Discurso durante a 26ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupação com a ameaça da liderança nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra - MST de desencadear uma série de protestos no país para pressionar o governo federal a acelerar a reforma agrária e os assentamentos rurais.

Autor
Leomar Quintanilha (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/TO)
Nome completo: Leomar de Melo Quintanilha
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA AGRARIA.:
  • Preocupação com a ameaça da liderança nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra - MST de desencadear uma série de protestos no país para pressionar o governo federal a acelerar a reforma agrária e os assentamentos rurais.
Aparteantes
Antero Paes de Barros, Jonas Pinheiro, Pedro Simon, Sergio Guerra, Serys Slhessarenko.
Publicação
Publicação no DSF de 30/03/2004 - Página 8651
Assunto
Outros > REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • REPUDIO, DECLARAÇÃO, LIDER, MOVIMENTO TRABALHISTA, SEM-TERRA, AMEAÇA, TUMULTO, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, LOBBY, URGENCIA, REFORMA AGRARIA.
  • APREENSÃO, FALTA, SEGURANÇA, ZONA RURAL, RISCOS, VIOLENCIA, CONFLITO, INVASÃO, SEM-TERRA, PREVISÃO, PERDA, PRODUÇÃO AGRICOLA, EXPECTATIVA, CUMPRIMENTO, PROMESSA, REFORMA AGRARIA, CAMPANHA ELEITORAL, REGISTRO, SITUAÇÃO, ESTADO DO TOCANTINS (TO), NECESSIDADE, URGENCIA, PROVIDENCIA, MINISTERIO DO DESENVOLVIMENTO AGRARIO.
  • COMENTARIO, PARTICIPAÇÃO, DESEMPREGADO, PERIFERIA URBANA, MOVIMENTO TRABALHISTA, SEM-TERRA.

O SR. LEOMAR QUINTANILHA (PMDB - TO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, nobres Srªs e Srs. Senadores, eu e seguramente milhares de brasileiros estamos estarrecidos com a afirmação do líder nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). À guisa de pressionar o Governo Federal no sentido de apressar o trabalho de reforma agrária e, seguramente, de promover o assentamento de inúmeras famílias, ele afirma: “Abril vai ser um mês vermelho. Servidor público, estudantes, a turma da moradia, nós, os sem-terra, os rurais, nós vamos infernizar. Abril vai pegar fogo”.

Imagine o clima que toma conta do meio rural, porque há exemplos anteriores de invasões, que, na grande maioria das vezes, não é feita de forma pacífica. Em algumas ocasiões, os trabalhadores sem terra, munidos de facões e foices, em turbas, de forma agressiva, têm tomado conta de muitas propriedades neste País. E são propriedades, Sr. Presidente, que vêm passando de geração em geração, de pai para filho, durante muitos anos. O meio rural sempre trouxe alegrias para o povo e para o Governo brasileiro, principalmente quando a agricultura competitiva e a pecuária extremamente produtiva brasileira têm contribuído para o equilíbrio da balança comercial, para a exportação, para a geração de riquezas internas e para a criação de pontos de trabalho, abrigando a mão-de-obra cada vez mais carente de oportunidades de trabalhar. Sendo assim, não podemos nos conformar com afirmações desta natureza.

Se o propósito tem sentido de apressar, de exigir do Governo a reforma agrária, não podem os produtores rurais pagar por isso. Aliás, o que vemos, diante do impasse criado com a reforma agrária, é a multiplicação dos acampamentos dos chamados sem-terra, às margens das rodovias, na sua grande maioria, outros às margens de propriedades rurais, em uma vida subumana, abrigados em casebres de palha improvisados, feitos às pressas em locais insalubres. Ali, há pessoas abrigadas com suas famílias, muitas com crianças, sujeitas às intempéries e aos riscos da permanência à margem das rodovias, onde acidentes também têm se multiplicado, à espera de uma definição dessa questão relacionada com a reforma agrária. Isso tudo porque houve um certo comprometimento de que seriam assentadas as pessoas que estivessem acampadas.

E no nosso Estado, Sr. Presidente, Senador João Ribeiro, o Estado do Tocantins, vimos, de um ano para cá, surgirem centenas de acampamentos de pessoas que, entendemos, não serem afeitas a lides rurais; de pessoas que estão hoje na periferia das cidades, sem ter uma oportunidade de emprego ou de ganho para sustento seu e de sua família, buscando nessa alternativa, nessa esperança alentada pelo Governo, a oportunidade de sustentar a si mesmos e as suas famílias, engrossando as filas daqueles que estão criando esse novos acampamentos.

Recordo-me bem de um quadro interessante que vi nas proximidades da cidade de Miracema, no Estado de Tocantins, em um desses acampamentos. Muitas das pessoas que o integram, ao final do dia, retornam para suas casas na cidade de Miracema. Pela manhã, dirigem-se ao acampamento como forma de pressionar o Governo no processo de distribuição de terras de assentamento rural, a destinar às famílias um pedaço de terra. Logo, não podemos nos conformar e ouvir calados essa verdadeira ameaça ao Estado de direito e a um setor que, com seu o trabalho, tem contribuído para o desenvolvimento do País.

É imperativo que o Ministro da Reforma Agrária adote providências urgentes para que essa ameaça não se materialize. Aliás, os jornais de hoje anunciam que invasões já começaram no sul do País, antes mesmo de abril iniciar.

Assim, Sr. Presidente, como entendo que esse processo de reforma agrária é equivocado, penso que o Ministro precisa reexaminar a situação, porque as famílias se multiplicam nos assentamentos e, ainda que assentadas, se o processo continuar, os acampamentos nunca terminarão, nunca terão fim, porque estes serão assentados, mas novos acampamentos surgirão, formados pelas pessoas que, hoje, moram nas periferias das cidades e não têm alternativa de trabalho para sustentarem a si e as suas famílias.

O Sr. Jonas Pinheiro (PFL - MT) - Permita-me V. Exª um aparte?

O SR. LEOMAR QUINTANILHA (PMDB - TO) - Com muito prazer, nobre Senador Jonas Pinheiro.

O Sr. Jonas Pinheiro (PFL - MT) - Eminente Senador Leomar Quintanilha, hoje pela manhã, em Cuiabá, recebi em minha residência um dos líderes do sindicato de trabalhadores rurais da cidade de Diamantina. Ele foi até lá para saber a minha opinião sobre o movimento apregoado pelo líder nacional do MST, de certa forma já também adotado no Estado de Mato Grosso. E ele queria saber porque estava previsto que Cuiabá recebesse em torno de 2.200 sem-terra, que estavam se reunindo para traçar um plano para invadir as propriedades no Estado do Mato Grosso, fossem elas produtivas ou não, obedecendo a idéia que V. Exª traz à pauta do Congresso Nacional, qual seja, a de pressionar o cumprimento dos compromissos e das promessas do Governo Lula. E V. Exª foi muito feliz nisso: O que o produtor rural, aquele que tem a sua propriedade consolidada, que está produzindo bens e que cumpre a função social dessa mesma propriedade ser invadida. Essas invasões estão programadas, principalmente, às margens das rodovias, nas proximidades das cidades, para chamar mais a atenção. Portanto, feliz é V. Exª que, preocupado com essa situação, traz esse tema hoje à Casa. Associo-me a V. Exª. Muito obrigado.

O SR. LEOMAR QUINTANILHA (PMDB - TO) - Agradeço a V. Exª, Senador Jonas Pinheiro, que tem uma compreensão ampla principalmente da atividade rural. O Brasil não consegue abrigar aqueles que se propõem a cultivar um pedaço de terra e produzir o suficiente para o seu sustento e, quem sabe, obter um excedente para construir uma condição de dignidade para a sua família. O Governo Lula está procurando aprimorar o modelo já existente, que, para mim, é equivocado, pois não consulta os interesses daqueles que têm terra. E o que vemos, efetivamente, são hordas de rotos e famintos, desesperados por não ter o seu ganha pão, buscarem nessa vertente que o Governo oferece uma oportunidade de trabalhar. E V. Exª tem razão quando diz que os acampamentos e os assentamentos estão se multiplicando na proximidade das cidades, pois é onde vivem pessoas com dificuldades de encontrar um posto de trabalho ou uma forma de obter receita própria e que, vêem nessa alternativa, um modo de sobreviver. Por isso, os acampamentos não vão acabar. Se assentarmos todos os que estão hoje acampados, seguramente, amanhã, haverá outra quantidade de pessoas originárias das periferias das cidades na busca da oportunidade de encontrar um modo de sobreviver.

Ouço com muito prazer o eminente Senador Pedro Simon.

O Sr. Pedro Simon (PMDB - RS) - Senador Leomar Quintanilha, essa é uma matéria sobre a qual, sinceramente, todo o Brasil esperava que o Governo do Presidente Lula desse encaminhamento. Aliás, na campanha, ele dizia, com muita convicção - e, na minha opinião, com muita correção -, que, se havia alguém que podia fazer a reforma agrária, era ele. Se o povo brasileiro escolhesse um Presidente na expectativa de que esse Presidente fizesse a reforma agrária, era ele, porque conhecia o assunto e, o mais importante, tinha a confiança das pessoas, dos sem-terra. E ele, Lula, tinha condições de fazer a reforma agrária. Ele escolheu para Ministro da Reforma Agrária um homem do Rio Grande do Sul, conhecedor da matéria, sério e responsável, que tem entre as suas características - no Rio Grande do Sul, reconhecíamos isso - a capacidade de negociar, de dialogar. Ele era considerado, no Governo Olívio Dutra, a pessoa que fazia as negociações internas do Governo. A surpresa nisso tudo é que já faz quase um ano e meio e o Governo ainda não disse a que veio com relação à reforma agrária. Vamos falar com toda a sinceridade, o problema é esse: o Governo tinha que chamar os líderes da reforma agrária, sentar à mesa, ficar um ou dois dias naquelas espécies de hotéis que eles têm, e discutir, analisar e chegar à conclusão: “Vai ser assim; nós, do nosso Governo, vamos fazer assim”. Uma vez, li que o Lula disse depois de assumir: “As invasões, essa coisa toda, eram necessárias porque o Governo não queria fazer a reforma agrária, mas eu quero”. Então, se o ele quer, se ele vai fazer, o problema era sentar com os líderes da reforma agrária e dizer como é que eles vão fazer: “Olha, queríamos assentar 200 mil este ano, mas não vai dar. Então, vamos chegar a um acordo de 20 mil, 50 mil”. Mas não falaram, não discutiram, não propuseram, não disseram nada. Hoje, em termos de reforma agrária, é como no tempo de Fernando Henrique: não se tem notícia de coisa alguma. Concordo com V. Exª que é um absurdo a declaração de Stédile de que abril será vermelho. Isso é horrível, é altamente negativo, prejudicial e até criminoso, porque ele está anunciando o que vai fazer. E o doloroso é fazer isso no Governo Lula, mas, mais doloroso, é que isso está ocorrendo porque o Lula não diz uma palavra. Na entrevista, poderia chamar o Movimento dos Sem-Terra, o pessoal da reforma agrária. Segundo manchete dos jornais de hoje, o Presidente Lula manda distribuir recursos para a reforma agrária, mas ninguém cumpre. Não estão cumprindo as determinações do Lula, do Presidente da República, e não acontece nada! A notícia a que V. Exª se refere é tão grave e tão importante que justificaria que o Presidente da República chamasse os lados interessados para encontrar uma solução, uma proposta de como ficará a situação daqui em diante, o que não quer dizer que Sua Excelência assentará essas pessoas amanhã. Evidentemente, não há condições para isso. No entanto, é possível apresentar uma proposta para um plano de ação periódico. Lamentavelmente, publicam-se essas notícias, como a que V. Exª citou, e daqui a pouco a Brigada Militar estará nas ruas e pessoas estarão morrendo durante o Governo Lula. E nunca imaginamos que esses fatos pudessem ocorrer na sua gestão. Manifesto minha solidariedade a V. Exª. De tudo que está aí, seria importante que o Governo Lula dissesse algo que ainda não falou. Obrigado.

O SR. LEOMAR QUINTANILHA (PMDB - TO) - Senador Pedro Simon, V. Exª tem toda a razão quando afirma que havia realmente uma expectativa muito grande do setor de que a reforma agrária ocorresse no Governo do Presidente Lula. E até acredito que o Presidente esteja interessado em fazer a reforma agrária e tenha escolhido um Ministro que conheça o problema.

No meu entendimento, o modelo é ruim, equivocado. Esse modelo não trará um resultado positivo à reforma agrária brasileira. Portanto, espero que o Presidente reveja essa situação, juntamente com o Ministro Miguel Rossetto, e ofereça ao País, aos produtores rurais a tranqüilidade necessária para que aqueles que esperam ter um pedaço de terra para trabalhar e abrigar sua família encontrem essa oportunidade mas numa reforma agrária tranqüila, pacífica. Não é preciso incendiar o País nem o meio rural, que está dando prestígio ao País. O produto brasileiro, principalmente depois da ação efetiva da Embrapa, assim como a agricultura e a pecuária brasileiras tomaram uma dimensão extraordinária no contexto social e econômico deste País.

Senador Antero Paes de Barros, ouço V. Exª com muita alegria.

O Sr. Antero Paes de Barros (PSDB - MT) - Senador Leomar Quintanilha, cumprimento V. Exª pela oportunidade do seu pronunciamento. Foi dado o aviso, mas faço uma pequena correção: o aviso não é da semana passada, mas do ano passado, quando o MST tinha essa mesma pauta. Naquela ocasião, o Governo se mobilizou e estabeleceu o prazo de um ano, em razão de haver uma política para desenvolver a reforma agrária, mas não aconteceu nada até agora. Precisamos discutir o Estado: como ele funciona, qual é o seu aparelhamento, a sua eficiência, se as pessoas que ocupam funções públicas têm ou não capacidade para fazer essas coisas acontecerem dentro das suas funções ou se há falta de vontade política do Governo do PT de fazer a reforma agrária. Quero acreditar que uma das coisas com as quais o Presidente Lula é mais comprometido é com a reforma agrária, que faz parte da sua história, da sua vida, da sua biografia. O Presidente sempre lutou pela reforma agrária. E o Ministro da Reforma Agrária, Miguel Rosseto, é ligado aos movimentos, tem a credibilidade dos movimentos. Sendo assim, é a questão burocrática, do aparelhamento do Estado que não deixa a coisa funcionar. E isso tem que funcionar. A Senadora Serys Slhessarenko me diz que lá no nosso Estado, em Mato Grosso, há questões gravíssimas. Por exemplo, o Ministério Público entrou com uma ação proibindo a desapropriação no Estado enquanto não forem devolvidas à União as terras públicas, o que foi acolhido pelo Juiz Federal. Então, é preciso retomar as terras públicas, mas muitas delas estão ocupadas por grandes fazendeiros que produzem enorme quantidade de grãos e ajudam o Brasil na questão da balança comercial. O Brasil está entre duas situações: primeiro, precisa prestigiar o agronegócio e, segundo, precisa diminuir o custo Brasil, investir na infra-estrutura, melhorar as nossas estradas, melhorar os nossos portos e tornar os nossos produtos mais competitivos em nível internacional. Isso é verdade, mas há uma injustiça tão grande e tão atravancadora do desenvolvimento quanto essas: é preciso fazer a reforma agrária, que não é um tema de agora, é um tema de quinhentos anos. É um tema que assusta, assim como assusta também a continuidade da injustiça. Creio que o Movimento está no seguinte dilema: acredita mais uma vez, espera mais um ano ou acredita naquele velho adágio popular lá do nosso Mato Grosso que diz “Vai esperar? Então, morre o burro e mais quem toca”. O MST está entendendo que, ou age como movimento para ocupar, resistir e produzir e obter aquilo que sempre reivindicou, ou acabará não tendo acesso à política de reforma agrária. Vamos observar. Há um ano o MST vem recebendo promessas e o processo pode se tornar mais célere inclusive com a contribuição do Congresso Nacional. Todos temos esse discurso agora em abril. Quero ver esse discurso na hora da elaboração do orçamento, porque a prioridade deve ser colocada no orçamento. Esse discurso nós queremos ver refletido no orçamento. Então, vamos unir os que defendem o Movimento dos Sem-Terra com os que defendem o agronegócio e vamos fazer a defesa de recursos para a promoção da reforma agrária. Aí, tranqüilizaremos a todos, melhoraremos o Brasil e diminuiremos a injustiça. Parabenizo V. Exª pela oportunidade do pronunciamento.

O SR. LEOMAR QUINTANILHA (PMDB - TO) - Agradeço a V. Exª o aparte, com o qual concordo. Esse fato não é isolado, ele acaba aumentando a sua pressão em decorrência das dificuldades que o País experimenta, inclusive para crescer. A partir do instante em que o País não cresce economicamente, os substratos sociais, por não terem alternativas de aproveitamento da sua capacidade de trabalho, acabam buscando essa alternativa, que vislumbram ser a correta para buscar a sobrevivência.

A Srª Serys Slhessarenko (Bloco/PT - MT) - Senador Leomar Quintanilha, permite-me V. Exª um aparte?

O SR. LEOMAR QUINTANILHA (PMDB - TO) - Ouço com prazer a nobre Senadora Serys Slhessarenko.

A Srª Serys Slhessarenko (Bloco/PT - MT) - Senador, o MST é um movimento de credibilidade, inclusive internacional. É o Movimento organizado mais forte deste País. A reforma agrária tem que ocorrer, não tenho dúvida. Chega de superconcentração de terra neste País, que vem desde o seu descobrimento, começou com as Capitanias Hereditárias. Se tivéssemos tempo, faríamos aqui um histórico dessa superconcentração de terra e a razão da não-realização da reforma agrária no Brasil. Como disse o Senador Antero Paes de Barros, em Mato Grosso, por exemplo, a situação é dificílima. Há terra que não acaba mais, mas há também muitos sem-terra. E não se consegue fazer a tal da reforma agrária. Existe uma decisão judicial de que não se pode desapropriar terra em Mato Grosso, enquanto não houver o resgate das terras públicas. E considero uma decisão correta. Há 3 milhões de hectares de terras públicas apropriadas de forma absolutamente indevida e irregular e que devem ser retomadas. Em Mato Grosso, não se deve investir mais dinheiro em desapropriação de terras. O dinheiro deve ser utilizado em políticas agrícolas para micro e pequenos agricultores. E devem ser resgatadas as terras públicas. Mas quem as entrega, Senador? Pessoas que se apossaram de 10, 20, 30, 50 mil hectares, de forma indevida e irregular, e não entregam a terra. Recorrem da sentença, e o juiz federal decide a favor do resgate da terra pública. Mas é óbvio que a pessoa que se apossou de 30 mil hectares de terra e a cultiva gratuitamente como “dono” recorre às instâncias superiores. E nossa Justiça, como bem sabemos, é lentíssima. A situação é esta: não se pode desapropriar e, por outro lado, o resgate da terra pública é moroso. Então eu pergunto: como fazer reforma agrária em Mato Grosso? A reforma agrária é necessária, é essencial e urgente. Mas são criados mecanismos a fim de inviabilizá-la. Infelizmente, é o poder do grande capital, do grande latifúndio, que a inviabiliza. Muito obrigada.

O SR. LEOMAR QUINTANILHA (PMDB - TO) - Senadora, V. Exª tem razão. Compete ao Governo adotar providências urgentes e imediatas que a questão tão importante requer. O que o Governo não pode e o Brasil não aceita é que essa luta fratricida continue. São irmãos brigando com irmãos em razão de um pedaço de terra em um País de dimensão continental, com terras sobrando para todos os lados. Isso não faz sentido.

O Sr. Sérgio Guerra (PSDB - PE) - Senador Leomar Quintanilha, permite V. Exª um aparte?

O SR. LEOMAR QUINTANILHA (PMDB - TO) - Eminente Senador Sérgio Guerra, já não sou mais dono do meu tempo. Se a Mesa concordar, ouvirei V. Exª com muito prazer.

O SR. PRESIDENTE (João Ribeiro. PFL - TO) - O tempo de V. Exª já se esgotou, Senador Leomar Quintanilha, mas a Mesa espera que seja breve o aparte do Senador Sérgio Guerra.

O Sr. Sérgio Guerra (PSDB - PE) - Agradeço a atenção de V. Exª, Senador Leomar Quintanilha, bem como a condescendência do Sr. Presidente. Hoje o jornal Folha de S.Paulo publica um texto do Senador Jorge Bornhausen - V. Exª deve ter lido -, em que S. Exª analisa o problema da exportação brasileira de soja e os descontos concedidos na safra brasileira, o que implica redução de preço por conta de baixa produtividade, defeitos de sistema, que tem origem na falta de infra-estrutura brasileira para suportar as exportações agrícolas. O fato concreto é que a sociedade econômica brasileira afirma, e com razão, que o grande problema do setor público no Brasil, de uma maneira geral, e do Governo Federal, em especial, não é colaborar, é não prejudicar. Difícil é produzir. Esperar apoio governamental é ilusão pura, simples, histórica. Não se dá, e não se dá muito menos agora. O tema do discurso de V. Exª, os fatos que estão aí nos jornais são extremamente preocupantes. Este País está sustentado na nossa capacidade de produção agrícola, que não deve lá muito aos Governos e, de uma maneira muito clara, não deve quase nada a este Governo. E, neste instante, quando surge outra vez e começa a se confirmar toda uma ação com vistas à apropriação de terras para, de uma maneira concreta, levar o Governo a fazer a reforma agrária, penso que todos devemos nos unir - e não é uma questão partidária - nesta que é uma das prioridades sociais brasileiras: a reforma agrária. Qual é o limite dessa prioridade? Ela tem que ser prioridade, mas deve-se considerar de outro lado a capacidade de produzir. Devemos ser tão decididos a fazer a reforma agrária quanto devemos também ser decididos a proteger a produção existente, a fazer com que o esforço de reforma agrária e o de produção sejam coincidentes, juntem-se, porque o problema de quem não tem terra no Brasil e o problema de quem tem terra no Brasil é exatamente o Governo e a falta de uma política agrícola. Ministros se sucedem, uns mais talentosos, outros menos, uns mais adaptados ao problema que estão enfrentando, outros menos adaptados, mas o fato concreto é que o Ministério da Agricultura é um Ministério sem a menor importância econômica, e o Ministério da Reforma Agrária, menos ainda. Não é nem o fato de ter prioridade no orçamento, porque não há prioridade em orçamento quando o contingenciamento é de 80%. Toda a prioridade é do Governo Federal e este não dá prioridade à produção agrícola de nenhuma forma, como não dá prioridade à produção alguma. A prioridade é o arrocho, a prioridade é o controle monetário, são as taxas de juro. No mais, tudo é conversa e ficção. As políticas sociais pelas quais o PT lutou a vida inteira, neste Governo, são rigorosamente inexistentes. Não há políticas que se transformem em ação, são apenas intenções que não se confirmam em método para fazer as coisas acontecerem. Este é um Governo que não tem começo, meio e fim. E o Brasil está pagando um preço elevadíssimo por isso. Se agora os trabalhadores voltam a invadir as terras à procura do espaço para viverem, de uma Reforma Agrária que a América Latina, em grande parte, já fez e que o Brasil não fez, estaremos dando uma demonstração de incapacidade pública, de um Partido que governa o Brasil com a prática completamente diferente da que prometeu nos seus longos anos de existência.

O SR. LEOMAR QUINTANILHA (PMDB - TO) - Agradeço ao eminente Senador Sérgio Guerra pelas ponderações que faz, considerando-as apropriadas, oportunas, notadamente quando fala sobre as condições que deveria o Governo dar a quem produz, que praticamente inexistem.

Trabalhei no Banco do Brasil por muitos anos e vi, acompanhei de perto, fui testemunha ocular das dificuldades que o produtor brasileiro tinha pela inexistência de estradas e de programas de assistência à moradia, no interior do País, além da dificuldade enorme para educar suas crianças e receber atendimento às suas demandas de saúde. Esses problemas não se resolveram; diminuíram, mas não se resolveram.

Quanto à reforma agrária, somos um País de dimensão continental e a sociedade clama por ela. É imperativo que o Governo encontre um caminho efetivo e correto para implementá-la urgentemente, distendendo essa pressão que existe sobre o meio rural.

Sr. Presidente, agradeço a compreensão de V. Exª e espero voltar ao assunto, em razão da sua importância, em outras oportunidades.

Era o que tinha a registrar. Obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/03/2004 - Página 8651