEPOIMENTO, POLICIA FEDERAL, DIRETOR, EMPRESA MULTINACIONAL, LOTERIA, IRREGULARIDADE, CONTRATO, CAIXA ECONOMICA FEDERAL (CEF), PARTICIPAÇÃO, EX SERVIDOR, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, AUMENTO, SUSPEIÇÃO, VINCULAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT).
  • DENUNCIA, INEXATIDÃO, OMISSÃO, RESPOSTA, CAIXA ECONOMICA FEDERAL (CEF), REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES, AUTORIA, ARTHUR VIRGILIO, DEMOSTENES TORRES, SENADOR, ASSINATURA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), CRIME DE RESPONSABILIDADE, OPINIÃO, ORADOR, NECESSIDADE, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI).
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), PROJETO, MINISTERIO DO ESPORTE, REGULAMENTAÇÃO, JOGO DE AZAR, SEMELHANÇA, PROPOSTA, ENTIDADE, BINGO, CONTRADIÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), EXTINÇÃO, ATIVIDADE.
  • LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), AUTORIA, JOSE SERRA, PRESIDENTE, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB), ANALISE, CRISE, POLITICA NACIONAL, INCOMPETENCIA, GOVERNO, DESENVOLVIMENTO NACIONAL, FALTA, ETICA.

O SR. ANTERO PAES DE BARROS (PSDB - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a verdade está aí: Waldomiro Diniz não agiu sozinho; agiu quando já estava na Subchefia de Assuntos Parlamentares da Casa Civil. Já caiu por terra a velha tese de que os fatos são de 2002, que não ocorreram no Governo Lula.

Lamentavelmente, também está provado que a Caixa Econômica Federal mentiu ao Senado da República, quando informou que não houve interferências externas na renovação do contrato de R$ 700 milhões com a GTech. Os depoimentos dos diretores da GTech, na sexta-feira, à Polícia Federal, desmentem todas, rigorosamente todas as alegações do Governo.

Waldomiro Diniz não era um franco atirador que extorquia bicheiros, donos de bingo e empresários por conta própria. Não é também um reles funcionário da Casa Civil, como diziam pessoas ligadas ao Ministro José Dirceu. Waldomiro é, sim, um operador conhecido, com muitos contatos no Governo, com ligações importantes na estrutura do Partido dos Trabalhadores e nos esquemas de arrecadação de recursos.

Os depoimentos de sexta-feira dos diretores da GTech deixaram claro que a Caixa Econômica Federal mentiu ao Senado, mais especificamente aos Senadores Arthur Virgílio e Demóstenes Torres.

E o que é pior, fizeram com que o Ministro da Fazenda assinasse um documento contendo informações pela metade ao Senado da República. A Caixa Econômica Federal deixou de encaminhar todas as negociações ocorridas entre junho de 2002 a fevereiro de 2003. Posteriormente, esses documentos chegaram ao Ministério Público Federal por intermédio de jornalistas.

A Caixa Econômica Federal e seus diretores omitiram do Senado da República documentos relevantes de março de 2003, que também chegaram ao Ministério Público Federal por meio de jornalistas. Nesses documentos, estavam as provas do sistema de descontos que valeria para o contrato da GTech com a Caixa Econômica Federal.

Os depoimentos, portanto, Sr. Presidente, deixaram claro que o Governo mentiu ao Senado quando respondeu requerimento de informações do Líder do PSDB, Arthur Virgílio, e voltou a mentir quando respondeu requerimento do Senador Demóstenes Torres. E isso é grave porque, ao agir assim - e quem assinou as respostas ao Senado da República foi o Ministro da Fazenda Antonio Palocci -, S. Exª incorre em crime de responsabilidade. Entendo que isso deve ser apurado e devem ser responsabilizados, no mínimo, os diretores da Caixa Econômica Federal.

A Lei nº 1.079, de 10 de abril de 1950, que define os crimes de responsabilidade e regula o respectivo processo de julgamento, estabelece:

Art.13. São crimes de responsabilidade dos Ministros de Estado:

.........................................................................................................................

4 - Não prestarem, dentro de 30 dias e sem motivo justo, a qualquer das Câmaras do Congresso Nacional, as informações que ela lhes solicitar por escrito, ou prestarem-nas com falsidade.

Quando os Ministros omitem informações, prestam-nas com falsidade.

O Vice-Presidente de Logística da Caixa Econômica Federal, Paulo Bretas, agiu em sintonia com Waldomiro Diniz. Paulo Bretas telefonou para pressionar a GTech e impor a contratação da consultoria de Rogério Buratti como pré-condição para o fechamento do contrato entre a GTech e a Caixa. A direção da Caixa, segundo depoimento dos diretores da GTech, falseou a verdade todas as vezes em que se manifestou publicamente sobre o contrato, porque sempre dizia que não houvera interferências externas nas questões do contrato da Caixa com a GTech.

Esta afirmação, Sr. Presidente, ouço aqui toda semana: “O momento é grave, a Polícia Federal está investigando, mas, se surgirem fatos novos, apoiaremos a CPI”. Os fatos são novíssimos e gravíssimos; surgem aos borbotões, toda semana. Os motivos para a indicação da CPI são ultra-relevantes. O Brasil precisa apurar isso; não sei como insistem em não abrir essa Comissão Parlamentar de Inquérito.

Independentemente da existência ou não da CPI dos Bingos ou da CPI de Waldomiro Diniz, o Senado precisa ouvir os diretores da GTech, o Vice-Presidente Paulo Bretas e toda a diretoria da Caixa Econômica Federal, bem como o empresário Rogério Buratti, de Ribeirão Preto, para que esclareçam os detalhes dessa negociação.

Se há samba de uma nota só, a do PT é “ré” - ré em tudo; a da Oposição é “dó”, porque dá dó ver as pessoas rasgarem as suas biografias, condenando uma investigação. Só há estas duas possibilidades: uma nota só do PT, que é ré, e uma nota só da Oposição, que é dó.

Rogério Buratti, Sr. Presidente, foi Secretário de Governo da Prefeitura de Ribeirão Preto nos anos de 1993 a 1994, na administração do então Prefeito Antonio Palocci. Isso não prova nada, mas é um dado já divulgado pela imprensa. Buratti foi investigado pelo Ministério Público e por uma sindicância da própria prefeitura, sob a suspeita de receber propinas de empreiteiras. Ao final da investigação, não se concluiu nada contra ele.

Buratti deixou os cargos que ocupava no PT, mas não se afastou dos companheiros do Partido. Fundou uma assessoria, a Assessorarte, em sociedade com um amigo, parece-me que de nome Luiz Prado, que era Diretor de Recursos Humanos da Prefeitura de Ribeirão Preto, e passou a assessorar ao menos sete prefeituras do PT paulista. Buratti transferiu as ações na Assessorarte para sua irmã, quando Vice-Presidente do grupo Leão & Leão, que tem uma construtora e presta serviços de coleta de lixo para dezenas de prefeituras petistas.

Algumas questões me intrigam durante esse episódio. Por que Rogério Buratti, que diz não conhecer Waldomiro Diniz, teve seu nome lembrado como possível intermediário nas negociações entre a Caixa e a GTech? Rogério Buratti disse que não conhece Waldomiro Diniz. É de se concluir que Waldomiro Diniz, se isso for verdadeiro, também não conhece Rogério Buratti. Quem disse a Waldomiro Diniz para indicar Rogério Buratti para a GTech e, para a Caixa Econômica Federal, o Vice-Presidente Paulo Bretas? Essas indagações precisam ser respondidas.

Buratti disse à imprensa que não queria, que não aceitaria. Se não pretendia aceitar os R$20 milhões, que era a proposta original do contrato, por que veio à Brasília para discutir? Quem não aceita, quem não quer prestar determinada assessoria não trata do assunto. São questões que precisam de esclarecimentos, que, evidentemente, seriam melhores se fossem públicos, feitos à luz do dia, na TV Senado, em uma Comissão Parlamentar de Inquérito. Para recusar o serviço, não era preciso vir a Brasília. Se veio conversar, alguém o chamou. O próprio Diretor Jurídico da Caixa Econômica Federal faz revelações mais ou menos nessa linha.

É inadmissível, Sr. Presidente, que, após 30 dias de investigações pela Polícia Federal, ainda não se tenha sequer quebrado o sigilo telefônico de Waldomiro Diniz. Mais de um mês após a divulgação da fita de vídeo em que Waldomiro Diniz pede dinheiro a Carlinhos Cachoeira, nada foi esclarecido, e as suspeitas e dúvidas só aumentaram.

Gostaria de manifestar a minha enorme surpresa com as comemorações que o Governo faz: “Governo sustenta que não existe crime no caso Buratti”. Está na Folha de S.Paulo de hoje. Diz o jornal:

Na sua estratégia para se contrapor à Oposição, o Governo sustenta a tese de que, se não houve pagamento de propina, não foi caracterizada a corrupção. Eis o principal argumento para limitar as investigações à Polícia Federal e ao Ministério Público.

Será que os diretores da GTech disseram que não pagaram, para que não fosse anulável o contrato com a Caixa Econômica Federal? Essa questão precisa ser investigada.

Penso que, antes de se pronunciar, o Governo deveria consultar o Ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, porque o crime de concussão não é receber, mas exigir, e isso está demonstrado no depoimento dos diretores da GTech. Solicitou-se, marcou-se data para a assinatura do contrato, que foi adiado porque as pessoas não haviam cumprido a exigência de conversar com o Sr. Buratti em Ribeirão Preto. Então, não se pode passar para a opinião pública que é correto exigir propina, mas não o é recebê-la. Que conversa é essa? Isso também é crime, está no Código Penal e não foi modificado nem pelo Senado nem pela Câmara dos Deputados. Trata-se de crime praticado por um agente público, por diretores da Caixa Econômica Federal, conforme acusam os diretores GTech. Não vejo como essa situação se encerrar aqui.

Antes, a tese do Governo era a seguinte: não se pode investigar, porque tudo começa e termina em Waldomiro, que fez tudo em 2002. Está provado que não o fez apenas em 2002, mas também em 2003; que, como assessor do até então mais importante Ministro da República, agiu com a GTech, traficou influência.

Agora surgem todas essas informações. Pessoalmente, Sr. Presidente, por ser uma área muito nervosa, entendo que deveríamos prosseguir nas investigações, sem promover qualquer especulação ou ilação sobre o Ministro da Fazenda, que, entretanto - defendo -, deve explicações a esta Casa e ao Brasil. Não que tenha alguma responsabilidade provada no episódio, mas no sentido de que se possa realmente tranqüilizar a Nação.

Trago ainda outra questão, para mim a matéria mais relevante depois de sexta-feira, contida na página 3 do jornal O Globo, que passou despercebida por todos os pronunciamentos: “Escândalo da propina: jogando junto”, que prova que o projeto da Abrabin é 70% igual ao projeto do Ministério do Esporte. O projeto da Abrabin para o jogo do bingo é 70% igual ao projeto apresentado pelo Ministério do Esporte.

Esse é mais um dado - não tenho dúvida nenhuma de que, na seqüência das investigações, esses dados se transformarão em mais relevantes - que trata do assunto. Pela sua enorme capilaridade, já se vê que não era um assunto exclusivamente do Sr. Waldomiro Diniz.

O Governo, hoje, defende o fechamento dos bingos, mas, até a quinta-feira 12, antes daquela sexta-feira 13 do caso Waldomiro Diniz, defendia a regulamentação do setor. Mandou para cá um projeto, e tinha uma equipe interministerial trabalhando sob a orientação exatamente da Casa Civil.

Encerro o pronunciamento fazendo um registro que retrata bem a posição do meu Partido, o PSDB. Trata-se do artigo publicado hoje pelo jornal Folha de S.Paulo, do ex-Ministro, Presidente atual do PSDB, José Serra, que escreve o seguinte:

A crise é outra

Existe uma crise institucional no Brasil? Claro que não. Não há conflito entre os três Poderes, não existem tentativas de derrubar a ordem democrática nem se vê nada parecido com os impasses que dilaceram a Venezuela. O que há, isto sim, é um processo de desgaste político do governo federal e de seu principal partido de sustentação. Esse desgaste ou “crise”, como nos acostumamos a qualificar tais situações, resulta da combinação de três circunstâncias.

A primeira envolve o aumento do desemprego, a queda dos rendimentos reais da maioria da população e os cortes de gastos públicos essenciais, tudo isso contrastando com as imensas esperanças despertadas pelas promessas e pela vitória do PT na eleição presidencial de 2002.

A segunda circunstância é a inépcia - perdoem-me a dureza do termo - do Governo. Comparada com ela, a capacidade decisória e administrativa do governo passado, mesmo em seus momentos mais frágeis, assume uma dimensão, digamos, bismarckiana. Tal inépcia é agravada pela ausência de um programa de governo, uma vez que o preexistente foi deixado de lado e, até agora, não foi substituído por outro coerente, com início, meio e fim. Um exemplo da inépcia: o programa Fome Zero, que só existe no mundo da publicidade. Um exemplo da falta de programa? Vão três: a educação, a reforma agrária e a geração de empregos. Afora alguma agência de publicidade, quem seria capaz de resumir de forma clara o que se pretende nessas três áreas?

A terceira é a quebra da aura ética do PT, sem dúvida um dos principais pilares que sustentavam sua imagem positiva na população.

Inicialmente, o governo Lula beneficiou-se nas elites por ter descartado o seu programa histórico, sendo aplaudido mais pelo que não fez. Na maioria da população, detinha um enorme crédito de confiança, traduzido na tolerância com suas dificuldades iniciais. Um inegável talento publicitário engrossou esses dividendos ao longo de seus primeiros meses de existência,

Mas as três circunstâncias apontadas já consumiram uma boa parte desse capital político, mesmo porque lideranças do PT têm se esforçado para agravar seus efeitos. Caçam bodes expiatórios, duelam entre si e exibem, especialmente no Senado, uma rara mistura de mediocridade, despreparo e truculência.

Nenhuma força de oposição responsável está interessada em provocar uma crise institucional. O presidente Lula cumpriu pouco mais de um quarto do seu mandato. Uma deterioração rápida e descontrolada de seu governo, na linha do que já acontece, pode prejudicar o país, consagrando uma nova década “perdida” em matéria de crescimento da produção e do emprego e causando tal decepção à população que as escolhas eleitorais do futuro correriam o risco de piorar ainda mais, em vez de melhorar.

Nenhuma força de oposição responsável pode, no entanto, deixar de fiscalizar as ações do governo, cobrando a transparência de sua administração e exigindo a lisura de seus integrantes. Nem de pleitear que o governo se disponha finalmente a governar, apresentando alguma visão estratégica e capacidade de ação. E é também dever da oposição mobilizar a sociedade para pressionar pela correção de rumos errados e para impedir retrocessos nas políticas sociais. Se não o fizesse, estaria colaborando para tornar o futuro do País a maior vítima deste presente de esperanças frustradas.

Peço à Mesa que registre nos Anais o artigo do Presidente do PSDB, Senador José Serra.

Renovo aqui a minha convicção de que, amanhã, teremos aqui, no Senado da República, quorum alto, suficiente para que tenhamos mais do que os trinta e cinco votos. Qual é a minha teoria? Trinta e nove assinaram a CPI; houve uma brutal pressão do Governo, e quatro retiraram as assinaturas. Portanto, trinta e cinco assinaturas querem a CPI e, ao pedirem a CPI à Mesa do Senado, devem estar aqui amanhã para votar e aprovar o requerimento. Creio que haverá mais algumas, pois os episódios do final de semana, com os fatos aos borbotões, estão a demonstrar a urgente necessidade da CPI. Assim, quero dizer claramente que vamos, sim, vencer o debate político de amanhã, consagrando a necessidade de a Mesa do Senado, com a omissão dos Líderes, cumprir o seu poder/dever. Não é poder/faculdade, mas poder/dever de indicar todos os membros desta Comissão Parlamentar de Inquérito. Nenhuma outra, desde PC Farias, é mais importante do que esta CPI.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/03/2004 - Página 7030