Discurso durante a 40ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupação com o tratamento que o governo federal tem dado à reforma agrária e com a ocupação de terras pelo MST. Comentários ao editorial de hoje, do jornal O Estado de S.Paulo, que questiona a afirmação do ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rosseto, que o governo não cederá à pressão do MST.

Autor
Lúcia Vânia (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/GO)
Nome completo: Lúcia Vânia Abrão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. REFORMA AGRARIA.:
  • Preocupação com o tratamento que o governo federal tem dado à reforma agrária e com a ocupação de terras pelo MST. Comentários ao editorial de hoje, do jornal O Estado de S.Paulo, que questiona a afirmação do ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rosseto, que o governo não cederá à pressão do MST.
Publicação
Publicação no DSF de 21/04/2004 - Página 10740
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • CRITICA, OMISSÃO, TRATAMENTO, GOVERNO FEDERAL, PROBLEMA, REFORMA AGRARIA, INVASÃO, TERRAS, MOVIMENTO TRABALHISTA, SEM-TERRA.
  • LEITURA, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), QUESTIONAMENTO, DECLARAÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DO DESENVOLVIMENTO AGRARIO, AUSENCIA, ACEITAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, IMPOSIÇÃO, MOVIMENTO TRABALHISTA, SEM-TERRA, SIMULTANEIDADE, LIBERAÇÃO, ADICIONAIS, REFORMA AGRARIA, ADVERTENCIA, NOCIVIDADE, EFEITO, AUMENTO, VIOLENCIA, INVASÃO, PROPRIEDADE PRODUTIVA, ESTADOS, NECESSIDADE, IMPEDIMENTO, AGRAVAÇÃO, TENSÃO SOCIAL, PAIS.

A SRª LÚCIA VÂNIA (PSDB - GO. Sem apanhamento taquigráfico.) -

O governo em guerra contra os fatos

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho neste momento a esta Tribuna para novamente lamentar o tratamento que o Governo Lula tem dado à reforma agrária e à ocupação de terras pelo MST.

Editorial de hoje, 20 de abril de 2004, do jornal O Estado de S. Paulo, ressalta que “poucas vezes se viu, na história da administração pública brasileira, ‘uma guerra do governo contra os fatos’ tão intensa como a que está em curso no campo da Reforma Agrária.”

O artigo questiona a afirmação do Ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rosseto, de que o Governo não cederá à pressão do MST, em contraponto com a liberação por parte do Governo de uma verba adicional de R$1,7 bilhão para a reforma agrária e a pressa em duplicar - de R$ 7 mil para R$ 16 mil - os recursos alocados per capita para os assentados.

A matéria, de extrema atualidade, alerta-nos sobre os efeitos nefastos da intensificação da violência e do aumento de invasões de propriedades rurais produtivas, na maioria dos Estados brasileiros. Por isso, peço sua inserção nos Anais do Senado, ressaltando mais uma vez a necessidade de uma providência por parte do Governo Lula para evitar a situação de tensão permanente que permeia a questão agrária no Brasil.

O texto que passo a ler, para que fique integrando este pronunciamento, é o seguinte:

O Estado de S. Paulo

Publicado em: 20/04/2004

O governo em guerra contra os fatos

Editorial

Poucas vezes se viu, na história da administração pública brasileira, uma "guerra do governo contra os fatos" tão intensa como a que está em curso no campo da Reforma Agrária. O choque entre o que é dito, o que é prometido e o que é "interpretado", por parte das autoridades responsáveis pelo setor - começando pelo ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rossetto -, e a realidade da produção rural, do agronegócio, bem como dos efeitos nefastos da intensificação da violência e do aumento de invasões de propriedades rurais produtivas, na maioria dos Estados brasileiros, praticados pelo Movimento dos Sem-Terra (MST), dá a impressão de que, pelo menos nesse terreno, o governo Lula está padecendo de uma cegueira que não tem dado mostras de ser reversível.

Enquanto o ministro Rossetto "garante que o governo não cede à pressão do MST" - como a do "abril vermelho" do coordenador Stédile -, o governo libera uma verba adicional de R$1,7 bilhão para a Reforma Agrária e se apressa em mais do que dobrar (de R$ 7 mil para R$ 16 mil) os recursos alocados per capita para os assentados. Enquanto o ministro parece considerar a coisa mais natural do mundo a intensificação das ações do MST no País, afirmando que "faz parte do ambiente democrático" respeitar os movimentos e as atividades sindicais - como se se tratasse apenas disso! -, a insuspeita Comissão Pastoral da Terra (CPT) informa, em seu relatório anual, que o primeiro ano do governo Lula foi marcado pela maior violência e volume de conflitos no campo nos últimos 18 anos - ou seja, desde 1985, quando a CPT começou a fazer esse levantamento. Em 2003 as ocupações dos sem-terra aumentaram 172% (em relação a 2002), foram registrados 1.690 casos, envolvendo cerca de 1,2 milhão de pessoas - quer dizer, quase o dobro do último ano da administração FHC. E com a duplicação dos subsídios a essa baderna pode-se imaginar que este ano a violência vai bater novos recordes.

Por outro lado, o ministro acredita firmemente que, com a verba atual, de R$ 3,1 bilhões (que em seu entender não será contigenciada), o programa de Reforma Agrária irá gerar 2 milhões de empregos "até o final do primeiro (?) mandato do presidente Lula", pois está convicto - mais uma vez, contra todas as evidências econômicas - de que "a reforma agrária é um instrumento de desenvolvimento econômico sustentável, e não uma política de assistência social". Ora, o que significa, para o País, o maior fulcro de desenvolvimento sustentável - e que tem sido atrapalhado, sistematicamente, pelo desrespeito às propriedades rurais produtivas, à lei e à ordem, por parte dos militantes do MST, que têm no esbulho possessório sua estratégia básica de operação - é justamente o agronegócio, que, gerando uma renda recorde de quase R$76 bilhões, acelera o ritmo de produção e vendas da indústria e do comércio - impulsionando a venda de máquinas agrícolas, veículos e imóveis -, o que se reflete na ampliação do emprego nas cidades do interior do País - como mostrava matéria do caderno Economia & Negócios do Estado de domingo.

É certo que há opinião discordante quanto aos benefícios para a sociedade brasileira do grande desenvolvimento do agronegócio no País: para o presidente da CPT - a mesma entidade que detectou o recorde de conflitos no campo ocorrido no primeiro ano do governo Lula -, bispo D. Tomás Balduino, "o agronegócio, que está salvando as finanças do País, está impedindo a democratização da terra". Não sabemos se na opinião de Balduino a democratização da terra significaria, necessariamente, a ruína financeira do País... Também não dá para saber se o religioso está levando em consideração os recentes dados divulgados, segundo os quais a Reforma Agrária se transformou numa das grandes especulações imobiliárias ilegais do País, na medida em que os assentados têm vendido (o que é proibido por lei) 40% de seus lotes - segundo o governo esse porcentual é de 25%, o que reduziria a quantidade, mas não a ilegalidade da alienação. E será que o bispo considera também "democratização da terra" as invasões que os sem-terra começam a fazer de terrenos urbanos?

Ontem o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que "este país tem lei" - que vale para o presidente da República e "para os sem-terra e com terra", mas esqueceu de dizer se o presidente da República, finalmente, vai fazer essa lei ser cumprida. Ontem, ele se limitou a dar um conselho aos "seus companheiros do movimento social": "Ajam com a maior responsabilidade possível (sic) porque todos nós somos vítimas de nossa palavras."

O conselho apropriado para os que estão violando a lei devia mencionar as vítimas dos seus atos (ilegais), como as de Eldorado dos Carajás. Vítimas das suas palavras são os governantes que não as traduzem em atos.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/04/2004 - Página 10740