Discurso durante a 58ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Situação social do Chile. Reajuste do salário mínimo.

Autor
Mão Santa (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PI)
Nome completo: Francisco de Assis de Moraes Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO. DIREITOS HUMANOS. POLITICA SALARIAL.:
  • Situação social do Chile. Reajuste do salário mínimo.
Aparteantes
Jefferson Peres.
Publicação
Publicação no DSF de 19/05/2004 - Página 14969
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO. DIREITOS HUMANOS. POLITICA SALARIAL.
Indexação
  • ELOGIO, DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL, PAIS ESTRANGEIRO, CHILE, OBRIGATORIEDADE, ESTADO, OFERECIMENTO, GRATUIDADE, ENSINO, CRIANÇA, REGISTRO, VALORIZAÇÃO, SALARIO MINIMO, PAIS.
  • COMENTARIO, RESPONSABILIDADE, GOVERNO FEDERAL, OCORRENCIA, MORTE, ADOLESCENTE, INSTITUIÇÃO ASSISTENCIAL, RECUPERAÇÃO, MENOR, ESTADO DO PIAUI (PI).
  • CONDENAÇÃO, SUGESTÃO, AUTORIA, JOSE DIRCEU, MINISTRO DE ESTADO, CHEFE, CASA CIVIL, DESVINCULAÇÃO, REAJUSTE, SALARIO MINIMO, BENEFICIO PREVIDENCIARIO.

O SR. MÃO SANTA (PMDB - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.)- Sr. Presidente Eduardo Siqueira Campos, Srªs e Srs. Senadores, brasileiras e brasileiros aqui presentes e os que acompanham esta sessão pelo sistema de comunicação do Senado, Senador Cristovam Buarque, solicitei um aparte, mas V. Exª estava preocupado com o importante pronunciamento que fazia. Como Deus escreve certo por linhas tortas, faço agora o meu comentário.

No último fim de semana, o País assistiu ao notável jornalista Paulo Henrique Amorim fazer uma enquete se as brasileiras e os brasileiros tinham mais medo da Polícia ou do bandido. Um quadro vale por dez mil palavras.

Ao Prof. Cristovam, que é uma riqueza nossa, a que ninguém do PT excede, nem do núcleo duro, nem do núcleo mole, porque S. Exª simboliza o saber, aquele buscado pelo rei Salomão, eu diria: estive no Chile e ouvi do povo - Ulysses dizia que devíamos ouvir a voz rouca das ruas - que a Polícia daquele país não é corrupta. E quero dizer por quê. Aquele país também teve ditadura, mas se democratizou. O atual Presidente do Chile foi, como V. Exª, no primeiro governo democrático, Ministro da Educação, aceito, aclamado, aplaudido: Ricardo Lagos. Eu até trouxe de lá um livro para presentear o Presidente José Sarney, mas como S. Exª já está muito sabido, fiquei com ele porque gostei muito. Ricardo Lagos foi Ministro da Educação e agora é o Presidente do Chile. “Meu Caminho” é o nome do livro dele.

Atentem bem, lá era por oito anos a educação obrigatória. Eu não vi meninos na ruas, agredindo, pedindo escolas. Ricardo Lagos, o Cristovam Buarque de lá, o intelectual, que tem sabedoria, baixou uma lei - isso é que é lei - justa e boa, obrigando que cada cidadão chileno tenha 12 anos de ensino gratuito de qualidade. Eis aí a diferença de tudo.

E o salário mínimo de lá é de US$250.00, Lula. Seria bom visitar o Chile para conhecer. Pode-se tomar um vinhozinho, é agradável, como eu tomei! Tem o Concha y Toro, vinho bom. E o ensino universitário é pago. Com 12 anos de ensino, aprende-se a ganhar. Estudos demonstram, Lula, que cada ano de educação aumenta 16% na renda de qualquer um. Bem ali, no Chile, a universidade é privada. Mas o estudante retira um empréstimo no banco, que será pago dois anos após sua formatura. Então, teremos que mudar e valorizar a educação - área do Professor Cristovam Buarque.

Com suas palavras, enriquecerá este pronunciamento e o Senado o Senador Jefferson Péres, a quem concedo um aparte.

O Sr. Jefferson Péres (PDT - AM) - Senador Mão Santa, há pouco tempo estive em Santiago. Eu já conhecia o Chile, porque acompanho a trajetória chilena, que é exemplar para o resto da América Latina. O Chile amadureceu politicamente, deu a volta por cima, livrou-se do complexo terceiro-mundista, que ainda persegue o Brasil. É um país maduro, que tem relações com os Estados Unidos muito respeitosas, o que é recíproco. Ele acaba de fechar um acordo bilateral de comércio com os americanos. Percorri as ruas de Santiago, onde se pode andar até a noite tranqüilamente, em segurança, e ouvi dos chilenos exatamente o que V. Exª acaba de dizer: “Não ofereça propina aos guardas, porque você vai ser preso; os guardas daqui não são corruptos”. Não sei se é uma patriotada, mas há essa advertência. É claro que eu jamais ofereceria propina a qualquer título, mas dizem isso para todos os turistas, tanto confiam em sua polícia. O Chile tem uma das economias mais sólidas da América Latina, o Governo investe fortemente na educação e no social. Veja, Senador Mão Santa, o Chile não precisa mais do FMI, não deve nada a esse Fundo, depois de ter feito vários acordos. No ano passado, o Chile ingressou numa linha especial do FMI, na qual depositam recursos extras apenas os países ricos. O Chile deu-se ao luxo de ser parte desse fundo especial, como um contribuinte a mais do FMI. Não deve nada. Mas duvido que os políticos brasileiros se voltem para um país como o Chile. Acho que eles preferem a Venezuela, do Hugo Chávez. Parabéns pelo seu pronunciamento!

O SR. MÃO SANTA (PMDB - PI) - Senador Jefferson Péres, agradeço o seu aparte, que incorporo ao meu pronunciamento. Solicito ao Sr. Presidente que peça ao Sr. Raimundo Carreiro que o envie para o núcleo duro, para que, como eu, aprenda os ensinamentos do Senador Jefferson Péres.

O Presidente José Sarney lançou um livro extraordinário, Crônicas do Brasil Contemporâneo, no qual diz: “A minha pátria começa onde começa o meu chão, Pinheiro, no Maranhão”. E o meu chão é o Piauí. Então, isto é muito importante para mim. O Piauí, com todo respeito e admiração, Senadora Ideli Salvatti, é como a sua Santa Catarina para V. Exª, é o meu chão.

No jornal Diário do Povo - desse negócio de povo eu gosto mesmo -, foi publicada matéria sobre a morte dos menores. Eu não falei nem queria falar sobre isso. O bravo líder, extraordinário homem público, Senador Heráclito Fortes, teceu comentários sobre a notícia, mas eu me calei. No Dia das Mães, menores incendiaram suas celas.

Senador Jefferson Péres, fui eu que construí aquele complexo, um sonho que teve início com o Ministro Freitas Neto, que foi Senador, e que continuei com muito carinho. No mesmo bairro, há o Estádio Albertão, um Detran construído por mim, um centro médico para os exames, um pronto-socorro, portanto, há poucas residências. Foi muito bem feito, eu o inaugurei na presença de Ministros do Governo Fernando Henrique, com o objetivo de dar proteção ao menor de rua. No complexo deveria haver psicólogo, médico, procurador, promotor, defensor público, a assistência primária necessária aos que estão na rua.

Senador Jefferson Péres, sete menores morreram, e presume-se que tocaram fogo nas celas para gritar, mas não tinha ninguém. Parece uma história medieval de inquisição.

Professor Cristovam Buarque, atentai bem, a morte dos menores, fato dramático, que nos lembra a Inquisição, queima de presos e Joana D’Arc, é inacreditável, pior do que aquele episódio que envergonhou a Bancada de Rondônia. Mas veja a manchete: “Secretária culpa governo federal pela tragédia dos sete menores”. É uma mulher, e a mulher sempre diz a verdade, a mulher é verdadeira. Na crucifixão de Cristo, verificaremos que nenhuma delas falhou, a exemplo da mulher de Pilatos, Verônica. E a Secretária é do Partido do Presidente da República, o PT. Ela é uma senhora muito respeitável. Parece-me que o seu marido é Secretário de Comunicação.

...a secretária de Assistência Social e Cidadania do Estado, Rosângela Sousa, culpou o governo federal pela tragédia ocorrida no Piauí no último dia 8, quando sete adolescentes acabaram morrendo queimados...

Sete estão mortos, mas há ainda aqueles que estão hospitalizados. V. Exªs sabem que queimadura é algo muito grave. O Senador Papaléo Paes já viu quadros como esses.

Segundo o juiz da Vara da Infância e da Adolescência, o Estado foi omisso.

Outra mulher fabulosa, extraordinária, com quem convivi e a quem nomeei Vice-Presidente do Conselho de Menores, é Leida Diniz. E ela deixa a Presidência do Conselho. Está ruim o Piauí!

Outro fato: Fernanda Moita pede demissão da presidência do Interpi. No meu Governo, Fernanda Moita foi diretora do Interpi do Piauí e era conhecida como a Deusa Loira dos Sem-Terra.

Mas eu estranho uma coisa. Sou professor de Biologia. Professor Cristovam Buarque, que disciplina V. Exª ensinava na universidade?

O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PT - DF) - Ensinava, não, continuo ensinando, mesmo estando no Senado.

O SR. MÃO SANTA (PMDB - PI) - E nós estamos aprendendo com V. Exª.

O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PT - DF) - Estou dando um curso sobre economia brasileira.

O SR. MÃO SANTA (PMDB - PI) - Então, serei econômico nas palavras. Como professor de Biologia, nunca vi cachorro comer cachorro, mas, no meu entender, aqui há uma autofagia, um canibalismo político.

Eu gostaria que o Presidente da República, generoso e sensível, ouvisse isso. Senador Jefferson Péres, imagino que o Ministro da Justiça pensou em colocar o Beira-Mar numa penitenciária do Piauí, construída por mim também. Foi uma D. Guido, mas para aqueles presos domésticos. Se a Secretária do Estado diz que não garante tomar conta dos inocentes meninos que hoje são anjinhos, vítimas, avaliem se o Beira-Mar tivesse ido para lá!

Quero pedir sensibilidade, para que se averigúe o assunto, Senador Antonio Carlos, porque nunca vi isso. Chegou, quis Deus, Antonio Carlos Magalhães. Lá o Governo é do PT. E diz a manchete do jornal: “Secretária culpa Governo Federal pela tragédia dos sete menores”. Isso é canibalismo político. Mas, sob os céus, há um propósito determinado para cada tempo, Senador Siqueira Campos. E quis Deus que aqui chegasse Antonio Carlos Magalhães, uma história e uma vida de luta e de firmeza. Uma das melhores leis é a do combate à pobreza. E coragem não lhe vai faltar, porque o espírito do seu filho Luís Eduardo não vai deixar que isso aconteça. Esse salário mínimo não pode ficar assim.

Ó Deus! Diante das crianças, feche este Congresso! Ó Deus! Está na Bíblia: pedi, e dar-se-vos-á! Ó meu Deus, feche este Congresso se não formos capazes de buscar luzes para minimizar esse salário mínimo, o mais vergonhoso da História do Brasil e o pior de todos os países da América. Com a fé que remove montanhas, oramos mesmo: pedi, e dar-se-vos-á. Ó Deus! Vem para nos alegrar!

Será o mais triste o dia em que virmos isso passar como um roldão. Se Lula se julga o Cristo, o Líder maior do PT, o Senador Paulo Paim é São Francisco ou o que dele mais se aproximou. E São Francisco foi atendido por Cristo quando proclamou: “Senhor, faça-me um instrumento de Sua paz. Onde houver desespero, que eu leve a esperança”. Que sejamos nós a esperança!

No dia em que esta Casa foi fechada pela ditadura, Petrônio Portella disse que aquele havia sido o dia mais vergonhoso da sua vida.

E quis Deus que tivesse chegado aqui Paulo Paim, o São Francisco. Os humilhados serão engrandecidos e exaltados. V. Exª, Senador Paulo Paim, já foi humilhado demais. Em nome de Ulysses Guimarães; em nome daquele que, com câncer, teve coragem de pregar e fazer nascer a democracia, Teotônio Vilela; em nome daquele que se imolou, Tancredo Neves; em nome de Pedro Simon, que sintetiza as melhores virtudes do meu Partido; e em meu próprio nome, de luta, vim convidá-lo para fazer parte do meu Partido, daquele Partido do salário mínimo.

Lembrem-se de Getúlio, que criou o salário mínimo. Indaguei sobre o valor do salário mínimo à Fundação Getúlio Vargas e fui informado de que, na época de Getúlio, o seu valor era correspondente a atuais R$600,00. Não deixem o “pai do trabalhador” pular na sepultura!

João Goulart deixou esse Governo pacificador para não haver guerra civil. O valor do salário mínimo era de US$125.00, Senador Antonio Carlos Magalhães, e ele tinha um ideal: ia aumentá-lo para US$250.00. Estamos pedindo US$100.00. No Chile, são US$250.00; nos Estados Unidos, US$860.00; na França, US$1 mil. Senador Papaléo Paes, sabemos anatomia: o francês não tem dez estômagos, mas um estômago, assim como o trabalhador brasileiro. Assim, temos que conseguir isso.

Essa é a luta de que não podemos fugir. Não há razão para isso, porque nunca se viram tantos tributos cobrados neste País. Essa é a nossa luta.

Agora é aqui, Senador Jefferson Péres. Foi aqui que Deus mandou orientar Moisés. Foi aqui que começou a democracia no Senado da Grécia, aperfeiçoada no Renascimento, na Itália e na França, e aqui, pelo baiano Rui Barbosa e pelos que passaram por aqui, por nós. É longo e sinuoso o caminho daqui. Há aqui um ex-Presidente da República, um vice, vinte e dois que já governaram Estado, alguns por três vezes, outros prefeitos, algum como os três, como o bravo lá de Santa Catarina, Senador Leonel Pavan, tantos outros Ministros, líderes e sindicalistas.

Sr. Presidente, essa é a nossa luta, senão vamos para a desgraça: a desvinculação do salário mínimo. Esta é a desgraça total: a desvinculação do salário mínimo para os aposentados. Isso passou do núcleo, do cérebro.

O Ministro José Dirceu e o Presidente Lula concordaram que o valor do salário mínimo deve ser desvinculado dos valores pagos na previdência. Pobres dos aposentados! É arrocho à vista. Essa indexação é a única aceita pela Constituição: mudou o mínimo, muda o benefício.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. MÃO SANTA (PMDB - PI) - Sr. Presidente, permita-me só uma explicação: o que eu disse foi tirado da minha cabeça mesmo, do meu núcleo mole, do meu cérebro, do meu encéfalo. Mas o que vou dizer agora parte dos melhores técnicos do País, que mandei buscar para dignificar e engrandecer este pronunciamento.

Segundo o economista Guilherme Delgado, técnico do Ipea, Assessor do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, estudioso dos efeitos das políticas sociais sobre a distribuição de renda, só o desconhecimento explica que um governo cuja principal bandeira é o combate à miséria defenda a desvinculação entre os benefícios da previdência e o salário mínimo.

Diz Guilherme Delgado: “O verdadeiro Fome Zero é a seguridade social”. Enquanto os benefícios da previdência chegarão, neste ano, a R$120 bilhões, o Bolsa Família, o principal Programa do Fome Zero, ficará em R$5,7 bilhões. Segundo o IBGE, os pobres no Brasil são 34% da população. Já sem os benefícios previdenciários, os pobres passam a 45,3% do total. Isso representa um crescimento de 11%, ou seja, quase 20 milhões de pessoas iriam aumentar o contingente de pobres no Brasil.

Em resumo, essa desvinculação proposta pelo Presidente Lula e o Ministro José Dirceu poderá levar 20 milhões de brasileiros para a linha da miséria. Só pode ser desinformação.

Eu terminaria com o que disse São Francisco: onde houver desespero, que eu seja a esperança. Que o Senado seja a esperança do salário justo!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/05/2004 - Página 14969