Discurso durante a 32ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Postergação da recriação da Sudene pelo governo federal.

Autor
José Jorge (PFL - Partido da Frente Liberal/PE)
Nome completo: José Jorge de Vasconcelos Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • Postergação da recriação da Sudene pelo governo federal.
Publicação
Publicação no DSF de 07/04/2004 - Página 9531
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, NEGLIGENCIA, REGIÃO NORDESTE, ADIAMENTO, CRIAÇÃO, SUPERINTENDENCIA DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE (SUDENE).
  • REGISTRO, FRUSTRAÇÃO, DIVERSIDADE, SETOR, SOCIEDADE, CONDUTA, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DESCUMPRIMENTO, PROMESSA, CAMPANHA ELEITORAL, REATIVAÇÃO, SUPERINTENDENCIA DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE (SUDENE), OBJETIVO, REDUÇÃO, DESIGUALDADE REGIONAL, DESIGUALDADE SOCIAL, PAIS.
  • DETALHAMENTO, EVOLUÇÃO, PROPOSTA, CRIAÇÃO, SUPERINTENDENCIA DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE (SUDENE), CRITICA, ALTERAÇÃO, PROJETO, CONDENAÇÃO, DECISÃO, GOVERNO FEDERAL, CANCELAMENTO, PEDIDO, URGENCIA, TRAMITAÇÃO, PROJETO DE LEI, CONGRESSO NACIONAL.
  • REGISTRO, ATUAÇÃO, BANCADA, REGIÃO NORDESTE, CONGRESSO NACIONAL, RESTABELECIMENTO, URGENCIA, TRAMITAÇÃO, PROJETO DE LEI, CRIAÇÃO, SUPERINTENDENCIA DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE (SUDENE).
  • ANALISE, DESIGUALDADE REGIONAL, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, DIVERSIDADE, REGIÃO, PAIS.
  • APRESENTAÇÃO, SUGESTÃO, GARANTIA, ATENDIMENTO, OBJETIVO, CRIAÇÃO, SUPERINTENDENCIA DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE (SUDENE).

O SR. JOSÉ JORGE (PFL - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os problemas decorrentes da falta de atenção do Governo Federal para com o Nordeste, após os enormes danos provocados pelas últimas enchentes no início do ano, vieram recrudescer o sentimento já existente, de abandono do povo nordestino pelo Senhor Presidente da República e seus Ministros. Esse sentimento é mais um foco de decepção e até de revolta contra a paralisia do Governo Federal, desta vez diante da sempre postergada recriação da Sudene, que tanta falta fez nesses últimos meses.

Posso afirmar, desde logo, que tais sentimentos não se restringem a Parlamentares nordestinos ou a Governadores e Prefeitos. Não se trata aqui apenas de integrantes das oposições. Eles são mais profundos e têm raízes em organizações não-governamentais, sindicatos, associações de profissionais liberais, entidades estudantis, segmentos empresariais da indústria e do comércio e em múltiplos setores da comunidade acadêmica e técnico-científica.

Todos esses grupos sociais têm feito reverberar na imprensa, em debates, seminários e reuniões de órgãos de classe, suas amargas frustrações pelo não cumprimento do compromisso de recriação da Sudene, após os quinze primeiros meses - um terço praticamente, Senadora Heloísa Helena - da administração do Presidente Lula, apesar de todas as promessas realizadas.

Quero citar apenas, por exemplo, dois importantes eventos ocorridos neste ano.

O Fórum Pernambuco Século XXI - criado como centro de debates de alto nível pela Secretaria de Planejamento do Estado, em janeiro de 1999 - realizou seminário no dia 12 de fevereiro último, com os melhores técnicos de Pernambuco e importantes lideranças políticas, empresariais e da classe trabalhadora, sobre a política nacional de desenvolvimento regional e a Sudene. Foi palestrante a economista Tânia Bacelar, que, apesar de seu brilho pessoal, não pôde evitar o constrangimento e a decepção dos presentes com a constatação do descompromisso do Presidente da República com a recriação da Sudene.

No setor privado, já no início deste mês, profissionais e consultores de planejamento empresarial constituíram o Movimento Acorda Nordeste - Mano, para lutar pela retomada do Projeto de Lei Complementar nº 76/03, que cria a superintendência de desenvolvimento da região e que se encontrava praticamente paralisado. Esse mesmo movimento realizou o seminário regional em Recife, no dia 20 próximo passado, para unir instituições em torno de estratégias que venham a forçar com urgência a recriação do órgão.

Na realidade, Srªs e Srs. Senadores, fica muito difícil para os nordestinos esquecerem tão rapidamente as imagens do então candidato Lula, desfeito em lágrimas, em plena campanha eleitoral, abraçando com seus militantes o prédio da sede da Sudene em Recife, prometendo resgatar a instituição e sua vocação histórica de indutora do nosso desenvolvimento.

Torna-se muito difícil também esquecer as suas palavras, ditas em alto e bom som durante a campanha eleitoral, por diversas vezes. Dizia Lula que considerava a recriação da Sudene um compromisso pessoal e político tão importante, que a nova autarquia seria criada como órgão diretamente vinculado a seu gabinete, para não sofrer qualquer interferência que viesse a dificultar seu desempenho ágil e eficaz.

E tudo parecia andar bem na empolgação de começo de Governo.

O Presidente criou, em fevereiro de 2003, o Grupo de Trabalho Interministerial chamado GTI-Sudene, sob a responsabilidade do Ministério da Integração, para elaborar um documento básico sobre políticas de desenvolvimento sustentável para o Nordeste, que servisse de fundamento para o projeto de lei complementar de recriação da Sudene.

O GTI-Sudene, coordenado pela economista Tânia Bacelar, realizou inúmeras reuniões e fóruns de debate em Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e em todos os Estados nordestinos, para consolidar e apresentar o solicitado documento ao Senhor Presidente da República ainda no mês de junho de 2003.

No dia 29.07.2003, o Chefe do Executivo enviava à Câmara Federal o projeto de lei complementar instituindo a Sudene e estabelecendo sua composição, natureza jurídica, objetivos, área de competência e instrumentos de ação. E também requeria o regime de urgência para sua tramitação.

Mas, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a empolgação acabou aí. A partir de então, o projeto começou a sinalizar mudanças de rumo. Em vez de ficar vinculado ao Gabinete da Presidência, como prometera o Presidente Lula, a Sudene foi inserida num emaranhado de órgãos do Ministério da Integração Nacional, ficando a ele vinculada e subordinada. Era, sem dúvida, uma primeira reversão nas intenções e promessas do Sr. Presidente.

Para surpresa de todos, em 15 de setembro de 2003, o próprio Palácio do Planalto pedia o cancelamento da urgência do citado projeto de lei. Confirmava-se o temor de que mais um ato de estelionato eleitoral estivesse em curso: a Sudene estava entrando para o rol das promessas feitas sem prazo para cumprimento. E foi efetivamente o que ocorreu.

Já em dezembro do ano passado, todos fomos surpreendidos, mais uma vez, com o gesto da economista Tânia Bacelar, dando por concluídos os trabalhos do GTI-Sudene, com as propostas para as políticas nacionais de desenvolvimento regional. Simultaneamente, ela pedia exoneração do seu cargo, apresentando como justificativa motivos de ordem familiar.

A imprensa pernambucana, porém, registrava seu gesto como o de um “obsequioso silêncio”, tipo de pena mínima do período inquisitorial. Todos sabiam, na verdade, que aquele era um gesto de desencanto e de frustração com o desandar de um projeto no qual ela estivera tão profundamente engajada e que fora concebido pela elite política e técnica do Nordeste.

Por sinal, o Jornal do Comércio, em 12 de dezembro, já trazia esta manchete, em artigo de fundo: “Nova Sudene: o jogo do sai-não-sai”. No dia seguinte, o Diário de Pernambuco estampou em manchete o seguinte título: “Recriação da Sudene adiada para 2005”. O editorial do mesmo jornal, de 27 de fevereiro, fazia esta interrogação: “O que há com a Sudene?” Todos já sabiam que a Sudene estava sendo asfixiada em seu processo de gestação. E todos prevêem que, se a Sudene nascer dentro desse contexto, estará condenada, desde o berço, a ser apenas uma espécie de Adene, pseudo-agência totalmente esvaziada e sem condições de operacionalizar as suas competências.

Para infelicidade do Nordeste, o Presidente Lula, com o objetivo de sufocar, o mais rapidamente possível, a CPI do Waldomiro Diniz, foi ao Ceará, no dia 17 de março, para lançar um novo programa, o chamado Cresce Nordeste, anunciado um mês antes. Sua Excelência o faria por meio de duas medidas provisórias - mais duas, Sr. Presidente - a serem lançadas, autorizando a utilização de R$3 bilhões dos recursos do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste - FNE - para empréstimos a pessoas físicas urbanas e a empresas de economia mista.

A viagem se transformou em mais uma trapalhada presidencial, porque, prontas para serem assinadas, verificou-se que aquelas MPs modificariam a legislação do FNE definida na Constituição Federal. Queriam alterar a Constituição com medida provisória, Senadora Heloísa Helena. E o Presidente Lula não teve dúvida: sustou as MPs e aproveitou para, naquele momento, fazer mais sete promessas ao nordestinos, entre as quais a criação de um milhão de empregos no Nordeste em 2004, a redução dos juros no País e, novamente, a recriação da Sudene.

Sr. Presidente, não foi sem razão que o Presidente Lula, nessa sua última viagem, foi pessoalmente alvo de manifestações por Sua Excelência inimagináveis, de protestos e vaias, tanto em Fortaleza, quanto em Recife. Ultimamente, nosso Presidente vem sendo vaiado até quando aparece em telão, como ocorreu em São Paulo, no dia da festa de homenagem a Ayrton Senna, Senadora Heloísa Helena. V. Exa ri, mas isso é verdade.

Não considero essa trapalhada como o mais desastroso nessa “viagem das sete promessas”. O mais grave é que, mais uma vez, um programa federal para o Nordeste, que inicialmente contaria com R$3 bilhões, seria operacionalizado como atividade puramente bancária, sem a existência de um órgão regional coordenador de investimentos que aplicasse os recursos dentro de uma visão estratégica atualizada, moderna e eficiente.

Entendo, Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, que, na verdade, esse foi mais um ato contra a Sudene, que joga para a frente, sem horizonte de prazos, a sua própria recriação.

Mas, como já me referi antes, o Nordeste não está de braços cruzados. Nesse sentido, a Bancada nordestina na Câmara Federal já deu um importante passo. No dia 18 de março, conseguiu reunir 302 assinaturas de Parlamentares, para restabelecer a urgência para o projeto de lei de recriação da Sudene, que tramita naquela Casa. Registre-se que o regime de urgência foi restabelecido contra a vontade do Palácio do Planalto.

Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, sabemos que hoje não se pode cair no reducionismo dos anos 60 e dizer simplesmente que há dois Brasis: um, que é pobre e está no Nordeste, Norte e Centro Oeste, e outro, que é rico e está no Sul e Sudeste. Essa visão de homogeneidade macrorregional está superada.

A partir da década de 90, surgem “ilhas competitivas” também nas regiões pobres, que se confirmaram como centros de produção, comercialização e exportação. Essas “ilhas” já integram a economia globalizada e se relacionam de forma direta com o Sul, com o Sudeste e com o exterior. É o caso do vale do São Francisco, com o dipolo de vitivinicultura e fruticultura de Petrolina e Juazeiro, e do vale do Açu, no Rio Grande do Norte, com a fruticultura. Essa é uma nova dinâmica da economia nacional que já está consolidada.

Por outro lado, verificam-se bolsões de pobreza e miséria nos Estados do Centro-Sul, que se equiparam aos do semi-árido nordestino, não só dentro das próprias cidades, como São Paulo e Rio de Janeiro, mas também em sub-regiões, como no extremo sul do Rio Grande do Sul e nos vales do Jequitinhonha e do rio Doce, em Minas Gerais.

Já ocorre também uma desconcentração da produção industrial em nível macrorregional. Não vem mais da região metropolitana de São Paulo o maior impulso da indústria nacional, mas sobretudo de outras capitais do Sul e Sudeste e das cidades de menor porte do interior de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

Nas outras regiões do País, surgem também “ilhas de produção”, como os centros de fruticultura nos vales úmidos já citados e também no oeste graneleiro e nos pólos de turismo do litoral nordestino.

É para essas ilhas de dinamismo econômico que fluem os maiores volumes de capital e de investimento em infra-estrutura.

Mesmo com a Sudene esvaziada e a Adene como instituição puramente figurativa, ocorrem surtos de organização econômica em sub-regiões e também em consórcio de cidades. No caso de Pernambuco, por exemplo, embora, incipientes, já existem os planos de investimento a partir de vocações sub-regionais e de clusters produtivos locais. São os casos do pólo gesseiro do Araripe, do pólo de laticínios do agreste meridional, do pólo de confecções do agreste setentrional, do pólo de ovino-caprinocultura do sertão do Pajeú-Moxotó, do pólo cultural da região metropolitana do Recife, do pólo de informática de Recife, além da fruticultura e vitivinicultura de Petrolina.

Como se vê, Sr. Presidente, existe uma nova realidade em cada região do País, o que vem evidenciar, ainda mais, a urgência e a necessidade de que se criem e recriem agências de desenvolvimento, como a Sudene, para planejar, coordenar e executar as políticas de desenvolvimento regional, integrando as regiões entre si, dentro da nova dinâmica, inclusive na perspectiva de exportação e globalização.

Sr. Presidente, nobres Srªs e Srs. Senadores, todos reconhecemos que, nos últimos 50 anos, o Brasil e o Nordeste melhoraram os seus índices de desenvolvimento e crescimento. Mas temos de reconhecer também que as desigualdades regionais não diminuíram. Ao contrário, até aumentaram, tornando mais sério o problema.

Os estudos demonstram que, nas décadas de 60 a 80, ocorreu, no País, o fenômeno de uma leve “descontração produtiva”, gerando uma maior integração inter-regional do setor produtivo, com a migração de capitais para o Nordeste, por exemplo. Não se pode negar, nesse processo, os efeitos dos incentivos fiscais oriundos dos artigos 34 e 18 da lei que aprovou o II Plano Diretor da Sudene. O mesmo se diga, por analogia, da Zona Franca de Manaus, que não teria existido sem os inventivos fiscais.

Mas o que quero enfatizar é que o Nordeste ainda hoje continua o primo pobre da Federação. É o que atestam os recentes dados do Atlas do Desenvolvimento Humano do Brasil, divulgado pelo Pnud, Ipea e Fundação João Pinheiro.

Enquanto o maior IDH do Brasil, que é de 0,919, pertence ao Município de São Caetano do Sul, em São Paulo, o mais baixo, de 0,467, e está em Manari, Pernambuco. A maior renda per capita, que é de R$954,65, pertence a Águas de São Pedro, em São Paulo, e a menor do País, que é de R$28,38, pertence a Centro do Guilherme, no Maranhão. A maior média de escolaridade, que é de 9,65 anos de estudo por habitante, encontra-se em Niterói, no Estado do Rio de Janeiro, e a menor média encontra-se, mais uma vez, em Manari, Pernambuco, onde 57,01% da população ainda é de analfabetos. Enquanto a maior expectativa de longevidade no Brasil, que é de 78,18 anos, está em São Caetano do Sul, em São Paulo, a maior mortalidade infantil encontra-se mais uma vez na cidade pernambucana de Manari, com 106,67 óbitos sobre mil nascidos vivos - é nível da África!

Estou convencido, Sr. Presidente, de que a finalidade primeira da Sudene será a inclusão social dos nordestinos na sociedade brasileira, com dignidade e efetiva participação na construção do progresso do País. Essa finalidade será alcançada através do planejamento estratégico e democrático de desenvolvimento sustentável da região, que não pode ficar restrito a investimentos de inversão financeira e às grandes corporações, mas que venha a atender também a outros níveis empresariais, como as pequenas e microempresas e também as unidades produtivas familiares e os profissionais liberais e suas corporações, desde que seus projetos venham a gerar emprego, aumentar renda, ofertar mais e melhores bens e serviços. A esses critérios, deve-se aliar também o do atendimento ao desenvolvimento em múltiplas escalas, do nível local ao sub-regional, regional e à integração competitiva com a economia nacional e internacional.

Permaneço também com a convicção de que a nova autarquia não poderá deixar de ter recursos estáveis, não contingenciáveis, oriundos de fundos especiais por ela geridos e que sejam direcionados para os investimentos nas chamadas externalidades, como a infra-estrutura, a inovação tecnológica, a qualificação científica, a técnica dos recursos humanos e as políticas de meio ambiente.

Sr. Presidente, não faltam estudos nem propostas para a recriação da Sudene. Faltam decisões, falta competência, falta comando, falta liderança e interesse do Governo Federal para que o Nordeste volte a ter um órgão que planeje e coordene o seu desenvolvimento.

Mas, desde já, no aguardo de que a Câmara Federal aprecie o projeto de lei complementar de recriação da Sudene, quero apenas antecipar algumas das preocupações que, a meu juízo, não podem estar ausentes no debate sobre a concepção das finalidades da nova Sudene e na operacionalização do seu apoio a investimentos públicos e privados:

·     Considerando que o semi-árido, que hoje conta com 20 milhões de habitantes, é a área menos provida de recursos naturais, possui baixa industrialização e detém os maiores índices de pobreza, a futura Sudene, no planejamento da criação de incentivos baseados em renúncia fiscal de impostos, deverá fixar o maior percentual desses incentivos para as empresas, de qualquer porte, que decidam se instalar no semi-árido e em apoio aos clusters produtivos de cada região;

·     Considerando a tradicional concentração de investimentos na industrialização das regiões metropolitanas, característica do planejamento tecnocrático da primeira Sudene, e a necessidade de reverter esse processo, a nova Sudene deverá definir como estratégia prioritária a interiorização dos investimentos produtivos de inversão financeira dos investimentos em infra-estrutura, capacitação de recursos humanos e modernização tecnológica, para promover o desenvolvimento local nas regiões da mata, do agreste, e do sertão;

·     Com o objetivo de estancar o fluxo migratório do interior para as capitais e para outras regiões, que em 2000 era de 9 milhões e 600 mil nordestinos. e, ao mesmo tempo, com o fim de apoiar o significativo número de migrantes que estão voltando para as suas terras com o recente fenômeno da reversão migratória, a Sudene deverá criar projetos especiais de apoio a atividades produtivas familiares ou a micro e pequenas empresas nas áreas expulsoras de população e/ou receptoras dos que fazem o retorno migratório.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ao concluir este pronunciamento, faço um veemente apelo a V. Exªs para que, diante da postura claudicante do Presidente Lula, o Senado da República assuma a bandeira da Sudene como um instrumento necessário para o cumprimento do princípio constitucional de redução das desigualdades sociais e regionais de nosso País, como está claramente expresso em nossa Carta Magna.

Era o que eu tinha a dizer.

Sr. Presidente, solicito a V. Exª que autorize a publicação do meu discurso na íntegra.

 

************************************************************************************************

SEGUE, NA ÍNTEGRA, DISCURSO DO SR. SENADOR JOSÉ JORGE

************************************************************************************************

O SR. JOSÉ JORGE (PFL - PE. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os problemas decorrentes da falta de atenção do Governo Federal para com o Nordeste, após os enormes danos provocados pelas últimas enchentes no início do ano, vieram recrudescer o sentimento já existente, de abandono do povo nordestino pelo Sr. Presidente da República e seus Ministros. Este sentimento é mais um foco de decepção e até de revolta contra a paralisia do Governo Federal, desta vez diante da sempre postergada recriação da SUDENE, que tanta falta fez nestes últimos meses.

Posso afirmar, desde logo, que tais sentimentos não se restringem a parlamentares nordestinos, ou a governadores e prefeitos. Não se trata aqui apenas dos integrantes das oposições. Eles são mais profundos e têm raízes em organizações não-governamentais, sindicatos, associações de profissionais liberais, entidades estudantis, segmentos empresariais da indústria e do comércio e em múltiplos setores da comunidade acadêmica e técnico-científica.

Todos estes grupos sociais têm feito reverberar na imprensa, em debates, seminários e reuniões de órgãos de classe, suas amargas frustrações pelo não cumprimento do compromisso de recriação da SUDENE, após os 15 primeiros meses da administração do Presidente Lula, apesar de todas as promessas realizadas.

Quero citar, apenas por exemplo, dois importantes eventos ocorridos já neste ano.

O Fórum Pernambuco Século XXI - criado como centro de debates de alto nível pela Secretaria de Planejamento do Estado, em janeiro de 1999 - realizou seminário no dia 12 de fevereiro último, com os melhores técnicos de Pernambuco e importantes lideranças políticas, empresariais e da classe trabalhadora, sobre a política nacional de desenvolvimento regional e a Sudene. Foi palestrante a economista Tânia Bacelar, que apesar do seu brilho pessoal não pôde evitar o constrangimento e a decepção dos presentes com a constatação do descompromisso do Presidente da República com a recriação da Sudene.

No setor privado, já no início deste mês, profissionais e consultores de planejamento empresarial constituíram o Movimento Acorda Nordeste - MANO, para lutar pela retomada do projeto de lei complementar nº 76/03 que cria a superintendência de desenvolvimento da região e que se encontrava praticamente paralisado. Este mesmo movimento realizou seminário regional em Recife, no dia 20 próximo passado, para unir instituições em torno de estratégias que venham forçar com urgência a recriação do órgão.

Na realidade, Srªs e Srs. Senadores, fica muito difícil para os nordestinos esquecerem tão rapidamente as imagens do então candidato Lula, desfeito em lágrimas, em plena campanha eleitoral, abraçando com seus militantes o prédio da sede da SUDENE em Recife, prometendo resgatar a instituição e sua vocação histórica de indutora do nosso desenvolvimento.

Torna-se muito difícil também esquecer as suas palavras, ditas em alto e bom som durante a campanha eleitoral, por diversas vezes, que considerava a recriação da SUDENE um compromisso pessoal e político tão importante, que a nova autarquia seria criada como órgão diretamente vinculado ao seu gabinete, para não sofrer qualquer interferência que viesse dificultar seu desempenho ágil e eficaz.

E tudo parecia andar bem na empolgação de começo de governo.

O presidente criou em fevereiro de 2003, o Grupo de Trabalho Interministerial chamado GTI-SUDENE, sob a responsabilidade do Ministério da Integração, para elaborar um documento básico sobre políticas de desenvolvimento sustentável para o Nordeste, que servisse de fundamento para o projeto de lei complementar de recriação da SUDENE.

O GTI-SUDENE, coordenado pela economista Tânia Bacelar, realizou inúmeras reuniões e fóruns de debate, em Brasília, S.Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e em todos os estados nordestinos para consolidar e apresentar o solicitado documento ao Sr. Presidente da República ainda no mês de junho de 2003.

No dia 29.07.2003 o Chefe do Executivo enviava à Câmara Federal o Projeto de Lei Complementar instituindo a SUDENE e estabelecendo a sua composição, natureza jurídica, objetivos, área de competência e instrumentos de ação. E também requeria o regime de urgência para sua tramitação.

Mas a empolgação acabou por aí.

A partir de então o projeto começou a sinalizar mudanças de rumo. Em vez de ficar vinculado ao Gabinete da Presidência, como prometera, a Sudene foi inserida no emaranhado de órgãos do Ministério da Integração Nacional, ficando a ele vinculada e subordinada. Era, sem dúvida, uma primeira reversão nas intenções e promessas do Sr. Presidente.

Para surpresa de todos, em 15.09.2003 o próprio Palácio do Planalto pedia o cancelamento da urgência do citado projeto de lei. Confirmava-se o temor de que mais um ato de estelionato eleitoral estivesse em curso: a SUDENE estava entrando para o rol das promessas feitas sem prazo para seu cumprimento. E foi efetivamente o que ocorreu.

Já em dezembro do ano passado, todos fomos surpreendidos com o gesto da economista Tânia Bacelar, dando por concluídos os trabalhos do GTI-SUDENE com as propostas para as políticas nacionais de desenvolvimento regional. Simultaneamente ela pedia exoneração do seu cargo, apresentando como justificativa, supostos motivos de ordem familiar.

A imprensa pernambucana, porém, registrava o seu gesto como o de um “obsequioso silêncio”, tipo de pena mínima do período inquisitorial. Todos sabiam, na verdade, que aquele era um gesto de desencanto e de frustração com o desandar de um projeto no qual estivera ela tão profundamente engajada e que fora concebido pela elite política e técnica do Nordeste.

Por sinal, o Jornal do Comércio de 12 de dezembro já trazia esta manchete em artigo de fundo: “Nova Sudene: O jogo do sai-não-sai”. No dia seguinte, o Diário de Pernambuco estampou na manchete o seguinte título : “Recriação da Sudene adiada para 2005”. E o editorial do mesmo jornal de 27 de fevereiro fazia esta interrogação: “Que há com a Sudene?”. Todos já sabiam que a SUDENE estava sendo asfixiada em seu processo de gestação. E já todos prevêem que, se a SUDENE nascer dentro desse contexto, estará condenada desde o berço a ser apenas uma espécie de ADENE, pseudo-agência totalmente esvaziada e sem condições de operacionalizar as suas competências.

Para infelicidade do Nordeste, o Presidente Lula, com o objetivo de sufocar o mais rapidamente possível a CPI do Waldomiro Diniz, foi ao Ceará no dia 17 de março do corrente mês, para lançar um novo programa, o chamado Cresce Nordeste, anunciado um mês antes. E o faria através de duas medidas provisórias a serem lançadas, autorizando a utilização de três bilhões de reais dos recursos do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste, o FNE, para empréstimos a pessoas físicas urbanas e a empresas de economia mista.

A viagem se transformou em mais uma trapalhada presidencial, porque prontas para serem assinadas, verificou-se que aquelas MPs modificariam a legislação do FNE definida na Constituição Federal. E o Presidente Lula não teve dúvida: sustou as MPs e aproveitou para naquele momento fazer mais 7 promessas aos nordestinos, entre as quais a de criação de um milhão de empregos no Nordeste em 2004, a redução dos juros no país e novamente a de recriação da SUDENE.

Sr. Presidente, não foi sem razão que o Presidente Lula, nesta sua viagem, foi pessoalmente alvo de manifestações por ele inimagináveis, de protestos e de vaias, tanto em Fortaleza, quanto em Recife. Ultimamente nosso presidente vem sendo vaiado até quando aparece em telão.

Mas não considero esta “trapalhada” como o mais desastroso nesta “viagem das sete promessas”. O mais grave é que, mais uma vez, um programa federal para o Nordeste, que inicialmente contaria com três bilhões de reais, seria operacionalizado como atividade puramente bancária, sem a existência de um órgão regional coordenador de investimentos, que aplicasse os recursos dentro de uma visão estratégica atualizada, moderna e eficiente.

Entendo, Sr. Presidente, Sras Senadoras e Srs. Senadores, que na verdade este foi mais um ato contra a SUDENE, que joga para frente, sem horizonte de prazos, a sua própria recriação.

Mas como já me referi antes, o Nordeste não está de braços cruzados. Neste sentido a bancada nordestina na Câmara Federal já deu um importante passo. No dia 18 do último mês de março conseguiu reunir o número de 302 assinaturas de parlamentares para restabelecer a urgência para o projeto de lei de recriação da SUDENE que tramita naquela Casa. Registre-se que o regime de urgência foi restabelecido contra a vontade do Palácio do Planalto.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a recriação da SUDENE não pode ser considerada apenas como reivindicação nordestina, diante da injustiça histórica que se comete contra a região que continua sendo, socialmente, a de maior pobreza neste país. O problema de fundo está na urgência de se definir uma política de desenvolvimento regional sustentável e não apenas uma política de desenvolvimento para o Nordeste ou para qualquer outra região. Esta concepção inclusive decorre de uma tendência da economia mundial, de que a partir de projetos de desenvolvimento regional, sub-regional e local possa-se projetar a retomada do crescimento econômico e social das nações.

Mas isto não se consegue sem um planejamento estratégico, em que sejam consideradas as diversidades e as potencialidades de cada região. Por isso é que as agências regionais, como Sudene, Sudam e outras, devem ser criadas como instrumentos especiais desta política para fazer o país voltar a crescer, gerar mais empregos e trazer o bem-estar para a população.

Historicamente, a temática da SUDENE emerge na esteira do debate sobre a pobreza do Nordeste, do Norte e do Centro-Oeste, em comparação com o Brasil da prosperidade do Sul e principalmente do Sudeste. A idéia-força da SUDENE, desde as suas origens, era criar mecanismos de correção das desigualdades inter-regionais, através de políticas de desenvolvimento do Nordeste.

Olhando as origens da SUDENE, no final da década de 50, identificamos que uma terrível seca estava flagelando o Nordeste. Aquela que foi uma das maiores estiagens na Região, levou a mobilização de lideranças em um movimento que seria a semente da criação de nossa agência regional de desenvolvimento.

E me ocorre lembrar e reconhecer a importância dos bispos nordestinos nas décadas de 50 e 60, à frente Dom Hélder Câmara, de saudosa memória, sobretudo a partir do encontro de Campina Grande, em 1956, promovido pela CNBB com o então Presidente Juscelino Kubitschek.

Naquela ocasião manifestaram os bispos ao presidente JK que a sua política desenvolvimentista centrada no eixo Minas- Rio-S.Paulo e na abertura para o centro-oeste com a construção de Brasília, poderia agravar as distorções e desequilíbrios Inter-regionais, prejudicando sobretudo os nordestinos que lotavam os chamados paus-de-arara fugindo da seca para serem candangos em Brasília ou trabalhadores braçais em S.Paulo. Era o momento de se tomar alguma providencia. Este era o apelo dos bispos.

Naquele momento dava-se um passo importante no debate sobre a questão regional com a constituição do Grupo de Estudos de Desenvolvimento do Nordeste (GTDN) que deu origem à CODENO, coordenada pelo economista Celso Furtado.

No relatório do GTDN a industrialização do Sudeste era apontada como perversa para o Nordeste, que estava sendo reservada para ser apenas região consumidora da produção industrial do Sudeste.

Por sua vez, as oligarquias nordestinas, conservadoras e privilegiadas, focavam principalmente as constantes secas como a principal causa da pobreza nordestina. E o GTDN concluía em seu relatório que o Nordeste, na verdade, não era vítima das secas, mas de políticas públicas equivocadas, inclusive a do projeto desenvolvimentista de JK, que ampliavam a desigualdade entre as regiões, concentrando a produção e a geração de riqueza no Centro-Sul do país.

E assim, após vários outros eventos, como o Encontro de Salgueiro, nasceu a SUDENE, como agência de planejamento e de coordenação para o desenvolvimento regional.

De fato, em 1960, em atos quase simultâneos, JK inaugurou Brasília e criou a SUDENE, tendo à frente, como seu primeiro superintendente, o próprio economista Celso Furtado.

Sabemos que hoje não se pode cair no reducionismo dos anos 60 e dizer simplesmente que há dois Brasis: um, que é pobre e está no Nordeste, Norte e Centro-Oeste e outro, que é rico, e está no Sul e no Sudeste. Esta visão de homogeneidades macro-regionais está superada.

A partir da década de 90, surgem “ilhas competitivas” também nas regiões pobres, que se confirmaram como centros de produção, de comercialização e exportação. Estas “ilhas” já integram a economia globalizada e se relacionam de forma direta com o Sul e Sudeste ou com o exterior. É o caso do Vale do S.Francisco, com o dipolo de vitivinicultura e fruticultura de Petrolina e Juazeiro ou de fruticultura do Vale do Açu do Rio Grande do Norte. Esta é uma nova dinâmica da economia nacional que já está consolidada.

Por outro lado verificam-se bolsões de pobreza e miséria nos Estados do Centro-Sul, que se equiparam aos do semi-árido nordestino, não só dentro das próprias cidades como São Paulo e Rio de Janeiro, mas também em sub-regiões como no extremo sul do Rio Grande do Sul e nos vales do Jequitinhonha e do Rio Doce de Minas Gerais.

Já ocorre também uma desconcentração da produção industrial em nível macro-regional. Não vem mais da região metropolitana de S.Paulo o maior impulso da indústria nacional, mas sobretudo das outras capitais do Sul-Sudeste e das cidades de menor porte do interior de S.Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

Nas outras regiões do país surgem também “ilhas de produção” como os centros de fruticultura nos vales úmidos já citados e também no oeste graneleiro e nos pólos de turismo do litoral nordestino.

São para estas ilhas de dinamismo econômico que fluem os maiores volumes de capitais e de investimentos em infra-estrutura.

Mesmo com a Sudene esvaziada e a Adene como instituição puramente figurativa, ocorrem surtos de organização econômica em sub-regiões e também em consórcio de cidades. No caso de Pernambuco, por exemplo, já existem, embora incipientes, os planos de investimentos a partir das vocações sub-regionais e de clusters produtivos locais. São os casos do pólo gesseiro do Araripe; do pólo de laticínios do agreste meridional; do pólo de confecções do agreste setentrional; do pólo de ovino-caprinocultura do sertão do Pajeú-Moxotó; do pólo cultural da Região Metropolitana do Recife; do pólo de informática de Recife, além da fruticultura e vitivinicultura de Petrolina.

Como se vê, Sr. Presidente, existe uma nova realidade em cada região do país, o que vem evidenciar ainda mais a urgência e a necessidade de que se criem ou recriem agências de desenvolvimento como a Sudene, para planejar, coordenar e executar as políticas de desenvolvimento regional, integrando as regiões entre si dentro da nova dinâmica, inclusive na perspectiva da exportação e globalização.

Sr. Presidente e nobres Senadoras e Srs. Senadores, todos nós reconhecemos que nos últimos 50 anos o Brasil e o Nordeste melhoraram os seus índices de desenvolvimento e de crescimento. Mas temos de reconhecer também, que as desigualdades regionais não diminuíram. Ao contrário, até aumentaram, tornando mais sério o problema.

Os estudos demonstram que nas décadas de 60 a 80 ocorreu no país o fenômeno de uma leve “desconcentração produtiva”, gerando uma maior integração inter-regional do setor produtivo, com a migração de capitais para o Nordeste, por exemplo. Não se pode negar neste processo, os efeitos dos incentivos fiscais oriundos dos artigos 34 e 18 da lei que aprovou o II Plano Diretor da Sudene. O mesmo se diga, por analogia, com a Zona Franca de Manaus que não teria existido sem os incentivos fiscais.

Tais efeitos, contudo, não alteraram os índices de concentração de capitais e de indústrias no Sul-Sudeste, principalmente em S. Paulo que hoje ainda detém 42% da produção industrial nacional. E esta concentração teve sérios reflexos na reforma tributária, na repartição dos recursos do ICMS em relação aos estados de destino das mercadorias.

Mas, o que quero enfatizar é que o Nordeste ainda hoje continua o primo mais pobre da Federação. É o que atestam os recentes dados do “Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil”, divulgado pelo PNUD, IPEA e Fundação João Pinheiro.

Enquanto o maior IDH do Brasil, que é de 0,919, pertence ao município de São Caetano do Sul em S.Paulo, o mais baixo, de 0,467, está em Manari, em Pernambuco. A maior renda per capita, que é de R$ 954,65 pertence a Águas de São Pedro, em S.Paulo e a menor do país, que é de R$ 28,38 pertence a Centro do Guilherme, no Maranhão. A maior média de escolaridade, que é de 9,65 anos de estudo por habitante, encontra-se em Niterói, no Estado do Rio de Janeiro e a menor média encontra-se mais uma vez em Manari, Pernambuco, onde 57,01% da população ainda é de analfabetos. Enquanto a maior expectativa de longevidade no Brasil que é de 78,18 anos, está em S.Caetano do Sul, em S.Paulo, a maior mortalidade infantil encontra-se mais uma vez na cidade pernambucana de Manari, com 106,67 óbitos sobre 1.000 dos nascidos vivos.

Segundo pesquisa do IBGE, nos 5.507 municípios, entre as 40 cidades com melhor qualidade de vida apenas uma é do Nordeste, que é Fernando de Noronha, e todas as demais são do Centro-Sul. E das 40 cidades com pior padrão de vida, 33 são do Nordeste e 7 são do Norte do país. Nenhuma de qualquer outra região.

Recentemente foi divulgado pelo IBGE que 42,1% dos sem-teto da cidade de S.Paulo, é de nordestinos, que formam uma verdadeira nação dentro daquela cidade. Só de baianos a cidade de S.Paulo tem 777.952 habitantes e de pernambucanos tem 464.219.

O Centro-Oeste, como região, deu um grande salto econômico e social e já conseguiu alcançar os padrões do Centro-Sul, segundo dados do ultimo censo realizado pela IBGE.

Hoje é consensual que, em termos macro-regionais, o Brasil tem o Norte e o Nordeste como os seus maiores desafios para a erradicação da pobreza, e para o crescimento econômico.

Sr. Presidente, o projeto de lei complementar que volta a tramitar em regime de urgência na Câmara Federal cria a Sudene e extingue a Adene. Posso atestar que em sua curta existência, a Adene vem se mostrando como um órgão inútil, burocrático, inoperante e sem credibilidade. Em termos de planejamento e coordenação a Adene é uma entidade fictícia. E os nordestinos temem, diante da inconstância do Governo Lula, que em seu lugar surja uma Sudene natimorta, esvaziada e fragilizada, tendo, por um lado, um novo formato bastante adequado à realidade econômico-social do momento, mas, por outro, sem os instrumentos financeiros necessários para o cumprimento de suas finalidades.

É claro que a ex-Sudene não existia apenas para planejamento e aplicação de incentivos e recursos fiscais, mas foi o esvaziamento progressivo dos seus recursos que a levou ao descrédito e ao abandono até pelos próprios governadores nordestinos. A Sudene se tornara uma espécie de assembléia para discussões quase acadêmicas. Sem falar na burocracia, na ineficiência e na corrupção que sempre andam irmanadas.

O citado projeto de lei prevê, por exemplo, entre as finalidades da Sudene, (Art. 3º, Incisos V e VI) apoiar, em caráter complementar, investimentos públicos e privados em diversas áreas e estimular, por meio da administração de incentivos, os investimentos privados prioritários. Contudo, claudica quando não estabelece uma relação consistente entre a nova Autarquia e os fundos hoje existentes.

Entre os principais instrumentos financeiros e fiscais hoje existentes estão o FNE - Fundo Constitucional de Desenvolvimento do Nordeste, criado em 1988 e o FDNE - Fundo de Desenvolvimento do Nordeste criado em 2001, com a Adene, que substituiu o antigo Finor. Ambos são destinados apenas a inversões financeiras e são geridos pelo BNB.

O mesmo ocorre em relação aos novos fundos, tanto com o FNDR - Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional, constante da PEC da Reforma Tributária, quanto com os fundos mistos, de parcerias público-privadas e de parcerias entre a União, Estados e Municípios.

O FNDR, formado com 2% do IPI e 2% do IR, destinará parcela à região Nordeste que será utilizada em investimentos nas condições de competitividade do sistema produtivo e na criação das externalidades, sobretudo em inovações tecnológicas e preparo de recursos humanos. Lamentavelmente, como se sabe, o Governo Federal está pretendendo fatiar este fundo, diretamente com os governadores, como moeda de troca para compensar as perdas dos Estados com a própria reforma previdenciária, tornando-o uma espécie de FPE II.

O Governo também não se definiu no projeto, quanto aos recursos de renúncia fiscal a serem destinados para os projetos de investimentos nas regiões, e, nós sabemos, que o Nordeste vem diminuindo o seu percentual em termos de utilização desse tipo de recursos. Enquanto em 1997 o Nordeste utilizava 13,9% dos recursos de renúncia fiscal em seus projetos de desenvolvimento, este índice caiu em 2000 para 12,3%. No caso de S.Paulo, a trajetória foi inversa: 42,8% em 1977 e 51,7% em 2000, respectivamente.

Enfim o projeto de lei complementar não inclui nenhuma definição quanto aos instrumentos operacionais financeiros e de incentivos para que a Sudene possa ter vida. E tal fato é extremamente preocupante no contexto atual.

Estou convencido, Sr. Presidente, que a finalidade primeira da Sudene será a inclusão social dos nordestinos na sociedade brasileira, com dignidade e efetiva participação da construção do progresso do país. Esta finalidade será alcançada através do planejamento estratégico e democrático de desenvolvimento sustentável da região, que não pode ficar restrito a investimentos de inversão financeira e para as grandes corporações, mas que venha atender também a outros níveis empresariais, como o das micros e pequenas empresas e também a unidades produtivas familiares, a profissionais liberais e suas corporações, desde que seus projetos venham gerar emprego, aumentar renda, ofertar mais e melhores bens e serviços. A estes critérios deve-se aliar também o do atendimento ao desenvolvimento em múltiplas escalas, do nível local, ao sub-regional, ao regional e à integração competitiva com a economia nacional e internacional.

Permaneço também com a convicção de que a nova autarquia não poderá deixar de ter recursos estáveis, não contingenciáveis, oriundos de fundos especiais por ela geridos e que sejam direcionados para os investimentos nas chamadas externalidades como a infra-estrutura, a inovação tecnológica, a qualificação científica e técnica dos recursos humanos e as políticas de meio-ambiente.

Sr. Presidente, não faltam estudos e nem propostas para a recriação da Sudene. Faltam decisões, falta competência, falta comando, falta liderança e interesse do Governo Federal, para que o Nordeste volte a ter um órgão que planeje e coordene o seu desenvolvimento.

Mas desde já, no aguardo de que a Câmara Federal aprecie o projeto de lei complementar de recriação da SUDENE, quero apenas antecipar algumas das preocupações que, a meu juízo, não podem estar ausentes no debate sobre a concepção das finalidades da nova Sudene e na operacionalização do seu apoio a investimentos públicos e privados:

·     Considerando que o semi-árido, que hoje conta com 20 milhões de habitantes, é a área menos provida de recursos naturais, possui baixa industrialização e detém os maiores índices de pobreza, a futura Sudene, no planejamento da criação de incentivos baseados em renúncia fiscal de impostos, deverá fixar o maior percentual destes incentivos para as empresas, de qualquer porte, que decidam se instalar no semi-árido e em apoio aos clusters produtivos de cada região;

·     Considerando a tradicional concentração de investimentos na industrialização das regiões metropolitanas, característica do planejamento tecnocrático da primeira Sudene, e a necessidade de reverter este processo, a nova Sudene deverá definir como estratégia prioritária, a interiorização dos investimentos produtivos de inversão financeira dos investimentos em infra-estrutura, capacitação de recursos humanos e modernização tecnológica, para promover o desenvolvimento local nas regiões da mata, do agreste e do sertão;

·     Com o objetivo de estancar o fluxo migratório do interior para as capitais e para outras regiões, que em 2.000 era de nove milhões e seiscentos mil nordestinos e, ao mesmo tempo, com o fim de apoiar o significativo número de migrantes que está voltando para as suas terras com o recente fenômeno da reversão migratória, a SUDENE deverá criar projetos especiais de apoio a atividades produtivas familiares ou de micro e pequenas empresas nas áreas expulsoras de população e/ou receptoras dos que fazem o retorno migratório.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ao concluir este pronunciamento, quero fazer um veemente apelo a V. Exªs, para que, diante da postura claudicante do Presidente Lula, o Senado da República assuma a bandeira da SUDENE como um instrumento necessário para o cumprimento do princípio constitucional de redução das desigualdades sociais e regionais de nosso país, como está claramente expresso em nossa Carta Magna.

Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/04/2004 - Página 9531